Há aquele dito, constantemente repetido, atribuído a André Malraux: "O século XXI será religioso ou pura e simplesmente não será." Mas ele negou ser o seu autor. Prevenindo para o perigo do vazio espiritual da civilização ocidental - "civilização das máquinas e da ciência superpotente, mas incapaz de dar ao Homem uma razão de viver" -, o que disse foi: "Nunca disse isso. O que digo é mais incerto. Não excluo um acontecimento espiritual à escala planetária."
Segundo a revista Philosophie magazine, no número de Setembro, donde tiro as citações, a expressão de Malraux acabaria por antecipar o grande abalo, à escala do planeta, da passagem do racionalismo das Luzes ao retorno do religioso nas suas múltiplas facetas. Ainda no quadro do Iluminismo, E. Renan escreveu, em O Futuro da Ciência, que "a humanidade que sabe" iria substituir "a humanidade que crê". Depois, os "filósofos da suspeita", Marx, Nietzsche e Freud, denunciarão a religião não apenas como superstição, mas como neurose colectiva, ópio do povo, ódio da vida, concluindo o seu processo com a sentença da "morte de Deus". Mas, como escreve Martin Legros, afinal, "o século XXI parece estruturar-se mais à volta das identidades e das crenças religiosas do que da razão".
Para Max Weber, a modernidade caracterizava-se pelo "desencantamento do mundo", entendido como "o abandono da magia como técnica de salvação". Tinha, no entanto, a convicção de que o processo de racionalização deixaria em aberto a questão do sentido. A secularização não responde às perguntas metafísicas. Assim, outro sociólogo, Peter Berger, reviu a sua tese da secularização no sentido de secularismo, escrevendo que "o mundo actual é tudo menos o mundo secularizado que tinha sido anunciado, para gáudio de uns e lamento de outros, por tantos analistas da modernidade. Não existe nenhuma razão para pensar que o mundo do século XXI será menos religioso".
Os dados estão aí, quando se considera "a geopolítica da fé". Há um progresso fulgurante do islão, com 1300 milhões de fiéis, ultrapassando o número dos católicos, e do neo-protestantismo - sobretudo do evangelismo pentecostal, "centrado na adesão pessoal, no milagre e no cuidado da cura espiritual" -, com milhões de conversões na África, na Ásia e na América Latina e que será "a grande religião do século XXI (maioritária a partir de 2050)".
Anselmo Borges
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