ESTADO A MAIS
OU ESTADO A MENOS?
A ninguém, se anda com os pés no chão e está atento ao que se passa à sua volta, lhe passa despercebida a dificuldade de se exercer hoje a autoridade, em qualquer domínio da vida. Na família, na escola, na Igreja, na rua, no quartel, na autarquia, nos diversos órgãos do Estado de direito, o problema é sempre o mesmo: ânsia de liberdade sem limites, dificuldade em aceitar a mínima advertência, disputa em que cada um se afirma mais do que o outro, jogo de influências para conseguir o que se pretende, campanhas a perturbar os horizontes da sensatez, reacção imediata a quem quer que mande…
Há, porém, sectores de autoridade mais decisivos nas relações sociais e maior influência nos comportamentos, nos ambientes em que se vive e na procura de melhor solução para os males de que todos se vão queixando. Não se pode negar que o modo como o Estado exerce a autoridade é importante para que, na vida em sociedade, as coisas se passem de modo positivo e construtivo. É pacífico julgar-se que o modo de agir público dos que fazem as leis, governam e julgam, constitua escola dos cidadãos.
No espírito de gente responsável, ante problemas públicos que se avolumam com gravidade, basta abrir o jornal para o ver, surge a interrogação, pertinente e insistente, se temos, em Portugal, Estado a mais ou Estado a menos.
Também partilho desta preocupação. Por isso mesmo, não me esquivo a opinar. No meu entender é ainda mais grave verificar que, em alguns aspectos da vida nacional, temos Estado a mais, e noutros, visivelmente, Estado a menos.
A tentação clara de um poder centralizador, omnisciente e omnipotente, de pendor providencialista, que não admite críticas nem opiniões contrárias, nem dá razão do que faz e, por motivos próprios ou por pressões alheias, se fecha, para solucionar sozinho problemas em campo, calando ou ignorando possibilidades democráticas, existentes e legítimas, é uma manifestação evidente de Estado a mais.. Ora, esta atitude de sobranceria sente-se tanto no poder legislativo, como no executivo. Os males do judicial, que também não são poucos, andam por outros caminhos.
Parece necessário a quem exerce o poder, dispor-se a frequentar um curso de ética social e política. Assim terá sempre no horizonte das suas acções e decisões, o bem comum com as suas exigências, como objectivo fundamental. Este bem não é a soma dos bens individuais e, muito menos, o atrelar de todos os cidadãos às soluções pensadas e decididas só para alguns. Reconhecer e garantir os direitos individuais, um dever do poder legislativo, não pode ter como caminho a subversão de instituições que constituem o tecido consistente de uma coesão social necessária. De modo mais claro: leis sobre o reconhecimento e protecção legal de opções homossexuais não é aceitável fazerem-se à custa da desvalorização e da destruição da família natural; protecção às mães que não querem nascidos os filhos que geraram, não é admissível que se faça em total ruptura com o direito à vida de um ser humano indefeso e já gerado; proporcionar educação pré-escolar gratuita a todas as crianças do país, um dever do Estado, não se admite que se marginalizem instituições particulares existentes ou negando-lhe o direito de serem consideradas ensino público gratuito, enriquecedor do sistema educativo.
Os exemplos podem multiplicar-se. Haja clarividência no dever de servir a todos, sem ignorar, nem marginalizar a maior parte. As famílias normais, a maioria no nosso país, são agredidas e prejudicadas na sua missão e estabilidade, com resultados negativos à vista, por leis que já existem e por falta de outras que as respeitem. Estado a mais ou a menos é sempre carência de Estado. Não responde ao dever de servir, empobrece a comunidade, dá mau exemplo no exercício da autoridade, divide em vez de unir, torna-se obsessivo, em vez de reflexivo. Bom para alguns, mas mau para todos.