domingo, 7 de junho de 2009

Nos 65 anos do Dia D, Obama homenageia os homens normais que redefiniram o futuro da história

Obama
Salazar retirou-nos o orgulho de podermos cantar vitória
Obama continua a marcar a nossa história contemporânea com intervenções certas na hora certa. Ontem, em França, nas celebrações do Dia D, batalha em que se definiu o rumo de um futuro democrático, o Presidente norte-americano homenageou os homens normais que defenderam a liberdade da Europa, face ao terror Nazi. Foi um combate entre duas visões da humanidade. Venceu a visão que ainda hoje nos anima, embora carregada de sombras prenunciadoras de perigos, tudo por causa das injustiças sociais. Falou dos homens normais. Os eternos esquecidos nos registos da história. Os chefes, os que ficam nos anais e que são também fundamentais, ensombram ou ignoram os que dão o corpo à luta. Esses que, muitas vezes, semeiam os campos de batalha, marcando com o seu sangue as areias que testemunham o seu esforço. Honra, portanto, aos homens normais e quase sempre esquecidos. Já agora, só mais uma palavra. Nessa luta por uma liberdade digna para a Europa e para o mundo, os portugueses, pelas decisões dos seus chefes, ficaram de fora. Salazar não passou de um cobarde que negociou, ora com os aliados ora com os nazis, uma neutralidade indigna, retirando-nos o direito e o orgulho de podermos cantar vitória com esses homens normais, que reorientaram a história do nosso tempo. Não deixou que os portugueses lutassem pela dignidade dos homens livres. Fernando Martins

FEIRA DO LIVRO EM AVEIRO: Uma desolação

Pouca gente na Feira do Livro
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Velhas edições e monos
não são serviço útil à cultura
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Fui um dia destes à Feira do Livro, em Aveiro, no Rossio, onde era suposto encontrar muita gente. Meia dúzia de pessoas por ali andavam e, que se visse, pouco ou nada compraram. Tal como eu. Custa-me dizer isto, mas foi verdade. Nos barracas que, à partida, deviam ter as obras que procurava, nada. Questionei a empregada, que me atendeu solícita, sobre a ausência de certos livros, e a resposta foi pronta: Com as percentagens de lucro que as editoras nos dão, não temos hipóteses. A Feira "exige" uma baixa de preços e nós não podemos perder dinheiro.
Claro que as Feiras do Livro servem para atrair pessoas e criar leitores. Os descontos são um estímulo. Mas estar numa Feira destas a vender velhas edições e monos, daqueles que se vendem ao molho, não é um bom serviço para a promoção da leitura e da cultura. Se isto continuar nestes moldes, a Feira do Livro em Aveiro cai no descrédito, o que é pena.
FM

TECENDO A VIDA UMAS COISITAS – 134

BACALHAU EM DATAS - 24
A PRIMEIRA GRANDE GUERRA
Caríssimo/a:
1911 - «1911 fora um ano mau. Queixavam-se as empresas “de que os seus barcos trazem menos que no último ano alguns contos de réis da preciosa salga... Apanharam quase todos os restos de um tufão e tiveram na viagem um mar tormentoso. No regresso, o lugre SOPHIA perdeu um pescador, “o infeliz Cipriano José, natural de Ílhavo”. O capitão Manuel dos Santos Labrincha: “Ia o rapaz a sair das escadas da câmara quando um golpe de mar entrou por aí dentro e mo levou. [...] A câmara ficou com meio metro de água dentro. Os vidros desapareceram, rebentou-lhes com as portas, e lá vai o pobre rapaz sem o poderem salvar [...].” »[Oc45, 88] 1912 - «Em 1912, um ano fraco para a pesca do bacalhau, nasce uma nova sociedade, a “Boa União”, que inicia a construção dos seus armazéns.» [Oc45, 84] «Em 1912, ao sair para a Terra Nova, o LUCÍLIA, da praça de Ílhavo, “esteve em risco de naufragar. Já fora da barra, amainando o vento, o iate encostou numa restinga do sul, tendo de alijar parte da carga de sal para poder safar-se”. Nesse mesmo ano de 1912, no regresso da Terra Nova, perdeu-se o ATLÂNTICO: ”encostou à praia, ao entrar, e se partiu perdendo-se. A carga, anunciada para vender em leilão, foi arrematada pela firma Pinto Leite, do Porto, à razão de 6$000 réis o quintal”.» [Oc45, 88] «Tanto a Murraceira como o Cabedelo, Carneiro e outros locais da Figueira da Foz serviram para a construção de lugres bacalhoeiros já no primeiro quartel do século XX, quer pela mão dos Mónica, quer pela mão de outros mestres construtores navais como Sebastião Gonçalves Amaro ou Jeremias Novaes, destacando-se, entre outras, as seguintes unidades: GOLFINHO (1912), JÚLIA IV (1914), GUERRA SEGUNDO (futuro CORÇA e futuro GRANJA – 1919), SARAH (futuro GASPAR – 1919), CISNE (1920), MARIA DOMINGAS (futuro BRETANHA – 1923), SÃO PAULO I (futuro MARIA PRECIOSA – 1925).» [Oc45, 120 n. 14] 1913 - «Em 1913, eram já 38 os navios portugueses na Terra Nova. Aveiro contribui com 6 unidades. Nesse mesmo ano, a empresa Cunha & C.a constrói uma nova seca na Gafanha da Nazaré. No final desse mesmo ano, nasce uma nova empresa para a pesca do bacalhau, para o que adquiriu o lugre LUCÍLIA. Mas o crescimento da frota era lento e irregular.» [Oc45, 84] 1914 a 1918 - «Mas a pesca do bacalhau decaiu com a Primeira Grande Guerra. Depois do Armistício, o Estado disponibilizou algum auxilio aos armadores, assistindo-se a um incremento da pesca do bacalhau e da construção naval associada, que originou um novo relançamento da frota. Esta compunha-se de navios de madeira, de propulsão à vela, construídos maioritariamente nos estaleiros da Figueira da Foz, Aveiro e Viana do Castelo e armando em lugre, lugre-patacho, lugre-escuna, patacho escuna e iate.»[Creoula, 10] «O período da I Guerra Mundial foi marcado por dificuldades várias, a começar pela irregularidade do volume do pescado, que de resto se fez sentir durante as primeiras décadas do século XX.» [Oc45, 85] «Alberto Souto, membro da Comissão de Pescarias da Câmara dos Deputados: [...] “[E]nquanto nas Escolas Industriais dos centros piscatórios se não fizer um curso de aquicultura com as competentes demonstrações nos Viveiros Nacionais e nos Laboratórios de Zoologia Marítima, a indústria aquícola em Portugal continuará a ser o que hoje é – o atraso, a rotina e a devastação”. O papel do Estado não podia ser, em seu entender, “apenas o de um fisco avaro e de um polícia severo”.» [Oc45, 85]
Pelas palavras que lemos, ficamos com algumas certezas e muitas dúvidas. Certamente que estou com Alberto Souto lá isso estou... mas parece que estas “guerras” estão perdidas antes de tempo! Manuel

sábado, 6 de junho de 2009

Bispos europeus reflectem sobre crise actual

D. António Marcelino
Os bispos europeus do Conselho das Conferências Episcopais da Europa responsáveis pelas questões sociais estarão reunidos em Zagreb, Croácia, dia 9 de Junho, para reflectirem sobre a crise económico-financeira. Neste encontro que terá 34 participantes de 21 conferências episcopais reflectir-se-á sobre as experiências, iniciativas e respostas da Igreja na Europa sobre a temática da crise actual. Portugal estará representado por D. António Marcelino, bispo emérito de Aveiro.

Cuidado, medicina e hospital

Porque a sua essência reside no cuidado, o Homem, ser-no-mundo e temporal, precisa de ser cuidado e de cuidar. Cuidar de quê? Cuidar de si, dos outros, da Terra, da transcendência. Por afectos, palavras - ah!, a cura pela palavra! - e por obras
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Numa obra essencial da Filosofia no século XX, Ser e Tempo, o seu autor, M. Heidegger, retoma a famosa fábula sobre o Cuidado, de Higino, um escravo culto (64 a.C.-16 d.C.). Retomo-a, traduzindo literalmente.
"Uma vez, ao atravessar um rio, o 'Cuidado' viu terra argilosa. Pensativo, tomou um pedaço de barro e começou a moldá-lo. Enquanto contemplava o que tinha feito, apareceu Júpiter. O 'Cuidado' pediu-lhe que insuflasse espírito nele, o que Júpiter fez de bom grado. Mas, quando quis dar o seu nome à criatura que havia formado, Júpiter proibiu-lho, exigindo que lhe fosse dado o dele. Enquanto o 'Cuidado' e Júpiter discutiam, surgiu também a Terra (Tellus) e queria também ela conferir o seu nome à criatura, pois fora ela a dar-lhe um pedaço do seu corpo. Os contendentes tomaram Saturno por juiz. Este tomou a seguinte decisão, que pareceu justa: 'Tu, Júpiter, deste-lhe o espírito; por isso, receberás de volta o seu espírito por ocasião da sua morte. Tu, Terra, deste-lhe o corpo; por isso, receberás de volta o seu corpo. Mas, como foi o 'Cuidado' a ter a ideia de moldar a criatura, ficará ela na sua posse enquanto viver. E uma vez que entre vós há discussão sobre o nome, chamar-se-á 'homo' (Homem), já que foi feita a partir do húmus (Terra)'."
Heidegger, um dos maiores filósofos do século XX, mostrou que o cuidado é estrutura essencial do ser humano. O Homem, que tem a sua origem no cuidado, pertence-lhe ao longo da vida e não será abandonado por ele. O cuidado é duplo: preocupação ansiosa - a mãe diz ao filho: tem cuidado, filho! - e entrega abnegada, pois a perfeição do ser humano na realização das suas possibilidades mais próprias é uma tarefa do cuidado.
Viemos ao mundo e cuidaram de nós. Mas o cuidado não pode abandonar-nos nunca. Sem o cuidado, ao longo da vida toda, do nascimento até à morte, o ser humano desestrutura-se, sente-se perdido, não encontra sentido e acaba por morrer.
Não sei se o cuidado é mais próprio das mulheres. De qualquer modo, como escreve a filósofa M. L. R. Ferreira, "o tema do cuidado é o lugar por excelência em que se revela o pensamento maternal". E continua: "O cuidado é uma ternura vital, fruto do conhecimento e do afecto que temos pelos que estão a nosso cargo. Em todas as grandes religiões, em todos os mitos fundadores, em todas as culturas humanas a atitude de cuidado surge na sua dimensão compassiva de atenção ao outro. E as guardiãs do cuidado são as mais das vezes mulheres."
Cuidado, em latim, diz-se cura, que, para lá de cuidado, significa incumbência, tratamento, cura, inquietação amorosa, amor. Por esta via, chegamos também à medicina, que provém do latim mederi - a raiz é med: pensar, medir, julgar, tratar um doente -, que significa cuidar de, tratar, medicar, curar e que está também na base de moderação e meditação, sendo deste modo remetidos para um conceito holístico de saúde e de cura, que resultam e têm no horizonte sempre um equilíbrio harmónico.
Porque a sua essência reside no cuidado, o Homem, ser-no-mundo e temporal, precisa de ser cuidado e de cuidar. Cuidar de quê? Cuidar de si, dos outros, da Terra, da transcendência. Por afectos, palavras - ah!, a cura pela palavra! - e por obras.
Fragilizado ou doente, o Homem necessita de cuidados especiais. Aí aparece o médico ou o clínico (do grego klinein, inclinar-se), debruçando-se sobre ele/ela com o seu saber e técnica e também afecto e palavra, num pacto solidário. Em princípio, esse encontro dá-se no hospital ou na clínica.
Hospital vem do latim hospite, que significa hóspede, também em conexão com hotel. Como ser-no-mundo, o Homem é, logo na raiz, hóspede: somos hospedados no mundo. Significativamente, a palavra está ligada também a hoste, donde provém hostil. Não nos pedem, à chegada a um hotel, que em inglês também se diz hostel e em espanhol hostal, a identificação, pois não se sabe quem chega por bem ou por mal?
Espera-se que o hospital seja lugar de hospitalidade e não de hostilidade. Em francês, para hospital, também há o composto Hôtel-Dieu. Lá no termo, quem não espera ser hospedado pelo Deus da graça?
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quinta-feira, 4 de junho de 2009

As Rádios Locais também fazem serviço público

Vasco Lagarto alerta: 
as pessoas cada vez mais se interessam menos 
por aquilo que acontece à sua volta

Vasco Lagarto 

A Rádio Terra Nova (RTN-105FM), como a grande maioria dos órgãos de comunicação social, está, desde há muito, a encontrar sérias dificuldades para sobreviver. O fenómeno é conhecido, mas nem por isso as comunidades locais, nas quais ela se insere, se mobilizam para a apoiarem. Como nos dizia Vasco Lagarto, seu principal responsável desde a primeira hora, as pessoas e instituições só reconheceriam a importância da RTN se ela se calasse de vez. “Toda a gente se habituou à ideia de que a rádio está ali, que funciona 24 horas por dia, e só reclamam quando há um programa que vai para o ar com uns dez minutos de atraso ou quando, por qualquer razão, não há possibilidades de fazer a cobertura de provas desportivas ou de outros eventos”, salientou. O director da Terra Nova garante que a rádio só se mantém em actividade porque existem algumas pessoas que lhe dedicam o seu tempo, mas urge compreender que há “encargos e que é preciso chegar ao fim do mês com meios financeiros para os suportar”, referiu.
A RTN nasceu na década de 80 do século passado, num período de baixa de preços dos equipamentos de emissão. Um pouco por todo o mundo, e em Portugal também, surgiram rádios locais, muitas vezes direccionadas para simples bairros. Pretendia-se divulgar iniciativas de instituições dos mais variados ramos, que nunca tinham vez nem voz nas rádios nacionais. O boom das “rádios piratas” foi de tal ordem elevado, que as entidades oficiais não tiveram qualquer hipótese de impedir o seu funcionamento. Em 12 de Julho de 1986, a RTN, mesmo sem baptismo, foi para o ar, na sede da Cooperativa Cultual. 
Diz a sua história que eram 11.30 horas de um sábado. “Ligámos apenas um amplificador e passámos música gravada”, recorda Vasco Lagarto. Em 31 de Dezembro de 1988 “calou-se”, por imposição do processo de legalização entretanto iniciado. Mas em 26 de Março de 1989, num domingo de Páscoa, agora com alvará e com as exigências de legislação entretanto aprovada, reiniciou as suas emissões, assumindo um projecto voltado para as realidades culturais e sociais das comunidades envolventes, num raio de acção que hoje chega aos 50 quilómetros. Posteriormente, adoptou o nome Terra Nova, não só em homenagem a quantos viveram a saga da Faina Maior – pesca do bacalhau – nos mares do mesmo nome, mas ainda por reflectir o sonho de quantos apostam numa terra nova, no respeito pelo progresso sustentado e pelos direitos humanos.

Crónica de um Professor...

Johnny Holliday
Irreverência II
“Sleep is my only homework. And I wish I had more of it”
(O meu único trabalho de casa é dormir. E gostaria de ter mais trabalho desse...) Em letras brancas, garrafais, sobre fundo preto, ostentava com ar desafiador, aquela inscrição na sua t-shirt nova. Era aquele aluno, oriundo dali, da Costa Nova, com uns olhos verde-água, quase transparentes, penetrantes. A língua inglesa era para ele uma toada estranha, que em nada se assemelhava aos pregões que ouvia no mercado, onde a sua família vendia o pescado. Não vislumbrava qualquer utilidade nela, nem sequer na época balnear, em que a sua zona era visitada e frequentada por uma multidão de turistas estrangeiros. A ocupação nos tempos de férias, em restaurantes e bares, onde podia usar, dar utilidade à língua estrangeira, não era suficientemente atractiva para o demover da sua inércia. Deixava-a passar ao lado! P’ra quê falar Inglês, se os seus compinchas tão bem o entendiam e as suas aspirações na vida, não tinham acompanhado o seu crescimento, tinham ficado anãs? Aquela inscrição, subversiva, em Inglês, despertara-lhe o apetite! Era “in” exibir um dito jocoso, na língua mais falada do planeta! A teacher esteve atenta e aproveitou, pedagogicamente, aquela intencionalidade irreverente. Pelo menos, aquela frase entrara-lhe e sabia o seu significado! Atrás desse, outros viriam, também provocadores, mas... o que interessa é que lhes visse a utilidade. T-shirts com inscrições, em Inglês, mescladas com certa conotação humorística, sempre foram do agrado da teacher, que ainda hoje as usa no seu quotidiano. Desde cedo que exerceram fascínio na sua mente feminina e a aquisição dessas peças de vestuário tem sido uma prática recorrente. Evoca aquela fase dos seus verdes anos, na Faculdade, em que se pavoneava pelas ruas da Lusa Atenas com a efígie do cantor pop Johnny Holliday. A revista jovem da altura, Salut les coupains promovera a venda dessas t-shirts a troco de uma pequena quantia em francos. Fã que era do cantor, lá vai a jovem universitária encomendar e receber, pelos CTT, a almejada encomenda. Ah! Aquilo é que foi um delírio! Toda ufana e ostentando uma coisa original (ninguém fora tão excêntrico (!?) percorria o caminho para a universidade e ouvia, com a timidez duma teenager, o piropo avulso de algum transeunte com quem se cruzava! O rosto estampado no peito daquele cantor francês era o mote para uma comunicação unilateral... mas que dava algum gozo àquela aspirante a teacher! Afinal, aquela criatura ingénua, com ar de santinha, introvertida e sonhadora, tinha lá no fundo, aprisionada, a sua fracção de irreverência que haveria de explodir num futuro longínquo... quiçá na idade madura!
M.ª Donzília Almeida 05.06.09

Emigrantes solidários com a construção do Hospital de Cuidados Continuados da Misericórdia de Ílhavo

Mais de 800 emigrantes de vários locais dos EUA reuniram-se em Newark numa festa, tipicamente portuguesa, e cuja receita reverte, integralmente, para a construção do Hospital de Cuidados Continuados da Santa Casa da Misericórdia de Ílhavo. Presentes nesta festa o provedor da Santa Casa, professor Fernando Maria, o presidente da Câmara, Ribau Esteves, e dois vereadores da Câmara de Newark, que entregaram às entidades portuguesas a medalha daquela cidade Americana. A receita prevista será de mais de 20 mil dólares e vai ser entregue em Ílhavo pela comissão organizadora do encontro, composta por emigrantes de Ílhavo e das Gafanhas. O professor Fernando Maria visitou o Hospital Saint Barnabás acompanhado pela Direcção do hospital, tendo ficado satisfeito com a visita, pois a estrutura funcional deste estabelecimento americano é idêntica à de Ílhavo.

O obsceno e o sentimental invadem o nosso espaço público

Os ecologistas estão muito atentos ao gato morto que se abandona na rua ou ao lixo lançado fora dos contentores, mas passa-lhe ao lado a preocupação pelo ambiente humano deteriorado e cada dia mais inquinado pelo que se publica, se vê e ouve, até na rua, que, por enquanto, ainda é espaço de todos
Será que foi sempre mais ou menos assim ou estaremos perante um fenómeno novo a que a comunicação social se encarrega de dar permanente e vistosa publicidade? O inquinamento doentio da mente e do coração sempre pôde atingir a todos com gravidade. Em tempos foi-se muito longe, quando a manifestação pública deste inquinamento produziu vidas depravadas e chegou à exaltação, como se se tratasse de grandeza da raça ou de um melhor estatuto cívico. Ainda aí há sinais disso. Como quer que tenha sido antes, a verdade é que estamos hoje a viver ou a reviver uma época de pan-sexualismo, reduzido à manifestação de obscenidade que o ambiente farisaicamente favorece e dá dinheiro a quem o promove, acabando por manchar, socialmente, a maravilhosa dimensão da afectividade e da sexualidade humana. Como que a fazer eco do que se passou há poucos anos nos Estados Unidos da América, surge agora, como realidade ao longo de décadas, igual mazela na Irlanda. Acontecimentos que são, descontados embora os exageros de alguns relatos, a todos os títulos lamentáveis e condenáveis, mais ainda por estarem relacionados com instituições cristãs. Ninguém está imune do mal e de passos mal andados, devendo reconhecer-se, no entanto, que não é isso que se espera de pessoas e de obras sociais, que se propuseram ter a mensagem evangélica como instância educativa permanente. Quem folheia jornais e revistas de generalidades e pára na rua para observar os escaparates dos quiosques da imprensa ou passa pelos canais de televisão, de cá e de fora, se tem sentimentos de dignidade e preocupação por uma sociedade sadia e liberta, não pode deixar de ficar perplexo e preocupado ante o que lê e vê. A educação sexual, sempre e muito mais neste contexto, torna-se, de facto, necessária para os mais jovens, chamados a ser gente responsável, não por caminhos modernos tortuosos ou a agir sob sentimentos imediatos, mas pela transmissão lúcida de valores perenes que levem ao respeito por si e pelos outros. Muitos adultos necessitam, também, de um forte safanão que os acorde e os leve a quererem ser mulheres e homens, pessoal e socialmente dignos, e a trocar os atoleiros e o chafurdo por ambientes sadios, onde se viva de modo feliz e liberto. Do mesmo modo, haja quem atento tome conta do que se publica. Os ecologistas estão muito atentos ao gato morto que se abandona na rua ou ao lixo lançado fora dos contentores, mas passa-lhe ao lado a preocupação pelo ambiente humano deteriorado e cada dia mais inquinado pelo que se publica, se vê e ouve, até na rua, que, por enquanto, ainda é espaço de todos. Quando a vergonha e a responsabilidade pessoal não são censura válida, qualquer outra se torna odiosa. Quando o poder económico é rei e senhor, não faltam outros poderes a dobrar-se reverentes, ante os que mais têm e podem sempre ser úteis. Tem começado pela desagregação moral o declínio dos povos que se julgavam pioneiros de uma liberdade sem controlo. Por aí vamos, porque as crises económicas são antes morais e éticas. Comer, gozar e agradar não é modo de viajar rumo a bom porto. E a família? Muito se tem feito para a dignificar e capacitar para as suas tarefas. Mas muito se tem feito, também, para a destruir e anular na sua dignidade e nos seus direitos e deveres. A fonte que gera todas as crises humanas é sempre a mesma numa sociedade adormecida, manietada e desvirtuada nos seus objectivos normais. Se houver coragem para o reconhecer haverá também determinação para dar resposta. A intoxicação do obsceno e do sentimental debilitou os sentimentos mais nobres e os vínculos que unem as pessoas. O problema é cultural, com inevitáveis reflexos no humanismo reinante. As grandes vítimas estão aí à mostra: as crianças e os mais idosos. Ambos, pela sua natural dependência, se tornam manejáveis a interesses. Sem respeito e amor às crianças e gratidão aos idosos, para onde ruma e onde vai parar a sociedade?

António Marcelino

Só se pode Participar!

1. Cada acto eleitoral afirma-se como um forte desafio à cidadania. Sendo verdade que a motivação em participar, muitas vezes, é bem mais desperta em situações de não liberdade ou quando existem regimes ditatoriais…o certo é que a plena consciência de uma cidadania efectivamente activa conduzirá a saber dizer «presente» mesmo, porventura, em situações em que não dá jeito ou a urgência parece não ser tanta. Torna-se essencial o nunca perder da memória histórica para apreciar o direito de votar e o valor do voto como das conquistas sociais mais dignificantes; é importante o considerar que cada dia, cada pessoa e cidadão, é convidado a ser actor sócio-político de modo generalizado, o que implica a noção dos «deveres para com a comunidade» (Declaração Universal DH, artigo 29º).
2. Nunca a «desculpa de mau pagador» das más imagens ou menos boas práticas políticas poderá ser justamente argumento para a não participação. Poderão, porventura, existir muitas condicionantes, circunstâncias e até dúvidas sobre o «peso» de cada voto; poderão existir visões ou distracções promotoras de uma indiferença generalizada diante da distância dos centros de poder (europeus) para que se vota… Mas nada nem nenhum argumento, numa sociedade madura que se deseja, justificará qualquer sentimento e prática de abstenção. Sociedade não participativa será comunidade social adormecida. Esse adormecimento, depois consequentemente, deita por terra o terreno activo de credibilidade reclamadora e estimulante.
3. Sendo que por vezes até pode interessar a indiferença ou um não pensamento de visão crítica integral a determinados agentes políticos, a verdade é que nada poderá afectar a necessidade de alimentar a democracia diária de que também a possibilidade de votar é expressão inequívoca. Uma certa anemia social da sociedade civil portuguesa, que se denuncia volta e meia, é desafiada a ser superada nas eleições europeias(?). Alexandre Cruz