Universalismo, Valor a rentabilizar
1. Com a actualidade em polvorosa com outras questões, o 10 de Junho parece já ter sido esquecido. Sobra a polémica de uma ou outra “frase” dita que também faz apagar, rapidamente, algumas questões de fundo salientadas na celebração deste dia das comunidades que vivem em português. Destacamos o discurso de João Bénard da Costa, aprofundando a raiz profunda do universalismo característico dos portugueses. De uma noção de língua, que em Heidegger (1889-1976) é a «casa do ser», os portugueses, efectivamente, assumiram e assumem, na generalidade, uma capacidade de relacionamento e interlocução que continua a registar páginas de história viva com os outros.
2. Nos tempos que vivemos, como foi sublinhado nos diversos discursos, as relações entre os povos não podem ser um factor lateral mas essencial. A história dos cinco milhões de emigrantes portugueses espalhados pelo mundo, mesmo que contenha grandes lutas e sofrimentos, também espelha esse facilitador do relacionamento humano. Vivemos já o tempo em que, pese embora tantas condicionantes de vária ordem, o sentido de universalismo é um dos eixos que faz a diferença. Daqui em diante, em tempos de globalização e mega-aceleração da vida diária, os factores de diferenciação talvez se venham a transferir das potencialidades técnicas para as capacidades de relação humana.
3. Se o presidente da República «desafia os portugueses a serem “exigentes e rigorosos” consigo próprios», estímulos positivos que ninguém de bom senso colocará de parte, todavia, esta mesma correspondência terá de ser assumida de modo total. Os portugueses habitam em famílias, instituições, escolas, mundo do trabalho. Esta procura do rigor «cá dentro» não é incompatível com um universalismo de rasgados horizontes. Casa mais arrumada é projecto que, não perdendo todo o potencial criativo, vai mais longe. O ser da cultura portuguesa, mesmo a partir da matriz da língua, em português, contém em si o gérmen da totalidade. Mesmo acima do mitológico exaltado por escritores e poetas, e ainda que racionalmente não se queira assumir o desígnio da portugalidade (até para não deixar que as emoções comandem as razões), o certo e o facto é que o universalismo está no bilhete de identidade dos portugueses.
4. É verdade que de todos os povos, pois que todos somos cidadãos de um mesmo mundo em relação. Mas se formos ao código genético cultural, este que não depende da riqueza mas está assente em valores, há povos que se relacionam melhor uns que outros e entre estes estão os portugueses. É um facto que também quer derivar em responsabilidade e, actualmente, em valores e oportunidades, até como nova relação que seja impulso de ligação das nossas comunidades emigrantes às suas terras de origem…Será possível?