Com o fim do Verão reabre o ciclo dos regressos. Da terra visitada, do longe espreitado, da casa ao trabalho, do diferente ao mesmo, da solidão à solidão. São muitos os regressos. E as memórias do vivido como que se desvanecem rapidamente pelas urgências a cumprir com as desarrumações da partida e da chegada. Afinal os locais, as pessoas, os hábitos, as rotinas como que teimam em dizer que nada se passou e que não cairia mal um início de férias que pusesse fim a todo este cansaço.
Mas quem mais sente esta mudança de registo é o mundo da diáspora. Mais uma vez vimos os nossos emigrantes e percebemos que tiveram que regressar por um imperativo doloroso não apenas de trabalho, mas de país readquirido, família ampliada, incapacidade de voltar atrás nas opções de vida há muito tomadas. A errância não é apenas a mudança de pátria e cultura. É uma procura incessante de equilíbrio entre o nomadismo e a vida sedentária.
Neste todo há alguém que está no fim da lista. Silêncio de elegância social, bloqueio político, incapacidade de alterar uma lei de despejo. São os repatriados. Um dia, na infância ou adolescência, partiram para a terra dos sonhos, a grande América.Com ou sem culpa envolveram-se em problemas criminais de maior ou menor gravidade. Manchado o cadastro, sentem alguém bater à porta, informar-se da identificação e, depois de lhes atar as mãos enviam-nos para a sua terra. Pura e simplesmente. O crime pode ter muitos anos, mas os retroactivos na lei não têm remissão nem apelo. E ei-los que voltam dolorosamente para a pátria, sem “saber” a língua, a cultura nem se enquadrar minimamente no novo-velho ambiente. A família está partida. A esperança afundada. Regressam compulsivamente à sua terra de que tantas vezes tiveram saudades míticas e quase são obrigados a odiar. O horizonte é negro. Serão recebidos, se não têm familiares, numa espécie de orfanato para adultos, apoiados por técnicos. Não poucas vezes vem o desespero e até o suicídio.
E o silêncio quase completo da sociedade perante um drama duplo. De quem regressa para a terra como exílio, e da comunidade que tem desconfiança e medo dos novos visitantes, velhos conterrâneos.
A Igreja foi quem mais atenção deu, de início, a este drama. Mas ele repete-se e aumenta. A pergunta continua a mesma: quem poderá travar esta avalanche de dramas? Que força política consegue humanizar uma lei com efeitos tão cruéis?
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António Rego