terça-feira, 5 de abril de 2005

PAPA para a vida de muita gente

A minha geração foi marca indelevelmente pela vida e exemplo do Papa João Paulo II. Durante mais de 26 anos, o nosso dia-a-dia não pôde ignorar a sua intervenção, com apelos que foram moldando os nossos comportamentos e definindo o rumo das nossas atitudes. Os testemunhos disso mesmo estão bem patentes nos inúmeros escritos e declarações vindos de todos os quadrantes. E de tal modo, que me deixam impressionado, pela autenticidade que revelam. Leio-os e escuto-os com indisfarçável comoção. Nos últimos tempos, porém, o carisma do Papa projectou-se no mundo dos crentes e não crentes, sobretudo pela força que imprimia à defesa dos valores em que acreditava. Fragilizado pela idade e pela doença, exausto por uma entrega sem limites à missão que recebeu, sempre sem notarmos no seu semblante ou nas suas palavras qualquer gesto de enfado, de cansaço ou queixa, João Paulo II ensinou ao mundo que os velhos, afinal, têm direito a estar entre nós, com as suas experiências de vida, com os seus dons, com a sua sabedoria. E mostrou isso, precisamente numa altura em que, por esta ou por aquela razão, em especial económicas, se marginalizam pessoas, pelo simples facto de serem velhas. O mundo inteiro continua a curvar-se perante a memória deste Papa que contribuiu para mudanças radicais que se alargaram da Europa a outros continentes, colocando o homem, com toda a dignidade que lhe é devida, no centro do universo. Os regimes totalitários ruíram como castelos de areia, mas nem assim o Papa fez a apologia do capitalismo, como muitos esperavam, antes o condenou pelas injustiças que levavam, também, à exploração do homem pelo homem, transformando-o, em imensas situações, apenas no elo de uma máquina ou cadeia de produção. João Paulo II soube deixar os salões do Vaticano para ir ao encontro do homem todo e de todos os homens, em especial dos que sofrem no corpo e na alma, não para simplesmente os consolar, e já não seria pouco, mas fundamentalmente para clamar por justiça. E fê-lo sem constrangimentos junto dos poderosos, assumindo afirmações nem sempre politicamente correctas, que logo mexiam com o mundo, levando gente de bom senso a pensar e a decidir pela dignificação do ser humano. Outros, foram-se calando, ao sabor dos seus interesses egoistas. A sua morte, perante a qual todos os povos da Terra se curvaram, quantas vezes com lágrimas nos olhos, ainda vai acicatar-nos mais. Estou disso convencido. É que o testamento de João Paulo II ainda tem muito por descobrir. Os seus inúmeros escritos, encíclicas, cartas pastorais, homilias, exortações apostólicas, livros de teologia e de filosofia, poesia e discursos, entre muitos outros, precisam de ser mais lidos. E eu estou mesmo convencido de que tal vai realmente acontecer, porque são um património inestimável que não pode cair no esquecimento. Fernando Martins

Sem comentários:

Enviar um comentário