Visitar doentes:
maneira de santificar o domingo
Rosa Lé, viúva de João Vilarinho das Neves, é visitadora de doentes na nossa paróquia. Oficialmente começou há cerca de um ano, quando respondeu ao apelo do Prior da Gafanha da Nazaré, Padre Francisco Melo, dirigido a todos os que se sentissem vocacionados para o serviço de apoio aos idosos e doente. Mas Rosa Lé já tinha, desde muito nova, a experiência de visitar os doentes, sobretudo na Marinha Velha, lugar onde nasceu e com o qual mais se identifica por conhecer toda a gente.
Quando menina acompanhava regularmente sua mãe, Custódia Lé, nessa missão de caridade e de apoio a quem sofre, na companhia de Maria da Luz Bola. Aconteceu isto na década de 50 do século passado. E Rosa Lé recorda-nos esses tempos de «muita pobreza», o que levava sua mãe com a referida vizinha a desenvolverem iniciativas de ajuda às famílias encontradas em situação precária, ao mesmo tempo que solicitavam a cooperação da comunidade.
A nossa entrevistada lembra que as visitas eram habitualmente aos domingos, assistindo ela à forma carinhosa como lidavam com os doentes, animando-os nas horas de sofrimento. E acrescenta: «A minha mãe até era chamada na hora da morte de doentes e idosos para os acompanhar. Ela, que sabia ler, lia orações próprias para esses momentos difíceis.»
Ao longo da vida, Rosa Lé continuou a visitar familiares e vizinhos doentes, com quem tinha mais confiança. Fazia-o, porque sentia ser sua obrigação, enquanto cristã, acompanhar quem sofre. Seguia a sensibilidade do seu coração, alimentada pelo exemplo colhido na infância e juventude. E sempre assim tem sido, considerando ser este serviço uma forma de «santificar o domingo».
Quando se inscreveu para se tornar oficialmente uma visitadora de doentes, participou num encontro, onde recebeu algumas informações. E continuou a fazer o que já fazia há muito. E contou: «Quando chego, pela primeira vez, apresento-me e digo que, se o desejarem, poderei passar regularmente para estar com os doentes; normalmente, todos aceitam a minha oferta e a partir daí procuro fazer uma visita semanal; falamos da doença e da necessidade de seguirem os conselhos médicos; da coragem que é preciso para aguentar o sofrimento e de o oferecerem a Deus.»
Se a conversa se proporciona, direta ou indiretamente, Rosa Lé, pergunta se a família e os doentes gostariam de receber a visita do nosso prior; e se a resposta for positiva, ela própria se encarrega de comunicar esse desejo ao Padre Francisco ou ao Padre César, responsável por este serviço. E a nossa entrevistada adianta-nos que, a partir da visita do sacerdote, o doente passará a receber Jesus Sacramentado, todos os domingos, por intermédio de um Ministro Extraordinário da Comunhão.
Durante as visitas, Rosa Lé sente quanto é desejada, tal é a empatia que se estabelece entre ela os visitados. Sublinha a dado passo da entrevista que um doente lhe disse, há tempos, quando chegou, que ela «já não o visitava há uma semana e dois dias», sinal de que gostava da sua presença.
Entretanto, recordou que alguns doentes vivem numa grande solidão. Em casa, sem qualquer contacto com a rua e com as pessoas, são pura e simplesmente esquecidos pela sociedade e até por muitos familiares e amigos. Daí a alegria que manifestam quando se lembram deles. Refere, então, que muitas vezes são os doentes que se visitam uns aos outros.
E contou um caso: «Um doente, com um AVC, que anda numa cadeira de rodas, foi visitar com sua esposa, que o levou, um amigo que estava acamado; este disse-lhe que até já tinha recebido a visita de um sacerdote, ao que o amigo respondeu que a ele nenhum padre o tinha visitado.» Deste desabafo nasceu o encontro esperado, o que muito agradou ao doente e sua família.
Na paróquia da Gafanha da Nazaré, a Pastoral dos Doentes está a ser reorganizada, para avançar em pleno brevemente. Nesta altura, há apenas oito visitadores, mas o número vai crescer significativamente, porque há, certamente, muitas pessoas a precisar de quem as ajude a enfrentar a doença e a solidão em suas próprias casas.
Fernando Martins
Algumas notas históricas
O Serviço dos Doentes sempre existiu na Gafanha da Nazaré, não como setor organizado, mas como tarefa fundamental dos batizados, que não podem, nem devem, viver alheios ao cuidado de quem sofre. Em 1973 foi assumida esta missão pastoral de forma mais organizada, conforme se lê na monografia da Paróquia, “Gafanha, Nossa Senhora da Nazaré”.
A princípio, a tarefa de visitar os doentes era orientada a nível arciprestal. Em Ílhavo se discutia e preparava o programa anual, participando os visitadores em reuniões de formação. Em 1976, porém, por dificuldades na deslocação, a Pastoral dos Doentes passou a ter formação paroquial, ficando como primeiras responsáveis Rosa Bela Vieira, Maria Isabel Carreira e Fernanda Dias.
Nessa altura, além das visitas aos doentes, a paróquia também estava atenta ao Dia Mundial do Doente, ao encerramento do Mês de Maria, em Outubro e ao Natal. Em 1986, havia na freguesia 150 doentes, que recebiam regularmente as visitadoras. E na mesma monografia refere-se que as pessoas que visitam os doentes e idosos devem ser «humanas, caridosas, disponíveis, unidas e capazes de manter sigilo»
Presentemente, há apenas 8 visitadores, 22 ministros extraordinários da Comunhão que, de certo modo, também desempenham a função de visitadores e 64 doentes registados. Tudo se conjuga para que a Pastoral dos Doentes num futuro muito próximo consiga chegar a todos os doentes da Gafanha da Nazaré.
FM