ou do pluralismo democrático?
A decisão do Tribunal Europeu de Direitos Humanos, a partir de um equívoco do laicismo provocado por outros equívocos, que define a “presença dos crucifixos nas escolas da Itália como uma violação da liberdade religiosa dos alunos”, traz ao de cima um problema mais grave que o dos sinais religiosos em lugares públicos. Este problema cifra-se na prática corrente de as instâncias europeias decidirem, com um dogmatismo carregado de moralismo ou amoralismo, sobre os países da União, em relação a aspectos que bolem com a sua história, cultura, religião e identidade nacional, como se tratasse de definir as cotas leiteiras. Agora foi a Grécia a reagir.
Não é assim quando os países grandes têm interesses próprios e uma voz grossa para dizer “não”, como aconteceu e acontece em relação a muitos aspectos comunitários.
As habituais tensões provêm, em geral, de uma União Europeia que deixa pouco ou nenhum lugar aos seus membros para se afirmarem na sua originalidade ou se defenderem de intromissões, que não deviam existir. Morto o pluralismo, matam-se muitas ocasiões de um enriquecimento comum, benéfico para todos.
A ideia de que os cidadãos europeus devem ter em tudo direitos iguais e padrões de valor idênticos, onde quer que se encontrem, tem destruído, a pouco e pouco, o património cultural e moral de muitos países com história própria. À revelia das suas origens, a UE foi-se transformando, por pressões diversas, numa instância de padrões morais e pseudo culturais. Por infelicidade, são poucos os estados que reagem a este domínio e prepotência. E, quando o fazem, logo são classificados de reaccionários e conservadores. Para os ideólogos, com carimbo europeu, só o que eles ditam é certo, moderno e aceitável. Assim têm baralhado as populações e as suas referências morais.
Leis e normas sobre família, casamento, vida humana, natalidade, divórcio, aborto, tudo sai da central ideológica de Bruxelas, como decisão sem apelo ou critérios de inspiração obrigatória para as leis dos países membros.
Assim, as doenças morais graves do continente europeu acabam por ser epidemia que se exporta e alastra por todo o lado. Quando, neste campo, os países que ainda mantêm lucidez, pundonor e liberdade, reagem, logo surgem pressões e ameaças. Como da Europa vem o dinheiro e já nenhum país pode sobreviver sem cumprir as normas europeias que lhes abrem portas, por vezes bem estreitas, a reacção torna-se impossível para os mais dependentes, que são sempre os mais pequenos e mais pobres. Aparecem na fotografia, mas, nas grandes decisões, são números que pouco contam.
Certamente que nem tudo tem sido negativo e que o balanço tem muitas coisas positivas, que muitos países membros nunca teriam coragem de enfrentar por si, dados os interesses criados, sobretudo políticos e económicos. Mas não é este o problema, na minha opinião. Será, antes, saber se os países têm de se anular na sua originalidade e legítima autonomia para poderem fazer parte de um grupo alargado, com interesses comuns, mas que parece esquecer-se que precisa de todos e do específico de cada um, que não é só a gastronomia, o artesanato e o folclore.
A origem da EU, a partir do Tratado de Roma de 1956, não previa aniquilar ninguém. Os da primeira hora eram cristãos com ideais de respeito e abertura. Os que agora dominam são, na sua maioria, servos da maçonaria, com poderes e estratégias que já não enganam ninguém. Não se nega a ninguém o direito a ser de qualquer Loja, mas sim que esta seja a oficina do novo rosto da Europa, a que negam as raízes cristãs e a face humanista.
O primeiro obreiro, Giscard D’Estaing, de uma Constituição rejeitada, não ocultou a face maçónica nela impressa, os objectivos ideológicos pretendidos e os incómodos históricos que sofria. Não se entende, com tudo isto, qual é a noção de pluralismo e de respeito pela verdade e pelas pessoas. Se o Parlamento tivesse mais gente com cultura e capaz de pensar, as coisas seriam diferentes. Assim, seremos os eternos obedientes que trocam tudo por dinheiro e por sonhos.
António Marcelino