OUVIR O PADRE AMÉRICO
Paulo Rocha
Foi com surpresa que, no meio do trânsito, ouvi a voz do Padre Américo.
Na rádio pública evocam-se, nos "27 mil dias de rádio", os 75 anos de emissões. Entre os muitos registos que agora se voltam a ouvir, os arquivos da RDP guardam alguns minutos com a voz do fundador das Casas do Gaiato.
São gravações de 1946. Não identificam as circunstâncias em que o Padre Américo falava entusiasticamente de projectos que levava por diante. Afirmava a urgência da iniciativa e a necessidade de se abrirem mais casas para acolher, educar e formar rapazes "sem nome" de meados do séc. XX.
"Muitos que batem à porta, não sabem identificar-se, não comeram nunca alimentos preparados ao lume, vêm totalmente despidos de hábitos humanos. São de terras de ninguém".
O tom penafidelense do Padre Américo coloca muita paixão na descrição daqueles que mereciam afecto. Revela ainda mais dedicação a uma obra que, como começa por dizer, "nasceu pequenina". Não por falta de recursos ou pouca ousadia. Mas porque é esse o "costume das coisas grandes". Diz, de uma só vez, o Padre Américo, com saber feito de muito trabalho desenvolvido: "A nossa obra nasceu muito pequenina, como é costume das coisas grandes".
Nesta circunstância, a voz do Padre Américo, ouvida pela rádio, não é pretexto para avaliar pedagogias ou episódios, os felizes e também os menos felizes, que fazem parte da história de 70 anos das Casas do Gaiato. Antes para fixar a determinação de Américo Monteiro de Aguiar, do Padre Américo, num projecto de ajuda muito concreto, capaz de devolver a merecida dignidade às histórias de vida que conheceram o seu ideal. Também àqueles que, pela sua influência, beneficiaram de actos efectivos de ajuda na freguesia, na proximidade.
Hoje, cresce a ambição de resolver os problemas a partir do local onde quase todos nascem: o escritório. Encontros multilaterais, grupos de 8, 10 ou 20 países e muitas cimeiras... Infelizmente para muito aparato, algumas conclusões e poucas consequências reais na vida das Nações e das relações entre elas.
Do Pe. Américo fica um modelo transformador da sociedade porque capaz de mudar pessoas, devolvendo-lhes dignidade, tornando-as obreiras de justiça.
Como em 1946 disse o Pe. Américo, depois de muita obra feita, também hoje é pertinente afirmar: "nós somos hoje uma palavra nova que se levanta em Portugal. Que todos os portugueses se levantem também