1. Claro que a notícia do jornal diário passou despercebida pelo envolvimento e azáfama geral nas legislativas do fim-de-semana. O título – «juízes indignados com a classe política» –, noutra altura do ano chamaria para a primeira página as declarações de Noronha do Nascimento (Supremo Tribunal de Justiça). Regista-se o implorado pedido para os magistrados terem «mais poderes para evitar atrasos nos tribunais», querendo «saber por que razão são responsabilizados quando cometem erros e os políticos não quando as suas leis ferem direitos fundamentais de cidadãos» (?!). A questão não é simplista nem recente e abre portas a esmiuçar um dos pilares fundamentais da sociedade de direito, a justiça.
2. Noronha do Nascimento referia-se com pertinência e num olhar de transversalidade ao diploma de 1 de Janeiro de 2008 que prevê que o Estado seja processado por erros graves que sejam cometidos por magistrados no exercício da actividade no tribunal, mas em que agora o Estado poderá, após indemnizar os lesados, exigir ao juiz esse reembolso na circunstância de se provar a existência de “erro grosseiro”. Sendo certo que este erro poderá ter muitos contornos, até no foro da subjectividade, a verdade é que esta abordagem parece abrir portas a uma desconfiança que fragiliza a justiça que se procura implementar. A este designado “direito de regresso”, que está a deixar os magistrados inseguros, pertencerá a ideia de exigência e de responsabilidade…, mas de quem delas desconfia.
3. Não sendo o cenário da justiça em Portugal o melhor dos mundos, agora os juízes, como refere António Martins (Associação Sindical dos Juízes Portugueses), «têm uma espada de Dâmocles em cima da cabeça em cada decisão que proferem». O cidadão, em busca de pontos de referência…já sentia a baixa de autoridade saudável das autoridades, já vivia a ansiedade da morosidade da justiça e agora recebe a confirmação que o sistema desconfia de si próprio ao criar este apertão aos juízes. Não é fácil resistir a tanto esmiuçar!
Alexandre Cruz