sábado, 19 de janeiro de 2008

MENTIRA E DIREITO À VERDADE


Quando se reflecte sobre a mentira, é difícil não vir à mente o famoso paradoxo de Epiménides. Diz um cretense: "Todos os cretenses são mentirosos." Sendo cretense, também ele mente. Então, a sua afirmação é verdadeira ou falsa?
Pessoalmente, também lembro uma estória que um jesuíta me contou. Ah! o céu vai ser a coisa mais fabulosa que possamos imaginar. Mas, nos primeiros dois-três dias, no fim do mundo, antes da entrada no céu, quando Deus começar a entregar os filhos aos verdadeiros pais e o dinheiro aos verdadeiros donos, portanto, quando se repuser a verdade, que confusão!...
Afinal, independentemente do paradoxo do cretense, todos mentimos. Mentimos às crianças e ensinamo-las a mentir, com este resultado caricato: "O pai disse para dizer que não está em casa." O miúdo acha que a tia é feia e diz-lho na cara, mas é claro que vai ser repreendido.
Se uma mulher gorda nos pede a opinião - "Estou gorda, não estou?" -, vamos aliviá-la: "Nem pense nisso!"
Imaginemos que uma bela manhã todos se levantavam com a decisão firme de, fossem quais fossem as circunstâncias, dizerem na cara dos colegas, dos amigos, dos vizinhos, dos superiores hierárquicos, dos amantes, dos companheiros de viagem em comboios e autocarros, dos imbecis, dos governantes, fosse de quem fosse, o que verdadeiramente pensam deles. O que seria a vida social sem algumas mentiras ou, pelo menos, sem a omissão da verdade nua e crua?
Os políticos! Desses diz-se que têm como condição de sobrevivência mentir.
Depois, há sempre o que não é conveniente...
E é assim que a verdade raramente se diz, pelo menos toda. Porque realmente não é conveniente: nem na política, nem nos media, nem no sexo, nem aos amigos - Pascal escreveu que, se os amigos soubessem o que os amigos dizem deles na sua ausência, talvez não restassem no mundo mais do que dois ou três. O que pensam e dizem realmente de nós os nossos amigos? Quereríamos saber?
Todos mentimos. Há, porém, mentiras e mentiras. Tomás de Aquino distinguiu entre mendacium - mentira - e falsiloquium - não dizer a verdade a alguém que não precisa de sabê-la ou não tem o direito de sabê-la. No limite, pode acontecer que mentir seja uma obrigação moral. Se um assassino procura um inocente para matá-lo, deve-se mentir quanto à sua localização. O detentor da chave do segredo para desencadear a guerra nuclear deverá mentir ao terrorista que a exige...
A mentira não se refere imediatamente à verdade, mas à veracidade: dizer a alguém o contrário do que se julga ser verdade, com a intenção de enganar. Aprofundando mais, deve-se acrescentar: não dizer a verdade a alguém que tem o direito de sabê-la. M. Onfray escreveu que nunca se deveria mentir, fossem quais fossem as consequências, como exige Kant; mas, se Kant tem razão em princípio, esse princípio é na realidade não vivível, impraticável; por isso, aceita a definição de mentira como "o facto de não dar a verdade, sem dúvida, mas só a quem é devida". Uns têm direito a ela, outros não: por exemplo, um nazi que procurava um judeu para matá-lo não tinha o direito à verdade. Deve-se distinguir "a mentira prejudicial, impura, a que procura um engano destinado a submeter o outro, a limitá-lo, a evitá-lo, a desprezá-lo, e a mentira para ajudar, limpa, chamada por alguns mentira piedosa, a que cometemos, por exemplo, com a finalidade de poupar sofrimento e dor a uma pessoa querida".
Em Portugal, quando se olha para as promessas incumpridas dos políticos, jogos obscuros na banca, subterfúgios à procura da localização de aeroportos, uma política de saúde que fecha maternidades e urgências e descura pobres e velhos, o caos na justiça, um leque salarial gritantemente indecoroso, previsões inverdadeiras da inflação e outras infindas manobras com corrupção activa e passiva à mistura, tem-se a sensação de que se avança em terreno minado pela mentira, com uma democracia perplexa, triste e quase impotente. Quando os portugueses têm direito à verdade.

Anselmo Borges

In
Diário de Notícias

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

REFORMAS DOURADAS

O texto que aqui insiro enquadro-o na linha das reformas douradas, existentes no nosso País. Veio publicado no PÚBLICO de hoje. É certo que se trata de uma empresa privada, com liberdade para fazer o que entender, ao nível salarial. Mas que é um escândalo, aos meus olhos, lá isso é, sabendo-se como são as reformas normais dos trabalhadores portugueses, na sua grande maioria. Vejam:



"O ex-presidente da comissão executiva do Banco Comercial Português (BCP), Paulo Teixeira Pinto, saiu há cinco meses do grupo com uma indemnização de 10 milhões de euros e com o compromisso de receber até ao fim da vida uma pensão anual equivalente a 500 mil euros, 35 mil euros por mês, 14 vezes por ano. Quando o BCP divulgar as contas anuais de 2007, estas deverão incorporar uma verba de 22 milhões de euros, associada à demissão negociada de Teixeira Pinto, que entrou para o banco em 1995, assumindo a presidência em 2005."

Bispo de Aveiro dialoga com a sociedade civil


Na recta final da visita pastoral às paróquias da Torreira e S. Jacinto, diocese de Aveiro, D. António Francisco dos Santos realçou à Agência ECCLESIA que “é fundamental um bispo conhecer os seus cristãos no seu meio ambiente”. De 7 a 20 de Janeiro, o prelado de Aveiro caminhou com aquelas comunidades paroquiais.
Depois da preparação prévia – com os párocos e elementos dos conselhos pastorais – a visita pastoral deve obedecer a três vertentes: “parte celebrativa, encontro com os agentes de pastoral (iniciativas programáticas) e proximidade do bispo com as famílias e instituições (realidade socio-cultural)” – disse D. António Francisco Santos.
Nas paróquias da Torreira e S. Jacinto, o bispo de Aveiro encontrou-se com os agricultores, pescadores, comerciantes e autarcas. “Como são zonas de veraneio e que acolhem pessoas que vêm de fora é fundamental ouvir estas pessoas” – frisou. E acentua: “senti as alegrias e dificuldades deste povo”.
Na visita às escolas e unidade militar, o bispo deixou palavras de ânimo. “A Unidade Militar de S. Jacinto presta um grande serviço na promoção da paz”. Neste contacto promove-se um “diálogo entre a Igreja e a sociedade civil”.

FORTE DA BARRA


A propósito do texto e foto que inseri, hoje, neste meu espaço, recebi esta fotografia, enviada, gentilmente, pelo Ângelo Ribau, com a seguinte nota: "Tenho nos meus arquivos esta foto 'velha' do Forte. Não sei a data em que foi tirada, mas as águas batem contra a muralha do Forte. A barra devia ser a sul daquelo local, dado que não existia 'Triângulo'."
Não sabes, meu caro, mas talvez haja quem saiba. Ficaremos à espera.

Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos


TESTEMUNHAR A FÉ É FUNDAMENTAL



Ano após ano, sucedem-se nesta altura, entre 18 e 25 de Janeiro, os encontros e reflexões sobre a unidade dos cristãos. É a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos, normalmente animada por várias denominações que aceitam o ecumenismo, em diálogo e em oração. Em Aveiro, também, este ano num templo ortodoxo, em S. Bernardo, como refiro em Informações do meu blogue, haverá uma celebração ecuménica.
Penso que todas as iniciativas levadas a cabo nesta altura são importantes, pese embora a necessidade de se não ficar apenas por uma semana. É certo que os teólogos lá vão fazendo o seu trabalho, mas julgo que a nossa intervenção, ao nível do dia-a-dia, também necessita de ser uma realidade constante, e não esporádica, ao jeito de quem cumpre um ritual por obrigação.
Todos os anos costumo dizer que há muito o hábito de pensar que o ecumenismo mais não é do que o esforço que todos temos de desenvolver para que as Igrejas cristãs se acolham na Igreja católica, tornando-se numa só. Penso que o caminho não será esse, pois acredito que as Igrejas cristãs não católicas têm uma parte significativa da verdade, já que a totalidade dela está em Cristo e na unidade que Ele efectivamente representa e é.
Se todos os cristãos, os que aceitam Jesus Cristo como único Salvador e Redentor da humanidade, se congregarem em torno desta verdade essencial e fundamental, estou em crer, salvo o devido respeito pelos teólogos, que estaremos na rota certa d’Aquele que é o caminho, a verdade e a vida. Ora isto, que precisa das nossas orações, também não prescinde dos nossos contributos diários, como testemunhos autênticos da fé em Jesus Cristo.
Em ECUMENISMO, à margem, no meu Blogue, há textos cuja leitura recomendo.

Fernando Martins

FORTE DA BARRA DE AVEIRO


UM POUCO DE HISTÓRIA


Temos da convir que um qualquer motivo de interesse turístico ganha ou perde conforme o concelho a que pertence ou não pertence. Assim acontece com o Forte da Barra de Aveiro, localizado na ilha da Mó do Meio, Gafanha da Nazaré, concelho de Ílhavo, considerado imóvel de interesse público pelo Decreto - Lei n.º 735/74 de 21 de Dezembro, e completamente esquecido dos roteiros postos à disposição de quantos visitam esta encantadora região. Integrado numa outra região, talvez fosse mais lembrado pelos que têm responsabilidades no sector do turismo. É certo que o estado de abandono a que foi votado muito tem contribuído para que dali se desviem os mais sensíveis a tudo quanto de algum modo faça recordar o nosso passado histórico, muito embora se reconheça que o Forte da Barra não terá sido grande baluarte de defesa da foz do Vouga e desta zona ribeirinha.
Este antigo forte, denominado Forte Novo ou Castelo da Gafanha, é um imóvel do século XVII, embora haja quem o considere anterior. Trata-se de “uma obra do tipo abaluartado, restando, actualmente, uma pequena cortina de dois meios baluartes. Depois que deixou de ser necessária a defesa do Rio Vouga, foram edificadas construções sobre a cortina e o meio baluarte norte. Também o espaço existente entre os dois meios baluartes foi afectado. No baluarte sul foi erguida uma torre de sinalização mas, nesse lado, ainda é visível parte da escarpa, cordão e três canhoeiras cortadas no parapeito.
Os dois meios baluartes remontam, assim parece, a épocas diferentes. O flanco norte aparenta ser oblíquo à cortina, enquanto o do sul é perpendicular. Também as linhas rasantes não são do mesmo ângulo”. Esta é a descrição do Inventário Artístico de Portugal de Nogueira Gonçalves.
O Guia de Portugal da Fundação Calouste Gulbenkian acrescenta que a “torre de sinalização que aqui se ergue foi construída em 1840, sob a direcção do Eng. Oliveira Antunes”, e o Roteiro dos Monumentos Militares Portugueses do General João de Almeida diz que “este forte teria sido construído durante a Guerra da Restauração e reconstruído nos anos de 1801 a 1802, em obediência ao plano de defesa do reino, elaborado nos fins do século XVIII” e que, em fins do século passado, perdida a sua eficiência militar, foi construída, contígua à fortaleza, da banda do sul, uma bateria rasa, de tiro de sinal para avisar a defesa da entrada da barra”.
A descrição do Forte da Barra de Aveiro, também conhecida por Forte Novo, sugere‑nos uma referência a um outro forte, o Forte Velho, que existiu na Vagueira e bem assinalado em diversas cartas, possivelmente construído com finalidades semelhantes pela mesma altura e há muito destruído. Aliás, sabe-se que a pedra dos seus muros foi aproveitada para a construção de parte da muralha da barra, quando ela ali se localizou. E é curioso que muitos se interrogam sobre qual deles é, afinal, o mais antigo.
A este propósito, consultámos os escritos do superintendente das Obras da Barra, Francisco António Gravito, que teceu as seguintes e curiosas considerações em 1781. “O forte conhecido com o nome de Velho o não merece senão pela sua ruína porque a inscripção de nua pedra que se acha entre as ruínas o declara feito em anno de 1643 pouco tempo para merecer aquele nome se não fosse a ruína como dizemos.
O conhecido com o nome de Novo, o vemos quase inteiro, sem memória do seu princípio com os seus materiais, indicando sua antiguidade maior, que estes 138 anos que tem o chamado Velho.
Se fosse mais moderno que este apareceria alguma memória da sua certa factura. Nestes termos parece, sem hesitação devemos ter este chamado Novo, pelo mais antigo e imemorial, e que o nome de Novo o conserve pela falta da sua ruína”.
Poder-se-á concluir que o chamado Forte Novo afinal é o mais antigo da foz do Vouga e das margens da Ria de Aveiro? Até prova em contrário pensamos que sim.
E neste caso, urge que lhe seja reconhecido o direito de figurar nos guias e roteiros turísticos editados pela Câmara de Ílhavo e pela Região de Turismo da Rota da Luz, às quais ele pertence como imóvel de interesse público.
Para além disso, e tendo em vista um melhor e mais completo aproveitamento, sugerimos um restauro adequado e urgente e a sua entrega a uma qualquer instituição vocacionada para a defesa do património cultural, histórico e monumental. Talvez assim o Forte Novo ou Castelo da Gafanha passe a ocupar o lugar a que tem direito.


Fernando Martins


JACINTA COM JAZZ À FLOR DA PELE



Jacinta, uma cantora com a arte à flor da pele e na alma, é já há bastante tempo uma artista que se impôs e impõe no mundo contemporâneo do jazz, muito para além das nossas fronteiras. Os seus discos são, de facto, um sucesso inquestionável, fazendo dela uma referência no panorama artístico, em geral. Ouvi-la é um regalo, pois a sua voz e sensibilidade envolvem-nos de tal modo que nos deixam num outro mundo.
Gostei de saber que se iniciou, entretanto, no mundo da blo-gosfera (www.jacintajazz.blogspot.com/), para mais facilmente nos pôr a par do que vai fazendo e se propõe fazer a nível artístico, enquanto nos oferece o que dela vai dizendo a crítica especializada, que nos ajuda a compreender, ver-dadeiramente, a sua voz notável e a sua maneira de cantar única e expressiva.
Os meus parabéns à Jacinta, na certeza de que ela continuará a subir cada vez mais alto e a chegar cada vez mais longe.
No seu blogue, experiemente ouvir a sua arte.

FM