domingo, 12 de novembro de 2006

UM ARTIGO DE ANSELMO BORGES, NO DN

RELIGIÃO E (IN)FELICIDADE
Sobre o inferno escreveu Tomás de Aquino: "Aos bem-aventurados não se deve tirar nada que pertença à perfeição da sua bem-aventurança. Ora, cada coisa conhece-se melhor pela comparação com o seu contrário. E, por isso, para que os santos tenham mais satisfação na bem-aventurança e dêem por ela abundantes graças a Deus, concede-se-lhes que contemplem com toda a nitidez as penas dos ímpios." Muito antes, Tertuliano, Padre da Igreja, tinha escrito: "Que espectáculo grandioso! Exultarei, contemplando como tantos e tão grandes reis, dos quais se dizia que foram recebidos no céu, gemem nas trevas profundas. A visão de tais espectáculos, a possibilidade de que te alegrarás com tais coisas - que pretor ou cônsul ou questor ou sacerdote poderá oferecê-la, por muita generosidade que tenha?" Não duvido de que subjacente a estes textos se encontra a ideia de que um dia será feita justiça. A injustiça é intolerável. Mas, sub-reptícia e inconscientemente, aninha-se neles muito sadismo. A crença no inferno foi uma das polícias mais eficazes de todos os tempos. No entanto, o inferno não faz parte do Credo cristão e só pode pregá-lo quem nunca meditou no mistério insondável da liberdade humana, mergulhada nos condicionamentos da temporalidade. Aliás, mesmo do ponto de vista conceptual, o que é que pode querer dizer uma condenação eterna? Às acusações de que deste modo se está a abrir caminho à irresponsabilidade e ao vale-tudo deve responder-se que o amor não banaliza, mas responsabiliza, devendo acrescentar-se que Deus só levará à plenitude as possibilidades concretizadas pelo ser humano no tempo. Não constitui nenhum exercício de masoquismo lembrar que, desgraçadamente, para um número indeterminável de homens e mulheres, a religião, cujo núcleo é a salvação e a felicidade plena, em vez de ser o espaço da alegria, da expansão e da vida, foi, de facto, o espaço da tristeza, da humilhação e da morte.
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GOTAS DO ARCO-ÍRIS - 39

QUAL A COR
DA CASTANHA?
Caríssimo/a: Há cada pergunta que nos fazem logo pela manhã; esta da cor da castanha leva-nos para profundas recordações... Ontem recebi carta de amigo de velha data a responder a um pedido que lhe fiz. Já lhe agradeci, mas fui pensando que este ano éramos muito menos junto dos nossos Santos. E, quase sem querer, caí na esparrela de recuar, recuar, recuar até à década de cinquenta do passado século; aí sim estávamos lá todos e os que não estavam não se dava por isso: a animação, a alegria, o barulho e a música afastavam o tempo e deixavam passar a nossa confiança no futuro. Planeavam-se as serenatas e, no lareiro, as brasas assavam umas castanhas compradas na taberna do canto. Sentados, a conversar e a tomar conta para não se estorricarem, estavam dois que, passo e volta, comiam uma ou outra que se mostrava mais apetecível. E foram conversando e comendo, agora uma, depois outra, e conversando... Quando deram por ela, tinham embarcado todas as dignas e restavam as queimadas, pretas, cheias de cinza, algumas mesmo podres e deformadas. Depois dos risos malandrecos, perplexidade e alguma desconfiança inquieta nos olhares que trocaram. Não havia fuga possível; foi o bom e bonito quando se deixou de ouvir o ensaio para a tal serenata e os comensais se aproximaram. Descoberta a falta de cor das castanhas, meus amigos, a lenha utilizada foi outra... Onde se demonstrou que nem sempre as castanhas o são. Manuel

FORÇA QUE CONVOCA

O ESPÍRITO VENCE O Espírito vence A espessura da noite E uma língua de fogo inumerável Purifica, renova, acende, alegra O mistério criado. Eis a força Que convoca a Igreja Nos templos e nas praças E suscita entre o povo testemunhas Com palavras ousadas de verdade Em frente dos juízes. Profunda chama, Que secreta iluminas O coração do homem: Com a boa notícia restabelece A vacilante fé, acende o amor Na esperança que é semente Da salvação do mundo.
Da “Liturgia das Horas”,
na “Hora Intermédia” de hoje

VIOLÊNCIA ESCOLAR

CRISE DE AUTORIDADE
FAMILIAR PROVOCA AUMENTO
DA VIOLÊNCIA ESCOLAR
O aumento da violência escolar deve-se, em parte, a uma crise de autoridade familiar, onde os pais renunciam a impor disciplina aos filhos, remetendo-a para os professores, defenderam especialistas em educação, reunidos na cidade espanhola de Valência para analisar o assunto “Família e Escola: um espaço de convivência”. Os participantes no encontro, dedicado a analisar a importância da família como agente educativo, consideram que é necessário evitar que todo o peso da autoridade sobre os menores recaia nas escolas, o que obriga a “um esforço conjunto da sociedade”. “As crianças não encontram em casa a figura de autoridade”, um elemento fundamental para o seu crescimento, disse na conferência inaugural do congresso o filósofo Fernando Savater. “As famílias não são o que eram antes, um núcleo muito amplo e hoje o único que muitas crianças contactam é a televisão, que está sempre em casa”, sublinhou. Para Savater os pais continuam a “não querer assumir qualquer autoridade”, preferindo que o pouco tempo que passam com os filhos “seja alegre” e sem conflitos e empurrando o papel de disciplinador quase exclusivamente para os professores. No entanto, e quando os professores tentam exercer esse papel disciplinador, “são os próprios pais e mães que não exerceram essa autoridade sobre os filhos que intentam exercê-la sobre os professores, confrontando-os”. “O abandono da sua responsabilidade retira aos pais a possibilidade de protestar e exigir depois. Quem não começa por tentar defender a harmonia no seu ambiente, não tem razão para depois se ir queixar”, sublinha. O filósofo acusa igualmente as famílias de pensarem que “ao pagar uma escola “deixa de ser necessário impor responsabilidade, alertando para a situação de muitos professores que estão “psicologicamente esgotados” pela situação e se convertem “em autênticas vítimas nas mãos dos alunos”. Os professores, afirma, não podem ser deixados sós, e a liberdade “exige uma componente de disciplina” que obriga a que os docentes não estejam desamparados e sem apoio, nomeadamente das famílias e da sociedade. “A boa educação é cara, mas a má educação é muito mais cara”, afirma, recomendando aos pais que transmitam aos seus filhos a importância da escola e a importância que é receber uma educação, “uma oportunidade e um privilégio”. “Em algum momento das suas vidas, as crianças vão encontrar disciplina”, disse Savater que, em conversa com jornalistas, explicou ser essencial perceber que as crianças hoje não são mais violentas ou mais indisciplinadas que antes, mas que hoje “têm menos respeito pela autoridade dos mais velhos”. “Deixaram de ver os adultos como fontes de experiência e de ensinamento para os passarem a ver como uma fonte de incómodo. Isso leva-os à rebeldia”, afirmou. Daí que mais do que reformas aos códigos legislativos ou às normas em vigor, é essencial envolver toda a sociedade, admitindo que “mais vale dar uma palmada, no momento certo” do que permitir as situações que depois se criam. Como alternativa à palmada, oferece outras, como suprimir privilégios, alargar os deveres ou trabalhos de casa.
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Fonte: IID

sábado, 11 de novembro de 2006

SÃO MARTINHO


São Martinho,
muito mais que
as castanhas


O calendário litúrgico aponta hoje, 11 de Novembro, para a celebração da festa litúrgica de São Martinho de Tours, Bispo e Confessor, figura muito querida da religiosidade popular e tradicionalmente associada ao “magusto”. S. Martinho de Tours nasceu na Hungria, em 315, e faleceu, sendo Bispo de Tours, França, em 397. Este Santo era filho de um oficial romano que servia na Panónia, actual Hungria, e foi ele próprio militar. Dois anos depois de se ter convertido à fé católica e baptizado na Gália, deixou o exército e passou a levar vida solitária, sob a orientação espiritual de Santo Hilário de Poitiers. Eleito mais tarde bispo de Tours, exerceu de modo admirável as suas funções de pastor, sendo considerado o iniciador da vida monástica na Gália e o grande evangelizador de França, país em que existem 3700 paróquias de que é padroeiro. A sua fama de evangelizador e de fundador de mosteiros torna-se motivo para que os Beneditinos, nos séculos XI e XII, o transformem em orago e protector dos mosteiros que iam fundando ou refundando na Península Ibérica. Na tradição popular, ficou célebre o episódio da partilha da sua capa de oficial de cavalaria romano com o mendigo que morria de frio, dando assim origem ao chamado “Verão de S. Martinho”.
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Fonte: Ecclesia

DEUS É EM NÓS...

A DANÇA DIVINA
DA POESIA
A aproximação de Teixeira de Pascoaes ao teólogo de Hipona, a Jerónimo ou a São Paulo só deve ter surpreendido quem não tivesse notado como Pascoaes transforma qualquer tema, e o comentário é de Fernando Pessoa, num «degrau para a religiosidade». Pascoaes apontara, com a sua obra poética, um tremeluzente norte à poesia portuguesa, que fora, no século anterior, substancialmente clássica e com ele entrou, «com passo decidido, na pura linha romântica do irracional» . E o irracional é a paisagem onde o sagrado reflorescerá como categoria necessária. O conhecimento mítico-poético e o conhecimento religioso que a Modernidade colocou sob suspeita, considerando-os sombras da razão, regressam como uma arte inexplorada. Entre sentimento e mistério, entre nítido e indeterminado alumiam-se afinidades («Deus é, em nós, como uma lembrança» , há-de escrever Pascoaes. «A atitude divina é anti-racional» ). Busca-se numa experiência originária aquilo que as estratégias do pensar deixam em silêncio e que vem guardado na linguagem densa dos símbolos. Ganha verdade a declaração de Jung: «O século das luzes nada apagou».
Mas não é exactamente de cristianismo que se trata. Já na recepção às biografias que Pascoaes escreveu, criticava-se o facto de ele «tratar os santos com um simples processo poético» . Num artigo dos anos 50, Manuel Antunes classificava tanto Pessoa e Régio como Pascoaes de poetas do sagrado, profundamente religiosos, mas avisando que «nenhum deles conhece o cristianismo (...) existencializado, sensibilizado. Apenas mostraram «através de tenteios, do caminhar nas sombras, do dualismo inquieto, do ansioso interrogar do mistério sentido ou pressentido (...), grande, secreta e inextinguível nostalgia de Deus» . De facto, ao pisar o invulgar território que tinha em S. João de Gatão seu centro magnético, estamos longe da elaboração teológica ou mesmo de uma retórica da experiência religiosa. A Pascoaes a santidade interessou enquanto fantasmagoria. Cada uma das biografias aborda, não a história propriamente dita, nem sequer os meandros labirínticos da legenda, mas a representação imaginária de uma prática da alma. Pois é isso que ele repete: «só me interessam as almas».
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SUBSÍDIOS PARA A HISTÓRIA DA GAFANHA


"CASA GAFANHOA", na rua S. Francisco Xavier,
perto da igreja matriz da Gafanha da Nazaré.
Há sinalização adequada


CASA GAFANHOA
foi inaugurada há seis anos

A CASA GAFANHOA, pólo museológico do Museu Marítimo de Ílhavo, completa hoje seis anos, pois foi inaugurada em 11 de Novembro de 2000. Trata-se de um edifício do princípio do século XX, que foi adquirido pela Câmara Municipal de Ílhavo e entregue à administração do Grupo Etnográfico da Gafanha da Nazaré, a entidade que mais lutou por este espaço, que reflecte a vida de um lavrador rico desta região. 
A casa antiga, depois de bem restaurada com todo o respeito pela traça original, mostra um recheio totalmente dominado por móveis e utensílios do princípio do século, num desafio constante à pesquisa e estudo de quanto os primeiros gafanhões nos legaram, mostrando um viver simples, mas prático, que não pode hoje deixar de nos encantar pela simplicidade que se desprende de tudo. 
Recorrendo à minha memória, posso lembrar que nas casas gafanhoas podia ver-se a cozinha com a sua trempe de ferro, panelas de três pés, aparadores, mesa e bancos toscos. Os talheres eram de ferro e alguns de cabo de osso. A um canto havia a cantareira com a respectiva cântara de ir à fonte buscar água, junto à mata da Gafanha, que dava gosto beber pela sua limpidez e frescura (que lhe era dada pela cântara de barro). 
Na cozinha de fora, mais modesta, com chão de junco, e na principal, de tudo um pouco ali se encontrava, desde roupa pendurada nos cabides até aos armários com louça e com comida que se não estragasse com o calor. O forno, onde se fabricava a sempre apetecida boroa de milho (e com que apetite era esperada a bola — boroa pequena e achatada — para comer com chouriço ou alguma carne de porco, mesmo gorda), era obrigatório em quase todas as casas gafanhoas. E também a salgadeira que guardava, no sal, o porco, governo de todo o ano. Também ali ficava, a um canto, a barrica com sardinha salgada, bem acamada. 
Na CASA GAFANHOA, podem apreciar-se os quartos pequenos, onde mal cabia uma cama e a respectiva mesa-de-cabeceira, com a mala do enxoval da casa, quantas vezes sem guarda-fatos e sem outros móveis, que o dinheiro e os hábitos não davam para mais. Sobre as camas das casas gafanhoas não faltavam as mantas de tiras, que as tecedeiras fabricavam com farrapos e restos de roupa velha, tiras essas cortadas nas noites de Inverno, ao serão, sobretudo pelas mulheres da casa. Mas ainda se hão-de admirar cobertores grosseiros de lã, lençóis de linho churro, e a um canto, o lavatório, normalmente só usado aquando da visita do médico a algum familiar doente. 
A Sala do Senhor, à frente, que se abria na Páscoa ou em dias de casamento ou baptizado, com um crucifixo sobre uma toalha alva, em cima da cómoda, onde se guardavam as roupas brancas e de festa. Havia cadeiras à volta, retratos nas paredes, principalmente dos casamentos, ampliados, que são actualmente grandes e importantes fontes de conhecimento da maneira de vestir e de ser das pessoas dos tempos antigos, sobretudo desde que a fotografia começou a marcar presença e a registar os principais acontecimentos das famílias. Aliás, em cima da cómoda, onde dois castiçais suportavam outras tantas velas para acender em dias de trovoada e, ainda, quando havia a visita das “almas” e quando se velavam os mortos, podiam ver-se algumas fotos de datas marcantes da família, a par das jarras de flores, renovadas semana após semana. 
No pátio interior não faltam as padiolas, os carros de mão e de vacas ou bois, com todos os seus apetrechos, as várias alfaias agrícolas, encabadas com paus toscos, a charrua e o arado, a um canto o galinheiro para as galinhas e galos, sobretudo, se refugiarem à noite, pois que de dia andavam, normalmente, a campo, comendo sementes, restos de comida e bicharada, quando não comiam outras coisas bem piores. E também não falta a retrete, pequena e de tampo de madeira, com o indispensável buraco a meio, que quarto de banho era coisa que não existia. E porque falamos de quarto de banho, o tal que só apareceu muito mais tarde, talvez na década de 50 para o grosso da população, que os mais ricos já o tinham havia algum tempo, se não nos falha a memória, perguntar-se-á onde tomavam banho os gafanhões. Ao que nos têm dito, tomavam-no na cozinha, geralmente ampla e que dava para o viver do dia-a-dia, numa grande bacia de lata, com água aquecida nas panelas de ferro de três pés. 
A água estava sempre quente, para o que fosse preciso, porque se cozinhava em panelas mais pequenas. Para o que fosse preciso, significa para lavar a loiça e para se lavarem, antes de se deitarem, especialmente os pés, que nem tudo podia ser lavado todos os dias, talvez por falta de hábito. Para o pátio interior ainda davam os currais dos porcos e das vacas ou bois, que sempre berravam acusando a falta da "lavagem", os primeiros, e da erva ou palha seca, de milho, os segundos. O celeiro também tinha uma porta para este pátio e às vezes para o exterior. 
Nos beirais dos telhado viam-se as abóboras a secar e à espera do Natal, para fazer os bilharacos. No pátio de fora não faltava a eira, onde se malhavam e secavam os cereais, cobertos de noite pelo tolde, feito de palha de centeio, a estrumeira (quando não era no pátio interior), para onde se deitava tudo o que pudesse transformar-se com o tempo em esterco, tão necessário à fertilização dos solos, a par do moliço e de mistura com ele. 
Viam-se as medas de palha e o “cabanéu” (prisma triangular, feito de uma armação de troncos de eucalipto e de ripas, e deitada sobre uma face), onde se arrumavam lateralmente e num dos topos, bem apertadas para não entrar a chuva, as palhas de milho, secas, para no Inverno servirem para alimento do gado. No interior guardavam-se alfaias agrícolas, menos usadas no dia-a-dia, e também ali dormiam, em especial os filhos da família, quando havia milho na eira, para o guardar dos ladrões que às vezes deixavam o lavrador sem nada do que granjeou durante todo o ano agrícola. Claro que não podemos esquecer, o poço, de onde se tirava a água para os usos domésticos, e um outro, o de rega, com o seu engenho puxado por vaca ou boi, que servia para regar o aido. 

Fernando Martins

ARTE EM AVEIRO

Pintura de José Maia - "OUTONO" -
publicada pelo jornal Correio do Vouga
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PRIMEIRA BIENAL
INTERNACIONAL
DE ARTE CONTEMPORÂNEA
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A Primeira Bienal Internacional de Arte Contnporânea vai ser inaugurada hoje, pelas 16 horas, em Aveiro, no auditório da Assembleia Municipal, edifício da antiga Capitania. Nessa altura, será divulgado o nome do vencedor do "Prémio Aveiro", no valor de dez mil euros, e dos três artistas que foram distinguidos com menções honrosas. As 77 obras seleccionadas e os trabalhos do artista convidado, Evariste Lichr, podem ser apreciados até 30 de Dezembro nas Galerias da Capitania, Paços do Concelho, Morgados da Pedricosa, Museu da Cidade e Teatro Aveirense. As 77 obras seleccionadas são de 49 artistas. Dessas, 40 são pinturas, 14 são fotografias, 12 são esculturas e 11 são desenhos. Esta Primeira Bienal Internacional é uma iniciativa da Câmara Municipal de Aveiro e do Círculo Experimental de Artistas Plásticos - AveiroArte. Paralelamente à Bienal, há um programa que inclui eventos culturais diversos, que serão anunciados em tempo oportuno.

UM LIVRO DE FLANNERY O’CONNOR


"UM BOM HOMEM
É DIFÍCIL DE ENCONTRAR”

Confesso que não conhecia a escritora Flannery O’Connor, como não conheço, obviamente, muitas outras. Aliás, é impossível conhecer tantos e tantos escritores bons, cujas obras enchem os escaparates das livrarias e… das grandes superfícies comerciais. Esta escritora americana, falecida em 1964 com apenas 39 anos, foi-me revelada pelo padre e poeta José Tolentino Mendonça, em ensaio publicado no caderno “Mil Folhas”, do “PÚBLICO”, com tais encómios, que não pude deixar de comprar este livro, que agora foi editado pela editora Cavalo de Ferro. 
A tradução foi da bióloga e escritora Clara Pinto Correia, que afirmou, a propósito desta preciosidade: “Li as histórias todas, uma por uma, noite dentro, sempre a sentir-me quase na margem do rio por onde se navega para outra dimensão qualquer. Era incrível. Era hipnótico. Era impossível de interromper antes de chegar ao fim e depois eu apagava a luz e ficava a dar voltas na cama (…). 
A minha Flannery morreu em 1964. Descubram-na agora e cada um que julgue por si mesmo.” Senti o mesmo quando li os contos que Flannery criou para quem gosta mesmo de ler. O pormenor das descrições de uma época, cheia de contrastes, e o fascínio dos desfechos dos contos, mais a tranquilidade com que a escritora me envolveu, deixaram-me, realmente, fascinado. 
Na contracapa há uma transcrição do “New York Times”, que é mais um desafio a quem aprecia boa literatura. Diz assim: “Ela não era só a melhor escritora deste tempo e lugar: ela conseguiu expressar algo secreto sobre a América, algo chamado Sul, com um dom transcendente de expressar o espírito real de uma cultura que é transmitido por escritores que se tornam naquilo que vêem. Ela era um génio.”
Esta pode ser uma óptima aposta para um fim-de-semana mais calmo e mais rico. 

Fernando Martins

UM LIVRO PARA O NATAL

Uma obra a lançar dia 23 de Novembro
"UM MENINO
CHAMADO NATAL"
Com texto de Joaquim Franco e fotos de Elísio Assunção e Ana Paula Ribeiro será lançado a 23 de Novembro, às 18.30 horas, na Livraria Bertrand do Centro Comercial Vasco da Gama, a obra “Um Menino chamado Natal”. Fazem a apresentação a pintora Emília Nadal e o jornalista António Marujo. Com 33 representações artísticas do Presépio e “palavras” que o fazem actual, este livro pretende ser um contributo para proclamar um Natal que, antes de ser a festa da família, da solidariedade, da boa-vontade, das juras mútuas de respeito e amizade, já era o que sempre foi: a celebração de um “nascimento”… “Um Menino chamado Natal” é um projecto de duas editoras – a Lucerna e a Sociedade Bíblica – com uma mensagem de motivação ecuménica, vocacionado para toda a sociedade.
Pelas referências que me chegam, este pode ser um livro para todas as idades e bem adequado para prendas de Natal, época propícia à demonstração das amizades e dos amores. Em vez de tantas futilidades que às vezes ofertamos, penso que esta obra pode ser uma óptima prenda de Natal.
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Fonte: Ecclesia

quinta-feira, 9 de novembro de 2006

UM ARTIGO DE D. ANTÓNIO MARCELINO

PRAGMATISMO
PERIGOSO E CONSEQUENTE
Diz-se hoje, a torto e a direito, que “temos de ser pragmáticos”.Os dicionários anotam que pragmatismo é “a doutrina filosófica que adopta como critério da verdade a utilidade prática, identificando o verdadeiro com o útil”. A dar fé à definição, é fácil ver como sob a capa do pragmático muita coisa se pode esconder, mesmo com pessoas bem intencionadas. Encontramos neste “ser pragmático” a chave de leitura de decisões, pessoais, familiares e públicas, carregadas de consequências e que reduzem, de modo leviano, a verdade aos interesses mais variados, a coberto da utilidade, dita prática. É verdade que muitas vezes se perde demasiado tempo a reflectir e a ponderar, prejudicando, assim, a necessidade de decisões de certa urgência, que não se podem adiar eternamente. Como também acontece que, por receio de se enfrentarem problemas e situações, estes se vão ampliando, dando origem a outros não menos graves. O que é claro e aparece como certo e sensato é que o pragmatismo não pode, a qualquer preço, cultivar a superficialidade e a insensibilidade e pôr no simplesmente útil o móbil de toda a acção. O que é útil para uns, nem sempre o é para outros da mesma comunidade e com iguais direitos. Um útil relativizado pode tornar-se antro e vespeiro. O homem pragmático pode ser corajoso, mas é por vezes pouco culto e, por isso mesmo, pouco reflexivo, cego e pouco sensato. Se acrescenta a tudo isto a teimosia e o orgulho de não reconhecer o erro da sua precipitação e teimosia, então é o desastre completo. Se não se vê logo, o tempo não consegue ocultá-lo por meses e anos. A formação técnica, quando menospreza a formação humanista e se manifesta mais atenta aos resultados que às pessoas, é campo aberto, fora do laboratório experimental, para o pragmatismo das decisões perigosas e inconsistentes, ainda que vistosas e aplaudidas. Parece que já chegamos aqui em muitos campos, públicos e privados. É preocupante ver a ligeireza de decisões irrealistas e pobres, bem como o cuidado de iluminar apenas o lado que interessa do problema que, pragmaticamente, se pretende resolver. Vem-se decidindo minimizar o ensino da história e da filosofia, do latim e do grego, e investir tudo para que a matemática e o inglês sejam o grande motor da cultura actual. Assim se sublinham os aspectos utilitários de um problema grave que é o da formação para a vida, como se as pessoas fossem apenas máquinas e produtores de riqueza. Formar gente que cultive a harmonia do saber, consciente de que, por esta harmonia, o saber é mais universal e sólido e constitui o clima que permite que as pessoas sejam mais pessoas, não pode ser um decisão meramente pragmática. Nem sempre o objectivo da utilidade é respeito pela verdade. A utilidade muda segundo os interesses de ocasião. A verdade persiste na procura do interesse real e global de pessoas e comunidades. Este pragmatismo à moderna da sociedade do vazio, nasce e alimenta-se de um relativismo perigoso porque vazio de ideias, culturalmente analfabeto, incapaz de construir no presente um futuro que valha. Exprime-se por gritos de poder, não dá voz aos intervenientes e interessados, deixa-se fascinar pelo resultado imediato. Fabricam-se e publicam-se resultados que quem está no terreno sabe que são falsos; promete-se o que se sabe, de antemão, que não se pode dar; fomentam-se grupos emotivos de apoio que abdicaram de pensar e para os quais, também, o útil passou a ser o verdadeiro; por imponderada atenção, às minorias dá-se o que se nega ou dificulta às maiorias. O espectáculo atinge famílias, Estado, grupos corporativos, ambiente em geral, porque o contágio não pára. Se fascina parte da plebe, revolta a outra parte. A unidade de um povo, há que afirmá-lo, nasce da verdade, não do pragmatismo que a não respeita. E só na verdade tem consistência a esperança da felicidade e do bem-estar.

PARA SABER MAIS

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SOS
CULTURA CATÓLICA
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Acontece em muitos sítios da Internet: basta um clique em F.A.Q. (Frequently Asked Questions) para ultrapassar dúvidas surgidas ao navegar... Com a Igreja Católica, passar-se-á o mesmo: navegando por páginas institucionais ou informativas, podem levantar-se questões relacionadas com expressões utilizadas, com normas da Igreja, com a sua organização interna e relacionamento externo. As respostas estão em www.ecclesia.pt/sos. E se não estiverem lá, é possível perguntar e, poucos dias depois, chega a resposta.
Como fazer?
O SOS Cultura Católica responde a questões, a dúvidas e propõe explicações para problemas específicos de uma comunidade cristã. Para isso, é necessário preencher o formulário proposto "Pergunte-nos". A questão é encaminhada para um perito do SOS Cultura Católica, cuja resposta é enviada pessoalmente a quem coloca a questão. O gestor do SOS Cultura Católica, em contacto com o perito, retira referências pessoais à questão colocada e publica no SOS Cultura Católica a pergunta e a resposta sem qualquer referência à pessoa que se dirigiu ao SOS Cultura Católica, tanto na pergunta como na resposta.
Perguntas com resposta
As respostas às perguntas que são colocadas aos peritos do SOS Cultura Católica estão publicadas por temas e por ordem alfabética. As últimas perguntas e respectivas respostas mostram-se com destaque especial. Entre as ferramentas oferecidas pelo SOS Cultura Católica, destaque para o motor de busca. Em "Procurar" é possível verificar se a resposta que se pretende já está ou não publicada on-line. Esse deverá, aliás, ser um procedimento a efectuar antes de dirigir qualquer questão ao SOS Cultura Católica. Neste sítio da Internet poderá encontrar respostas na área da História da Igreja, das normas da Igreja Católica (Direito Canónico), da Bíblia, da liturgia, dos sacramentos e questões administrativas das várias comunidades, nomeadamente as paroquiais.
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Fonte: ECCLESIA - Texto de Paulo Rocha

PARA REFLEXÃO

LIBERDADE,
PAZ E DESENVOLVIMENTO
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Celebra-se hoje o Dia Mundial da Liberdade. E amanhã, sexta-feira, o Dia Mundial da Ciência ao Serviço da Paz e do Desenvolvimento. Dois temas que merecem uma reflexão profunda, entre todos, pessoas e instituições, para se conseguir uma sociedade mais justa e mais harmoniosa, onde a fraternidade seja uma realidade. Se é verdade que passamos a vida a falar e a reclamar liberdade, quantas vezes sem coerência, também é correcto pensar que esse bem inestimável nunca será possível, enquanto houver injustiças que escravizam. A liberdade, que neste dia se comemora, tem de ser olhada como uma conquista diária de cada um e de todos. É um caminho longo e difícil, com subidas e descidas, mas sempre com as metas da verdade e da tolerância a desafiarem-nos e a incitarem-nos a prosseguir, na mira de alcançarmos uma sociedade com homens e mulheres capazes de se respeitarem e de se ajudarem. Uma sociedade onde a solidariedade seja norma de vida para todos. Amanhã, as nossas reflexões têm mais dois grandes desafios. São eles a paz e o desenvolvimento, alimentados pelas ciências que devem estar ao seu serviço. Nesta perspectiva, se as ciências forem direccionadas para o desenvolvimento e para a paz, e não para alimentar guerras e conflitos, entre pessoas e países, temos meio caminho andado para alcançarmos a justiça e a liberdade. Uma coisa, porém, é certa. Não vale a pena passarmos a vida a falar de Liberdade, de paz e de desenvolvimento, se não contribuirmos para tudo isso, com o nosso empenho de todos os dias. É que há muito o hábito de pensar que a paz, o desenvolvimento e a liberdade são tarefas para os outros.
Fernando Martins

STELLA MARIS

JANTAR COM ESPECTÁCULO
PROF. MARCOS DO VALE
MOSTRA A SUA ARTE
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O Stella Maris é um clube da Obra do Apostolado do Mar, com sede na Gafanha da Nazaré, junto ao Porto de Pesca longínqua. Foi criado pela Diocese de Aveiro com a vocação de congregar e apoiar homens do mar e suas famílias, o que sempre fez, tanto ao nível da solidariedade como espiritual.
Presentemente, está a passar por uma fase de remodelação, sob a direcção do diácono permanente Joaquim Simões, esperando-se que em breve possa alargar a sua acção a toda a zona banhada pela ria e pelo mar, no âmbito diocesano.
Nessa linha, avançou com uma iniciativa que, para além de ser congregadora de gente com ligações ao mundo marítimo, pretende juntar amigos, à volta da mesa, no dia 25 de Novembro, pelas 20 horas, num jantar de convívio e com animação a cargo do Prof. Marcos do Vale, um ilusionista e hipnotizador de renome.
As inscrições podem ser feitas até 22 de Novembro, pessoalmente, no Stella Maris, ou pelo telefone 234367012.

quarta-feira, 8 de novembro de 2006

Um artigo de António Rego

Não matarás
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Vendo do nosso lado, ninguém morre de amores pela figura de Sadam Hussein. Como chefe, político, militar, interlocutor e, nos últimos tempos, como estratega ou defensor das próprias causas. Antes de cair a sua estátua em Bagdad já parecia desmoronado o deus com pés de barro, mais frágil do que todas as suas arrogâncias faziam supor. Conhecemos o homem público, o detestado por muitos e por muitos amado. Mal sabemos quanto de verdade e teatro, política e circunstância havia nas suas palavras e imagens. Chegavam-nos apenas poeiras dum ditador que construiu o seu reinado para venda de imagem. Mas isso acontece com quase todos os chefes de quem se conhecem os adereços e se ignora a substância. Desde aquele dia em que lhe abriram a boca para observarem os dentes, com uma sequência de imagens humilhantes que foram vendidas ao planeta, nos fomos apercebendo que, por trás de todas as máscaras, havia um homem que também tinha medo e que queria salvar a vida. Tinha caído a estátua e a pessoa. Começou um processo de julgamento de que conhecemos algumas ramas aligeiradas que nos quiseram oferecer. Muitos, durante esta operação de acusação e defesa, foram abatidos. Vieram ao de cima alguns crimes cometidos pelo ditador que nem sabíamos em pormenor ou mesmo se eram os crimes mais graves dum longo regime de opressão. Pode agora acorrer-nos o sentimento vago de converter a repulsa em compaixão, como somos capazes de enganar a polícia para salvaguardar o criminoso. Tem acontecido com os faróis na estrada a avisar os eventuais transgressores, como na fácil compaixão pelo assaltante. Acontecerá agora com Hussein pelo simples facto de ter sido condenado. Mas foi condenado a pena de morte. E entramos num terreno ético, escandalosamente discutível, uma vez que se trata duma vida humana – para além de inocente ou criminosa – que é aniquilada por outro ser humano.
A condenação à morte duma pessoa e a sua execução não é nem mais leve nem mais grave que um aborto praticado sobre um ser humano vivo a que, por comodidade se chamará feto, gérmen ou embrião. Custa a crer que haja quem julgue inocente um caso e criminoso outro. Ninguém tem poder sobre a vida de ninguém. Nem a mãe é dona do seu ventre. Nem a humanidade dona dum ser que gerou.

terça-feira, 7 de novembro de 2006

DROGA NAS PRISÕES

ESTADO INCAPAZ
DE RESOLVER O PROBLEMA
Há muito que se fala da circulação e consumo de droga nos estabelecimentos prisionais da responsabilidade do Estado. Sabe-se que a droga é ali consumida pelos presos como se estivessem em qualquer bairro com negócio à vista de toda a gente.
Porque o consumo e a normal compra e venda de droga é coisa do dia-a-dia nas prisões portuguesas, o Estado resolveu avançar com a ideia de "oficializar" tais comportamentos, garantindo a toda a gente um apoio descarado, para evitar o perigo de alguém trocar as seringas, causadoras da propagação da SIDA e de outras doenças contagiosas. O mesmo Estado cria, então, salas de chuto, para todos ficarem mais sossegados. Na verdade, isto tudo é ridículo e próprio de gente inconsciente e irresponsável. O Estado, em vez de promover o tratamento dos doentes, preparando-os para a vida fora das cadeias, ajuda os toxicodependentes a manterem o vício e a "doença", com a cumplicidade de alguém que permite a entrada da droga e a livre circulação da mesma. Como é possível que a droga possa entrar nas cadeias, quando é certo que nada nem ninguém entra ou sai sem autorização dos responsáveis? E como é que, uma vez lá dentro, ela chega às mãos dos reclusos? Disso o Estado não cuida. Mas devia cuidar. Fernando Martins

Um artigo de Alexandre Cruz

O aborto do bom-senso?
1. É muito interessante e óptimo demais o discurso do partido político radical. Em questão muito delicada – como o referendo ao Aborto -, assunto que exige capacidade de diálogo e confronto de ideias que sirvam a sociedade portuguesa (“para onde queremos ir?”), que considerar de um partido político com assento no parlamento quando nas suas palavras marca a agenda da seguinte forma: “A campanha (do BE) acentuará a sensatez e a decência contra a intransigência, o fanatismo e as agendas ocultas do ‘não’. Para o coordenador do BE no ‘sim’ (ao aborto) está a humanidade e a convergência.” (Jornal Público, 6 de Nov., pág. 9) A juntar a esta admirável declaração podem-se referir, no mesmo contexto de lançamento da campanha que é agora o único problema nacional, as palavras, também tão interessantes, de pessoa dirigente do mesmo partido político (com salários pagos, com tanto sacrifício, por todos os portugueses para servirem o bem comum), que sublinha que todos os que defendem o “não” ao aborto são “fanáticos e terroristas”. Mais maior qualidade de pensamentos e ideais – cada um fala do que lhe vai na alma! - pode, ainda, verificar-se e confirmar-se quando do outro partido político (com salários pagos, com tanto sacrifício, por todos os portugueses para servirem o bem comum) vem a reclamação de que este assunto nacional é propriedade do seu partido (tal como o embrião é propriedade da barriga da mãe), e que por isso todos os outros devem estar calados; leia-se opinião de Odete Santos: “Diga a RTP o que disser, a verdade é que no debate que organizou sobre um tema de inegável importância marginalizou o partido que mais se tem batido, denodadamente, pela despenalização do aborto, o PCP.” Por isso este será o partido que tem autoridade para declarar que “O debate mostrou que o “não” (ao aborto) vai continuar a utilizar a mentira, o terror e a hipocrisia”. (Jornal Público, 5 de Nov., pág. 8) Fica-nos a questão: será o aborto uma questão política? 2. São, assim, muitas, elegantes e cheias de sentido de responsabilidade e educação, as atribuições delicadas e simpáticas da campanha lançada por deputados para a sociedade portuguesa; eis-nos diante da exaltação degradante completa do resto de bom senso que, desta forma, apresenta as novas regras do jogo onde as palavras de ordem são o chamar ao “outro”, àquele que “pensa diferente”, de “fanático” e “terrorista”. Quase que dá vontade de lhes dizer: “acordem, não nos acordem!” O pior caminho desses nomeados partidos simpáticos é “atacar” sem ética os que pensam diferente; gente tão intelectual que ainda não entendeu que a sociedade no seu geral vive a “indiferença” adormecida e alienante e que esse caminho partidário radical acaba por virar o feitiço contra o feiticeiro; todo o fanatismo que critica o outro de “fanático”, espelho do vazio integrista de facções deste tempo, acaba por ser – QUANDO SE PENSA O QUE SE QUER DA VIDA E DA SOCIEDADE – mais um voto no sentido contrário. Na outra face da moeda, não se pode crer que haja futuro num indiferentismo – estratégico ou de puro descompromisso social - e num não optar em assuntos que, porventura, podem dividir a sociedade. Claro que são tantas, é natural, as temáticas que dividem a sociedade; mas quanto “silêncios” de quem não se sente livre?! Quantas vozes com ideias importantes a serem ditas para bem da sociedade que preferem o cómodo “deixa andar”?! Talvez seja oportuno e muito interessante – senão mesmo o mais importante – ler neste contexto a URGÊNCIA de um debate aberto, clarificador, diferenciador das palavras (tão caras) que estão em jogo; talvez, neste caminho cultural, seja cada vez mais importante o papel do PENSAR A VIDA e de quem nos ajude, com autenticidade e procura da Verdade, nessa tarefa indo ao fundo das questões e não lendo apenas no “apagar do fogo”, na visão utilitarista dos números ou dos casos de saúde pública. Já agora, que fazem esses senhores do abortismo político dia-a-dia no acompanhamento das pessoas, das situações, dos sofrimentos? 3. A intolerância dos partidos políticos radicais fala por si. Deputados à Assembleia da República a chamar “fanático” e “terrorista” ao outro que pensa diferente é esse sinal degradante inqualificável. É este o modelo de sociedade que se pretende? Nesta questão joga-se muito mais que o ficar pela “rama”; há uma “raiz” cultural que está a secar pois as “causas” de tudo estão quase esquecidas e investe-se de olhos tapados só nas consequências. Claro que ninguém quer ver pessoas julgadas, nunca, de maneira nenhuma numa sociedade com valores; mas claro que ninguém, primeiro de tudo pois no princípio está a vida, num estado de direito de dignidade humana poderá ver pessoas – ainda que invisíveis – mortas. Como criar pontes nesta complexidade? Esta é a questão essencial a debater. Haverá disponibilidade interior para o debate? Mas para “embelezar” mais a pintura eis que já há semanas, mudada a casaca de primeiro-ministro para líder partidário, faz-se o apelo – que distrai o país de outras questões - da modernidade civilizacional do acto de abortar; testemunho este confirmado pelos números de Portugal que (no dizer do Ministro da Saúde) faz poucos abortos. Não há palavras! Dizemos, já agora, talvez também fosse bom Portugal acompanhar a Europa nas realidades boas!... Definitivamente, se nós estivéssemos “lá” nesse século, teríamos de “ser como os outros” e seríamos absolutamente incapazes de ser diferentes. Não teríamos partido para a Índia nem seríamos capazes de abolir a escravatura (feliz novidade portuguesa em 1775). Não estava na moda! A realidade primeira que nos preocupa, pois sem ela nada feito, são as condições para o “diálogo”. A intransigência intolerância em relação ao “outro”, quando existe, é sempre o sinal de surdez e menoridade; estas impedem um crescer em dignidade humana de dia para dia.

segunda-feira, 6 de novembro de 2006

UM LIVRO PARA A AMI

“CARTAS A DEUS”
COM RECADOS
PARA CADA UM DE NÓS
Com edição de “Publicações Pena Perfeita”, acaba de ver a luz do dia um livro interessante que se lê em poucas horas e que oferece, a cada um de nós, alguns recados oportunos. Com este desafio, figuras públicas, crentes e descrentes, homens e mulheres ligados a diferentes áreas da cultura, escreveram cartas a Deus, revertendo os direitos de autor para a AMI – Assistência Médica Internacional. Para além do mérito que representa a iniciativa, conta imenso, também, o contributo de cada um dos compradores e eventuais leitores para aquela organização que, nos campos de guerra e de catástrofes, apoia vítimas da violência dos homens e da natureza. Rui Zink, António Sala, Gilberto Madaíl, Marcelo Rebelo de Sousa, Clara Pinto Correia, Sofia Alves, J. Pinto da Costa, Mário Cláudio, Jacinto Lucas Pires, Pedro Sena-Lino, Fernando Nobre, Ângela Leite, Manuel Rui, António Rego, Joel Neto, Paulo Fragoso, Maria Filomena Mónica, Valter Hugo Mãe, Carlos Pinto Coelho, Carlos Vaz Marques, Maria João Cantinho, Pedro Mexia, Mafalda Arnauth, Maria João Seixas, João César das Neves, José Carlos Bomtempo, Fernando Pinto do Amaral, Mísia, Luís Norton de Matos, Maria de Belém Roseira, Urbano Tavares Rodrigues e José Augusto Mourão aceitaram o desafio, dando-nos contributos simples mas necessários para a reflexão que se impõe, rumo a um mundo muito melhor. As certezas dos crentes, as dúvidas dos agnósticos, as questões dos ateus e as inquietações de todos aqui estão, de maneira despretensiosa, para nos ajudarem no esforço de construir o sonho que acalentamos de ver a sociedade global mais fraterna, que não pode deixar de passar por cada um de nós. Fernando Martins

domingo, 5 de novembro de 2006

UM ARTIGO DE ANSELMO BORGES, NO DN

O enigma do tempo:
o instante vivido
Há quem olhe para o tempo como se ele fosse um corredor que vamos atravessando. Mas, se se pensar bem, realmente não é assim.
Experienciamos o tempo, porque nos lembramos de quando éramos pequenos e de como fomos crescendo e de como damos connosco adultos e mudamos e envelhecemos e sabemos que morreremos. Haveria tempo, se não houvesse morte e consciência da mortalidade?
No entanto, é profundamente enigmático que não possamos lembrar-nos de quando fomos concebidos nem sequer de quando e como nascemos - de facto, como constatam várias línguas, como o latim, o francês, o alemão, não nascemos, fomos, somos nascidos.
Quando olhamos para trás, não nos é possível captar o início, pois perdemo-nos no imemorial. Quando olhamos para diante, "sabemos" que um dia não estaremos cá, mas, de novo, desembocamos num tempo sem tempo, pois é para nós inconcebível não estarmos cá, porque não podemos conceber-nos mortos. Ninguém acredita na sua própria morte. É por isso que a morte é sempre a morte dos outros, nunca a nossa.
O que é o tempo?
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GOTAS DO ARCO-ÍRIS - 38

AZUL OU COR-DE-ROSA?
Caríssimo/a: Há certas notícias que nos deixam a olhar para elas como se fossem algo de muito estranho. Olha para esta: “Está a nascer, na China, uma cidade que recupera o ideal de poder matriarcal do clã das Amazonas. Nesta cidade mandam ELAS! “ Como se isto fosse uma grande novidade!? Vamos ver o que escreveu Bernardo Santareno, na década de 50, do século passado. É só espreitar «Nos Mares do Fim do Mundo», entre as páginas 229 e 235. Apenas duas imagens de relance: “Nas Gafanhas da Nazaré, da Encarnação, na d'Aquém, na do Carmo, na Vagueira,... em todas as Gafanhas de Ílhavo, as mulheres amanham a terra, durante o tempo (às vezes, dez meses por ano!) em que os homens pescam o bacalhau nos mares distantes da Terra Nova, da Gronelândia, da Costa do Labrador. Elas cavam, semeiam, ceifam e colhem: duramente, com sanha viril. E assim se bastam e aos filhos. Quando o marido vier da campanha, encontrará a casa cheia como um ovo; e branquinha, sem sombra de dívida: Então com a ajuda de Deus, ele poderá comprar mais um pedaço de terra. É assim com o Ribau, com o Chibante... com muitos outros. Com o Sarabando, também gafanhão e dos sete costados, não será bem assim: muitos filhos e todos pequenos ainda. Mas já alguém o viu triste, ao nosso Sarabando? Eu cá, nunca. Pobrete, mas alegrete.” E mais abaixo (falar do capitão... é falar de todos, pescadores incluídos): “O nosso capitão Viana recebeu hoje uma boa nova: o filho passou para o segundo ano do liceu. Está muito contente, é claro. A propósito confidenciou-me que, todo somado o tempo de terra, talvez ainda não tivesse vivido quatro meses com o filho: e o rapazinho, agora, já tem onze anos! Se ele no próprio dia em que se casou (às dez horas da manhã), logo teve que sair (às quatro da tarde) para o mar! Ai, a vida dum pescador... Assim, os pequenos foram crescendo, ele envelhecendo, e a companheira de sempre também: Separando-o da mulher, das crianças, o mar. Isto, uma vida inteira. Foi «ela» quem educou os filhos de ambos, quem lhes escolheu caminhos de vida, quem lhes serviu de exemplo impecável. Ela, sozinha: humildemente, em silêncio, como coisa natural e simples.» Será caso para perguntar: Azul ou cor-de-rosa? A minha resposta é: pela VIDA! Manuel