segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

IMIGRANTES CLANDESTINOS




As televisões mostraram hoje imagens tristes da prisão de 23 imigrantes clandestinos, oriundos de Marrocos. Algemados como perigosos cadastrados, recolheram às instalações do SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras), sendo amanhã ouvidos em tribunal. Podendo ficar em Portugal 70 dias, depois desse período terão, certamente, de ser repatriados. Segundo disseram, o seu destino era Espanha.
Quando vejo cenas destas, recordo de imediato os muitos milhares de portugueses que na década de sessenta do século passado procederam precisamente como estes marroquinos. A salto, como então se dizia, esses nossos compatriotas tiveram de vencer inúmeros obstáculos para poderem viver e trabalhar em França. Um dos maiores bairros de lata, nos arredores de Paris, estava cheio de portugueses.
Tal como estes imigrantes que hoje tentaram ficar por Portugal, provavelmente para mais tarde rumarem a Espanha, os nossos compatriotas foram forçados a fugir da pobreza, da miséria, do desemprego, de vidas sem futuro. Muitos, talvez a maioria, conseguiram construir uma vida melhor e oferecer aos seus filhos, a nível social e profissional, o que Portugal não podia dar-lhes.
Estas reportagens sobre imigrantes que lutam por uma vida melhor comovem-me sempre. Fundamentalmente porque sei quanto familiares e amigos meus sofreram para singrar na vida, porque o nosso País não podia garantir-lhes nada. Era, então, um país fechado ao mundo, “orgulhosamente só”, pouco industrializado, com uma agricultura quase da Idade Média, com gente de pé descalço, muito pobre, em suma.
Estes imigrantes clandestinos, que hoje foram algemados, estão, afinal, na mesma situação dos portugueses que no século passado foram a salto para França, por montes e vales, ao frio e à chuva, levados por passadores que os exploravam até ao último escudo. Depois, em França, até conseguirem trabalho, a fome ainda os apoquentou uns tempos mais. Muitos conseguiram vencer. Outros saíram derrotados. As suas histórias, de sacrifícios sem conta, estão por conhecer em muitas comunidades portuguesas. Deles se registam, como símbolos das suas vidas, as habitações com traços franceses.

Fernando Martins

1 comentário:

  1. O mundo é um paradoxo. Países com potencial económico não proporcionam às populações condições humanas de vida. Há uma classe privilegeada que controla a produção e emprega os seus conterrâneos num verdadeiro esquema de escravatura disfarçada. Com o aval das autoridades e do rei como é o caso de Marrocos. Jovens com formação académica não vislumbram meios de alcançar a independência económica tolhidos pelo sistema. Por isso tentam o exterior. A África é um horror em questões humanitárias, onde os dirigentes usam e abusam do poder sacando o que não deviam de forma insaciável.
    No ocidente, onde as coisas são mais equilibradas, também não vejo mais discernimento a nível dos gestores: destroiem-se bens alimentares por não atingirem as medidas padrão, quando existe tanta gente a morrer de fome. Será que todos aqueles que nos governam têm a suficiente lucidez? Isto preocupa-me, talvez porque sou do tempo em que um pedaço de pão caído no chão era levantado, beijado como pedido de perdão, e comido de seguida. E quando as condições de higiene o não aconselhavam era aproveitado para a criação .
    Será que teremos de passar de novo por privações para voltar a dár valor ao conforto actual? Quem o tem claro.
    JM

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