"O Papa Francisco é um profeta que surgiu na Igreja e na sociedade. Não inventa nada. Fiel à mensagem evangélica, dá vida ao que crê e propõe. Os seus gestos são os de Cristo, para uma Igreja que lhe quer ser fiel. Servem também de sinal para uma sociedade descentrada do essencial. Ele mostra, de modo atual e ao vivo, o fundamental esquecido, minimizado, trocado por gostos do tempo, alheios à reflexão e às exigências do bem. Há mais gente a alegrar-se com as suas vaidades do que com a verdade que liberta. Assim na sociedade. Também, na Igreja, no meio do fumo do incenso, se pode esconder o essencial da mensagem, caminho certo na procura do bem. O que provoca o confronto incómodo nas ideias e opções, bem como a vontade de reagir, é o que na vida é essencial. Não é o banal ou o efémero. Pelo essencial reclamam os que querem ser fiéis à verdade e experimentam, cada dia, o vazio e sem horizontes de uma sociedade amorfa."
António Marcelino
Quem se instala na admiração do que lê, ouve e vê, corre o risco de adaptar tudo ao seu gosto pessoal. É preciso ouvir os profetas que têm os pés no chão e o coração a olhar mais longe. Os profetas são sempre incómodos. Pode espreitar-nos o risco de que fala na Bíblia o profeta Isaías. Os incomodados invetivam os profetas, dizendo-lhes: “Não nos reveleis a verdade, dizei-nos coisas agradáveis, profetizai ilusões. Afastai-vos do nosso caminho, desviai-vos da nossa vereda, tirai-nos de cima o olho que nos julga e incomoda…” Hoje, não falta gente a pensar assim.
O Papa Francisco é um profeta que surgiu na Igreja e na sociedade. Não inventa nada. Fiel à mensagem evangélica, dá vida ao que crê e propõe. Os seus gestos são os de Cristo, para uma Igreja que lhe quer ser fiel. Servem também de sinal para uma sociedade descentrada do essencial. Ele mostra, de modo atual e ao vivo, o fundamental esquecido, minimizado, trocado por gostos do tempo, alheios à reflexão e às exigências do bem. Há mais gente a alegrar-se com as suas vaidades do que com a verdade que liberta. Assim na sociedade. Também, na Igreja, no meio do fumo do incenso, se pode esconder o essencial da mensagem, caminho certo na procura do bem. O que provoca o confronto incómodo nas ideias e opções, bem como a vontade de reagir, é o que na vida é essencial. Não é o banal ou o efémero. Pelo essencial reclamam os que querem ser fiéis à verdade e experimentam, cada dia, o vazio e sem horizontes de uma sociedade amorfa.
Vem a propósito da perda do essencial uma história que por aí correu. Numa comunidade cristã apareceu um livro estranho. Ninguém o conhecia nem o entendia. Mandaram-no para Roma, pensando que aí podia ser decifrado. Depois, seria queimado ou divulgado. Em Roma, a mesma incapacidade. Ninguém sabia dizer nada de tão misterioso livro. Foi levado ao Santo Ofício, o santuário da ortodoxia. Havia aí uma máquina que podia fazer luz. Momento solene. O cardeal ligou a máquina numa tabela alta e exigente. Colocado o livro, a máquina rebentou… Cresceu a admiração de todos. Foi, então, que apareceu um frade velhinho, anónimo e desconhecido. Ao saber o que se passava, pediu para ver o livro. Pegou nele e exclamou com naturalidade: “É uma Bíblia!” Será que em terra de papas e de cristãos tradicionais, a Bíblia, livro fundamental da Igreja e dos crentes, já não era conhecido? Hoje não faltam bíblias…
Uma renovação com futuro implica a cuidada revisão de vida dos crentes e dos não crentes que procuram luz. É a conversão. Exige uma mudança de mentalidade, de valores e de critérios que orientem a vida. Sem ela, é impossível a reforma de cada um, da sociedade e da Igreja. A tradição criou repetidores, não inovadores. É mais fácil organizar eventos vistosos e repetir o de sempre com adereços de novidade, que inovar a partir de fidelidade ao essencial. Há que refletir mais sobre a realidade e a verdade.
Para os crentes, Deus Pai é o essencial a repor e a propor à Igreja e ao mundo. Muitos O esquecem ou O julgam inútil e alheio aos problemas das pessoas. É a chaga do indiferentismo. Ninguém mais próximo que esse Deus esquecido ou rejeitado. Cristo, Homem Deus, é a evidência histórica desta presença divina. Os políticos falam demais dos seus interesses partidários. Também a hierarquia da Igreja, por vezes, se esgota a falar mais do sistema clerical do que do Deus que salva. A Nova Evangelização dos pagãos batizados é o grito de alerta a uma Igreja repetitiva, adormecida, descentrada do essencial. Um grito que denuncia as ações de fachada e as novidades ocas. Dizer Deus aos homens e mulheres de hoje e, sobretudo, aos jovens e adultos a responsabilizar mais na sociedade e na comunidade cristã, ajuda a estabelecer um contacto pessoal com o essencial que gera experiência de vida e compromisso público. O problema de Deus, como tudo o que é essencial, não é parcelar. É total. A luz para uma sociedade que avança e uma Igreja que peregrina, movidas pela vontade de conversão aponta sempre à fidelidade diária ao essencial. Andando pelos caminhos de todos, sem enjoos nem orgulho, sente-se, a cada passo, necessidade de mudar de mentalidade e comportamentos, para viver uma fé que toque a vida toda e tudo da vida.
António Marcelino
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