Já Bocage não sou!
Já Bocage não sou!... À cova escura
Meu estro vai parar desfeito em vento...
Eu aos céus ultrajei! O meu tormento
Leve me torne sempre a terra dura.
Conheço agora já quão vã figura
Em prosa e verso fez meu louco intento.
Musa!... Tivera algum merecimento,
Se um raio da razão seguisse, pura!
Eu me arrependo; a língua quase fria
Brade em alto pregão à mocidade,
Que atrás do som fantástico corria:
Outro Aretino fui... A santidade
Manchei!... Oh! Se me creste, gente impia,
Rasga meus versos, crê na eternidade!
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NB: Em 2005, celebram-se duas datas, referentes ao poeta Manuel Maria Barbosa du Bocage, natural de Setúbal: 240 anos do seu nascimeto e 190 anos da sua morte.
Bocage, também conhecido por Elmano Sadino, não é, como muitos pensam e dizem, o poeta das anedotas. Ele é, de facto, um grande poeta português, cultor do soneto como poucos, e senhor de uma grande sensibilidade. E talvez essa sensibilidade tenha sido apurada pelo infelicidade de uma vida difícil.
Penso que Bocage merece que todos os portugueses leiam os seus poemas.