Reflexão semanal de Georgino Rocha
«Dois apóstolos admiráveis que a Igreja celebra na mesma festa. A ambos custou muito entender a novidade de Jesus: estavam amarrados a tradições religiosas ancestrais, defendiam o cumprimento literal das leis, esperavam ver desaparecer os inimigos e triunfar o reino por eles idealizado, de acordo com as tradições. Pedro chega a arvorar-se em mestre de Jesus que lhe dá uma reprimenda inigualável. Paulo orgulha-se da sua formação na escola de Gamaliel e de outros títulos de glória, mas, uma vez convertido a Cristo, considera tudo lixo, pois só quer saber de Jesus e de Jesus cruxificado.»
Jesus declara feliz Simão Pedro pela resposta dada à pergunta que havia feito ao grupo dos apóstolos: “E vós quem dizeis que Eu sou?” Espontâneo e emotivo, diz sem hesitação: “Tu és o Messias, o filho de Deus vivo”.
Jesus acolhe esta resposta que o identifica na sua realidade mais profunda, revela que Pedro foi agraciado por uma revelação especial de Deus Pai e anuncia a nova identidade que ele viria a assumir na Igreja encarregada de propor a verdade, de estabelecer laços de comunhão, de ser pedra sólida na construção de uma nova civilização - a do amor. A missão de Pedro emerge da identidade de Jesus Cristo e configura-se no seio de uma Igreja marcada pela fidelidade e responsável pelo testemunho coerente e oportuno.
Assente nos seus traços principais, a missão de Pedro e dos papas, seus sucessores, tem procurado, ao longo da história, a melhor forma de ser levada à prática. Nem sempre fácil, como demonstram os factos. Mas a harmonia na comunhão e o respeito pelas diferenças legítimas são sempre desejados e, ultimamente, foram expressos como “pedido” oficial ardente por João Paulo II, Bento XVI e Francisco. Nem excessos de papado e menoridade do colégio episcopal, nem o seu contrário. Nem uma diocese mundial – a de Roma – e redução das outras dioceses a simples filiais, nem uma dispersão que ignore e desfaça a comunhão no seio da qual o serviço do Papa tem relevo peculiar.
Exemplo claro desta tensão fecunda é-nos dado por Paulo de Tarso, homem determinado e temperamental, perseguidor zeloso, apóstolo de Jesus Cristo por especial eleição. O seu modo de ver as situações e de compreender a missão de evangelizar as pessoas entram em conflito aberto com os cristãos provindos do judaísmo e seus responsáveis. Várias vezes, tem de afirmar a sua convicção pessoal e de provocar reuniões com outros apóstolos e discípulos para que, como veio a recomendar o Vaticano II, “haja unidade no necessário, liberdade na dúvida, caridade em tudo” GS 92.
Dois apóstolos admiráveis que a Igreja celebra na mesma festa. A ambos custou muito entender a novidade de Jesus: estavam amarrados a tradições religiosas ancestrais, defendiam o cumprimento literal das leis, esperavam ver desaparecer os inimigos e triunfar o reino por eles idealizado, de acordo com as tradições. Pedro chega a arvorar-se em mestre de Jesus que lhe dá uma reprimenda inigualável. Paulo orgulha-se da sua formação na escola de Gamaliel e de outros títulos de glória, mas, uma vez convertido a Cristo, considera tudo lixo, pois só quer saber de Jesus e de Jesus cruxificado.
De ambos, conservamos o testemunho mais expressivo do serviço ao Evangelho, apesar da sua fragilidade: fazem a experiência feliz de encontros com Jesus ressuscitado, buscam a verdade e superam tensões mediante a oração e o diálogo em assembleias, aceitam as suas debilidades como espaços de vida onde emergem a força de Deus e a paixão pelo anúncio do Reino, reconhecem um no outro o amor de eleição e respeitam os campos acordados da missão, selam com o sangue martirial a opção de vida que haviam feito por Jesus Cristo e seu reino.
Festa de São Pedro e de São Paulo, colunas da Igreja, arautos do Evangelho ao serviço da verdade e do amor. Vale a pena experienciar o seu testemunho de felicidade!