ENA, VELHOTE! QUE MÁQUINA!...
Caríssima/o:
Há anos, em 2002, o jornal Público, na página 40, do dia 2 de Janeiro, trazia um extenso artigo: «O “vício” da bicicleta entranha-se no distrito de Aveiro». Se me permitis vou fazer umas ligeiras transcrições. Começa por afirmar:
«A Murtosa quase parece uma Pequim em ponto pequeno e em hora de ponta»
E pergunta:
«O que há de comum entre uma avó da Murtosa, alguns desportistas da Feira e o autarca de Aveiro?»
Acrescentando:
«A paixão pelas bicicletas, algo que nem o “boom” automóvel dos últimos anos conseguiu destruir. Há décadas que se intensificou o uso da bicicleta por toda a corda do distrito de Aveiro, mas onde essa paixão está verdadeiramente massificada é na Murtosa, espécie de pequena Pequim em horas de ponta.
“Talvez porque estamos numa zona plana e não é preciso carta de condução nem combustível”, opina Henrique Pinho, residente na freguesia do Bunheiro, daquele concelho, que tem três bicicleta na garagem a fazer companhia a outros tantos automóveis.»
Mas onde eu queria chegar vem agora:
«Pernas para que vos quero – Celeste Figueiredo, igualmente do Bunheiro, quis usá-las também para dar ao pedal logo aos nove anos de idade, começando então a ziguezaguear pelas ruelas da localidade numa bicicleta “emprestada sem ordem do dono”. Dinheiro para comprar uma, só o teve quando se casou e agora, aos 49 anos, continua a fazer da bicicleta o seu transporte favorito, garantindo que assim vai continuar “por muitos e bons anos”. “Se andam por aí velhotas de 70 anos em cima da bicicleta, porque hei-de eu deixá-la?...”, pergunta.»
O artigo continua, mas fiz uma pausa para respirar: com que então, 'se andam por aí umas velhotas de 70 anos'!!...
Pronto, vamos dar-lhe um pequeno desconto e desejar que lhe não aconteça como a um amigo meu de um concelho também situado junto ao mar e que aproveitava o fresco da brisa para dar umas pedaladas, mantendo o físico em forma e elevando a boa disposição do ego!
Reformado, atento aos avisos do seu médico, fazia caminhadas mais ou menos longas, mas onde sentia mais prazer era palmilhando as areias húmidas da praia. Porém, um dia, vendo passar uns ciclistas, lembrou-se que seria boa ideia comprar uma bicicleta e, em vez de andar a pé, dar umas pedaladas e sentir a liberdade do vento que sopra ligeiro do mar!
E assim fez: comprou uma que lhe pareceu bem equilibrada jogando o binómio qualidade-preço. Limpou ainda algum pó que, meticuloso, julgava não ter ficado na loja e ei-lo lançado calmamente, ganhando balanço para a sua nova e primeira aventura das muitas que se perfilavam rumo aos treinos que, metódico como é, já tinha programado.
A bicicleta rolava e habituava-se ao dono, adivinhando as suas intenções e tudo corria pelo melhor.
Mas eis que, de repente, surge, não sabe de onde, um admirador que, olhando para ele por cima do seu empertigado nariz de 6 anitos, com voz bem timbrada, encheu toda a praia:
- Ena, velhote! Que máquina!...
Bicicleta arrumada e, até hoje, não se sentou mais no selim.
Manuel