Da crónica de António Barreto
no PÚBLICO
Que pensa quem olha para este inventário?
Chegámos a um cume nunca antes atingido!
E ainda não vimos tudo. Um primeiro-ministro, um punhado de ministros, diversos secretários de Estado, vários directores-gerais, numerosos membros de gabinetes, múltiplos gestores, muitos banqueiros, directores bancários sem fim, juízes, procuradores, presidentes da Relação, desembargadores, advogados, professores de Direito, deputados, presidentes de câmara, vereadores, dirigentes de partidos nacionais e locais, chefes da polícia e oficiais das Forças Armadas: há de tudo entre notoriamente suspeitos, investigados, sob inquérito, em curso de instrução, arguidos, à espera de julgamento, condenados, à espera de recurso, a cumprir pena, presos e em detenção domiciliária! O elenco dos suspeitos de corrupção é uma lista de celebridades.
Não há paralelo na história do país. E parece haver poucos casos semelhantes, se é que existe algum, na história recente da Europa…
Que pensa quem olha para este inventário? Ou antes: que pensam as autoridades competentes? Os Presidentes da República e da Assembleia, o primeiro-ministro, os ministros, os secretários de Estado, os directores-gerais, os deputados, os presidentes de câmara, os dirigentes partidários, os juízes, os procuradores e os magistrados dos Tribunais de Contas, Constitucional, Supremo de Justiça e Supremo Administrativo? Que está tudo bem? Que está tudo mal, mas não se pode fazer nada? Que é o que deve ser, que a democracia e a humanidade não são perfeitas? Ninguém sabe a resposta exacta. Só se conhece o silêncio incomodado. Mas há uma certeza: os principais responsáveis pela política e pela justiça querem que as coisas fiquem como estão, pois é o que lhes interessa e dá vantagens. Se assim não fosse, já teríamos tido notícia de mais acção, mais julgamentos, mais medidas práticas, mais condenações, mais legislação punitiva e mais legislação eficaz anticorrupção.
Em vez disso, parece termos um Parlamento que receia a justiça e se abstém. Deputados que têm medo dos juízes. Um Governo que administra e trata das contas. Uns conselhos superiores que zelam para que não haja ondas. Uns poderosos das empresas que navegam e aproveitam. Uns vigorosos escritórios de advogados influentes que estão organizados para este sistema e preferem o que conhecem. Uns sindicatos que se limitam à sua esfera corporativa. E polícias sem meios nem peritos.
António Barreto no PÚBLICO