sexta-feira, 21 de julho de 2006

Representações do sagrado e conflito de liberdades - 2

O sagrado,
a liberdade
e a responsabilidade
O notório caso dos cartoons foi alvo de um sem-número de comentários. Quando a poeira começou a assentar, a conclusão mais comum consistiu em proclamar mais um capítulo daquilo que nas bocas dos sábios dos nossos tempos corre pelo nome de “choque de civilizações”. De um lado, o “Ocidente”, defensor inflexível da “liberdade de expressão”; do outro, o fanatismo religioso islâmico que coloca o sagrado como critério primordial do que é possível fazer (ou dizer), ou não, no domínio do profano. Parecia ser mais uma manifestação da célebre antinomia amigo/inimigo, da separação entre “Nós” e “Eles”, que, para mais, tinha o mérito de contribuir para a definição que cada uma das partes em conflito fazia de si mesma. É preciso notar, no entanto, que a violência que acompanhou a tomada de posição dos que, em certas regiões do mundo, se sentiram ofendidos com a publicação dos cartoons contribuiu decisivamente para a polarização em torno destas duas partes. Contudo, o grau que essa violência atingiu e as suas manifestações concretas também permitem concluir que este problema ultrapassou (e ultrapassa) em larga medida o domínio religioso. Concentrar-me-ei no exame de apenas uma das partes em conflito, a dita “ocidental”, a que se declarou, sem qualificações, pela liberdade de expressão. Todo o exercício da liberdade está sujeito a abusos (pelo menos potencialmente). Escutando as vozes dos partidários da liberdade de expressão, dir-se-ia que a publicação dos cartoons não foi encarada pelo mundo ocidental como uma manifestação dessa possibilidade. Muito simplesmente, não houve qualquer abuso da liberdade de expressão porque essa liberdade particular só muito raramente se presta a abusos. E como tantas vezes se insistiu, as referências religiosas não podem colocar limites ou entraves a essa liberdade; tal constituiria, isso sim, um terrível abuso. O que o discurso dos partidários da liberdade de expressão também revelou foi aquilo a que se poderia chamar (recorrendo à expressão de Marcel Gauchet, “a saída da religião” no mundo moderno ocidental) “a saída do sagrado”. A “saída da religião” ou, neste caso particular, a “saída do sagrado” ultrapassa no seu significado o fenómeno conhecido por “laicização” ou “secularização”. A “saída do sagrado” corresponde à reestruturação do mundo, e dos “imaginários sociais” que o configuram, segundo a neutralização mais extrema da presença do divino no mundo sublunar e a desvalorização mais radical das suas representações. Assim, o “sagrado” não pode impor limites à liberdade de expressão, ou, por outras palavras, a responsabilidade que deve acompanhar o exercício da liberdade de expressão não pode integrar as exigências da fé e das hierarquias religiosas, porque estas foram expulsas do espaço público, do lugar por excelência onde a sociedade se pensa a si mesma, ou mais rigorosamente, se interpreta a si mesma. A religião ou, para falar mais genericamente, o sentido do sagrado foi “secundarizado” e “privatizado”; tudo se resume a uma questão de escolha pessoal, privada e subjectiva. Enquanto tal, não pode reivindicar um lugar diferente de todas as outras escolhas privadas e subjectivas. Mais: em relação a outras escolhas, a fé e o sentido do sagrado adquirem nos nossos dias o estatuto duvidoso da mais “privada” e “subjectiva” das escolhas, o que contribui decididamente para interditá-las do espaço em que decorre a discussão pública. Durante estes últimos tempos, a defesa, sem qualificações, da liberdade de expressão assumiu-se como o derradeiro capítulo dessa longa narrativa a que Max Weber chamou “o desencantamento do mundo”. Parece, então, estar ausente do debate público uma terceira posição: uma que aceite a liberdade de expressão, e a liberdade da pessoa humana em geral, e, simultaneamente, a presença do sagrado no mundo. Ora, o Cristianismo contém, desde as suas origens, o princípio de separação entre Igreja e Estado; afirma a dignidade da pessoa humana e daí deduz o direito individual e grupal à(s) liberdade(s); mas não permite que, em nome da individualidade, se reduza a vida humana à soma de escolhas subjectivas, sem ordem, nem hierarquização. A liberdade tem limites, e não se considera um acto como autenticamente livre se não for acompanhado pelo princípio da responsabilidade. A acção livre ocorre sempre num contexto social e político; é por isso que o exercício dos direitos individuais e grupais se encontra limitado, não só pela existência dos direitos de outros indivíduos e de outros grupos sociais, mas também pelos imperativos da justiça e do bem comum. É precisamente essa a recomendação da Declaração do Concílio Vaticano II sobre a liberdade religiosa, Dignitatis Humanae (§7). Alguns apontaram que a literatura e a iconografia do escárnio fazem parte da nossa “civilização” ocidental. Sem dúvida. Mas recordar o princípio da responsabilidade que deve sempre acompanhar o exercício dos direitos e reavivar os deveres da caridade também não é sintoma de “tibieza”, “cobardia” ou “rendição”. É o seu contrário. Miguel Morgado Docente de Ciências Políticas, UCP
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In "Observatório da cultura"

quinta-feira, 20 de julho de 2006

Quadros da Ria de Aveiro

Zé Penicheiro, "O Sol da Tarde", acrílico sobre tela, 46x38

Os quadros da Ria de Aveiro que aqui deixo são um desafio aos meus leitores para que visitem a laguna aveirense. Mas também um apelo para que a apreciem com olhos de ver. Hoje ofereço o olhar e a arte muito própria do artista Zé Penicheiro.

Citação

À medida que tomamos consciência
do nosso lado divino
sabemos que o amor ilimitado
que nos habita
é o único alimento
verdadeiramente capaz
de nos curar
de eventuais doenças
ou inevitáveis
momentos de tristeza.
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In revista XIS

Um artigo de Alexandre Cruz

A guerra,
porquê? 1. Eis a pergunta mais ingénua e mais séria de todas: “A guerra, porquê?” Que drama de morte e que fatalismo consagrado este em que a guerra acompanha-nos e com uma certeza cruel de que só terminará quando acabar a Humanidade. Quem dera que fosse diferente mas é mesmo assim… Se há zonas do mundo cujas páginas de história se confundem com o constante conflito armado e mortífero, o Médio Oriente é esse emblemático lado escuro da humanidade. Ali, na visão dos livros típicos de história Ocidental, tudo nasceu: o bem, a esperança, a história, a ideia do colectivo, a civilização…mas também o mal, o ódio, a intolerância, a injustiça e a guerra. É este o fascínio obsessivo que faz de cada palmo de terra uma luta, uma conquista, uma guerra! Será que o melhor que se consegue serão “alguns anos” de processo de paz para o Médio Oriente? Não chega a visão simplista da história do século XX, dos acordos conseguidos a meados do século, da “força de persuasão” angariada pelas armas; ler as causas e perspectivas na óptica do passado século XX é não compreender que naqueles lados “1000 anos são um dia” e que o desígnio colectivo, onde não há pessoas indiferentes nem individualismos de indiferença, cria imperativos de não abdicar da própria história que cada grupo, etnia, comunidade, movimento, país, escreveu o quer escrever. Ou seja: são outros os olhos (e tantas vezes para o mal de todos), que não os nossos ocidentais, que movem as energias e conquistas ao longo dos séculos e mesmo milénios. Sim, já são pelo menos quase quatro milénios de história registada, em que aquele “chão” recebe as dores e as lágrimas humanas… Drama este em que todo o potencial de conhecimento e tecnologia militar é colocada ao serviço da morte de irmãos humanos, tragédia deste triste mundo em que os fanatismos, quer dum lado quer de outro, não olha a meios (nem à racionalidade) para atingir os seus fins egoístas, deixando por terra, pelo caminho, uma legião de mortos e desalojados!... 2. Que guerra é esta? O que está por trás como motor de guerra nesta desproporção alarmante da resposta israelita em que, “ferido um dedo”, ataca-se para matar todo o corpo do adversário? Interessa (há sempre interessados em guerra, que não o pobre povo) a quem este conflito? E a vergonha impávida e serena dos “G8” (que se chamam a si mesmo de mais ricos do mundo, mas são alarmantemente pobres de “amor sério e generoso à humanidade”), que da rica Cimeira da Rússia observavam desportivamente os mísseis a cair no Líbano? Como é possível, senhores da importância mundial, não se sentirem livres (interiormente e exteriormente) para dizerem cabalmente que, neste contexto, Israel deu início a esta guerra vergonhosa? Que falta de autonomia esta em que todos ‘alinham’ com os EUA protectores de Israel e não da verdade objectiva em cada situação? Pensarão os senhores de mundo que naquele constante “baril de pólvora” a guerra é caminho para alguma coisa de bom? Pela cultura dos tais milénios, e impregnados infelizmente de espírito terrorista e suicida, pensarão os gestores do Ocidente que o “Hezbollah”, o “Hamas”, os radicais Xiitas,… acalmam com as bombas que lhes são ‘presenteadas’? Ou antes, pelo contrário, recebem as bombas que lhes agradam como argumento de vingança duradoura contra Israel? Quem certamente estará a aproveitar bem o tempo será o nuclear presidente do Irão; Israel está-lhe a dar toda a margem de manobra. Apesar das diferenças no âmbito de todas as mil ramificações islâmicas, e em que mesmo o “Hezbollah” para os árabes é inimigo perigoso, o certo é que havendo um terceiro alvo a abater, Israel, então a motivação congregadora islâmica sobe em flecha; e se juntarmos a todo este contexto as palavras do presidente do Irão de que “Israel terá de desaparecer do mapa” então Israel corre mesmo perigo, um perigo que também atiçou. Claro que as posições no campo de combate vão-se gerindo: se Israel é, por obrigação histórica e económica, protegida pelos EUA, com a (possível) entrada em cena do Irão teremos então na final deste triste campeonato uma luta de titãs: Irão contra os Estados Unidos. 3. Onde pára a comunidade internacional? Quem é e o que pode a Comunidade Internacional? Onde está a ONU? Quem é afinal a Organização das Nações Unidas, com membros no Conselho de Segurança que são os desportivos “G8” a ver o mundo a passar à espera do momento certo para obter mais hegemonia e (porventura) petróleo do Médio Oriente?! Nos bombardeamentos de Haifa, cidade de Israel da maior convivência saudável entre as diversas comunidades islâmicas e israelitas, vemos a “morte” do processo de Paz, o terminar de um tempo de tolerância, esperança, expectativa, unidade da diversidade. Sendo certo que muitas águas existem a separar, por exemplo entre o que são os estados islâmicos e a sua necessária autonomia em relação aos movimentos fanáticos (como no caso do Líbano em relação ao “Hezbollah”), a verdade é que faz sentido perguntarmos quantos anos, décadas, serão necessários para restituir a esperança de um processo de paz? Não demorará só o tempo da reconstrução das pontes, edifícios e aeroportos de Beirute. O “essencial” não está no betão, se assim fosse a paz seria bem mais fácil!...

Procriação Medicamente Assistida

Jaime Gama
aceita projecto-lei
O residente da Assembleia da República admitiu o projecto-lei de iniciativa popular para a realização de um referendo à Procriação Medicamente Assistida (PMA). Jaime Gama enviou já a proposta para a Comissão de Saúde, que vai agora olhar para o documento. No entanto, decisões concretas só em Setembro. Depois do chumbo do Parlamento, o presidente da Assembleia da Republica propôs ao Movimento Pró-Referendo a transformação da petição, com mais de 80 mil assinaturas, num projecto-lei de iniciativa popular. A ideia foi aceite pelos dirigentes do Movimento que exigem um referendo sobre a Procriação Medicamente Assistida.
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Fonte: RR

CARTA ÀS INSTITUIÇÕES DO PRESIDENTE DA CNIS

Esclarecimentos e orientações sobre ATL SENHOR (ª) PRESIDENTE
Pelo muito que fizeram ao longo do ano e para melhor perspectivarem umas mais do que merecidas férias, todos os dirigentes das IPSS’s bem mereciam um fim de ano lectivo tranquilo. Porém, alguns vivem momentos bem difíceis porque o futuro próximo está envolto em muitas nuvens de dúvidas. Entre esses, estão claramente bastantes dirigentes de IPSS’s com a valência de ATL… Para fazer dispersar algumas nuvens, sinto ser meu dever esclarecer o que pode ser esclarecido e apontar algumas orientações:
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Leia mais em SOLIDARIEDADE

quarta-feira, 19 de julho de 2006

Um artista ilhavense

Costa Nova, 2004, Acrílico sobre tela, 80x120 cm
Brincadeiras de Menino, 2006, Acrílico sobre tela, 90x80 cm
JÚLIO PIRES: Um pintor a visitar
Há dias encontrei-me com um artista que desconhecia. Num ambiente em que se sente bem e que o completa: uma galeria de arte, a OP ARTE, na Gafanha da Nazaré. É um pintor ilhavense, que reflecte, num rápido contacto, uma serenidade que impressiona. Senti que não gosta de falar da sua arte. Gosta, porém, que sejam os outros a falar dela. É o que faço aqui, neste meu espaço, sem preocupações críticas. Deixando, contudo, que a minha sensibilidade diga o quanto gostei de apreciar nas suas telas, carregadas de cor. Mais luz e sombras dos nossos ares, com a Ria e o Mar a deixarem marcas que artistas, como ele, perpetuam. Por isso, digo que o Júlio Pires merece uma visita, onde quer que se encontre: nas galerias onde expõe, nas telas que se vão espalhando por casas de gente de bom gosto, no seu ateliê, que fica na Avenida João Vaz e Silva, Lote 4, na Praia da Vagueira, e no seu “site”, que mora em www.juliopires.com Os quadros que apreciei projectam-me para cantos e recantos da sua e nossa terra, e para mais além, ora carregados de cores fortes, ora de silhuetas que fazem sonhar, mas sempre com traços firmes que denotam o domínio das técnicas que experimenta, ou não fosse o artista um autodidacta que tem, como deve ter, a ânsia da procura e o desejo de chegar mais longe na arte que nunca mais pode abandonar. De quando em vez mostra-nos rostos que nos são familiares, tais são o rigor das feições e a expressividade de certos olhares e posições, das nossas gentes e de gentes de outras bandas, que Júlio Pires fixou de diversos pintores e de várias culturas. Aqui chegando, permita-me o pintor ilhavense que lhe diga que a sua arte, para se impor, não precisa, assim tanto, de sair dos horizontes que lhe enchem a alma, embora tenha o direito, como outros, de se deixar impressionar por outras formas de ser e de estar na vida, neste Portugal de tantos contrastes. Júlio Pires é natural de Ílhavo, onde nasceu a 30 de Outubro de 1964. É um autodidacta, criando o seu próprio percurso no caminho das Artes Plásticas. Frequentou em 1987 um curso de desenho e pintura no Grupo A.C.V. na Fundação Calouste Gulbenkian, sob a direcção de Pedro Andrade. Profissionalmente, foi pintor na Fábrica de Porcelanas da Vista Alegre. Porém, é nas telas que encontra a sua realização pessoal e a sua forma de expressão, que os ílhavos, e não só, têm a obrigação de muito mais valorizar. Júlio Pires já foi contemplado com vários prémios, fazendo parte a sua pintura do acervo de diversas colecções particulares. Está representado, também, em instituições portuguesas e estrangeiras, tendo participado em 34 exposições individuais e 24 colectivas. Fernando Martins

Textos ensanguentados

TEXTOS ENSANGUENTADOS 



Textos
ensanguentados
como feridas

Gralhas
ensanguentadas

Textos
gelados
como árvores
no Inverno

Textos
como árvores
cortadas
aos bocados

Textos
como lenha

Textos
como linho

Textos
brancos
como a noite

Textos
brancos
como a neve

Textos
sagrados

Textos
bifurcados
como ramos

Textos
unos
como troncos

Adília Lopes 

In “Sur la croix”

Um artigo de Daniel Serrão

PMA: com ou sem lei?
É legítima a pergunta. De facto, o tratamento médico da infertilidade, como qualquer outro tratamento do âmbito dos cuidados de saúde, não justificaria, por si só, a intervenção do legislador, fosse ele o Governo ou a Assembleia da República. E outros processos de tratamento da infertilidade, que não a PMA, como é o caso da desobstrução cirúrgica das trompas, não são objecto de preocupação dos legisladores. Basta a regra básica da actividade médica que é a de o médico agir sempre segundo as regras da boa prática científica e técnica, as leges artis dos juristas. Assim sendo, algo deve acontecer na PMA que ultrapassa a intervenção médico-técnica e que impôs a intervenção do legislador. E acontece: a PMA é um acto médico que extravasa da simples intenção terapêutica de curar a infertilidade, para campos não médicos e claramente sociais. E é a repercussão na sociedade e suas estruturas básicas, como a família, que impôs, e bem, a intervenção da Assembleia da República. Se o fez da melhor maneira, isso é matéria controversa.
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Leia mais em Ecclesia

Férias do Papa

Férias do Papa entre a leitura, a oração e a música
Bento XVI continua o seu período de repouso em Les Combes, nos Alpes italianos, preenchendo os seus dias com momentos de oração, leitura e música. Os tempos que o Papa passa ao piano, tocando Bach e Mozart, são audíveis nas casas vizinhas. O Centro Televisivo do Vaticano mostrou imagens inéditas de Bento XVI neste período de férias, que se prolongam até 28 de Julho. Além do piano, o CTV mostrou o Papa a caminhar pelos jardins que rodeiam o chalé que o aloja. Numa das poucas declarações que prestou aos jornalistas, nos últimos dias, Bento XVI explicou que “ver a montanha é como ver o criador”. Todos os responsáveis que são convidados a falar da estadia do Papa concordam com o clima de “tranquilidade” que se tem vivido, muito por força da personalidade reservada de Bento XVI e do seu amor pela natureza, que o leva a passear pelas montanhas circundantes. O descanso não impede, como já noticiado, que o Papa acompanhe a actualidade, através de contactos regulares com a Secretaria de Estado do Vaticano. O relativo sossego destes dias gera muita especulação em torno da actividade de Bento XVI e, tal como no ano passado, começa a falar-se com insistência da possibilidade de uma nova obra papal estar a ser redigida. Oficialmente, nenhuma indicação foi dada pelo Vaticano a esse respeito. Em declarações à Rádio Vaticano, o Bispo de Aosta, D. Giuseppe Anfossi, assegurou que “o Papa está tranquilo” e que “desfruta da liberdade de não estar submetido ao trabalho”.
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Fonte: Ecclesia

Um artigo de António Rego

Quando tudo
parece a arder
A humanidade vive de euforias e sobressaltos. Num misto de realidade e ficção, com alguns dados do passado e todas as dúvidas em relação ao futuro. Mais escancarado que nunca o buraco do ozono, com os raios ultravioleta quase a fecharem as pessoas em casa no braseiro do Verão, as temperaturas a roçarem os extremos suportáveis, os fogos a esgotarem os bombeiros e a inquietarem, com notícias, férias merecidas, os conflitos sem darem sinais de arrefecimento para os lados da Coreia do Norte, e agora em nova cena do Médio Oriente - para além de outros focos atenuados pela distância. Os preâmbulos da guerra parecem, agora, montados para um alastramento não apenas das escaramuças entre tanques e pedras, mas com dois exércitos frente a frente, incendiadas as fronteiras e enfurecidos os vizinhos e aliados. Em dado momento tudo parece conjugar-se para um fogo real ateado por um vulcão – o da violência - que sempre esteve em actividade na cratera da história, mas que varia de intensidade pelas formas de energia que utiliza. Entretanto, a justa exaltação de todo o progresso científico e tecnológico que permite o prolongamento da vida humana, as viagens planetárias, os meios de comunicação e informação com uma inteligência natural a artificial mais surpreendente que nunca. Mas tudo isso morre na praia, nas areias dos velhos absurdos da guerra e da violência. Assim é desde a noite dos tempos. E algum desalento se apodera dos profetas como que a confirmar que “ não há nada a fazer, o homem não tem remédio e a natureza parece que também não”. Restam apenas alguns pós de esperança para não alinharmos com os banais clamores dos fatalistas desiludidos? Talvez não. Não é negando a história e os factos que abrimos caminho para o futuro. Mas é precisamente no enquadramento e na medição exacta dos acontecimentos que ultrapassamos os aparentes bloqueios de cada momento. Se tudo parece a arder, será na frieza do nosso olhar que iremos descortinar a realidade que pertence a cada tempo. Não sabemos se daqui a duas semanas narramos os factos da mesma forma. Vamos descobrindo que a nossa emoção precipita juízos sobre acontecimentos incompletos e ajustáveis ao complexo cósmico e humano. Aqui, sim, vamos ter ao oceano de Deus que ultrapassa o nosso olhar, os nossos espaços, as nossas medidas e as nossas contas. Por isso a fé também se pode definir como o ângulo do olhar de Deus num sentir homogéneo sobre todos os tempos e todos os seres. Não passamos, afinal, duma ínfima – apesar de infinita - parcela desse todo. Nem por isso é menor a nossa responsabilidade ou maior a nossa desculpa.

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Animais das nossas vidas

O Toti e a Tita foram animais das nossas vidas. Aqui estão no relvado com a Lita. Descontraídos e excelentes companheiros, cada um com o seu...

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