Esta afirmação é feita a propósito de Jesus de Nazaré. Constitui o mais belo testemunho da sua vida e compêndio da sua obra. Desvenda o sentido de tantas atitudes notoriamente desconcertantes. Evidencia o alcance de gestos aparentemente insignificantes. Abre horizontes de plenitude aos momentos mais sombrios das suas lutas e tensões, inclusive da própria morte.
“Em proveito de todos” faz-se humano e assume um tipo de vida coerente com a dignidade da sua natureza; por isso, repõe a pessoa na sua fonte original – a de ser criatura de Deus, imagem e semelhança divinas, expressas no masculino e no feminino; por isso, propõe mensagens cheias de novidade que reforçam os laços solidários e fraternos entre os humanos e manifestam a relação com os bens de toda a criação que lhes é confiada; por isso, aproveita as ocasiões em que os seus adversários pretendem envolvê-lo e apanhá-lo em armadilhas e, com uma habilidade sábia e surpreendente, desmascara-lhes a mentira, deixando a descoberto a verdade.
“Em proveito de todos” restitui ao matrimónio o seu valor e sua qualidade originais, pondo a claro o projecto de Deus sobre o amor conjugal. Afirma que Moisés não foi fiel ao pacto da criação e que é preciso superar a “dureza do coração”, só possível com uma nova compreensão da relação entre homem e mulher. Esta relação mútua será sempre o sinal da relação original de Deus com o primeiro par humano, fruto de um amor exclusivo e único, dinâmico e fecundo, assertivo, fiel e performativo.
É certo que a licença concedida por Moisés representa um passo em frente na tradição judaica, obrigando o homem a legalizar o divórcio com a sua mulher mediante a carta de repúdio, E, em certas situações, a própria mulher repudiar o marido. Sem este acto formal, ficava pendente da arbitrariedade, do capricho ou de qualquer miudeza ocorrente, contrariando claramente a qualidade da relação assente no amor mútuo como pretendia o sonho primeiro do Criador da natureza humana.
O alcance da proposta de Jesus não é entendido por todos de igual modo. Por isso, dá origem a situações de vida divergentes e, por vezes, opostas que convém compreender à luz do projecto original e não apenas de qualquer lei positiva.
Esta diversidade de situações contém um gérmen evocativo, ainda que discreto e escondido, daquela harmonia interpessoal latente no coração humano e correspondente força de atracção e sedução. Como tal merece respeito, reconhecimento e apreço.
“Em proveito de todos” ergue-se o amor matrimonial, estável na liberdade da opção pelo casamento, apaixonado pela doação generosa, feliz no esforço de cada dia, compreensivo perante as fragilidades humanas, responsável pela aliança celebrada e pelo compromisso assumido. Feliz e fecundo, tendo o amor de Jesus como fonte inspiradora e medida de realização.
Georgino Rocha