quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Como é lida a Igreja em Portugal pela comunicação social




Janelas estreitas 
e relações limitadas

António Marcelino


«Há meios de comunicação social que, não só em relação à Igreja, mas também à política e a outras realidades sociais importantes, “adoram o conflito”, a divisão e o confronto, ainda que inútil, quando não mesmo ridículo. É seu gosto preferido explorar o que pode dividir e provocar fricção. É isto o que se vende a leitores ou ouvintes superficiais, sempre ávidos de novidades que choquem. Será esta a sua missão?»

Cada vez me impressiona mais a maneira como é lida a Igreja em Portugal pelos meios de comunicação social. Porque a maioria dos jornalistas prefere as janelas estreitas, logo reduzem os seus horizontes. Porque são limitadas as suas relações com gente da Igreja, depressa se convencem que a Igreja se reduz aos seus conhecidos.
A boca do palco não é lugar para muita gente e está habitualmente ocupada. Também na Igreja, uns têm vocação de trabalhar nos bastidores, outros de longe se habituaram a ser esquecidos ou a só serem lembrados quando algum facto grotesco, real ou ficcionado, directa ou indirectamente, lhes toca de algum modo. Assim, para os profissionais dos media, há na Igreja os gurus que são ouvidos por tudo e por nada, e os que, por si ou pelas terras onde se gastam na construção do Reino, nunca são notícia que interesse. Dizia-me um bispo de uma diocese discreta: “A gente de Lisboa pensa que só lá é que há Igreja?” Conhecia-o, sabia da sua obra e entendi.
Há meios de comunicação social que, não só em relação à Igreja, mas também à política e a outras realidades sociais importantes, “adoram o conflito”, a divisão e o confronto, ainda que inútil, quando não mesmo ridículo. É seu gosto preferido explorar o que pode dividir e provocar fricção. É isto o que se vende a leitores ou ouvintes superficiais, sempre ávidos de novidades que choquem. Será esta a sua missão?
É erro crasso pensar-se que a Igreja, em Portugal, são apenas alguns bispos mais mediáticos, quer o sejam pelo seu valor, quer pelo empenho de amigos em os mostrarem e promoverem. Será sempre empobrecedor reduzir a vida, o pensamento e a pronúncia da Igreja apenas à opinião, pedida ou aproveitada, dos mais conhecidos e escutados. Certamente, quando falam ou escrevem nunca pensam ir além da sua opinião, própria e legítima. Porém, a visão mutiladora das janelas estreitas e das relações restritas, logo transforma opiniões em dogmas e silêncios em omissões. Quando os critérios de juízo são pobres e limitados, e o conhecimento da realidade e da vida eclesial pouco mais que nulo, procuram-se logo sintonias ou dissonâncias para contrapor ideias, pessoas e intervenções. O realce de uma primeira página ou a abertura de um noticiário em tempo nobre, enriquecem a moldura do quadro pretendido ou forjado. Também assim se vendem jornais e sobem audiências.
Dificilmente dará da Igreja e da sua acção uma ideia exacta quem só a conhece de fora, ainda que faça do adro do templo, lugar de convívio e de conversa. Se entrasse sem preconceitos, sentiria talvez o incómodo dos bancos duros, das longas e, por vezes, monótonas pregações, dos cânticos pouco modernos e até do modo diverso de estar e de participar de alguns dos presentes. Mas só dentro, como acontece nas mais belas catedrais, se pode ver a beleza do que aí existe e só, e a partir de dentro, através dos artísticos vitrais, se poderá ver com olhos lavados o que é e o que faz a Igreja.
Na história recente podem ver-se homens da Igreja que sabem espelhar, com verdade, a sua vida e acção, sem preocupação de apagar deficiências ou de explorar valores. Muitos fazem-no num concerto social plural. Outros, alcandorados talvez num narcisismo doentio, aproveitam temas em que se pode beliscar a Igreja e a fé dos mais simples, procurando incursões pessoais que os levem ou mantenham na luz da ribalta.
Do adro da Igreja tanto se podem atirar pedras para o telhado do templo, como lançar foguetes para anunciar festas de pouca dura. Por aí, tanto passam cortejos de louvor e de gente crente a caminho das assembleias da família dos filhos de Deus e dos irmãos em Cristo. Mas, também, passa gente indiferente ao que se passa lá dentro ou apenas interessada em perturbar a vida de quem reza, serve e ama.
Tal como nas famílias, na Igreja, há filhos dedicados e outros que o não são. Há quem zele pelo património familiar e quem o delapide. Há gente para quem Deus é tudo e gente para quem Ele está distante do seu horizonte de vida. E todos, normalmente, são baptizados… Paulo VI, com olhos de profeta e coração de filho e de irmão, deixou-nos um conselho luminoso: “Só pode curar as feridas da Igreja, quem a amar de verdade”. É sobretudo um conselho para os de dentro. Serão também estes, quando mais mediáticos por valor próprio ou por favor dos amigos, que devem testemunhar, em todas as circunstâncias o seu amor e compreensão para com a Mãe Igreja, não se juntando, nem dando tom ao coro dos que lhe atiram pedras e lhe sujam o rosto. Para um cristão, aberto e esclarecido, diminuir a Igreja é prejudicar a sociedade.

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