A NOGUEIRA
A
Manuel Maria Carlos (Relvas),
Manuel Vechina Sarabando, o “Coveiro”
Caríssima/o:
a. Uma ou outra folha ainda teima segurar-se ao ramo, mas a nossa nogueira prepara-se para a invernia que este ano promete... Entretanto as nozes foram colhidas, uma a uma e, depois de limpas e lavadas, espalhadas na eira para secarem; estão prontas para serem partidas e degustadas sós ou com pão, metidas nos figos secos (os “casamentos” da Consoada...) ou ainda entrar na culinária, no nosso fogão e no dos parentes e amigos, já que, graças a Deus, a produção foi muito razoável.
Se mais quereis saber (estou a ver a vossa curiosidade: para quê aquele estrado de madeira?), tereis de questionar os mais novos da família, os usufrutuários.
e. Vistes por terras da Gafanha alguma nogueira?
Nanja eu e nozes também pouco nos atraíam; muito raramente apareciam à nossa mesa.
i. A madeira da nogueira é considerada uma das mais valiosas das diversas classes de madeira existentes entre nós. É de uma dureza comparável à do carvalho, mas fácil de trabalhar, e além disso é extraordinariamente decorativa pelos tons vivos e escuros do seu durame. É uma madeira utilizada sobretudo no fabrico de móveis e no revestimento interno das habitações, sendo também muito requisitada para trabalhos de talha e para culatras de armas de fogo. (Seria de nogueira a culatra da velha Mauser que me coube na Escola Prática de Infantaria, em Mafra? Fiz com ela uma boa relação de amizade e não me deixou ficar mal nas sessões de treino de tiro... até fiquei bem classificado!...)
Quanto às nozes, as suas sementes, de sabor agradável e ricas em óleo, consomem-se directamente ou são espremidas para obter o óleo de nozes, que se utiliza como óleo alimentar, como combustível ou como base de determinadas pinturas. Em anos de boa colheita, uma árvore de copa grande pode produzir até 150 kg de nozes. (A nossa, uma árvore bem desenvolvida, vai-nos presenteando com umas escassas arrobas ...)
o. Lembro-me que minha Sogra fazia colheita abundante de folhas da nogueira para fornecer aos vizinhos (alguns de bem longe...) que a procuravam e muito lhe agradeciam pelo alívio que elas lhes proporcionavam. Eram muito utilizadas para mal de pele.
Agora, dos livros, aprendemos que faz emagrecer, é afrodisíaca, cicatrizante, calmante, anti-inflamatória.
Cada um que se estude e peça ao médico a receita...
u. Curiosidades:
1. A nogueira não é originária das nossas latitudes, mas adaptou-se a elas há muito tempo. É originária do Sudoeste Asiático e do Mediterrâneo Oriental e foram os Romanos que a introduziram na Europa.
2. No texto de Eduardo Sequeira (cuja ortografia respeito e transcrevo como boa introdução para o acordo que aí vem!...), encontramos mais que uma lenda:
«A nogueira foi considerada pelos antigos como arvore sinistra e funeraria, sob a qual se reunem as feiticeiras, especialmente na noite de S. João, para celebrarem os seus horridos festins, ao passo que o fructo de tão má arvore foi sempre symbolo da abundancia e da geração.
Foi em cascas de nozes que, segundo uma lenda slava, escaparam ao diluvio os homens que depois repovoaram o mundo. Eram cascas de nozes os maravilhosos trens das boas fadas protectoras de nossos antepassados que—ai de nós!—para sempre desappareceram do mundo, e eram estes saborosos fructos os que se distribuiam outr'ora nas bodas como de feliz e prolifico agouro para os noivos.
Na Belgica, no dia de S. Miguel, as donzellas casadoiras abrem cuidadosamente algumas nozes, tiram-lhe o conteudo e collam depois as duas cascas vazias com todo o cuidado, de modo a parecerem intactas, e deitam n'um sacco um numero egual de nozes vazias e nozes cheias. Misturam-as bem, e depois, fechando os olhos, mettem a mão no sacco e tiram uma noz. Se acertam tirar uma cheia é signal de que casarão dentro de um anno, mas se acontece vir uma das vazias, então ainda téem que esperar muito pelo anciado marido...
Entre nós, especialmente no Porto, ha uns leves vestigios d'esta tradição. No dia de S. Miguel é costume, na cidade invicta, comer-se nozes com trigo, o que, dizem, dá a felicidade e a abundancia em casa. E á gente nova, á gente solteira, temos nós ouvido repetidas vezes dizer que «no dia de S. Miguel, nozes com regueifa sabe a casar»...
No sul de França creem que o meio infallivel de conhecer um feiticeiro é collocar-lhe uma noz debaixo da cadeira quando elle estiver sentado, pois não se poderá mais erguer do logar onde estiver emquanto não retirarem a noz. É d'aqui que os camponezes de Bolonha penduram uma noz ao pescoço dos filhos para os livrar de maus olhados. Tem para elles a noz o mesmo valor da nossa figa.
Para os judeus a arvore do bem e do mal era uma nogueira, e o fructo que Deus prohibira a Adão que comesse, uma noz.»
Manuel