"Enfrentar o monstro da pedofilia
na Igreja e em toda a parte"
1. Não conheço condenação mais dura e funda da pedofilia do que estas palavras de Jesus no Evangelho: “Deixai vir a mim as criancinhas”, e é preciso tornar-se como uma criança, “para entrar no Reino dos Céus”, porque elas são simples, inocentes, não discriminam. Imediatamente a seguir Jesus diz: “Ai de quem escandalizar uma criança. Era melhor atar-lhe a mó de um moinho ao pescoço e lançá-lo ao fundo do mar.” Não se pode fazer mal às crianças: elas são inocentes, elas não fazem mal (é esse o sentido de inocente, a partir do verbo nocere: causar dano, fazer mal, com o prefixo negativo in).
É assim para todos e sempre. Mas isso vale de modo especial para a Igreja. E o que é que se passou, desgraçadamente? Foram milhares de menores e pessoas vulneráveis que foram abusados. Mesmo sabendo que o número de pedófilos é muito superior na família e noutras instituições, a gravidade da situação na Igreja é mais dramática. Por várias razões: as pessoas confiavam na Igreja quase sem condições, o que significa que houve uma traição a essa confiança, e o clero e os religiosos têm responsabilidades especiais. O mais execrável: abusou-se e, a seguir, ameaçou-se as crianças para que mantivessem silêncio, pois, de outro modo, cometiam pecado e até poderiam ir para o inferno. Isto é monstruoso, o cume da perversão. E houve bispos, superiores maiores, cardeais, que encobriram, pois preferiram salvaguardar a instituição Igreja, quando a sua obrigação é proteger as pessoas, mais ainda quando as vítimas são crianças. O Papa Francisco chamou a esta situação “abusos sexuais, de poder e de consciência”. Também diz, com razão, que a base é o “clericalismo”, julgar-se numa situação de superioridade sagrada e, por isso, intocável. Neste abismo, onde é que está a superioridade do exemplo, a única que é legítimo reclamar?