Crónica Semanal
de Anselmo Borges
Há muito tempo, no café, a senhora Isilda, uma senhora antiga, muito bonita e viva, com 91 anos, que teve filhos, esclareceu-me quanto ao baptismo: segundo ela, baptizam-se as crianças pequeninas, para receberem o Espírito Santo, que é mais forte do que Jesus, e que é “o Espírito falador”: é ele que dá às crianças a capacidade divina para falarem.
À sua maneira, a senhora Isilda — já partiu — tinha consciência do milagre que é falar. Quem algum dia reflectiu sobre isso — a capacidade de falar: proferir sons articulados que transportam sentido — falando, dizemo-nos a nós próprios, damos ordens, fazemos declarações de amor, e ódio também, ensinamos, contamos anedotas, fazemos paralisar um homem, levamos uma mulher à lua, dirigimo-nos ao Infinito —, não pode deixar de cair no assombro interrogativo.