“A admiração
é a ingenuidade da inteligência.”
Berilo Neves
Para cativar a atenção e o interesse dos alunos, hoje em dia, o professor tem de fazer malabarismos, que noutra épocas se atribuiriam apenas aos acrobatas circenses.
Dadas as solicitações a que está sujeito o aluno, na concorrente escola paralela, caberá ao professor superá-las, se quer conquistá-lo para o contrato pedagógico.
Assim e para conquistar os alunos para o assunto da aula, a teacher recorreu a uma nova estratégia, na abordagem da matéria desse dia.
Ia ensinar as criancinhas a dizer a morada em Inglês e para isso usaria a 1.ª pessoa: My address is….
Ocorreu-lhe referir a sua própria morada, apenas fazendo as alterações correspondentes à estrutura da nova língua. Sim, inicialmente visualizou a sua residência, ali perto da escola, mas…também logrou a visão dos seus “telhados de vidro”, na sequência de alguma contestação à autoridade pedagógica!
Os alunos não conseguem, na sua tenra idade, aperceber-se do que se passa na mente do professor, mas este tem de possuir um raciocínio mais veloz que a dispersão mental dos alunos e o consequente alheamento.
Assim, num ápice, a teacher mudou a estratégia e indicou uma morada fictícia, que pudesse obviar a qualquer hipótese de vandalismo…
My address is 25 Palm Street, Moon. Foi explicado às criancinhas, em Português, tendo a teacher satisfeito a curiosidade de alguns mais perspicazes, quando confrontados com esta inesperada morada. Com a quantidade de topónimos exóticos que abundam na geografia deste planeta, basta lembrar localidades próximas, como Nariz… Ancas, Bustos, Mamarrosa (referido pelos humoristas com um nome específico…) para não referir algumas com nomes obscenos, a Lua teria todo o cabimento e verosimilhança. Quando Interpelada sobre esta insólita quão longínqua morada, atalhou que, efetivamente, ainda não era uma residente de facto, mas que havia lá comprado um andar … tencionando mudar-se em breve. Estava, no momento a fazer a mudança, para em breve se mudar de armas e bagagens! Um aluno, com o olfato intelectual mais apurado, ainda quis argumentar, titubeante…que na lua não havia água, pelo que a existência de vida era impossível. Prevaleceu o “Magister dixit!”já que não deu consistência à sua fundamentação.
Esta súbita mudança de direção proporcionou-lhe a visualização de uma possível evasão para um ambiente tranquilo, em que a ausência de poluição sonora e ainda melhor, de força da gravidade, lhe permitiriam deslocar-se como uma pena, sem ter de carregar o peso dos anos. Desde miúda, quando parecia estar alheada, em silêncio, ouvia por vezes o raspanete: “Estás, na lua!” Sempre fora um refúgio muito apelativo…agora seria a concretização da fuga!
Enquanto as crianças registavam, nos cadernos, a nova estrutura linguística, a teacher divagava.
Ah…que bom seria, de vez em quando, deixar estas atribulações terráqueas e mergulhar no paraíso lunar!
A aula terminou, tendo as criancinhas ficado com a convicção que a teacher queria ir para a lua!
Só não pensaram no meio de transporte que ela usaria para descer à Terra e vir lecionar à Escola Básica 2/3 da Gafanha da Encarnação! Se ainda contasse com ajudas de custo da tutela, para essas deslocações…pagas ao Km!!!
Na aula seguinte, depois de terem registado a abertura da lição e estar tudo a postos para mais uma sessão de trabalho, o Joãozinho, aluno muito educado e empenhado, na aprendizagem da Língua Inglesa, levanta timidamente o dedo para falar. Nenhuma semelhança com o brejeiro “Joãozinho” das anedotas!
— Vá lá, Joãozinho…tens alguma questão a colocar?- diz a mestra, aguardando com expetativa.
— Sim…queria perguntar se mora mesmo na lua!
A muito custo refreou uma sonora gargalhada…mas conteve-se…não podia desdenhar de tão flagrante demonstração de candura, uma realidade que cada vez se aproxima mais da extinção, na escola portuguesa.
— É que a s’ora estava com um ar tão sério quando falou nisso!
— Já ganhei o dia!- cogitou a professora. Com boa disposição e alento, deu seguimento aos trabalhos, depois de ter esclarecido e apaziguado aquele aluno, na ânsia de prosseguir no estudo da língua estrangeira, sem mudar de professor!
— Bem me apetecia, de vez em quando, ir lá passar uma temporada! Mas não era de ti que queria fugir, Joãozinho! Tu irias deixar-me saudades!