terça-feira, 17 de junho de 2008

Peditórios

Com muita frequência, sou abordado, em casa ou na rua, com pedidos de contribuição para instituições diversas, maioritariamente dedicadas, segundo me dizem, a apoiar toxicodependentes em recuperação, doentes com SIDA e crianças abandonadas. Há tempos, ao indagar a sede da instituição que pedia o meu apoio, recebi como resposta que se situava numa rua por sinal perto da minha. Fiquei espantado. E disse que achava estranho existir uma instituição com essa vocação tão perto de mim sem eu saber. Eu que julgava conhecer a minha terra e a sua vocação para apoiar quem sofre. Claro que se tratava de mais um grupo que anda por aí a governar a vidinha à custa da boa-fé dos outros. A partir daí, confesso que fiquei mais desconfiado. Hoje aconteceu mais um desses peditórios. Vêm de longe, aterram e pedem. E se porventura não contribuímos, não faltam, por vezes, os azedumes… E se pergunto, como perguntei, se o Estado não apoia a sua instituição, logo vem a resposta de que não, o que as abriga a recorrer às pessoas para poderem sobreviver. Eu gostava de saber se as autoridades não têm possibilidades de averiguar a honestidade e veracidade destas instituições. Penso que as forças policiais, delicadamente, podem muito bem fazer isso, sem molestar ninguém. Não serão essas pessoas obrigadas a apresentar credenciais para poderem fazer esses peditórios? FM

Congresso Missionário, Oportunidade a Valorizar

Carmelo de Aveiro

"Recomendo insistentemente a todos os párocos que valorizem os subsídios recebidos da Comissão Episcopal das Missões e do nosso Secretariado Diocesano de Animação Missionária. Peço que se aproveite o envio dos jovens voluntários que nos meses de Verão fazem experiências missionárias e se promovam encontros de reflexão e de oração, convívios e festas em que haja espaço para a partilha de bens e para o testemunho. Exorto vivamente as famílias, sobretudo as que sentem a urgência da causa missionária, a que tomem iniciativas que julguem adequadas e acompanhem com solicitude e gratidão os que se dedicam inteiramente à Missão."

Nota Pastoral do Bispo de Aveiro sobre o Congresso Missionário 2008

Uma Europa de Valores

Mais uma vez, a União Europeia foi despertada do seu adormecimento institucional pelos cidadãos. Neste caso, o «Não» da Irlanda tem um impacto que ultrapassa, em muito, o âmbito nacional, podendo colocar em risco o Tratado de Lisboa de que os governantes portugueses tanto se orgulham. Os cidadãos europeus parecem ser um problema para quem lidera a União e está, muitas vezes mergulhado em questões menores ou demasiado virado para si mesmo: quando os europeus não participam, há queixas do seu alheamento; quando participam, são pouco dóceis aos desígnios comunitários e têm o mau hábito de se lembrarem dos problemas com que convivem no seu dia-a-dia e castigarem quem comanda os seus destinos. “Bruxelas” está a deixar de ser o símbolo de paz e unidade europeias para passar a ser uma espécie de papão para as faixas da população mais desprotegidas. Se quiserem ser levados a sérios, os mentores desta nova Europa (reunificada, para os políticos; reconciliada, para a Igreja) têm de estar atentos às necessidades concretas das populações que são chamados a servir – esse fim nobre da política que cada vez mais parece mais esquecido... Enquanto a vida passa lá fora e a União discute sobre o que há-de fazer com os seus documentos, o preço do petróleo não pára de aumentar, as greves e as manifestações de descontentamento multiplicam-se, a crise alimentar adensa as nuvens negras no horizonte. O papão não será o culpado de tudo, mas tem de fazer mais para esclarecer e ajudar os habitantes deste Velho Continente, uma referência para todo o mundo. A Europa dos 27 precisa de redescobrir-se, nos valores que lhe deram origem e nas intuições que fundamentam esses valores, de forma a querer ser “seguida” pelos seus e pelo mundo. Negligenciar este património é comprometer o futuro deste projecto político. Neste contexto, é impossível neglicenciar a importância do diálogo com a sociedade civil e com as confissões religiosas. A presença da Igreja neste continente é um dado incontornável, visível na construção dos valores que moldaram a Europa e, pelo seu património cultural, praticamente nas ruas de cada cidade. O diálogo com o passado tem neste campo dos Bens Culturais da Igreja um desafio particular, simbólico. Vale a pena investir naquilo que distingue a nossa casa e nos ajuda a reconhecê-la.
Octávio Carmo

Espírito de Entreajuda

"Afinal, como tantas vezes me confidenciou o tio João, as rivalidades não eram as-sim tantas entre os diversos lugares da Gafanha da Nazaré. Aliás, tem-se mantido na índole dos gafanhões das diversa gerações um certo espírito cordato e de cooperação mútua, bem patente nas inúmeras associações que ao longo dos tempos nasceram e se desenvolveram nesta terra."
Ler mais em GALAFANHA

PONTES DE ENCONTRO


Deus: Criador do Homem e do Universo!

E se, de repente, qualquer um de nós tivesse um contacto com um ser extra-terrestre, o que aconteceria, para além da natural estupefacção e possível receio de tão inesperado encontro?
Não é fácil de responder a uma questão destas, sobretudo quando colocada no campo das hipóteses ou das probabilidades de poder, um dia, acontecer. No entanto, esta é uma questão que exige uma séria e profunda reflexão, tanto pela parte dos que acreditam em Deus, como por parte daqueles que não são crentes.
Para aqueles que acreditam no Deus Único, Trinitário, Criador de todas as coisas do Universo e de todos os seres vivos nele existentes, a sua fé ficaria inalterada, seria motivo para a pôr em dúvida ou mesmo deixar de acreditar?
Recordo, em especial, os muitos cristãos que rejeitam, em absoluto, qualquer forma de vida para além do planeta Terra e os que fazem interpretações literais de algumas passagens bíblicas.
No inicio do mês de Maio, do corrente ano, o Director do Observatório Astronómico do Vaticano, o padre jesuíta José Gabriel Funes, de 45 anos de idade, concedeu uma entrevista ao jornal oficial da Santa Sé, L´Osservatore Romano, cujo título é “O extra-terrestre é meu irmão”. Nessa entrevista, o sacerdote argentino indicou acreditar na possível existência de vida extraterrestre e que esta, a existir, não se opõe necessariamente à doutrina católica.
O Padre Funes disse que "a astronomia tem um valor profundamente humano. É uma ciência que abre o coração e a mente. Ajuda-nos a colocar, na justa perspectiva, a nossa vida, nossas esperanças e os nossos problemas. Neste sentido – e aqui falo como sacerdote e como jesuíta – é também um grande instrumento apostólico que pode aproximar-nos de Deus", explica na entrevista, realizada por Francesco M. Valiante.
Em relação à origem do Universo, o presbítero argentino precisou que, pessoalmente, considera que a teoria do "Big Bang" parece ser a mais plausível, e que não contradiz a Bíblia. "Não podemos pedir à Bíblia uma resposta científica. Ao mesmo tempo, não sabemos se, num futuro próximo, a teoria do “Big Bang” não será superada por uma mais completa e precisa sobre a explicação da origem do Universo".
Ao ser-lhe perguntado pela existência de vida extraterrestre, o Padre José Funes indicou que "é possível, mesmo se, até agora, não temos prova dela. Certamente, em tão grande Universo, esta hipótese não pode excluir-se", assinalando que "assim como existe uma multiplicidade de criaturas sobre a Terra, assim também pode haver outros seres, inclusive inteligentes, criados por Deus. Esta não é uma contradição com a nossa fé, porque não podemos estabelecer limites à liberdade criadora de Deus.”
"E o que se passaria se fossem pecadores?", questionou Valiante. "Jesus encarnou uma vez e para sempre. A encarnação é um evento único. Então, estou seguro que eles, de algum modo, teriam a opção de desfrutar da misericórdia de Deus, assim como aconteceu com os seres humanos", respondeu o sacerdote. "Como astrónomo, continuo a acreditar que Deus seja o Criador do Universo e que nós não somos um produto do acaso, mas filhos de um Pai bom" – acrescentou, durante a entrevista.
"Observando as estrelas, emerge claramente um processo evolutivo, e este é um dado científico, mas não vejo nisso uma contradição com a fé em Deus."
O Observatório do Vaticano tem a sua sede em Castel Gandolfo (perto de Roma), e o observatório no Estado do Arizona (EUA). Foi fundado em 1891, pelo Papa Leão XIII, já que “a Igreja e os seus pastores não se opõem à ciência autêntica e sólida, tanto humana como divina.”

Vítor Amorim

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Câmara Clara sem Sombras

Germana Tânger (foto de 1962)


Ontem à noite, na RTP2, assisti ao programa "Câmara Clara", de Paula Moura Pinheiro. A conversa, de mistura com recordações e informações culturais, teve, como ponto de partida e fonte, Germana Tânger, uma senhora na arte de dizer poesia. Dizer e não declamar, como sublinhou. Arte que ensinou a outros artistas, alguns dos quais ainda hoje a consultam. Com a serenidade dos seus 88 anos, falou, com palavras bem medidas e bem ditas, da sua convivência com grandes poetas e vultos da cultura lusa. Simplesmente belo o momento em que disse de cor o poema Aniversário de Fernando Pessoa (Álvaro de Campos), um poeta que lhe é muito caro.
Almada Negreiros, José Régio, João Villaret, Mário Sá-Carneiro, Mário Viegas, Vitorino Nemésio e Fernando Pessoa, entre outros, vieram até nós pela memória de Germana Tânger, com a ajuda ou desafio da responsável pelo programa. Foram momentos agradáveis.
Depois deste momento televisivo, dei comigo a pensar na mediocridade que reina nas nossas TVs. Há programas bons, é verdade, mas também muitos outros de lixo autêntico. Não há por aí um caixote perto?
FM
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Aniversário
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui - ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho... )
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a umidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos ...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas - doces, frutas, o resto na sombra debaixo do alçado,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos. . .

Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira! ...

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...


Álvaro de Campos

NA LINHA DA UTOPIA

As mazelas da Competitividade
1. Já são várias as ocasiões em que pais de crianças e adolescentes, verdadeiramente interessados com a melhor educação dos seus filhos, o maior tesouro, manifestam uma profunda preocupação com os efeitos maléficos da competitividade feroz. Já não é só no 12º ano de escolaridade, na fronteira delicada de grandes decisões e transições, que os adolescentes sofrem os abalos de um sistema de vida que coloca os resultados práticos acima de quaisquer valores, mesmo, muitas vezes, acima dos valores da ética pessoal e social. Logo a partir de uma «publicidade férrea» nos meios de comunicação, no dizer de Lipovetsky, os mais novos vão entrando numa lógica em que o outro se apresenta mais como “concorrente” e menos como um “irmão”; que o digam muitos dos entretenimentos reinantes, onde a força e o domínio do outro é o objectivo primordial. 2. A reafirmação contínua da competitividade nos grandes discursos sócio-políticos faz transferir para o quadro educativo das gentes mais novas a lei da superioridade. O delicado refrão de que os melhores é que triunfam na vida pode fazer regressar a lei de Darwin, fazendo emergir uma selecção natural dos mais fortes por vezes menos respeitadora e integradora das diversidades. Não são casos isolados, já entre alunos do básico e secundário, os registos de desumana “inveja” escolar, de egoísmo na não partilha de conhecimentos, de angústias profundas ou mesmo cansaços (e até quase-esgotamentos) diante de resultados não tão excelentes. Parece que tudo se encontra formatado mais na ordem do melhor sucesso para mais dinheiro ganhar no futuro, que propriamente na ordem da descoberta progressiva da vocação a uma área de conhecimento para servir a sociedade. 3. Pode ter efeitos bloqueadores da totalidade da experiência humana a focalização exclusiva na obtenção dos melhores resultados para mais e melhor poder competir. É verdade, sem dúvida, que o esforço, rigor e trabalho, terão de acompanhar o crescimento da vida. Mas quase que valerá a pena pedir-se que as crianças sejam crianças e que os adolescentes não sejam adultos competitivos antes do tempo. Uma vida equilibrada na razoabilidade é que proporcionará o cidadão humano do futuro, aquele que sabe que a vida é um todo social e não uma caminhada solitária em leituras de vida vividas na competitividade como valor absoluto. As mazelas deste modelo de sociedade estão aí, espelhadas nas ansiedades stressantes acalmadas com milhões de anti-depressivos. A vida é desafio diário; mas quanto mais desenvolvermos as capacidades de humanidade pessoal e social mais conseguiremos ser resposta estimulante.

Histórias do Mar e da Ria


Por iniciativa da Rádio Terra Nova, em cooperação com a Comissão das Comemorações do Bicentenário da Abertura da Barra de Aveiro, decorreu um concurso literário sobre “Histórias do Mar e da Ria”.
Para além dos prémios, que são sempre um estímulo à participação, é justo realçar a importância destes concursos, nem sempre acarinhados devidamente pelas nossas escolas e outras instituições educativas e culturais.
Quando tanto se fala da Língua Portuguesa, como riqueza nacional que urge preservar e valorizar, impressiona-me a indiferença que há face a iniciativas que a promovem, aceitando, passivamente, que ela seja bombardeada no dia-a-dia por novos termos oriundos de outras latitudes, sobretudo nas conversas entre jovens, nas mensagens via telemóvel e nas comunicações pela Internet.
Se o estudo do Português fosse mais apoiado e se os nossos jovens fossem sensibilizados para a participação em Concursos Literários, talvez houvesse mais gosto por falar e escrever com correcção a Língua Portuguesa.
Porém, não é com o alheamento de tantos professores, escolas e instituições que poderemos acreditar no futuro do Português. Mais do que ensinar as regras gramaticais, importa estimular a nossa juventude a escrever com sentido estético, sendo certo que a participação em concursos pode ser uma excelente forma de a levar a gostar da nossa Língua.

FM

PONTES DE ENCONTRO


BENTO XVI: ENTRE O ESTRANHAR E O ENTRANHAR

Durante a visita que o Papa Bento XVI efectuou aos EUA, entre15 a 21 de Abril, do corrente ano, recordei-me da célebre expressão de Fernando Pessoa (1888-1935) que “Primeiro estranha-se, depois entranha-se”.
Esta lembrança e a relação que dela fiz fizeram-me recuar ao dia 19 de Abril de 2005, altura em que o Cardeal Joseph Ratzinger foi eleito para a Cátedra de São Pedro.
Lembro-me muito bem das manifestações de júbilo que se viam no rosto das milhares de pessoas que aguardavam, na Praça de São Pedro, que o “fumo branco” saísse da chaminé da Capela Sistina e de muitas outras expressões de alegria que os Órgãos de Comunicação Social transmitiam, incessantemente, um pouco de todo o lado do mundo, logo após a eleição papal.
A esta realidade contrapunha-se, em simultâneo, uma outra, onde um estado de ânimo, menos exuberante, porventura mais céptico ou de desilusão, era bem visível.
De tudo isto me recordo e, até, de algumas afirmações (e dos seus autores) feitas, poucos minutos, depois do anúncio “Habemus Papam”.
Bento XVI sucedia a um Papa – João Paulo II – que tinha exercido um pontificado de cerca de 27 anos, tempo este que está para lá do próprio “entranhar” de Pessoa, para se situar no nível daquele que já se identifica connosco e nós com ele, numa unidade construída de ternura e afecto espiritual e que está para além da admiração e do respeito.
Para alguns, o Cardeal Joseph Ratzinger, trazia consigo referências pouco favoráveis, das quais se destaca o ser uma pessoa conservadora e o ideólogo da linha dura da Cúria Romana. Provavelmente, os seus 24 anos como Prefeito da Congregação Para a Doutrina da Fé muito podem ter contribuído para o surgimento destas opiniões.
Algum tempo, após a sua eleição, Bento XVI começou a despertar a compreensão e o acordo dos mais cépticos e os discursos e outros escritos seus, analisados à lupa, tanto por crentes, católicos ou não, como por ateus e agnósticos muito ajudaram a alterar a opinião inicial que havia sobre ele.
Durante a visita de Bento XVI, aos EUA, ouvi um padre americano afirmar que, enquanto Prefeito, não podia ser bom, pois o cargo não dava para isso, pelo que só depois de ser eleito Papa passou a ter condições para o poder ser, ou seja, a velha questão entre a liberdade da pessoa e a sua lealdade à instituição que serve.
Dizem alguns, que o homem é ele e as suas circunstâncias, pelo que as contradições destas duas dimensões podem ser incompatíveis. Assim, quem se vergue à força dos circunstancialismos de um momento, de um lugar ou de uma tarefa está a deixar de lado o seu próprio eu. Quem diz isto parece, contudo, esquecer-se que as circunstâncias também podem ajudar o homem na procura das certezas que não tem, na satisfação e na coerência que descobre e que o podem levar a mudar as próprias circunstâncias. Estamos, pois, perante uma questão para a qual não há uma só saída, mas que não nos pode inibir de tomar opções, em função do que somos e conhecemos, em vez de ficarmos à espera que algo surja, fale, pense e aja por nós.
O Padre Anselmo Borges escreveu, um dia, que “qualquer homem existe compreendendo e interpretando, mas de tal modo que nunca interpreta de modo adequado e pleno o que quer compreender”, pelo que o homem,só se vai completando através do futuro que atravessa e vive e, mesmo assim, não deixa de ser um homem inacabado.
A afirmação do padre americano, não sendo única, é um mau exemplo do que se pode fazer, mesmo sem intenção, para rotular, negativamente, uma pessoa e o seu carácter, sobretudo quando se pensa que a liberdade, a responsabilidade, o descobrir o nunca atingido ou a satisfação pela realização do bem variam em função da hora, do local e do cargo que se exerce. No fundo, é querer fazer do homem um irresponsável, prisioneiro do tempo e do espaço, quando ele está para além da sua e da nossa compreensão.

Vítor Amorim

domingo, 15 de junho de 2008

NA LINHA DA UTOPIA


Era uma vez… A carreira

1. Era uma vez, algures lá longe em outro mundo, um governante de um país. Mergulhado nas águas sedutoras do poder omnipotente, um dia afirmou que a ratificação de um tratado europeu, na Europa de 27 países, era um dos passos «mais importantes da minha carreira pessoal». No dia seguinte o referendo acabaria por ser chumbado. Era uma vez um treinador de futebol, de uma selecção de um país em que o futebol tinha proporções colectivas enérgicas e em que esse líder treinador, mesmo com os prós-e-contras, havia conseguido um popular lugar ao sol. Na hora de continuar ou deixar a equipa, o próprio confessa que «a federação não cobriu a parada», pelo que «o dinheiro foi a razão para partir» rumo à Inglaterra. No dia seguinte, os rigorosos ingleses exigem a língua inglesa!
2. “É uma vez”, e é bem verdade, que alguns acontecimentos deste género vão fazendo vir à tona da água a qualidade, ou sua ausência, das lideranças que vão comandando os barcos sociais. Não é novidade que a fasquia da generosidade das grandes lideranças vai baixando e que vestir a camisola do serviço desinteressado é realidade, hoje, quase tida como ideia irrealizável. Mas talvez o pior de tudo seja que quase todos os vedetismos contemporâneos afirmam-se com as suas exorbitâncias, em termos económicos ou éticos, absolutamente escandalosas. (Quanto “pior” melhor?!) O generoso amor à camisola parece ser uma espécie em vias de extinção, e as mais novas gerações vêm vindo para este mundo e aprendendo desta escala de valores que dá primazia ao que se tem em vez do que se é.
3. Valorizar-se e sublinhar-se a «carreira pessoal» acima das causas a defender é ver tudo ao contrário, quase que fazendo dos eleitores-cidadãos o joguete de afirmações mais interessadas no prestígio pessoal que no autêntico espírito de serviço ao bem comum. É essencial rebater cada vez mais esta tecla! Confessamos que já nos parecia estranho um programa televisivo com o título «corredor do poder», mas afinal tudo faz parte do mesmo carreirismo, este que é um elemento perturbador da vi(d)a de uma sociedade democrática mais saudável. Quanto aos milhões que giram em torno dos grandes carreiristas famosos do futebol, neste escândalo, valerá a pena perguntar, nem que seja como inquietude inconformista com a realidade do ser pessoa: para quem já se vangloria dos “trilhões” que tem, de que valem mais uns milhões de euros?!
4. Não será tudo um profundo engano de pura ilusão, e logo de quem todos os dias tem uma visibilidade mediática extraordinária. Sinal de desumanidade? Império dos milhões de euros mas do vazio de valores? Enquanto esta forma de lideranças tiver todos os palcos, os valores humanos da educação para a generosidade serão praticamente impossíveis. Ou não será?!...

D. Manuel II e Aveiro



"Quem, nos dias de hoje, entrar na Sala das Sessões da Câmara Municipal de Aveiro e lançar um olhar atento sobre o conjunto das cadeiras de alto espaldar que a ornamentam, tenderá a reter no seu cérebro uma certa impressão de assimetria. Para além das dez que, em posição frontal, se encontram alinhadas ao longo da vasta mesa, uma outra se encontra encostada à parede do seu lado direito, mas faltando no lado oposto a que formaria o seu par. Não é de crer que se tivessem adquirido apenas onze cadeiras para aquela Sala e não se tivesse adquirido a que completaria a dúzia. Quase ninguém sabe hoje que essa outra cadeira, que foi pertença da Câmara Municipal de Aveiro, se encontra actualmente no Paço Ducal de Vila Viçosa, desconhecendo-se, até há muito pouco tempo, a sua proveniência. Foi a cadeira ofertada a El-Rei D. Manuel II que, durante a sua visita a Aveiro, em Novembro de 1908, manifestou desejo de a possuir e que nela se sentou durante o memorável passeio fluvial que o levou da Barra ao desembarque no Canal Central da cidade. Encontra-se descrita na obra “Cadeiras Portuguesas” de Augusto Cardoso Pinto.

Também muito poucos terão hoje conhecimento dessa visita, e menos ainda saberão como ela decorreu, que cerimónias, festas e realizações populares tiveram lugar. Aproximando-se o seu centenário, e embora “a descrição dos esplendorosos festejos com que Aveiro solenizou a visita do Soberano [seja] tarefa bastante difícil e quase impossível” (Districto de Aveiro, n.º 3767, 30 de Novembro de 1908), parece apropriado relembrá-la para que, de facto, ela “nunca [seja] esquecida por este povo” (Acta da sessão extraordinária da Câmara Municipal de Aveiro de 28 de Novembro de 1908)."


In Preâmbulo do livro "D. Manuel II e Aveiro", de Armando Tavares da Silva

O veto da Irlanda

Com o veto da Irlanda ao Tratado de Lisboa, não faltam as análises ao sucedido e às consequentes implicações que essa atitude arrasta. Cá para mim, a UE vai continuar como até aqui… Com ou sem Tratado, vai ficar tal como tem estado. E não morre ninguém. Estou convencido de que, se houvesse referendos, mais países votariam contra, embora não acredite que isso fosse o resultado de grande reflexão. O veto de outros países seria o resultado lógico de quem é chamado a votar um Tratado, feito à margem do povo. O povo terá pensado: se o fizeram, agora entendam-se. Por princípio, os Governos assinam Tratados, muitos de altos interesses, sem consultarem o povo. Os Governos estão mandatados para gerir, por período certo, os destinos dos seus países. É assim numa democracia representativa. Ora a UE tem funcionado sem grande envolvimento das pessoas nos seus próprios destinos. Há eleições, de facto, para o parlamento europeu, mas nem aí os eleitores correm em massa. As abstenções são, como se sabe, elevadas. Então há que escolher um caminho que leve os europeus a assumirem, como seus, os seus destinos. Como? Elegendo, realmente, quem dirige a UE. Talvez assim nos habituássemos à ideia de sentir a Europa como espaço comunitário. FM

PONTES DE ENCONTRO



Vasco Santana: um actor à medida do seu peso!

Nem sempre os afazeres da vida nos permitem fazer tudo aquilo que desejamos, mesmo quando a nossa vontade procura contrariar algumas dessas situações, como foi o caso, mas sem êxito. Vem isto a propósito da evocação, atrasada, dos 50 anos do falecimento do actor Vasco Santana, ocorrida precisamente no dia 13 de Junho de 1958, ou seja, no dia de Santo António, em Lisboa, cidade que também o viu nascer, em 28 de Janeiro de 1898.
Falar de Vasco Santana é recordar o Vasquinho da Anatomia, do filme A Canção de Lisboa (1933), onde contracenava com Beatriz Costa, que faltava às aulas semana após semana, e que dizia que “Chapéus há muitos, seu palerma!”; é sentir ternura pelo Senhor Narciso, do filme Pátio das Cantigas (1942), que bebe para afogar as mágoas dos seus desgostos de amor pela D. Rosa, ficar encantado com a cena da bêbado que pede lume para acender o seu cigarro a um candeeiro da via pública e que anda sempre em conflito com o seu vizinho Evaristo (António Silva), a quem está sempre a provocar com: “Ó Evaristo, tens cá disto?”; é o estar atento à sabedoria e aos conselhos do grande ensaiador e profundo conhecedor de teatro no filme Pai Tirano (1941), onde participou, igualmente, Ribeirinho. Para além destas personagens, Vasco Santana desempenhou outros papéis, não tão proeminentes, mas não menos relevantes, em outros filmes, como, por exemplo, Camões (1946), História de Uma Cantadeira (1947) e Ribatejo (1949).
Para além do cinema, a sua carreira dividiu-se entre o teatro de revista e a comédia, géneros onde não foi só actor, mas também autor, tradutor e adaptador.
Muitos dos seus êxitos ficaram na história do teatro ligeiro em Portugal e na primeira metade dos anos quarenta foi figura de topo no panorama artístico português, onde só entrar em cena já era o suficiente para ele pôr o público a rir.
Na antiga Emissora Nacional também conseguiu alcançar êxitos assinaláveis, através dos diálogos do Zequinha e da Lelé.
Igualmente conhecido pela sua faceta de grande conquistador dos encantos femininos, este actor português soube aproveitar, profissionalmente, todas oportunidades que teve e, passados 50 anos do seu desaparecimento, continua, através dos filmes em que participou, a encantar e a agradar a todas as gerações de espectadores que o vêm.
Numa altura em que as razões para sorrir se tornam cada vez mais escassas para a grande maioria dos portugueses, há que preservar e divulgar este e outros actores nacionais, a fim de que não se perca o saudável hábito de rir, até porque ainda não se paga imposto para tal! Vasco Santana e outros grandes colegas seus fizeram-no de uma forma admirável, no seu tempo. Convém, no entanto, não esquecer que, em Portugal, continuamos a ter grandes profissionais que nos podem ajudar neste excelente exercício salutar que é o rir. É só uma questão de, quem de direito, lhes darem a oportunidade devida, como foi o caso que sucedeu com Vasco Santana, e acreditar no talento, na qualidade e na criatividade dos actores portugueses contemporâneos. Ficamos, todos, a ganhar. O “Vasquinho”, mesmo sem fazer o exame de anatomia, não discordaria, estou certo, deste meu desejo nem enjeitaria, para nos animar, de cantar, de novo, o Fado do Estudante!

Vítor Amorim

"MAR de SONHOS"

Integrado nos festejos comemorativos dos 200 anos da abertura da Barra de Aveiro, realizou-se, ontem à noite, na Praia da Barra, um espectáculo piromusical. É um cheirinho desse espectáculo, "MAR de SONHOS", que aqui ofereço aos meus amigos.

TECENDO A VIDA UMAS COISITAS - 82


OS COMPANHEIROS

Caríssima/o:

Comum e comovedor quando encontramos companheiros do tempo da Escola: aquilo são abraços, abanar de cabeças, recordações infindas e uma que outra lágrima furtiva.
Quem está aí que não tenha passado por essa prova?
São muitos dias, muitas horas de convívio...
Falar disto é uma pura perda de tempo por demais evidente e conhecido.
Mas estou a ver a cara de alguns a dizer que não é bem assim: antigamente, etc e tal; agora, não...
Está bem, há sessenta anos, antes de irmos para a Escola, brincávamos com os nossos vizinhos e vizinhas nos caminhos, nas margens da ria, enquanto nossos pais e mães iam trabalhar. As brincadeiras desenrolavam-se perto dos mais crescidos, que nos deitavam os olhos, ou junto das mães enquanto elas cavavam,...
Criavam-se os primeiros laços de amizade...
O leque de amigos se alargará nos bancos da Escola, mas aqueles/as do nosso canto tinham, sempre a primazia. Lutas e rixas entre moradores de cantos diferentes provavam isso mesmo... A seguir virão os “encontros” entre freguesias vizinhas... [Uma nota avulsa: no nosso tempo, que “batalhas” verbais e não só travávamos contra os “da terra da lâmpada”!...]
Era notório, quando nos juntávamos para a preparação dos exames, a realização dos desafios entre as diferentes escolas. Só quando éramos confrontados com a saída para os estudos é que se dava a evolução e a integração...
Não era por esta via que gostaria de ter desenvolvido o tema; o teclado do computador traiu-me...
Que me desculpem todos os meus bons Amigos, gostaria de recordar o Oliveiros, o Silvério Oliveiros, o Amílcar Madail, o João Gandarinho, o Necas, o Manuel Roque, o Amadeu Vilarinho e o Arlindo... que andaram comigo na quarta classe. Um ou outro já nos deixou a saudade. Alguns tentamos a resolução de difíceis problemas de saúde... O hino à Amizade continuará!

Manuel

sábado, 14 de junho de 2008

AO VER A MULTIDÃO ENCHE-SE DE COMPAIXÃO


1. Jesus inicia a missão que pretende realizar. Percorre cidades e aldeias na região de Cafarnaúm. Provoca encontros nas ruas, entra nas sinagogas, detém-se na praça pública. Observa atentamente as pessoas, a organização da sociedade e as condições de vida. O seu olhar penetrante chega ao mais íntimo do ser humano. Os seus ouvidos escutam o inaudito que o faz vibrar. O seu coração estremece de emoção cheia de amor. E, sem mais demoras, dá largas à acção que liberta e à palavra que rasga horizontes. E numa ousadia, sem precedentes, chama pelo nome os homens que quer, começando assim a lançar os fundamentos da Igreja. Considera tão importante o que lhes vai pedir que reconhece a sua identidade pessoal, transmite-lhes a mensagem que hão-de anunciar, define-lhes as prioridades no agir e apresenta-lhes uma espécie de regras de actuação.
2. Outrora eram as multidões; hoje é o povo, de que fazem parte os indivíduos. O cansaço e o abandono espelham o seu estado de ânimo, mostram o seu desalento perante as condições de vida, a sem esperança com que encaram o futuro, prolongamento cego de um presente amargado. E, hoje como ontem, o cortejo dos abatidos integra os empobrecidos de bens indispensáveis, os solitários de todas as companhias, os explorados da dignidade inalienável, os ignorantes de todos os direitos, os “atirados” para as margens da vida como material descartável, os sujeitos às mais diversas formas de trabalho precário, os “mal vistos” pelas instituições do poder e pelos fazedores da opinião publicada: os rebeldes sociais e políticos, as mulheres libertárias, as vítimas das atrocidades autoritárias, os pesquisadores de energias alternativas e de organizações mais participativas da sociedade, os “cobradores” de outras economias que sabem fazer do lucro um meio para gerar bem estar social para todos. Os cansados da vida constituem presa fácil do desespero, da violência e do fanatismo, sobretudo quando abandonados e vilipendiados.
3. Hoje e sempre é Jesus que, de muitos modos, vai à frente na manifestação de reacções positivas, vencendo a indiferença e a distância, no apreço pela consideração de cada um e de todos, nas propostas inclusivas de humanização, nas atitudes de solidariedade, nos gestos de amizade, nas parcerias de acção. Se vai à frente, outros vão com ele, são seus companheiros desejosos de se tornarem discípulos, apóstolos e testemunhas. Outrora foram uns que têm o seu nome nos Evangelhos. Hoje somos nós os convidados para tão nobre e entusiasmante missão. Somos nós o “coração” de Igreja solícita e compassiva, o rosto sensível da humanidade nova, os artífices confiantes de uma sociedade inclusiva das pessoas e do bem integral para todos.
Georgino Rocha

Recordações

"O ti Atóino vinha da borda, onde andara ao moliço para o aido. Antes da maré, po-rém, deitara-se a descansar, com o corpo moído, na proa da bateira que ia à rola (à deriva). Sem saber como, e com uma nassa, apanhou uns peixitos para a ceia (o jantar de hoje). Já não era mau. Naquele dia não comeriam caldo de feijão com toucinho, com um bocado de boroa. Sempre seria melhor. Então ouviu a Ti Maria:"
Leia em Galafanha

Um poema de Sophia



LIBERDADE

Aqui nesta praia onde
Não há nenhum vestígio de impureza,
Aqui onde há somente
Ondas tombando ininterruptamente,
Puro espaço e lúcida unidade,
Aqui o tempo apaixonadamente
Encontra a própria liberdade.

Sophia de Mello Breyner Andresen

O Felipão


Anda toda a gente triste com a saída de Luiz Felipe Scolari para o Chelsea, o clube de um multimilionário russo. O Felipão estava identificado com o povo português e o povo português gostava dele. Deu boas alegrias às gentes lusas, porque soube, como poucos, ser um líder autêntico, com rara capacidade para mobilizar multidões.
Muita portugueses até já pensavam que este brasileiro, que tem o bom gosto de apreciar a nossa comida e os nossos vinhos, ficava por cá. Esqueceram-se de que este mundo é dominado pela “grana” e que Scolari é um homem que também sabe cuidar do seu futuro. Por mim, ele pode ir. Mas, já agora, que nos traga a taça do Europeu de Futebol.
Mais uma palavrinha: vai ser muito difícil encontrar um seleccionador como este. Um homem que tem o coração perto da boca, frontal, que se comove e que se zanga; que sabe motivar os jogadores, que consegue criar um grupo de trabalho coeso. E que, dizem, até leva os jogadores a rezar o Pai Nosso antes dos jogos. O Felipão é mesmo um tipo fixe.

FM

FRAGILIDADES

As fragilidades da nossa economia têm-se feito sentir nos últimos tempos. E como a economia é a mola-real do nosso viver social, o pânico instalou-se entre nós. Portugal paralisou com o descontentamento dos camionistas, que obrigaram o Governo a avançar com regalias, em detrimento de outras classes sociais, também seriamente afectadas com a subida, em flecha, dos combustíveis. O Governo cede com esta classe social, alimentando o risco de ceder, a partir de agora, com os pescadores. Depois, um dia destes, com os agricultores e com todos os que tiverem capacidade de mobilização. E como as eleições não tardam aí… Há, contudo, uma classe que não pode pensar em reivindicar. Tem de se calar perante as sucessivas reduções no seu poder de compra. São os aposentados. O seu único poder está nas eleições. Aí, sim, pode mostrar o seu descontentamento. FM

APONTAMENTOS SOBRE RELAÇÕES IGREJA(S)-ESTADO (4)


1.Dou hoje continuidade ao texto aqui publicado na semana passada. Nele, tentei dar o essencial da minha exposição sobre a laicidade, num "jantar branco", portanto, com a presença de "profanos", em Lisboa, organizado por uma loja maçónica e no qual se debateu precisamente o tema O Futuro da Laicidade. Os intervenientes foram o grão-mestre do Grande Oriente Lusitano, António Reis, e eu próprio.
Foi gratificante para mim constatar uma convergência fundamental de pontos de vista.
2. O grão-mestre do GOL citou a frase célebre de Jesus: "Dai a Deus o que é de Deus e a César o que é de César." A separação da Igreja e do Estado, da religião e da política, portanto, um Estado laico, é essencial para a paz e como garantia da liberdade de todos, para se ter uma religião ou outra, mudar de religião, não ter religião. Neste contexto, disse que é necessário estar atento às perseguições religiosas em muitas países do mundo.
3. O Estado confessionalmente neutro e a separação da(s) Igreja(s) e do Estado não significam que a religião e as Igrejas tenham de ficar confinadas ao foro íntimo. Deve ser-lhes garantida expressão no espaço público, entendendo-se por isso liberdade de crítica e defesa das suas doutrinas e ensinamentos, tentando mesmo influenciar as leis. O que nenhuma Igreja pode é ceder à tentação de querer impor as suas leis, normas e mandamentos ao Estado.
Por isso, o grão-mestre, depois de reconhecer o esforço feito pela Igreja católica para abandonar a constantinização e a era constantiniana, que veio até Pio IX e a sua condenação da modernidade, criticou o fundamentalismo islamista e o criacionismo de certos sectores cristãos, concretamente nos Estados Unidos da América.
Evidentemente, também as Igrejas não podem pretender ficar imunes à crítica. Desde que não haja incitação à violência, no espaço público e livre, podem ser criticadas e até satirizadas.
4. Distinguindo entre laicismo fechado, intolerante, e laicismo aberto, tolerante, reconheceu que concretamente no primeiro período da Primeira República, o Estado não foi religiosamente neutro, ao impedir o culto público e limitar a liberdade de expressão da Igreja católica. Ao clericalismo seguiu-se o anticlericalismo e um laicismo intolerante. No fundo, "duas atitudes dogmáticas". Ora, a um dogma não se pode contrapor outro.
Opondo-se ao cesaropapismo, ao regalismo, ao ateísmo estatal e a uma religião civil, António Reis mostrou-se defensor de um laicismo aberto e tolerante, esperando que a Igreja se liberte dos resquícios de constantinismo e os republicanos laicos deixem o laicismo intolerante.
Neste quadro, embora também não seja partidário de uma Concordata com a Santa Sé, lembrou que tem andado mal o Estado, que a assinou e ainda a não regulamentou, concretamente no referente às capelanias militares e hospitalares.
5. A minha divergência fundamental com António Reis esteve em que quereria que substituísse a diferença entre laicismo aberto e tolerante e laicismo fechado e intolerante por laicidade e laicismo simplesmente.
Por mim, não gosto de "ismos", porque não gosto de totalizações. É assim que, felizmente, a nível religioso, mesmo que se diga cristianismo e catolicismo, não há "cristianistas" nem "catolicistas", mas cristãos e católicos. Também chamo a atenção dos estudantes para que distingam islão e islamismo, islâmicos e islamistas.
6. Penso que problema mais complexo e com enorme futuro, não directamente tratado, mas que esteve na base do famoso debate entre o então cardeal Ratzinger e o filósofo Jürgen Habermas, na Academia Católica da Baviera, em 2004, é o do papel público das religiões sobretudo nas sociedades liberais democráticas.
A(s) Igreja(s) não precisam de pequenos e reles privilégios, que deviam evitar. Mas, garantidos os direitos humanos e no quadro do respeito pela autonomia dos indivíduos e pelo pluralismo democrático, as religiões podem dar, como escreveu J. Habermas, contributos significativos mediante os seus recursos simbólicos e a sua capacidade superior de "articular a nossa sensibilidade moral".

sexta-feira, 13 de junho de 2008

PONTES DE ENCONTRO

Vítor Amorim

A decepção de uns e a mediocridade de outros

O Arcebispo de Trento (Itália), D. Luigi Bressam, considerou, num Encontro Inter-religioso Europeu, que decorreu em Itália, entre 22 e 25 de Maio, do presente ano, que os textos dos políticos europeus são “decepcionantes e que os Documentos oficiais europeus não contêm uma “missão” para a Europa e critica a visão “eurocêntrica” dos mesmos.
“São decepcionantes – como diz – porque não têm na mente uma missão para a Europa e só prevêem novas estruturas com uma visão eurocêntrica do mundo, sem estarem prontos para reverem as regras de intercâmbios internacionais e económicos, se estas não tiverem como resultados proveitos para o chamado primeiro mundo.”
Numa altura em que o mundo está a passar por profundas alterações, com dinâmicas sociais e económicas a surgirem a um ritmo vertiginoso e, tantas vezes, inesperado, onde os centros de decisão da economia parecem, cada vez mais, estarem a deslocarem-se para outros países, estas recentes palavras do Arcebispo D. Luigi Bressan são tudo menos portadoras de confiança no futuro.
Durante a sua intervenção, D. Luigi Bressan referiu “que todos nós somos co-responsáveis pela paz e afirmamos o princípio que todas as pessoas têm de ser livres para conseguir a felicidade, de acordo com a sua natureza, como criaturas dotadas de razão e livre arbítrio.”
Contudo, o Arcebispo Bressan, reconhece que na Europa há uma “falta de interesse pela solidariedade e a promoção dos direitos dos outros”, considerando que “o desafio está em construir uma sociedade dinâmica, onde os membros poderão compartilhar uma consciência da sua unidade, apesar das convicções filosóficas, políticas e religiosas.”
Dificilmente o mundo volta a ser o que era e se os líderes europeus fazem de conta que nada de novo e definitivo está a acontecer só se podem estar a enganar a eles próprios.
Quando D. Luigi Bressan diz que os textos políticos europeus são decepcionantes está, pelo menos, a meu ver, a transmitir duas mensagens: que faltam líderes de qualidade à frente dos destinos da Europa e que estes já parecem não saber fazer melhor, nem sequer para defenderem os legítimos interesses dos seus cidadãos, tendo em conta, também os anseios dos outros continentes e países.
Por vezes, dou comigo a pensar quais serão os reais critérios que estão na base da nomeação ou eleição de um determinado líder, político ou não, para as funções que, supostamente irá exercer com honra, carácter, verdade e, quando necessário, até sacrifício pessoal.
Falo assim, porque sei que dirigir seja o que for, muito mais um país, não é uma tarefa fácil, a não ser que esse país, supostamente, não tenha nenhum problema para resolver, pois, como se costuma dizer: “Qualquer um toma o leme quando o mar está calmo.”
Ouvimos dizer, com alguma frequência, que as pessoas mais capazes se afastam da política, não só porque ao exercerem as suas profissões no sector privado ganham muito mais do que em tarefas de governação, assim como dificilmente seriam eleitos, na medida em que não se encaixam, muitos deles, no perfil plastificado e artificial que se foi instituindo e que as empresas de imagem alimentam e o povo parece gostar. Ter uma boa presença, ser fotogénico, possuir uma bonita voz, irradiar dinamismo e nunca se atrapalhar, quando sabe que até está a faltar à verdade, fazem parte deste folclore.
Assim, se a lógica não for sempre uma batata, a conclusão mais óbvia a retirar é que as probabilidades de serem os mais incapazes a acederem às múltiplas áreas de poder é muito grande. É evidente que todos somos responsáveis por este estado de coisas, quanto mais não seja por omissão ou por não termos coragem de dizer que já basta. Nem que, para isso, seja necessário, por vezes, dar um murro na mesa.

Vítor Amorim

quinta-feira, 12 de junho de 2008

ÍLHAVO: VIII Grande Pedalada

Centro Cultural de Ílhavo
A Câmara Municipal de Ílhavo vai organizar no próximo dia 15 de Junho, domingo, mais uma edição da Grande Pedalada. Esta iniciativa surge no seguimento do balanço extremamente positivo das edições anteriores, que reuniram centenas de participantes, de todas as idades, oriundos de todo o Concelho e também de fora dele, que puderam, durante esses dias, apreciar a grande beleza natural desta região, ao mesmo tempo que praticavam uma actividade tão saudável e amiga do ambiente como é o ciclo-turismo.
A Grande Pedalada 2008 terá início pelas 10 horas (concentração na Praça do Centro Cultural de Ílhavo), partida às 10.30, passando depois por vários pontos do Concelho, terminando cerca das 17 horas na Piscina Municipal de Vale de Ílhavo, que nesse mesmo dia reabre ao público, possibilitando assim um refrescante mergulho após o esforço. O almoço-piquenique será realizado no Parque de Merendas da Gafanha da Encarnação.
Fonte: "Site" da CMI

PARA PENSAR: Patriarcado de Lisboa terá perdido em sete anos cem mil católicos

D. José Policarpo
Falta qualidade nalgumas homilias, nas leituras e nos cânticos. A crítica é do cardeal-patriarca de Lisboa e o alerta foi feito recentemente aos católicos numa Carta Pastoral que D. José Policarpo enviou às paróquias da sua diocese. Numa altura em que a própria Igreja reconhece uma diminuição de católicos praticantes, o cardeal-patriarca defende a renovação da liturgia.
Segundo contas feitas pelo Expresso, a partir de indicadores fornecidos pelo Patriarcado, Lisboa poderá ter perdido em sete anos cerca de cem mil pessoas. Mas se algumas igrejas não se enchem nas missas de domingo, outras, com a da paróquia do Campo Grande, rebentam pelas costuras. "Aqui, a eucaristia é sempre uma festa e a homilia está sempre ligada à vida real", conta o padre Feytor Pinto.
Para o sacerdote e teólogo Peter Stilwell, que também tem missas cheias na capela do centro comercial das Amoreiras, a quebra de fiéis em Lisboa tem origem, entre outras causas, "numa cidade hostil e desumanizada". Mas o teólogo defende que tem de ser feita "uma reflexão sobre a formação dada nos seminários". Para Anselmo Borges, também ele padre e teólogo, com "a invasão do materialismo, Deus tem cada vez menos lugar". "Há sinais de que o cristianismo se pode tornar minoritário na Europa", avisa.
Segundo Steffen Dix, especialista em Sociologia da Religião e investigador no Instituto de Ciências Sociais, a quebra da prática religiosa não representa uma quebra da religiosidade. O padre Peter Stilwell partilha daquela ideia e realça que as peregrinações a Fátima e a Santiago de Compostela ''têm vindo a crescer continuamente''.
Texto publicado no Expresso online

NA LINHA DA UTOPIA


António de Lisboa e do mundo

1. Talvez seja quando saímos do país que mais e melhor apreciamos as raízes que, quase sem darmos por isso, continuamente nos habitam. De há muitos séculos que o 13 de Junho tem um carácter eminentemente popular, na melhor acepção do termo. Na essencial liberdade, são muitas as povoações que o desejam, muitas as terras que trazem inscrito o seu nome como patrono, o nome do santo mais famoso de todo o mundo, Santo António. Desconhecer ou não reconhecer a sua obra extremamente inventiva na sua época é refugiar-se no presente solitário, ocultando o melhor dos valores e dos princípios universalistas que, como antecipação (dos tempos das descobertas), fazem de António o eminente cidadão do mundo. Um dos primeiros.
2. Nasceu em Lisboa a 15 de Agosto de 1195, de nome, no seu “bilhete de identidade”, Fernando Martim de Bulhões e Taveira Azevedo. Após a entrada, aos 15 anos, no convento de Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, aos 25 anos, a sedução pela palavra (de que ele conhecia grandes exímios enquanto estudava no Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra) viria a proporcionar a sua transferência para a Ordem dos Franciscanos, a par da mudança de seu nome para “António”. Destacou-se pela cultura e pelo poder da palavra, leccionou em várias universidades europeias, assumiu (também na conjuntura) o horizonte viajante da vida, que o viria a conduzir a Pádua, cidade italiana onde viria a falecer (no bairro de Arcella) a 13 de Junho de 1231. De sua breve vida ficara um rasto imenso da palavra como sentido de justiça, evangelização, serviço aos pobres e profético horizonte de universalismo.
3. É significativo em António de Lisboa (de Pádua, do Bonsucesso, de Canelas, …) o sentido itinerante do gosto da pertença que vence todos os muros do tempo e do espaço. Não será excesso dizer-se que, conhecendo bem a sua época, a história de vida de António pertence as páginas mais belas e corajosas da história humana. Temos de ter a necessária distância crítica para compreender que na sua época não seria comum, como nos séculos posteriores, o sentido de partir viajante e em que o barco desse tempo – que teria o brilho lendário de Marco Pólo e das suas viagens venezianas à corte mongol (China) –, esse barco não era um cruzeiro seguro dos nossos tempos. Tudo aconteceu de forma arriscada, ousada, na partilha corajosa dos tesouros da mensagem (cristã) como força dignificante da vida toda, do encontro com o outro e dos valores comunitários. Mesmo que, por vezes, o excesso tenha registo histórico…
4. Se hoje verificamos o enraizamento de um conjunto de tradições e romarias, estas terão de ser o espelho de uma adesão ao seu conteúdo que redescubra os impulsos estimulantes que nos faça sair (de nós, ao encontro dos outros) para nos reencontrarmos. Não é uma questão espacial. É tarefa existencial que enriquece de sentidos e valores a própria vida. Talvez hoje seja esta a viagem mais importante.

Centenário da República: Presidente da República dá hoje posse à Comissão Nacional para as Comemorações

O Presidente da República nomeou, sob proposta do Governo, a Comissão Nacional para as Comemorações do Centenário da República. A Comissão será presidida por Artur Eduardo Brochado dos Santos Silva e terá como vogais Francisco Sarsfield Pereira Cabral, João José de Sousa Bonifácio Serra, Maria Fernanda Fernandes Garcia Rollo e Maria Raquel Henriques da Silva. Aníbal Cavaco Silva dará posse à Comissão no Palácio de Belém, hoje, dia 12 de Junho, pelas 19 horas. Em 5 de Outubro de 2010, como é sabido com certeza por todos os portugueses, celebra-se o centenário da República. Penso que esta é uma excelente oportunidade para se fazer mais luz sobre esse período da nossa vida colectiva. Não têm faltado historiadores que se debruçaram sobre a revolução republicana e sobre a chamada primeira República, com as intermináveis guerras político-partidárias, que levaram ao "Estado Novo" de Salazar. A Igreja, como é sabido também, sofreu bastante, directa ou indirectamente apanhada pelo ricochete das contendas. Não vejo mal nenhum em se ficar a saber, com verdade, a causa dessas contendas, embora seja útil sublinhar que, no fundo, as metas da democracia, da liberdade, de mais justiça social e da alfabetização, entre outras, encontraram campo para se estabelecerem entre nós. Em alguns casos tardou o progresso, mas algum chegou.
FM

Raciocínios limitados, o país a empobrecer-se


Muitos políticos, felizmente que não todos, têm, por vezes, raciocínios sobre a vida social e política, que não saem das baias estabelecidas pelos seus partidos. Nota-se, assim, a falta de horizontes mais largos e profundos e alguma prisão interior que não os deixa ser livres, nem expressar-se livremente. A disciplina de voto passa muitas vezes a ser, também, disciplina de pensamento e de opinião. Quando se sonham ou esperam favores, não se ousa dissentir dos que mandam ou influenciam as decisões, ou ir mais longe nas opiniões pensadas e reflectidas. É perigoso sair do estabelecido, se não se tem estofo para aguentar consequências, que podem ser fatais para quem sonha. O terreno da política partidária está, frequentemente, armadilhado e com percalços inesperados.
Gostava, e é legítimo esperá-lo, de ver gente com lugar na Assembleia da República, em postos de governação ou em estruturas políticas e administrativas, ser livre no seu pensamento e não se sentir acorrentado por interesses pessoais ou outros de qualquer ordem. Ponderar as próprias opiniões deve ser uma coisa normal, à luz das exigências do bem comum, da convivência sadia e do serviço à comunidade, sob a inspiração de postulados democráticos, princípios fundamentais e valores universais, como a subsidiariedade, a solidariedade, o respeito pelos outros, a intimidade e a interioridade pessoal, a liberdade de consciência, princípios e valores sempre enriquecedores, quando bem entendidos e respeitados.
Há chavões que passam na política de pais a filhos, ou seja, de veteranos a novatos, sobre os quais já não se perde tempo a reflectir. Afirma-se, e pronto. Uma pobreza ainda generalizada. As ideologias perderam cor e vigor, nivelaram-se ou construíram muros inacessíveis de incomunicação e as pessoas vivem de interesses.
Raciocinar à superfície é raciocinar de modo pobre, interessado e não gratuito. O medo de ir mais longe, descobrir novos horizontes de vida, aceitar confrontos é, para muita gente, uma fuga à verdade e à realidade, e um aconchegar-se no ninho. Só a verdade liberta, só a verdade é fundamento da liberdade interior, só ela tem futuro.
Um dos aspectos mais comuns na pobreza do raciocínio e dos confrontos, normais e necessários para um enriquecimento mútuo, vê-se na confusão entre governo e Estado, fazendo-se do primeiro o senhor e dono das pessoas e dos seus bens, dono de tudo como Estado providência. As iniciativas privadas e as ideias dos outros nunca são boas porque diminuem ou beliscam o poder e a missão de um tal Estado. Basta reflectir um pouco, libertos da cegueira dos preconceitos, para logo se ver a pobreza em que se foi caindo.
Esta reflexão, sempre incómoda porque a realidade a isso leva e nunca é agradável tocar feridas ocultas, veio-me agora ao de cima, quando li num diário (DA, 26.5.08) artigo assinado por um deputado em exercício com este título: “Mais e melhor escola pública, sim. Privatização, não”. Se o signatário se despisse do preconceito partidário, o raciocínio seria mais aberto e objectivo e teria uma dimensão de serviço ao país, para além do pendor partidário. Quem é que não deseja uma melhor escola pública? O mal, a meu ver e como parece evidente, está em dizer “mais e melhor escola pública”, porque, então, cai-se no facciosismo de pensar que só o que é estatal é que é público. Será que o signatário está mesmo convencido? É o raciocínio, fascista e totalitário, do “único” e do “nós”, que nega valor à participação democrática plural, porque só vê inimigos nos que não pensam segundo o sistema. Assim não vamos longe. Os partidos políticos passam e, quando estão, têm de aceitar o jogo democrático aberto. De contrário, anulam tudo à sua volta que não seja concordância acrítica com o dito e o decidido. Pensamento pobre é pobreza de decisão. Já todos vimos que calar os dissidentes é empobrecer o país. A diferença é riqueza a acolher e a aproveitar, se o respeito pelos outros ainda tem lugar.


António Marcelino

O Catitinha

"Foi em casa do tio João que um dia, aí por 1945, conheci uma figura típica e algo misteriosa. Aparecia de tempos a tempos e fixava residência em casa de alguns gafanhões, que o recebiam como se fora um parente próximo. Cediam-lhe um quarto, comia à mesa com as famílias que o acolhiam, conversava e dava conselhos a todos. Das suas palavras, serenas e bem medidas, saíam conceitos cheios de filosofia, que eu não entendia, mas que os sentia nos rostos extasiados de gafanhões iletrados e pouco viajados. Era o Catitinha, que até os fotógrafos da região gostavam de registar para a posteridade."
Ler mais em GALAFANHA

Conselhos para o dia todo e para todos os dias


Trabalha como se não precisasses de dinheiro.

Ama como se nunca tivesses sido magoado.

Dança como se ninguém te estivesse a ver.

Canta como se ninguém ouvisse.

Vive como se fosse o Céu na Terra.



NOTA: Frequentemente recebo mensagens lindíssimas e cheias de sentido, mas ainda não descobri a forma de as publicar no meu blogue. De uma dessas mensagens, enviada pelo João Marçal, leito assíduo e amigo de há muito, retirei estes conselhos para o dia todo e para todos os dias.

Regata dos 200 anos da Abertura da Barra – Cruzeiros à Vela


Realiza-se no próximo fim de semana (14 e 15 de Junho) a “Regata 200 anos da Abertura da Barra – Cruzeiros à Vela”. Esta Regata é organizada pela APA – Administração do Porto de Aveiro SA e pelo CVCN – Clube de Vela Costa Nova, tendo por Patrocinador Oficial a PRIO – Advanced Fuels. A prova irá concretizar-se ao largo da Barra e contará com a participação de inúmeros Cruzeiros de várias localidades.

A Base de Regata está instalada no Porto de Abrigo do PPC – Porto de Pesca Costeira. Uma tenda com 250 m2 permitirá a recepção dos velejadores e convidados bem como o serviço de refeições e animação. Faz parte do programa a actuação de um excelente conjunto musical, que manterá os participantes bastante animados, dando à regata um carácter festivo. A animação será igualmente ponto alto quando às 22.30 horas se iniciar o Grande Espectáculo Piro Musical, oferta da Comissão das Comemorações do Bicentenário da Abertura da Barra a toda a população e visitantes.

O segundo dia de provas começa com a largada dos Veleiros para o mar, a partir das 10 horas. No regresso, cerca das 17 horas, será servido um lanche durante o qual haverá o imprescindível convívio entre os participantes. A entrega dos prémios realizar-se-á no final do jantar que se inicia às 19 horas.

De referir ainda que, a todos os participantes, serão oferecidas várias lembranças. As entidades organizadoras convidam toda a população a assistir a esta importante iniciativa desportiva.

PONTES DE ENCONTRO

Do 25 de Abril ao 10 de Junho

No dia 5 de Março, do corrente ano, fiz algumas humildes e breves considerações ao discurso que o Presidente da República proferiu na cerimónia da 34ª Sessão Comemorativa do 25 de Abril, na Assembleia da República. Na altura, o Presidente da República afirmou que “Num certo sentido, o 25 de Abril continua por realizar-se”. Tive ocasião de escrever, então, que “o 25 de Abril de 1974 será, sempre, passado sem sentido e um memorial de recordações e nostalgias, que jamais poderão fazer parte do futuro”, se a classe política não tiver capacidade de se organizar e de se mobilizar, definitivamente, a fim de que os cidadãos deste país cumpram, na parte que lhes cabe, os desafios iniciados, após Abril de 1974. De outro modo, Abril (ou outro mês qualquer, para quem o desejar), continuará, em muitos sentidos, por realizar-se, para sempre!

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Não será euforia a mais?

Confesso que não compreendo tanta euforia. Hoje à tardinha, depois da vitória de Portugal sobre a República Checa, em algumas ruas da Gafanha da Nazaré, decerto à semelhança do que acontecia por todo o país, a alegria era esfuziante. Como se Portugal acabasse de vencer o campeonato do Mundo de Futebol. De outra coisa qualquer, o silêncio seria igual ao de todos os dias, com o povo mais preocupado com a crise que provoca angústias. Mas com o Futebol, não é assim. Carros cheios de gente, bandeiras e bandeirinhas agitadas ao vento, também em casas particulares e nos estabelecimentos comerciais, buzinadelas ensurdecedoras, gritos e gritinhos de entusiasmo! Quase todos vestidos ou decorados com as cores nacionais, aos pulos, nas ruas e em carrinhas de caixa aberta. Todo o pessoal se saudava de braços bem abertos e de bandeiras desfraldadas! Até vi um carro de museu na festa! Cada um é quem é. Mas eu, que gosto que Portugal vença e seja campeão, não sinto necessidade de todo este espalhafato. Por esse andar, se a nossa selecção perder, se ficar num lugar fora do pódio, então a tristeza é mesmo de morrer. Nunca li qualquer explicação para esta reacção nacional. Será uma resposta espontânea às crises económicas por que temos passado? Será uma vontade explosiva para afugentar as preocupações? Será uma atitude natural de quem tem andado na mó de baixo e se vê agora, com o Futebol, só com o Futebol, a bater forte nos outros? Expliquem-me, por favor, porque eu não entendo isto! FM

Mensagem do Bispo de Aveiro: Dar valor e sentido à vida

"As aulas de EMRC inscrevem-se necessariamente neste ho-rizonte de serviço aos alunos e à Comunidade Educativa e prestam um inalienável contributo nesse sentido. Ajudar os jovens a crescer com valor, oferecendo-lhes um percurso com sentido cristão, é uma das missões primeiras das aulas de EMRC. Abre-se este horizonte em cada aula e em cada etapa do tempo escolar para um desafio de vida cristã marcada pela coerência, pela disponibilidade, pela verdade e pela alegria manifestadas no testemunho exemplar de cidadania e de fé, no serviço entusiasmante do Evangelho e na entrega generosa às causas do bem comum, da justiça e da paz.A matrícula nas aulas de EMRC é assim também um testemunho de fé, nascido no coração dos jovens e das famílias."

Clique aqui para ler toda a mensagem

NA LINHA DA UTOPIA

Bénard da Costa

Universalismo, Valor a rentabilizar


1. Com a actualidade em polvorosa com outras questões, o 10 de Junho parece já ter sido esquecido. Sobra a polémica de uma ou outra “frase” dita que também faz apagar, rapidamente, algumas questões de fundo salientadas na celebração deste dia das comunidades que vivem em português. Destacamos o discurso de João Bénard da Costa, aprofundando a raiz profunda do universalismo característico dos portugueses. De uma noção de língua, que em Heidegger (1889-1976) é a «casa do ser», os portugueses, efectivamente, assumiram e assumem, na generalidade, uma capacidade de relacionamento e interlocução que continua a registar páginas de história viva com os outros.
2. Nos tempos que vivemos, como foi sublinhado nos diversos discursos, as relações entre os povos não podem ser um factor lateral mas essencial. A história dos cinco milhões de emigrantes portugueses espalhados pelo mundo, mesmo que contenha grandes lutas e sofrimentos, também espelha esse facilitador do relacionamento humano. Vivemos já o tempo em que, pese embora tantas condicionantes de vária ordem, o sentido de universalismo é um dos eixos que faz a diferença. Daqui em diante, em tempos de globalização e mega-aceleração da vida diária, os factores de diferenciação talvez se venham a transferir das potencialidades técnicas para as capacidades de relação humana.
3. Se o presidente da República «desafia os portugueses a serem “exigentes e rigorosos” consigo próprios», estímulos positivos que ninguém de bom senso colocará de parte, todavia, esta mesma correspondência terá de ser assumida de modo total. Os portugueses habitam em famílias, instituições, escolas, mundo do trabalho. Esta procura do rigor «cá dentro» não é incompatível com um universalismo de rasgados horizontes. Casa mais arrumada é projecto que, não perdendo todo o potencial criativo, vai mais longe. O ser da cultura portuguesa, mesmo a partir da matriz da língua, em português, contém em si o gérmen da totalidade. Mesmo acima do mitológico exaltado por escritores e poetas, e ainda que racionalmente não se queira assumir o desígnio da portugalidade (até para não deixar que as emoções comandem as razões), o certo e o facto é que o universalismo está no bilhete de identidade dos portugueses.
4. É verdade que de todos os povos, pois que todos somos cidadãos de um mesmo mundo em relação. Mas se formos ao código genético cultural, este que não depende da riqueza mas está assente em valores, há povos que se relacionam melhor uns que outros e entre estes estão os portugueses. É um facto que também quer derivar em responsabilidade e, actualmente, em valores e oportunidades, até como nova relação que seja impulso de ligação das nossas comunidades emigrantes às suas terras de origem…Será possível?

A Igreja precisa de um plano nacional de leitura?


Os dados trazidos agora a lume pelo Patriarcado de Lisboa, sobre os hábitos de leitura bíblica dos católicos, não são uma tragédia, mas desassossegam bastante. A grande falta parece não ser de material, pois a maioria até possui um exemplar da Bíblia e/ou acede comunitariamente a ela. O problema é mesmo ler a Bíblia, esse «livro complicado» - como justamente o refere o Cardeal-Patriarca (Ecclesia 05/06/2008), mas ao mesmo tempo fundamental para a construção da existência eclesial e cristã. É precisamente por ser um «livro complicado» que a Igreja tem a responsabilidade de promover uma apaixonada iniciação à leitura, entregando a cada crente o gosto e as chaves para a sua interpretação, cuidando que o encontro com o Texto Sagrado aconteça. Encontrar a Palavra de Deus é encontrar a Cristo, dizia São Jerónimo. Sem ela, o cristianismo torna-se vago, insustentável, insuficiente.
Há um grande desafio que se coloca, portanto, às comunidades cristãs: estas são chamadas a assumir-se, talvez de modo mais consciente e certamente mais activo, como comunidades de leitura. Quando D.José Policarpo lembra que, por vezes, nas próprias celebrações «a palavra é mal lida» e «a homilia nem sempre ajuda» está a colocar o dedo numa das feridas: a necessidade de formação, e de uma formação com qualidade. Não basta reproduzir um certo automatismo de modelos. De forma humilde, persistente e criativa importa fomentar uma iniciação ao conhecimento religioso. É verdade que muito já se faz, mas as estatísticas recentes mostram bem como esta é uma meta longe de estar ganha. E enquanto ela não for inscrita no centro das preocupações…!
Recentemente, o Ministério da Educação lançou o «Plano nacional de leitura», com o objectivo de «elevar os níveis de literacia dos portugueses e colocar o país a par dos nossos parceiros europeus». No específico da sua realidade, não é caso para perguntar se a Igreja portuguesa não carecerá de uma mobilização nacional para a leitura da Bíblia? Em que medida o Sínodo dos Bispos do próximo Outono e o Ano Paulino que este Verão começa podem constituir a Primavera de que precisamos?

José Tolentino Mendonça

Serra da Boa Viagem




(Clicar nas fotos para ampliar)

Ontem andei a desfrutar os ares puros e o silêncio da Serra da Boa Viagem, na Figueira da Foz, com mar à visto. Que tarde maravilhosa, de tempo ameno, sobretudo no vale por onde me quedei, por entre árvores e ervas. E no meio delas brotavam flores silvestres de cheiros que me envolviam e me transportavam aos tempos em que, menino, era capaz de dormir uma soneca no meio da seara, com vento a passar-me por cima.
Ali, olhando os pinheiros, uns altos e velhos, e outros mais rasteiros e ramosos, com arbustos à mistura e aves que passam e repassam, dei comigo a olhar a paisagem virgem, por onde correm carros cheios de gente de olhos fechados ou indiferentes.
A Serra da Boa Viagem, um ex-libris da Figueira da Foz, de tantas e tão grandes tradições de um cosmopolitismo que já faz parte da história, ou não se tivesse, há muito, democratizado a sua praia, de areais amplos e finos, continua a ser uma extensa área a necessitar de mais divulgação, para um maior usufruto.
Pois ontem andei por lá. E de lá voltei com vontade de ficar na paz que ali senti. Até breve, Serra da Boa Viagem.

Papa destaca papel da Igreja na construção da Europa


Bento XVI dedica audiência geral à figura de São Columbano, e lembra mosteiros medievais como centros «de irradiação de cultura»

Bento XVI destacou esta Quarta-feira a importância do Cristianismo na construção da identidade europeia, ao falar da figura de São Columbano, monge irlandês do século VI. "Com a sua energia espiritual, com a sua fé, com o seu amor a Deus e ao próximo, tornou-se realmente um dos Pais da Europa: ele mostra-nos também hoje onde estão as raízes das quais pode renascer esta nossa Europa", assinalou.
Na audiência geral desta semana, o Papa lembrou este abade da Irlanda, nascido por volta do ano 543, frisando que “juntamente com os irlandeses do seu tempo, tinha consciência da unidade cultural da Europa nascente”.
“Homem de grande cultura e rico de dons da graça, seja como incansável construtor de mosteiros seja como intransigente pregador penitencial, gastou todas as suas energias para alimentar as raízes cristãs da Europa que estava a nascer”, afirmou.
São Columbano foi o “irlandês mais conhecido” da Baixa Idade Média e os mosteiros por ele fundados, explicou o Papa, eram verdadeiros centros de irradiação de cultura e evangelização, bem como lugares que atraíam muitas pessoas pela sua vida de trabalho, austeridade, penitência e oração.
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"PORÃO" vence concurso gastronómico

III Concurso Gastronómico de Ílhavo
Juntou 13 restaurantes do Concelho
e o "Porão" da Gafanha da Nazaré foi o vencedor

Pelo terceiro ano consecutivo, a Câmara de Ílhavo organizou o III Concurso de Sabores a Maresia, juntando 13 restaurantes que apresentaram pratos de peixe, com especial incidência na ementa de bacalhau, que estava a concurso.
O júri foi composto pelo Presidenta da Câmara, Ribau Esteves, e por três Confrades das Confrarias Gastronómicas do Bacalhau, da Carne Barrosã, da Chanfana de Poiares e das Papas de S. Miguel.
Tarefa árdua, mas decerto gostosa, para o júri, que teve de provar os pratos a concurso dos 13 restaurantes concorrentes. Os quatro primeiros prémios ficaram assim distribuídos: "Porão", Gafanha da Nazaré; "Marisqueira", Costa Nova; "Casa Velha" (Hotel de Ilhavo); e "Mestre Palão", Gafanha da Nazaré.

PONTES DE ENCONTRO




A “liberdade dos sistemas” e a liberdade do Homem

No passado dia 6 de Julho, o ex-comissário europeu António Vitorino escreveu no “Diário de Notícias”, um artigo sobre “a tripla crise” que afecta as várias regiões do globo. Focando-me, apenas, na crise financeira, o Dr. Vitorino escreve que “o sistema capitalista tem a inegável vantagem comparativa de ser o único até hoje que passou a prova dos factos, contemplando ao mesmo tempo liberdade e desenvolvimento económico…”, ao mesmo tempo que está “crente” que tudo isto se voltará a reequilibrar, através da “reconfiguração de variáveis essenciais do próprio sistema” capitalista, que, segundo ele, não está “isento de perversões e excessos.” Também no dia 2, do mesmo mês, o “Diário Económico”, publica uma entrevista com o Presidente do BCE, Jean-Claude Trichet, na qual este diz que a crise actual é “um fenómeno global: o assunto é global, o desafio é global e precisamos de uma resposta global.” Mais adiante, reconhece que “Há códigos de boas práticas, de conduta que poderão ser voluntariamente discutidos e adoptados e se “tais códigos voluntários são insuficientes (…) ou se o sector privado for incapaz de concordar com as regras necessárias para promover e garantir estabilidade, estaremos claramente perante um caso de regulação pública.”
Estas declarações, nos tempos que correm, não deixam, se é que as havia, margens para dúvidas: a subida do preço do petróleo e dos alimentos e toda a desregulação financeira que anda por aí a afectar, gravemente, a vida de milhões e milhões de pessoas por todo o mundo, que leva a que outras tantas não tenham acesso aos alimentos básicos para a sua sobrevivência tem uma fonte: o sistema capitalista ou, se alguns quiserem, as suas “perversões e excessos”, como diz António Vitorino, ou, como diz o Senhor Trichet, estes são os riscos inerentes em vivermos numa economia de mercado.
Como em tudo na vida, nestas coisas de teorias económicas, “cada cabeça cada sentença”, pelo que uns dirão que é necessário, ainda, uma maior liberalização dos mercados; outros já estão a ver em tudo isto o fim, inevitável, do sistema capitalista; para outros tantos, estas crises são fenómenos cíclicos e naturais, pelo que o tempo se encarregará de recolocar tudo outra vez no lugar, enquanto outros já pensam que há que encontrar sistemas económicos e políticos alternativos, aos seguidos até aqui.
Como cidadão e cristão, não deixo de me interrogar e de me preocupar, seriamente, com o caminho que o mundo está a levar. O Presidente Trichet, reconhecendo que as coisas não estão bem (ele não especifica para quem) transmite a ideia de que há que evitar, tanto quanto possível, qualquer atitude de regulação dos mercados, por via dos Estados, dando a primazia que esta seja feita pelos próprios mercados e que paciência é coisa que não lhe falta para ficar à espera que tal aconteça. Mesmo assim, a fazer-se tal regulação, os seus resultados e alcance serão sempre discutíveis. O mundo está assim tão refém destes conceitos tão pouco transparentes, complexos e injustos?
Ou será, então, este o preço apagar pela anunciada “liberdade”, de que fala António Vitorino? Mas que liberdade? Uma pessoa que morre de fome é livre? Uma família que não tem dinheiro suficiente para as suas despesas é livre? Uma pessoa que perdeu o seu emprego é livre? Em resumo: onde está, a liberdade de quem não tem possibilidade de escolha ou de decisão, mesmo que um certo sistema económico diga que a respeita? E a liberdade intrínseca à essência do ser humano, onde fica no meio de tudo isto? Só por si esta também não basta, se não estiver acima da “liberdade do(s) sistema(s)”, nem se deixar condicionar por esta “oferta”. A liberdade não se oferece! Ou se tem ou não se tem! Confundir pobreza ou riqueza com a liberdade pessoal é uma falácia. Quem assim o fizer, já transformou a liberdade numa mercadoria e a riqueza num meio para a comprar, como se tal, aliás, fosse possível. Este é um dos pecados do capitalismo, seja sobre que forma se apresente, procurando confundir, quanto muito, liberdade com sonho, supostamente ao alcance de ser concretizado por todos, com a promessa de uma vida cheia de êxitos e fortuna. Fora disto, só existem os fracassados ou os vencidos da vida, que nem direito têm ao reconhecimento da sua própria liberdade, baseada, sempre, na dignidade pessoal e no reconhecimento que é devido a cada ser humano.
Vítor Amorim

terça-feira, 10 de junho de 2008

NA LINHA DA UTOPIA


Escravos da Economia?


1. Os noticiários das últimas semanas, de sobremaneira, procuram ser autênticas aulas de economia. Especialistas das diversas áreas económicas convergentes procuram explicar, até ao limite, todos os pormenores do que está a acontecer na economia mundial. As múltiplas greves confirmam na rua o mal-estar consequente às loucuras petrolíferas e financeiras. Da Europa a notícia do alargamento das horas de trabalho semanal. Os próprios governos de chancela tipicamente social estão vergados de tal forma que a primeira palavra de todos os discursos é sempre «economia» e só depois, lá para o final, então vem a palavra «social». A competitividade, sem olhar a grandes meios para atingir todos os fins vitoriosos, é palavra-chave já desde criança, para quem até a “lavagem” noticiosa dos juros e dos combustíveis vem dizer que parece não haver mundo para além da economia.
2. Juntando a toda esta feira económica, estamos em pleno campeonato europeu de futebol, Euro 2008, onde, a par das festas colectivas, são exorbitantes os números económicos das transmissões televisivas, para já não falar das loucuras clubísticas que conseguem sempre uns largos milhões para “comprar” novos deuses, os jogadores de futebol. Talvez tudo pareça surreal demais para ser a verdade da nossa actualidade. Apelidamo-nos de mundo desenvolvido, e muitas vezes como contraposição ao mundo subdesenvolvido de que temos também grande quota de responsabilidade histórica (pois que os países europeus assim proporcionaram). A Europa e o mundo estão em plena transformação, numa corrida atroz para ver quem chega primeiro a tudo; nesta corrida (que demonstra tão pouco desenvolvimento humano), regressa o triunfo da lei do mais forte.
3. Das realidades mais importantes dos dias de hoje, e com a aprendizagem da história (económica), talvez seja o tornar bem patente dos mecanismos de interacção económica. Não ver só o agora, mas perscrutar o depois. O endeusamento económico será a fatalidade de uma selva mortífera para os mais frágeis; o regressado deus-economia agrava as fracturas e desigualdades já existentes mas, simultaneamente, fará crescer sempre essa revolução da multidão “contra” a meia dúzia de senhores do mundo. É um erro dizer sempre a palavra economia em primeiro lugar, pois esta opção demonstra a menor visão das funções humanas da própria economia. Sendo verdade que o realismo obriga a enfrentar com inovação e esperança as complexas questões económicas, todavia estas não são um fim em si mesmo, mas sim um serviço com sentido de humanidade. A ética do trabalho (para todos) e a dignidade humana, nunca perdem a validade; antes são factor primordial de desenvolvimento. Este não se esgota, está muitíssimo acima dos factos da economia.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Um poema de Armindo Rodrigues


LIBERDADE

Ser livre é querer ir e ter um rumo
e ir sem medo,
mesmo que sejam vãos os passos.
É pensar e logo
transformar o fumo
do pensamento em braços.
É não ter pão nem vinho,
só ver portas fechadas e pessoas hostis
e arrancar teimosamente do caminho
sonhos de sol
com fúrias de raiz.
É estar atado, amordaçado, em sangue, exausto
e, mesmo assim,
só de pensar gritar
gritar
e só de pensar ir
ir e chegar ao fim.

Armindo Rodrigues
(1904-1993)

A frescura do verde

(Clicar na foto para ampliar)
Finalmente chegou o calor que aquece o corpo e a alma. Tardou mas já deu para perceber que mais dia menos dia virá de vez. Para um Verão quente e acolhedor que todos esperamos. E quando isso acontecer, a sério, o verde será sempre reconfortante.

A arte de ser português


Guilherme d'Oliveira Martins, Presidente do Centro Nacional de Cultura, apresenta o livro PORTUGAL E OS PORTUGUESES de D. Manuel Clemente, Bispo do Porto

As interrogações têm pelo menos mil anos. Quem somos, como povo e como pessoas? Que relação temos com Portugal? E se essa relação é normalmente difícil, a verdade é que nos deparamos a cada passo com a comparação histórica, com distância geográfica dos centros, com o confronto entre as ilusões e as desilusões, com a ironia e o remorso.
Afinal, a questão que temos connosco próprios, de que falava o poeta, começou por ser garantia e definição e prosseguiu entre restaurações e perdas, em ciclos de euforia e de depressão, de sucesso e de decaimento. E no entanto a nossa matéria-prima continua a ser a mesma. E “olhamos Portugal como uma personalidade colectiva portadora de uma alma, no sentido romântico do termo, ainda que referido a algo muito anterior ao Romantismo”. E que é o Romantismo senão o tentar reviver tempos imemoriais? Povo eleito? Povo enjeitado? O Padre Vieira compreendeu bem esse conflito íntimo. E, como diz o nosso autor(*), a “relação que mantemos com esse gostoso e custoso colectivo vem na esteira de um outro povo, que se descobriu eleito e portador de uma missão universal”. Ourique e o seu milagre (1139) têm como berço teórico Santa Cruz de Coimbra – “A partir da profecia de que se fundaria um reino tão imortal como a sua origem e com idêntica projecção religiosa”. E ainda há a sucessão de acontecimentos que passa pela promessa dionisíaca, pela afirmação joanina, pela ambição dos Altos Infantes, pela visão do Príncipe Perfeito, pelo maravilhoso cristão de Camões, pela ilusão sebástica, pela Restauração profética do Padre António Vieira e, por fim, pelo ouro e pela dissolução da nação antiga. E passámos a viver (se não vivíamos já, como mostraram Gil Vicente e Sá de Miranda) “geralmente mal connosco próprios, por nos acharmos sempre aquém do que teríamos sido ou do que poderíamos ser…”. E há nisto (prossegue Manuel Clemente) “algum auto-ressentimento independentemente da nossa extracção religiosa ou não-religiosa. Todos nos embebemos de um Portugal que não achamos”.
Ler todo o texto em Ecclesia

A nossa gente: Mestre Rocha

Quando procurava um livro de interesse imediato, veio-me à mão um outro do meu amigo de saudosa memória, Joaquim Duarte, “Hidro-Aviões nos céus de Aveiro”. Foi uma boa ocasião para reler uma ou outra passagem e para ver fotos que fazem parte da Escola da Aviação Naval de S. Jacinto.
De página em página, cheguei a uma que recorda um gafanhão que deixou a sua marca na Gafanha da Nazaré, pela maneira como lutou pelos seus interesses, enquanto presidente da Junta de Freguesia e para além dela. Trata-se do Mestre Rocha, com quem conversei inúmeras vezes sobre o que seria melhor para a nossa terra. Recordo, bem, o que ele me dizia, quando vinha em defesa das suas ideias: “Eu fui testemunha ocular e auricular!” Perante isto, eu tinha mesmo de acreditar nas suas convicções.
Contudo, hoje não quero falar das conversas que tive com Mestre Rocha, mas, sim, do que dele disse Joaquim Duarte, no seu livro “Hidro-Aviões nos céus de Aveiro”.
Leia mais em GALAFANHA

Homenagens aos nossos maiores

Amanhã, 10 de Junho, Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, o Presidente da República, Cavaco Silva, vai homenagear os nossos maiores. Sobretudo aqueles que, de forma significativa, se distinguiram nas suas actividades profissionais, sociais, culturais, artísticas ou científicas. Normalmente todos estamos de acordo com as escolhas feitas. Contudo, temos de convir que há muitos outros portugueses, gente menos conhecida pela maneira humilde como vive e age em prol dos que mais sofrem, que ficam de fora. Há, por isso, sempre injustiças. Mas, no fundo, esses que se dão aos outros, desinteressadamente, no silêncio das suas comunidades e longe dos holofotes dos grandes media, também nem reparam nas honrarias que atribuem a outros e nem precisam que os tirem dos seus cantos para pisar as passadeiras vermelhas que conduzem à mesa da presidência. Que ao menos as suas comunidades se lembrem desses servidores que, no dia-a-dia, espalham o bem e a alegria.