João Aguiar Campos
João Aguiar Campos |
1. Foi por acaso, numa partilha de rede social, que cheguei ao desenho da criança, sentada a meia encosta, ao lado do seu fiel cachorrinho.
Num diálogo que só a imaginação pode assegurar, ela pergunta: «Que nos trará o ano que vem?». O cachorrinho, de orelhas arrebitadas e cérebro vivo, responde prontamente: «365 oportunidades».
Confesso não saber se, na surpresa de uma questão igual, eu daria igual resposta. Admito mesmo um discurso redondo, evocando previsões de Agenda, evoluções desenhadas por uma série de indicadores ou prognósticos de consultores reais ou fictícios, etc, etc. Falar de 365 oportunidades porventura não me ocorreria. E constato-o com pena!
Admito, de facto, que tenho deixado alguma humidade escorrer livre pelas paredes do ânimo, refugiando-me no lugar comum do «isto está péssimo» - sem me aperceber que a repetição reforça a convicção e agrava o olhar.
Repito uma vez e outra que «Deus dá o frio consoante a roupa». Mas logo a seguir tirito de pessimismo, desmentindo a esquina soalheira onde poderia ver um céu diferente.
Na passagem de ano, tomei a decisão de mudar. Mas já sei quão difícil é contrariar o que é tido como inevitável, pois isso obriga-me a ser verdadeiramente crente: a acreditar em mim, nos outros e n'Aquele que nunca falta com a Sua graça. Obriga-me a valorizar pessoas e atitudes que tenho desvalorizado, subalternizando ao mesmo tempo algumas das prioridades até agora estabelecidas.
Mas vale a pena enfrentar o desafio que, na expressão de Whitney Junior, "existe para tornar as coisas melhores".
2. Olhar os dias que temos por diante como oportunidade implica virtude. Realmente, a esperança e a confiança são exigentes e, como diria S. Josémaria Escrivá, muito distintas de uma atitude melosa e quietista, segundo a qual ao fim e ao cabo tudo dará certo... Não.
Os resultados merece-os apenas quem é rigoroso e esforçado. Quem sabe conviver com as lágrimas e não fecha os olhos ao rosto desfigurado do seu tempo.
A passividade nada pode esperar legitimamente e, sobretudo, nada faz acontecer, se excluirmos o desastre... Tudo o mais pressupõe compromisso e trabalho permanente para tornar efetivas as pequenas esperanças e abrir a porta à grande esperança.
Trata-se, citando Bento XVI, de um modo de ser, que se adquire mediante esforçada e contínua aprendizagem. Sem desistência, ainda que pela vida pessoal ou pelo momento histórico, aparentemente nada mais haja a esperar (Spes salvi, 35).
Penso ser de Gustave Thibon a ideia de que as graças estão presas ao céu por um cabelo. A vontade é a tesoura que, facilmente, o corta. Decisivo é saber quanto queremos o que queremos!