Conheci-a em fins de 1961. Tinha um aspecto de disponibilidade, mas a sua manutenção tornava-se muito cara. E eu já tinha esposa e um filho, e estes estavam em primeiro lugar. Namorei-a durante algum tempo, e, aconselhado por um amigo lá me decidi. Estávamos próximo a embarcar para o Ultramar e era a altura. Ou agora ou nunca. Quando embarcámos levei-a comigo e daí em diante nunca mais a deixei e ela também sempre me acompanhou, por aquele maldito mato, em operações diurnas e até nocturnas.
Por seu intermédio muitos militares meus companheiros conseguiram provar a suas famílias que ainda estavam vivos. Ainda agora, ao apreciar o seu trabalho, eu pasmo:
- Quando trabalhava na fronteira norte de Angola onde estivemos, as caras apareciam sempre sorridentes, embora soubéssemos que para alguns poderia já não existir o dia seguinte;
- Quando passámos mais para sul, onde não havia confusão, a minha companheira sempre nos fazia a vontade, mas agora que o fim se encontrava cada vez mais próximo, as caras apareciam tristonhas, como a querer dizer nunca mais chega o dia da partida!
Hoje fui visitar a minha companheira. Estava descansada, mas velha. Já lá vão cinquenta anos (como o tempo passa) … parte do seu corpo já está a apodrecer. As humidades, as cacimbadas e até as chuvas não lhe perdoaram a ousadia. Mas tudo tem o seu tempo de duração. No entanto continuo a gostar dela!
Na verdade a minha Kodak Retina II S era uma óptima máquina fotográfica.
Ângelo Ribau
Nota: Foto captada pela companheira do Ângelo