quarta-feira, 13 de abril de 2011

Os melhores despertadores da Igreja são os que lhe põem problemas


Reflectir para acolher e dialogar com proveito

António Marcelino


«As pessoas honestas de um mundo secularizado não rejeitam os apelos do transcendente e do religioso. Se não encontram resposta, rumam à procura, como peregrinos, e vão batendo às portas onde se anuncia algo que tenha a ver com o espiritual, que grita e incomoda dentro de cada um. A proliferação de movimentos religiosos e iniciáticos, a invasão progressiva das espiritualidades orientais, os braços abertos dos criadores de emoções, tudo são lugares de refúgio, que fazem reflectir para agir. Não em tom de cruzada, mas de responsabilidade.
Os melhores despertadores da Igreja são os que lhe põem problemas, não os que lhe tecem coroas de louros. Hoje, o grito de alerta mais forte vem dos de fora que questionam, dos que vão mais facilmente ao “pátio dos gentios”, que ao templo, sem que a estes se retire a palavra.»
É recente a criação do Pátio dos Gentios, uma iniciativa do Pontifício Conselho da Cultura, concretizada em lugares e momentos de encontro, reflexão, escuta, diálogo e partilha com os não crentes, agnósticos ou mesmo ateus. Gente que não entra no templo, mas está disponível para partilhar saber, experiências e interrogações, mais ou menos incómodas. Aí se poderá encontrar uma Igreja despida da apologética incómoda de séculos passados, sem intuitos e manobras de um proselitismo fácil, consciente do valor do pluralismo, preparada para novas formas de diálogo e, certamente, também ela disposta a aprender, escutar e propor.
Este facto acordou os adormecidos para a necessidade do diálogo com a cultura emergente com propostas da fé da Igreja e da sua sensibilidade aos problemas que preocupam as pessoas e a sociedade, sejam eles de que natureza forem. Esta iniciativa precedida pela “cátedra dos não crentes” do Cardeal Martini, e experimentada de modos diversos, também em Portugal, não tem apenas a ver com as grandes cidades nas quais se cruzam as correntes mais determinantes da cultura e do pensamento, mas de todo o sítio onde há gente viva.
A luta, que ainda por aí travam alguns movimentos laicos e ateus, está fora do tempo. Restos de um passado, condenado por uma nova cultura do respeito e do diálogo. Os direitos humanos, promulgados e reconhecidos, o pluralismo em todas as suas expressões, a dignificação integral da pessoa, qualquer que seja a sua raça, cultura, língua, cor ou religião, uma visão purificada da história, a globalização que nos torna cada dia mais vizinhos uns dos outros, as novas tecnologias da comunicação cada vez mais acessíveis à maioria denunciam todas as formas de gueto fechado e todos os muros que ainda separam. O tempo é de lançar pontes que unem, não de abrir fossos que impedem a comunicação mais normal.
Também a Igreja, mormente a partir do Concilio Vaticano II, vem aprendendo, para ela uma lição difícil, a dialogar e a dar mais valor ao que se passa, tanto dentro, como fora do seu espaço de vida. E, se o diálogo interno ainda não é tão fácil como seria normal, o dialogar com o mundo, ler a realidade, perceber os seus dinamismos, entrar sem preconceitos nos seus projectos mais válidos e determinantes, tem constituído, para muita gente, um caminho duro pelos contrastes que apresenta com modos de ver de agir de muitos séculos.
A consciência histórica diz que, desde há dois mil anos, o acontecimento cristão tem estado presente na história, nos lugares públicos, ainda que, por vezes mais evidente, naquilo que ele é como sinal de contradição. Desde os inícios, até à sociedade secularizada em que hoje vivemos, apesar das muitas vicissitudes, a mensagem cristã vem subsistindo e, para muitos, ela constitui sentido e horizonte de vida. As dificuldades, hoje sentidas por força do dinamismo da missão, obrigam a Igreja a melhor se conhecer a si própria para aprofundar e defender a sua identidade, se capacitar para viver e agir num mundo que já não é homogéneo, mas diverso e plural, com novas dificuldades, mas também com novas oportunidades.
Pensar apenas em conservar os crentes tradicionais é depauperá-los. Muitas tradições de ontem, pouco mais comportam que a mensagem que no tempo as animou. A tradição é vida que se renova, as tradições não são imunes ao caruncho que as deteriora e inutiliza. Neste sentido, toda a acção da Igreja é necessariamente criativa e muito mais, se pretende comunicar coisas essenciais. Muitas destas perderam a sua riqueza. Dificilmente a recuperam como vida, sem o confronto diário com o tempo, a cultura, a vida das pessoas concretas. As verdades da fé não são peças de museu, mas são, em todos os tempos, verdades para a vida.
Torna-se necessário multiplicar os “pátios dos gentios” e pensar a acção pastoral no confronto com a cultura reinante, que já não toca só a grupos de intelectuais, mas modela a vida e o agir de todas as pessoas, seja qual for o recanto que as abriga. Pensar e agir apenas em função da vida interna das comunidades cristãs, e é ainda isto o mais comum nas preocupações de muitos responsáveis generosos, é perder oportunidades de evangelização, malbaratar recursos e energias, semear frustrações, ficar fora do tempo, deixar a Igreja a falar sozinha e para os que julga que ainda ter como seus. Os não crentes têm a sua cátedra. Como Paulo em Atenas é preciso ouvi-los para que eles ouçam também os outros mensageiros do Reino.
As pessoas honestas de um mundo secularizado não rejeitam os apelos do transcendente e do religioso. Se não encontram resposta, rumam à procura, como peregrinos, e vão batendo às portas onde se anuncia algo que tenha a ver com o espiritual, que grita e incomoda dentro de cada um. A proliferação de movimentos religiosos e iniciáticos, a invasão progressiva das espiritualidades orientais, os braços abertos dos criadores de emoções, tudo são lugares de refúgio, que fazem reflectir para agir. Não em tom de cruzada, mas de responsabilidade.
Os melhores despertadores da Igreja são os que lhe põem problemas, não os que lhe tecem coroas de louros. Hoje, o grito de alerta mais forte vem dos de fora que questionam, dos que vão mais facilmente ao “pátio dos gentios”, que ao templo, sem que a estes se retire a palavra.

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