Miguel Almeida, à esquerda, cumprimenta o Grupo Etnográfico
"Os Esparteiros de Mouriscas", Abrantes
O século XXI vai ser uma grande desafio
para a nossa identidade cultural
Miguel Almeida é visiense e conselheiro técnico da Federação do Folclore Português (FFP). Há 26 anos que apresenta o Festival Nacional de Folclore da Gafanha da Nazaré. Tantos quantos os festivais organizados pelo Grupo Etnográfico da Gafanha da Nazaré, que nasceu, oficialmente, em 1 de Setembro de 1983.
Miguel Almeida é habitualmente convidado para em palco falar das danças e cantares dos mais diversos festivais de grupos e ranchos folclóricos e etnográficos, denunciando um conhecimento muito grande da cultura popular do nosso País.
Ouvimo-lo, no sábado, antes do XXVI Festival Nacional da Gafanha da Nazaré. E do muito que nos disse aqui deixamos algumas respostas a perguntas que lhe fizemos.
- Qual a importância dos Festivais de Folclore no século XXI?
- Estes festivais servem, sobretudo, para mantermos vivas as nossas tradições. Nós estamos inseridos numa aldeia global, que é a Europa, e somos um ponto no meio de uma imensidão de pontos. Mas este ponto pequenino pode ser um ponto grande, se mantivermos a nossa cultura. Penso que no século XXI se abrem perspectivas do alargamento da UE, que se torna mais globalizante, ainda.
- Ficam mais diluídas as culturas…
- Exactamente. Por isso, no século XXI, os grupos folclóricos têm de se manter unidos para mostrarem a esses países que nós somos diferentes. Estamos todos dentro do mesmo saco, mas somos diferentes e com direito a essa diferença. Mas essa diferença só será possível através dos grupos folclóricos que organizam estes festivais, que são encontros de culturas.
- Culturas diversas dentro do mesmo País…
- O nosso País, tão pequeno, tem culturas muito diferenciadas e essa diferenciação tem de se manter viva. Penso que o século XXI vai ser um grande desafio para a nossa identidade cultural.
- Seremos uma reserva da Europa, a esse nível?
- Somos, de facto, uma reserva da Europa, porque ainda estamos, neste aspecto da cultura popular, diferentes dos outros povos. Por exemplo, para dançar o Vira ou o Fandango, só gente portuguesa o faz.
- Qual é a dança genuinamente portuguesa?
- Para mim, o Vira é a dança que melhor caracteriza o povo português. É uma dança espontânea, que pode ser dançada apenas por um par e por todos os pares. Até pode ser dançada por uma multidão.
- Onde nasceu essa dança?
- O Vira nasceu em terras de Entre Douro e Minho, mas logo passou por Portugal abaixo. E por onde passou foi aculturado, isto é, as pessoas pegaram nele e adaptaram-no à sua maneira de ser.
- Então há muitos Viras…
- É verdade. Há o Vira de meia volta e de volta inteira, há o rodado e trespassado, há o falseado e outros. Tantos quantas as regiões de Portugal.
- Para mostrarmos a nossa identidade, é importante, então, que os nossos grupos apresentem no estrangeiro o nosso folclore?
- Pois é verdade. Mas nem sempre o Estado apoia essas saídas. De vez em quando patrocina uma ou outra. Contudo, nem sempre apoia os melhores grupos, os que se apresentam com coerência, com autenticidade, o que temos de bom.
- Mas a FFP não dá o seu parecer?
- Dá o seu parecer quando lho pedem. A FFP não é, infelizmente, parceira do Estado para a cultura; é um parente pobre.
- E os grupos que andam nestes festivais são mesmo genuínos?
- A FFP tem os seus grupos, que são a sua imagem de marca. Isto cria a concha, isto é, guardam as costas uns dos outros. Num festival de um grupo federado, normalmente, não entram grupos não federados, porque não têm, à partida, aquela segurança para entrar num festival de qualidade, com garantia de autenticidade do povo que representam.
Fernando Martins