Uma reflexão de Georgino Rocha
“É necessário que Ele reine"
no coração da vida e no seio da morte,
nas manhãs de primavera e no outono da existência
“É necessário que Ele reine” afirma São Paulo na 1ª carta aos cristãos de Corinto; reine em todos e em tudo, no coração da vida e no seio da morte, nas manhãs de primavera e no outono da existência. Sempre! A afirmação paulina manifesta o reconhecimento da função benfazeja de Jesus Cristo e da situação humana carecida de sentido para a vida e de horizontes para a esperança. Faz parte de uma das leituras da celebração da festa de Cristo Rei e atesta a visão do apóstolo sobre a missão de Jesus ressuscitado. A comunidade cristã assume esta visão e procura ser coerente vivendo e anunciando a realeza de Jesus Cristo, ao longo dos tempos.
Pio XI, em 1925, dá uma nova visibilidade a esta fé comum dos cristãos e institui a solenidade de Nosso Senhor Cristo, Rei do Universo. A “onda” histórica, então crescente, era a da indignação contra a degradação a que a sociedade havia chegado conduzida por forças políticas e económicas desumanas e sem perspectivas de futuro. E vem a queda da República às mãos de Gomes da Costa, o abalo “sísmico” na bolsa de Nova York, a ascensão de tendências totalitárias, com Hitler, Mussolini e outros a progredirem na tomada do poder… Uma nova ordem parecia emergir. O cansaço aliado à inércia abria caminho a alternativas de ditadura.
“É necessário que Ele reine” continua a Igreja a apregoar por toda a parte. Reinar não à maneira dos senhores do mundo, mas de quem exerce o poder para servir, põe toda a autoridade na promoção do bem comum, sobretudo dos mais indefesos e necessitados. Como Jesus exemplificou de forma inexcedível e deixou em ensinamentos claros e libertadores.
Que Ele reine na consciência humana, iluminada pela verdade que liberta e pelo amor que sociabiliza; no matrimónio heterossexual, fonte de felicidade do casal e berço aconchegado da família; na sociedade, espelho da dignidade humana e recheio de valores solidários; na Igreja, samaritana de feridos e órfãos, abrigo seguro dos que procuram, suporte e garante dos que progridem na doação generosa aos demais, comunhão de comunidades em que a diversidade de dons e carismas converge na unidade da missão.
Que Ele reine na justiça – sinal emblemático da sua mensagem – que constitui o alicerce da paz. O que exige leis justas e responsáveis íntegros e competentes, processos transparentes, isenção de tráfico de influências, definição e respeito pelos prazos legais razoáveis. Justiça acessível a todos, sem discriminações, que valoriza a dignidade humana em todas as circunstâncias.
Que Ele reine na política – expressão pública da entrega incondicional pelo bem do povo – que dá solidez à convivência social em harmonia e ao desenvolvimento sustentado, procurando uma maior igualdade entre os cidadãos. Como seria diferente o clima social que vivemos, a constituição da República que nos define, a hombridade dos políticos que nos governam a todos os níveis!
Que Ele reine na economia – espelho qualificado da relação com os bens e com a sua função de serviço à pessoa humana – que garante o necessário a uma vida digna para todos e valoriza as capacidades de cada um, proporcionando-lhe oportunidades de realização feliz A este propósito é muito eloquente a atitude de Jesus no modo como conviveu com os ricos e como atendeu os pobres!
Que Ele reine na cultura da vida, no voluntariado por amor, na “saída de si mesmo” para ir em missão às “periferias” existenciais, nos sonhos dos jovens que valorizam a castidade e a honestidade, nos idosos que fazem das suas limitações recursos para novas ousadias de serviço ao seu próximo, nos responsáveis das comunidades eclesiais que dizem não às benesses e cultivam a simplicidade de vida e a proximidade de atitudes.
Os cristãos discípulos missionários, em parceria com as pessoas de boa vontade, são mensageiros qualificados da novidade deste “reinado” e, com a força do Espírito Santo, colaboradores preciosos da sua construção e difusão.