PELO QUINTAL ALÉM – 49
A
Manuel Joaquim Sarromão e
Ciganos do Esteiro
a. Há dias fui confrontado com os vimes do quintal cortados e enfeixados, para depois serem escolhidos. São seis ou sete pés, bem desenvolvidos e que fornecem os podadores quando amarram as videiras.
Ano em que não se gastem todos, oferecem-se a familiares ou vizinhos para reforçarem o seu lote de gigos e cabazes quando o cesteiro tiver disponibilidade.
e. As nossas memórias de meninice levam-nos até ao Esteiro, onde acampavam os ciganos que se ocupavam na confecção dos seus cestos que vendiam aos lavradores ou então nas feiras das redondezas (a dos 13, a dos 28...).
Como iam a nossa casa à água, lá presenteavam a minha Mãe com um cestito ou outro.
(Entre parêntesis, para deixar o meu sorriso ao recordar o comentário mudo de minha sogra a estes cestos: acenava com a cabeça e... vamos adiante que atrás vem gente!)
i. Há tanto para dizer do vime que não sei por onde começar!...
Falar da cestaria?
Claro que hoje só os da nossa geração se lembrarão dos cestos tradicionais: as cestas de almoço, usadas não só para o transporte das refeições para o campo, mas também a caminho das festas e romarias, com as tradicionais refeições que lhes estavam associadas (e também nos cortejos dos Reis...);os cestos vindimos, usados no transporte da uva para o lagar; e ainda os cabazes usados nas desmantadelas; ou os cestos da pesca desportiva; as canastras das peixeiras; os grandes cestos que as padeiras puxavam nas suas bicicletas quando distribuíam o pão pelos fregueses...
Que mundos passados e vividos!
Realçar a importância do vime na amarração das vides podadas?
Todo o trabalho do corte, escolha e utilização era (e ainda é...) ocupação artesanal que, muitas vezes, nos deixava de boca aberta pela perícia e precisão nos movimentos...
Claro que noutras zonas, como na Madeira, fabricam-se cadeiras, canapés e mesas.
E deixai-me só lembrar a produção das bengalas que os doutores das nossas universidades revolteiam e ensarilham durante a queima!
Há, contudo, um aspecto que fica sempre bem salientar nos tempos que correm: o vime recicla nutrientes normalmente indisponíveis para as culturas convencionais, preserva o solo, melhora a qualidade da água, protege as margens dos rios e está adaptado às condições locais.
o. Sabe-se que a casca destas plantas contém uma substância chamada salicina que é usada na produção do ácido acetilsalicílico, componente da aspirina, recomendada como medicamento humano importante, com muitas e várias acções terapêuticas (analgésico, anti-inflamatório, antipirético e anti-reumático, indicado para processos dolorosos somáticos, inflamações diversas e febre; profilaxia e tratamento de trombose venosa e arterial; artrite reumatóide e juvenil; profilaxia do enfarte do miocárdio em pacientes com angina do peito instável).
1. O vime é um produto obtido de espécies do género Salix, da família Salicaceae. São conhecidas cerca de 300 espécies desse género, entre árvores e arbustos, espalhadas pela Europa, América do Norte, Ásia e África.
2. As primeiras referências sobre o uso do vime datam de 3000 a.C..
O Antigo Testamento fala do facto de Moisés ter sido recolhido no rio Nilo numa cesta de vime.
No túmulo de Tuntakamon, falecido em 1325 a.C., foi encontrada uma cadeira feita de vime.
Os primeiros registos indicam que foi no Mediterrâneo que se começou a utilizar este material. O cultivo desta espécie foi muito importante para o Império Romano. No séc. I, os vimes eram utilizados na construção de escudos guerreiros e mais tarde foram para a manufactura de cestos onde se transportavam os diferentes produtos que se comercializavam entre as aldeias.
3. O vime esteve presente nos primeiros protótipos de balões e aviões, pelo seu baixo peso e resistência; nos balões, até em tempos actuais, é um dos materiais com o qual são confeccionados os cestos em que seguem os passageiros.
4. Quem está aí que não conheça a “Parábola dos sete vimes “?
Mas talvez a pequena história de “A Árvore e o Vime” seja quase que adivinhada. É assim:
«“Bem, meu pequeno,” disse uma Árvore a um vime que estava crescendo ao lado do seu tronco, “... por que não finca o seu pé profundamente no solo e ergue a sua copa atrevidamente no ar, como eu faço?”.
"Eu estou contente como sou," disse o Vime;” Posso não ser tão importante, mas penso estar bem mais seguro assim”.
"Seguro!?" zombou a Árvore. "Quem me arrancará pelas raízes ou dobrará a minha copa até o chão?".
Mas logo se arrependeu de sua jactância, pois um furacão surgiu arrancando-a pelas raízes, lançando-a como um tronco inútil ao chão, enquanto o pequeno Vime se submetia à força do vento, para logo estar de pé novamente quando a tempestade amainou.»
E alguém concluiu:
O importante não é ser duro como o carvalho, mas sim flexível como o vime que a tempestade verga, mas não quebra.
Manuel