IGUARIAS COLORIDAS
E ... GALINHAS
Caríssimo/a:
Depois da sesta, reparei que ainda tinha sobre os joelhos o primeiro número da Oceanos e na página 36. Aí José Quitério fala-nos de “Camões e a mesa”. Bem, vamos primeiro ao arco-íris:
De iguarias suaves e divinas,
A quem não chega a egípcia antiga fama,
Se acumulam os pratos de fulvo ouro,
Trazidos lá do Atlântico tesouro.
A laranjeira tem no fruito lindo
A cor que tinha Dafne nos cabelos;
Encosta-se no chão, que está caindo,
A cidreira co'os pesos amarelos:
Os formosos limões, ali cheirando,
Estão virgíneas tetas imitando.
As cerejas purpúreas na pintura;
As amoras, que o nome têm de amores;
O pomo, que da pátria Pérsia veio,
Melhor tornado no terreno alheio.
Abre a romã, mostrando a rubicunda
Cor, com que tu, rubi, teu preço perdes;
Entre os braços do ulmeiro está a jocunda
Vide, com cachos roxos e outros verdes.
Mas agora vem a parte que me fez rir, não só porque fala de galinhas mas também porque Camões brinca com as situações. Vejamos: “O senhor de Cascais prometeu a Camões seis galinhas recheadas por umas cópias que lhe fizera, mandando-lhe em princípio de paga meia galinha recheada. O poeta retruca, lesto:
Cinco galinhas e meia
Deve o senhor de Cascais,
E a meia vinha cheia
De apetite para as mais.
“Ou como aconteceu com o duque de Aveiro... que perguntou ao poeta o que queria da sua mesa e que lhe respondeu logo que bastava que lhe mandasse uma galinha; esqueceu-se o duque ou fingiu esquecer-se e, depois de haver jantado, quando já não havia outra coisa lhe mandou uma peça de vaca e o poeta pelo mesmo criado lhe mandou estes versos:
Já eu vi o taverneiro
Vender vaca por carneiro,
Mas não vi, por vida minha,
Vender vaca por galinha
Senão ao duque de Aveiro.
Quase me parece um sacrilégio desejar-vos um bom S. Paio com a respectiva caldeirada bem amarela e, lá pela tarde, uma anafada talhada de melancia vermelhinha..
Manuel