Por Georgino Rocha
Jesus marca o ritmo do tempo. Quer que o seu projecto entre numa fase nova: lançar os discípulos na primeira experiência da missão. Por isso, faz a escolha dos doze, símbolo da totalidade, confere-lhes poder sobre as forças do mal, define o anúncio da mensagem a proclamar e dá instruções claras e precisas.. Tudo em conformidade com o que tinha feito - e eles tinham visto e ouvido - nas viagens pelas aldeias e na ida às sinagogas, no contacto com as multidões, nas conversas em família.
Este modo de proceder constitui a melhor escola de formação: em grupo, com relacionamento personalizado, ensinamentos oportunos e, quase sempre, precedidos de acções envolventes e apelativas, recurso a explicações complementares, autoridade reconhecida e participada por todos, responsabilidades atribuídas progressivamente, riscos calculados e ousadia confiante. Tudo a convergir para formar aqueles que eram/são chamados a testemunhar e a cooperar na realização do projecto de salvação que Deus nos proporciona em Jesus Cristo.
Os discípulos partem em missão e, a avaliar pelo relato de Marcos, realizam obra notável: anunciam a novidade da vida com Deus que gera o arrependimento do mal praticado e a aceitação do bem a fazer, expulsam demónios que simbolizam tudo o que desumaniza a pessoa e a sociedade e organiza uma convivência eivada de preconceitos maléficos e de atitudes perversas em relação à escala de valores dignos da condição humana, ungem e curam doentes, sinal da integridade física e moral, afectiva e espiritual, individual e relacional. A cura é sanadora, faz recuperar a saúde e resgatar a paz interior, libertando da culpa e desvendando o dinamismo da misericórdia de Deus.
Jesus envia-os dois a dois, certamente por razões sérias: darem apoio mútuo, serem testemunhas aceites pela lei judaica, garantir credibilidade ao que venha a acontecer, tornar visível o núcleo inicial da comunidade a construir. A prática deste tipo de envio talvez radique na prática de viajar juntos e no costume dos enviados oficiais do Templo de Jerusalém para cobrarem o imposto anual, segundo as regras prescritas pelo tratado de Tosefta. Mas há uma diferença substancial pois os discípulos de Jesus são portadores de uma oferta que não “cobra” nada, percorrem os caminhos árduos sem protecção especial, apenas armadas com o imprescindível para a subsistência, devem permanecer onde são recebidos e anunciar a boa notícia que lhes é confiada. Nas casas de acolhimento começam os núcleos da comunidade, gérmen da igreja futura, alicerçados na relação fraterna, na escuta da palavra, na hospitalidade solícita, na certeza de que o reino de Deus está a emergir em gestos e atitudes humanas.
A equipagem dos discípulos para a viagem pelo mundo é modesta e leve. Apenas um cajado de segurança, umas sandálias de protecção e a autoridade sobre os espíritos imundos, quer dizer, sobre as forças do mal, as alienações que ameaçam a consciência humana. Ontem como hoje! Estas alienações têm nome e precisam de ser combatidas: injustiças, desigualdades, fomes, corrupções, mentiras e manipulações. É preciso sobrepor a relação solidária à razão económica, o bem de todos aos interesses da alguns, a prioridade de necessidades fundamentais às preferências elitistas de requintes supérfluos e ostensivos. É preciso combater tudo o que empobrece a vida humana, a sociedade de todos, o padrão digno do bem-estar de cada um.
Jesus quer libertos os seus discípulos e não amarrados a nada, prontos e disponíveis para a missão, sem outros encargos e preocupações. Interior e exteriormente. A sua fortaleza vem-lhes das convicções geradas pelas experiências vividas: a eficácia do bem, ainda que germinal e, por vezes, adiada na história, a qualidade de vida e o seu progressivo revigoramento, a alegria sentida e saudada por quanto de positivo e de bom vai surgindo, a certeza fundada de que o evangelho e a cultura se reclamam mutuamente e de que o divino e o humano se enlaçam em beleza e harmonia.
A mensagem cristã resume de forma bela e feliz esta missão de envio apostólico, de acolhimento hospitaleiro, de partilha de convicções existenciais, de testemunho e aceitação ou recusa da proposta evangélica na auspiciosa saudação: “A paz esteja nesta casa e com quantos nela habitam”.
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