domingo, 3 de outubro de 2010

TECENDO A VIDA UMAS COISITAS - 204

PELO QUINTAL ALÉM – 41


A ABÓBORA

A
José Araújo


Caríssima/o:

a. Já há anos que não semeamos abóboras no quintal mas, curiosamente, vão nascendo aqui e além uns pés de variedades não muito frequentes na região. Com mais ou menos sucesso, cuidando a rega e limpando as ervas que se intrometem, têm-se obtido exemplares interessantes, com certa parcimónia.

e. Abundante, abundante era a produção de abóboras por essa Gafanha além. E essa fartura era aproveitada para a criação do gado...

i. ... e também para a nossa alimentação... caldo (sopa!...), papas (ai as papas de carolo!!...)... as filhós.
Em matéria de doces, acrescentemos tão só o pão de abóbora.
E... as pevides!?...
Todos nos recordamos que tolera a seca mas não humidade em excesso e gosta de terra bem estrumada. Agora o que será motivo de admiração para alguns é o facto de se desenvolver bem na vizinhança da figueira do inferno, associar-se bem com o milho mas, quando plantada junto da batateira, têm um efeito inibidor mútuo.
É ainda interessante apreciarmos que as flores abertas são comestíveis e decorativas, servem para perfumar sopas; podem comer-se recheadas com carne e legumes ou ainda salteadas ou fritas com farinha e ovo.


o. Na saúde, e para não ser muito exaustivo, deixo apenas um leve apontamento das virtualidades que lhe são atribuídas, muitas das quais nos são completamente desconhecidas:

“As suas sementes, para os índios Cherookee, podem curar cólicas, diminuir pedras nos rins e acalmar febres desde que servidas em chás.
Na Índia, a polpa da abóbora colocada directamente sobre a testa alivia dores de cabeça e, nas Filipinas, o caldo do pé de abóbora é recomendado na cura de dores de ouvido."

u. Curiosidades:

1. Por vezes, de tão perto estarmos, não notamos as diferenças no linguajar das nossas gentes à borda da Ria.
Foi com alguma surpresa que ouvi, e ainda ouço, as pessoas da Murtosa dizerem «cabaça» quando na Gafanha empregamos «abóbora», referindo-nos à “abóbora porqueira”, pois reservam a palavra «abóbora» para a “menina”.

2. A abóbora é originária das Américas, onde era já consumida 6000 anos antes da nossa era, tendo sido importada para a Europa no séc.XVI.
Quando os primeiros colonos chegaram à América, observaram que os índios plantavam as abóboras junto ao milho e que a utilizavam não só na culinária, mas também para fins medicinais. A abóbora era para muitas tribos um verdadeiro objecto de culto.

3. A abóbora, símbolo da sabedoria e da fertilidade (e de prosperidade na China), tem também a si associadas muitas lendas.
A mais famosa talvez seja a que conta a história de um irlandês chamado Jack e a que já me referi quando encontrámos o nabo e se disse que este foi substituído pela... abóbora.
Sendo assim, valerá a pena conhecer outra lenda da abóbora, segundo Eduardo Sequeira que nos diz:

“Os povos orientaes consideram a abobora como o imperador dos vegetaes; é tambem para elles o emblema da saude pelo seu bello e rotundo aspecto e da fecundidade pelo numero extraordinario de sementes que possue.
A abobora tem dado origem a muitas lendas. [...]
Esta lenda — lenda americana — explica assim o diluvio.

Jaià um homem muito poderoso e forte tinha um filho unico que lhe morreu de repente. O pae, querendo dar-lhe uma sepultura differente da de todos os outros humanos, metteu-o dentro de uma enormissima abobora que foi depor no cimo de elevado monte. Dias depois, cheio de saudades pelo filho estremecido, quiz contemplal-o mais uma vez e partiu para o local onde depozera a abobora, mas ao tocar-lhe saíram-lhe de dentro enorme quantidade de peixes e diversos monstros marinhos. Jaià fugiu aterrado e veio narrar o caso para a sua aldeia. Quatro irmãos gemeos quizeram verificar o facto, e quando estavam a procurar mover a colossal abobora a fim de lhe examinar o conteúdo, chegou Jaià tão furioso pela violação a que ia ser sujeito o tumulo do filho que os quatro rapazes, aterrados, deixaram rolar a abobora pelo monte abaixo, e esta, batendo de encontro ás pedras que encontrou no caminho, fendeu-se sahindo-lhe do interior tal quantidade d'agua que toda a terra ficou inundada.”

Manuel

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