Maria Donzília Almeida
17 de Abril de 2013
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Desde tenra idade, que a vida me foi preenchendo com acontecimentos marcantes. Neste dia, evoco o meu ano de caloira na Academia de Coimbra, em que foi lançado o embrião daquilo que viria a nascer, em Abril de 1974.
Há 44 anos atrás, era eu uma jovem de 19 anos, a dar os primeiros passos na senda de Minerva, postada ali, em grande plano, no átrio da Faculdade de Letras.
Naquela manhã primaveril de 17 de abril de 1969, por ocasião da inauguração do Edifício das Matemáticas, a cidade de Coimbra estava em polvorosa. Vieram, a Coimbra, os Ministros das Obras Públicas, da Educação, o Prof. Hermano Saraiva e o então Presidente da República, Almirante Américo Tomás.
Foram recebidos na Reitoria, e em conjunto com o Reitor, Doutor Andrade Gouveia, seguiram pela Rua Larga até ao Largo D. Dinis onde, no meio de muito barulho, se erguiam cartazes contra a Ditadura. Seguiu-se a bênção do edifício em que o Bispo de Coimbra era constantemente interrompido, por gargalhadas e ataques de tosse simulados. Na inauguração do edifício, o Presidente da AAC, hoje deputado Alberto Martins a quem tinham avisado, previamente, que não podia usar da palavra, levanta-se e pede para intervir. Este simples gesto haveria de ficar para a história da Academia e do nosso país, mergulhado numa prolongada ditadura.
A recusa deste pedido foi o rastilho para os tumultos que se seguiram, a exaltação dos ânimos de ambas as partes e toda a irreverência/efervescência juvenis vieram à tona. O regime tremeu!
5 anos após este acontecimento, dava-se em Portugal, a grande revolução, no dia 25 de abril de 1974.
A Associação Académica foi demitida e os seus dirigentes suspensos da UC. Houve uma assembleia Magna, seguida de muitas outras, onde compareceram nomes sonantes de Professores, em apoio aos estudantes, pondo a sua carreira em perigo: o Doutor Orlando de Carvalho e o Doutor Paulo Quintela, meu professor que, com a sua voz de trovão, disse para os estudantes: -"Só quem vos elegeu vos poderá demitir".
Devo aqui, referir, que este último deixava transparecer de forma velada, mas explícita, os seus ideais de esquerda, nas aulas que nos ministrava de Literatura Alemã. Um dia, explodiu de cólera, quando esta criatura, numa oral de Língua Alemã, confundiu a cruz suástica ou cruz gamada, com o símbolo do comunismo! Quase saltou da cadeira e com aquele vozeirão que lhe era característico, aliado ao tom teatral, foi ao quadro preto (na altura era o que havia, num regime pobre e sem a cultura das TIC!) e desenhou, bem claro e grande, aquele símbolo, onde colocou uma cruz (das nossas), por cima! Ao ladinho mesmo, do outro símbolo do regime que ele, intimamente acariciava!
A ignorância é muito atrevida, mas a falta de formação política era gritante, naqueles tempos de obscurantismo fascista! Só o Alberto Martins, o Celso Cruzeiro e outros que não vou referir agora, faziam parte dessas catacumbas do poder, onde maquinavam as suas ideias revolucionárias e cozinhavam no cadinho da revolução!
Foram dias quentes, que o maio, em Coimbra ainda tornava mais escaldante!
A Briosa foi à final da Taça, mas como a Academia estava de luto, quis jogar de branco, cor do luto académico, mas não foi autorizada a tal. Subiram, ao campo, de capa ao ombro, para defrontarem o Benfica. Nas bancadas, o jogo era outro. Os estudantes que haviam chegado, em caravana de Coimbra, traziam cartazes que clamavam por democracia e liberdade, para exibir no jogo. A PIDE intervinha, mas os estudantes fintavam os agentes, fazendo sumir, por golpes de mágica, os cartazes, que logo surgiam no lado contrário. Pela primeira vez, o regime proibiu a transmissão do jogo da Final da Taça, por motivos óbvios. Foram tempos dignificantes para os Estudantes de Coimbra e é graças a isso, que hoje podemos afirmar que para a liberdade e democracia do país, a capa e a batina dos estudantes também deu o seu contributo.
Será que os protagonistas da crise académica de 1969, já referidos e que ficaram para a história como heróis, mantêm, hoje, a euforia dos seus tempos áureos de juventude? Num país que está a preto e branco... com uma primavera envergonhada que parece associar-se ao cinzento da nossa política? PFica a pergunta no ar.
17 de Abril de 2013
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