É curioso atravessar a manhã de domingo numa cidade ou aldeia. O templo, apesar de por vezes repetitivo no estilo, e nem sempre primoroso na decoração, é um sinal de identificação e um elemento integrante de qualquer paisagem rural ou urbana.Ao domingo, mesmo que alguns templos não estejam cheios, há uma “celebração” conhecida por Eucaristia Dominical, ou mais popularmente por Missa, que percorre todo o país. É distribuída abundantemente pela rádio e pela televisão. Não é captável como sacramento nem substitui o preceito dominical. É um sinal. Repetido em rádios e televisões é como um toque de sinos na cidade hodierna. Traz ressonâncias de Deus, notícias da comunidade reunida em oração, alma plural, palavras bíblicas (oportuna e inoportunamente), cânticos por vezes já ouvidos, reflexões do presidente da liturgia, preces pelo mundo inteiro, silêncios que também falam.
O mistério da Eucaristia. Constitui muitas vezes um convite ao olhar dos ouvintes ou espectadores, cada vez em maior número, que seguem, como quase tudo, em fragmentos, a liturgia à distância, a experiência de alguém que vestiu o fato de ver a Deus, saiu de casa e foi mesmo vê-l’O e escutá-l’O.
Os mestres da liturgia apreciam, e bem, o rigor, o passo e o gesto certo, os condimentos óptimos e oficiais que reúnem e revivem o património espiritual de milénios que urge não profanar em folclore fácil e meramente sensitivo. Mas o espectador e o ouvinte também têm o seu código de percepção de Deus. Por isso, a respiração interior duma comunidade celebrante, passada pela rádio e televisão de amplitude nacional ou mesmo local, têm a capacidade de acender a emoção do campanário que sempre recorda que Deus anda por ali perto, habita entre os homens e gera uma festa familiar, acessível, cantável, fraterna.
Mesmo que a televisão e a rádio estejam numa sala vazia da casa, não deixam de inundar as paredes porosas do cidadão de hoje a quem restam poucos espaços para sintonizar essa dimensão da vida e da comunidade. E os doentes, os idosos, os sós, os distraídos, mesmo os que descrêem, nunca deixarão de partilhar essa experiência desconcertantemente interactiva. É domingo. O espírito orante da comunidade é um dos elementos mais fortes desta aparente rubrica de entretenimento. Toda a qualidade é pouca. Mas que ande longe a erudição ritualista que só não afasta os apaixonados por rubricas. O Mistério da Fé não se comunica por rubricas.