DEIXAI-OS CRESCER ATÉ À CEIFA
Georgino Rocha
Sábia sentença que revela o coração do dono do campo onde, a par do bom trigo, cresce o joio daninho. E põe igualmente a descoberto o coração de todos os humanos. A vida é um bem precioso que não se pode beliscar e, menos ainda, eliminar. O crescimento é resultado da seiva vigorosa e das condições envolventes favoráveis. Se não houver atropelos, a vida desenvolve-se com naturalidade em todas as dimensões.
Além do reconhecimento do valor da vida, o proprietário desvenda outras atitudes que tornam mais humanas as relações familiares, laborais e sociais: espírito empreendedor, confiança num bom resultado, aceitação do ritmo dos factos, paciência nas turbulências, e contrariedades, diálogo concertado com os trabalhadores que o questionam, capacidade de tomar decisões arriscadas, respeito pelas leis do tempo, definição do método de avaliação, sensatez pedagógica em todo o processo.
Deixai-os crescer – ordena aos zelosos trabalhadores que estão prontos para tomar medidas radicais. O joio daninho representa o mal ameaçador da vida, usurpador do campo, concorrente do trigo bom, fruto de mão “invisível” reconhecida como inimiga do ser humano. Eliminá-lo, parece ser não apenas razoável, mas indispensável para evitar males maiores.
Parece, mas não é! Se fosse, todos os radicalismos estavam legitimados e os fanatismos seriam recomendados. A intolerância instalar-se-ia como regra de vida e a retaliação como medida de justiça. O impulso comandaria a razão e a verdade sobrepor-se-ia à pessoa. A ditadura do mais forte imporia a sua força devastadora. O homem desumanizar-se-ia progressivamente.
A humanização tem um outro caminho que o dono do campo aponta com as suas atitudes, antes descritas. A tolerância - tão em falta no mercado das relações familiares e sociais - mostra a capacidade de aceitar e conviver com o diferente e, a partir daqui, criar a harmonia possível. A paciência evidencia o espírito de quem aguenta os esforços custosos e não desiste de prosseguir na busca da relação desejada. A liberdade atesta e credencia o realismo das situações que hão-de ser avaliadas à luz da verdade. O limite do tempo que chega ao fim evoca a experiência da finitude em todas as suas dimensões e da responsabilidade humana, das oportunidades aproveitadas ou perdidas, da validade das opções feitas, do futuro que nos traz o que fomos construindo enquanto era tempo de sementeira. A ceifa e os molhos são, em linguagem de colheita, a visualização desta avaliação da nossa humanidade.
Segundo as comunidades a que Mateus dirige o Evangelho, o homem da parábola do trigo e do joio que Jesus narra, como ensinamento às multidões e aos discípulos, aos quais dá explicações complementares, é o ser humano em todas as suas configurações: de pessoa, de associação, de movimento espontâneo, de comunidade cristãs instituídas, de sociedade organizada e participativa. Ser humano que espelha o agir divino e se realiza na sementeira do trigal em germinação, no crescimento integral e solidário em expansão, na maturidade da relação em definitiva doação de amor e comunhão. Até à ceifa!