quinta-feira, 30 de abril de 2009

Crónica de um Professor

Dia 1 de Maio. Dia do Trabalhador
Faz-se uma interrupção no trabalho, um feriado, para comemorar o Dia do Trabalhador! É, no mínimo, paradoxal, esta lógica do ser humano! Sendo um valor que acompanha o homem em todas as sociedades, tem sido encarado das mais diversas formas. A ironia que subjaz à expressão “O trabalho dá saúde que trabalhem os doentes!”, atesta de forma jocosa a ambivalência do conceito. É um valor, sim, para muitos, mas também uma imposição para tantos outros, que, não o acatam com prazer! O aforismo popular “O trabalho não azeda” contraria o outro provérbio, “Não deixes para amanhã o que podes fazer hoje”. Afinal, sendo o povo detentor de uma sabedoria catalogada e milenar, também se contradiz nestas tiradas de sapiência! O valor do Trabalho que a teacher interiorizou, por herança genética, tem o peso e o valor que os seus progenitores lhe transmitiram. Sempre observou, empiricamente, como os pais, desde tenra idade, o iam transmitindo. Nesta perspectiva, discorda das políticas dos últimos governos, em relação a alguns apoios pecuniários, atribuídos aos desempregados do mercado laboral. Haveria múltiplas formas de ocupar as pessoas atingidas pelo flagelo do desemprego, dando-lhes tarefas, trabalho, num serviço cívico a prestar à comunidade. Para uma camada da população que não atribui ao trabalho, o valor, a dignidade que este confere, é mais fácil, cómodo e aliciante ficar à “boa vida”, sem fazer nada, sem despender qualquer esforço, e ter no fim do mês, a migalha, a esmola, o RSI (rendimento social de inserção) que o governo, displicentemente, lhes disponibiliza. Para os que dão o corpo ao manifesto, que fazem pela vida, que se esfalfam para ganhar o pão nosso de cada dia, que fazem calos nas mãos... ou nas cordas vocais, essa medida é vista com desaprovação, desconforto, desconfiança. Invoca-se aqui, a análise de António Aleixo:
Quem trabalha e mata a fome, Não come o pão de ninguém! Mas quem não trabalha e come Come sempre o pão de alguém! Há sempre alguém que por falta de cabeça, de capacidades, de dignidade, prefere estar às sopas dos outros, neste caso concreto, do governo, a “vergar a mola” e trabalhar! Faz calos! Dizem alguns, preferindo ficar na indigência. No seu percurso profissional, quando no final do ano lectivo se ocupava das matrículas, tarefa, já há muito desempenhada pelos DTs (directores de turma), deparava-se com esta cena tão caricata quanto insólita. Algumas mães, quando acompanhavam os filhos nas matrículas e eram interpeladas sobre a sua profissão, respondiam que não faziam nada, que não trabalhavam. Eram domésticas! A teacher remoía-se toda por dentro, contra esta assumpção de “inutilidade” de “indigência”, pois sabia que não correspondia à verdade. Durante muitos anos, senão décadas ou até séculos, o trabalho doméstico não estava catalogado no rol das profissões que os pais dos alunos indicavam, aquando do preenchimento dos boletins de matrícula. - Não limpa a casa? - Não passa a ferro? - Não cuida da educação dos seus filhos? - Não zela pelos interesses da família? Interrogava a teacher, levando as ditas mulheres “indigentes” a reflectir sobre a panóplia de afazeres que lhes preenchiam o dia. Claro que sim, Sra Doutora, faço tudo isso! Era a resposta imediata. E... ainda se atreve a dizer que não trabalha e que não tem profissão? Só porque não é remunerada? Não tem um patrão directo, com visibilidade para lhe exigir um horário rígido de entrar e largar o trabalho. Aposta a teacher que estas donas de casa que se esfalfam para que as suas tarefas sejam cumpridas, de tão compridas que são, têm isenção de horário de trabalho, como qualquer executivo de uma grande empresa! Estes, dadas as suas responsabilidades acrescidas, não têm horários rígidos, sim, todos sabemos, mas trabalham muito mais que os subalternos que lhes estão directamente dependentes. Ser dona de casa é uma missão e diria até, nos dias de hoje, uma profissão nobre! Nos dias de hoje, o trabalho doméstico assumiu outro estatuto e tanto é considerado já como alternativa profissional, desempenhado por uma série de mulheres com formação académica diferenciada, como é partilhado pelos casais jovens. Estes, quando têm a sua actividade profissional, fora de casa, assumem a divisão das tarefas domésticas como incumbência de ambos. Só assim haverá a igualdade, tão propalada por um sector do mundo feminino, e os homens contribuirão para a harmonia familiar que é aspiração de todos. E... doméstica, doméstica já é considerada uma profissão sem carácter sectarista, já que há elementos do sexo masculino a desempenhá-la também. E, à guisa de conclusão, apetece dizer: ou há moralidade... ou trabalham todos!
Maria Donzília Almeida 30.04.09

Dar Portugal a Portugal

D. Manuel Martins
Frei Nuno de Santa Maria foi finalmente canonizado. Este acontecimento não mereceu grande atenção a boa parte dos portugueses, sobretudo a nível dos responsáveis do país e de alguns dos meios de comunicação social. Não vem para aqui a questão dos milagres exigidos pela Congregação para a Causa dos Santos. Adianto só que, com todo o respeito pelas disposições da Igreja, julgo sinceramente que tais milagres não deviam funcionar como condição para a glorificação dos cristãos. Além de saberem a tentação de Deus, acontece que muitos deles não convencem. Já D. António Ferreira Gomes, nas célebres “Cartas ao Papa” põe clara e corajosamente esta questão. A Igreja, quero dizer mais propriamente, a Comunidade dos cristãos sabe bem quem é santo e merece, por isso, ser glorificado. Ao que vêm tantos exames aos escritos, ao que vem a audição de tantas testemunhas, ao que vem a perscrutação dos sentimentos do povo relativamente a este ou àquele cristão que viveu e morreu com fama de santidade? O nosso Frei Nuno há muito tempo que estava canonizado pelo povo. Quem olha atentamente para a nossa História do século XIV não terá dificuldade em reparar que Portugal estava a perder a alma, estava a fugir de Portugal. E foi o Condestável D. Nuno que deu Portugal a Portugal, que fez com que Portugal se reencontrasse e pudesse assim perspectivar futuro. Sem D. Nuno, Portugal seria uma apagada lembrança da memória. Se calhar, até seria bom que parássemos um pouco para nos perguntarmos se o Portugal dos nossos dias não andará a fugir novamente de Portugal, se Portugal não andará por caminhos que o levem a perder a sua alma e a sua identidade. Bastaria para tanto pensar em leis que atentam contra a família, contra a vida, contra tantas situações que têm a ver com o humanismo que deveria acompanhar situações de saúde, de trabalho, de educação de justiça, de respeito por valores e tantas coisas mais. Portugal está a afastar-se da sua matriz. Melhor, por razões de falso e perigoso poder, por razões ideológicas e filosóficas, muitos estarão a obrigar Portugal a fugir da sua matriz. Claro que os tempos vão mudando e operam-se transformações profundas na sociedade. O ontem pertence à história e muitas vezes não fica dele senão uma amarga saudade. Mas, o que nos fez e faz não pode mudar. O que nos estruturou e estrutura não pode mudar. Estamos numa hora magnificamente exigente. Oxalá sejamos capazes de a apanhar como se impõe. Manuel Martins, Bispo Emérito de Setúbal

Câmara de Ílhavo adere ao Plano Nacional de Leitura

A Câmara Municipal de Ílhavo (CMI) adere ao Plano Nacional de Leitura (PNL), através de um protocolo com o Ministério da Cultura, numa cerimónia de assinatura agendada para hoje, 30 de Abril, pelas 17.30 horas, na Biblioteca Municipal de Ílhavo (BMI). Com a assinatura deste protocolo, a CMI pretende levar os cidadãos a ler mais e melhor, proporcionando-lhes um maior acesso ao livro e à leitura, desde a primeira infância até à idade adulta. Também se pretende-se promover, de forma mais eficaz, junto das escolas e das famílias, o contacto com os livros e o gosto pela leitura. Entre as várias obrigações, o PNL ficará responsável pelo apoio financeiro durante os próximos três anos aos Jardins-de-Infância e escolas dos 1.º e 2.º ciclos do Ensino Básico do concelho, com vista à aquisição de livros destinados a leitura orientada nas salas de aula e nas demais actividades curriculares. Ainda foi agendada a assinado de um protocolo de Cooperação e Constituição da Rede de Bibliotecas de Ílhavo (Biblioteca Municipal e Bibliotecas Escolares). A Rede de Bibliotecas de Ílhavo é oficialmente criada por protocolo assinado, entre a CMI, os Agrupamentos de Escolas de Ílhavo, Gafanha da Encarnação, Gafanha da Nazaré, a Escola Secundária da Gafanha da Nazaré, a Escola Secundária Dr. João Carlos Celestino Gomes e o Centro de Formação da Associação de Escolas dos Concelhos de Ílhavo, Vagos e Oliveira do Bairro (CFAECIVOB), na BMI, enquanto sede do Serviço de Apoio às Bibliotecas Escolares (SABE). Este é sem dúvida o culminar de uma realidade, baseada num trabalho contínuo de persistência, dinamização, promoção e divulgação de práticas que permitem dotar os seus leitores e utilizadores de competências nos domínios da informação e da literacia. Ao longo destes últimos anos, o trabalho em equipa aproximou as nossas Bibliotecas Escolares e a Biblioteca Municipal na dinamização e promoção da leitura como factor primordial das aprendizagens. Na mesma data, foi apresentado o Cartão de Utilizador RBI, a ser implementado no início do próximo ano lectivo, que permitirá, a todas as crianças e jovens que frequentam as Jardins-de-Infância e Escolas do Concelho de Ílhavo, aceder em simultâneo ao serviço de empréstimo nas Bibliotecas Escolares e na Biblioteca Municipal. Fonte: CMI

Marcos Cirino desfia recordações

Marcos Cirino desfia recordações
com muito amor à Gafanha da Nazaré

 
Marcos Cirino da Rocha, 87 anos, gafanhão de gema, vibra com as coisas da Gafanha da Nazaré. Conhece muito da sua história. Evoca com entusiasmo os assuntos em que se envolveu. Conta pormenores que escapam a muito boa gente. E insiste na ideia de que há pessoas que nos querem prejudicar, decerto marcado por tempos e comportamentos idos. Fomos ouvi-lo um dia destes. Entrámos em sua casa e vimos miniaturas de barcos de várias épocas. Todos construídos por si. “À escala”, sublinha. Mas também vimos inúmeras pastas de documentos e processos relacionados com antigas, e talvez recentes, reivindicações e polémicas.

Fernando Martins

Leia toda a entrevista aqui

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Clube dos incorruptos, uma iniciativa com actualidade

O diário francês “Le Monde” de 22/23 de Março, dava conta de uma iniciativa original, a ganhar relevo nos tempos que correm, que, pelos seus objectivos, merece aplauso e, quiçá, seguidores onde vai grassando a peste tão nefasta da corrupção. A iniciativa deste Clube deve-se a Eva Joly, magistrada franco-norueguesa, que teve de instruir o famoso processo ELF. Um processo que envolvia pessoas do seu país e de África, ligadas, de um e de outro lado, ao poder político e ao poder económico. Os membros do “Clube dos Incorruptos” são magistrados que sentiram necessidade de pôr em comum as suas preocupações ante o dever grave, um verdadeiro desafio, de enfrentar e julgar casos de alta corrupção e de apreciar dossiers sobre o tema, que envolvem pessoas e entidades influentes, famosas e socialmente intocáveis. Reúnem-se com regularidade para confrontar métodos usados e resultados obtidos, e para se apoiarem, mutuamente, nesta tarefa, quase sempre ciclópica e difícil, que, muitas vezes, termina sem resultados positivos, mesmo quando tudo já aparecia mais ou menos claro. A corrupção, em alguns países de África, concluiu Eva Joly, quase sempre com raízes no Ocidente, tem posto em causa a democracia de muitos deles e até a sua sobrevivência como países. Manietado pela sofreguidão e cupidez de alguns poderosos locais, com apoios interessados, dentro e fora, e grande capacidade para mostrar inocência onde as culpas são evidentes e os resultados não escapam nem aos cegos, o papel da justiça é sempre difícil e muitas vezes inglório. Entre os membros do Clube fazem-se confissões, individuais e de grupo, que, pelo seu teor e gravidade, merecem uma especial atenção por parte de quem pode, a nível internacional, ter alguma interferência positiva, se acaso ainda existe alguém, pessoas ou instituições, com tal poder e influência. São as confissões dos magistrados, pelo menos, um alerta urgente para outros países e nações, onde iguais problemas se vão avolumando e não são menores as dificuldades encontradas para lhes fazer frente. O longo artigo do “Le Monde”, duas páginas recheadas, fala, por parte dos magistrados do Clube, de confissões dolorosas em virtude de combates perdidos, de ameaças e tentativas programadas de homicídio, de impossibilidade pessoal e de familiares de deslocação em privado, porque os conhecidos corruptos, quando sob investigação e juízo, lhes aparecem em qualquer canto, não pela preocupação de os saudarem ou de lhes proporcionarem auxílio. A corrupção, que sempre existiu em graus diferentes, muitas vezes encoberta e outras sem que seja possível ver todo o seu alcance, torna-se cada vez mais grave e cresce em espiral, quando os valores éticos se evaporam e à justiça faltam meios ou determinação para a enfrentar, anular os seus resultados ou minimizá-los, no possível. Ela cresce, também, por contágio. O fascínio do dinheiro e do poder, dois aliados habituais, é tentação que se espalha e em que se cai, a muitos níveis. Atenta a novas oportunidades, a grande corrupção ocupa o espaço da traficância, não apenas das drogas geradoras de toxicodependência, mas também de influências, espreita a permissividade do poder, pouco atento ou interessadamente desatento, goza dos favores de pessoas, locais e circunstâncias, tanto do poder absoluto, que também ele é, normalmente, corrupto, como das democracias, apáticas e sem espinha dorsal, embevecidas com a força dos resultados eleitorais, que depressa esquecem o que significa a promoção do bem comum, a justiça social e a defesa, corajosa e persistente, dos direitos individuais e colectivos. A corrupção não envolve só sofreguidão de dinheiro. Também se faz pela ânsia do poder. Mas a meada, por certo, tem duas pontas. António Marcelino

Seja festa Académica!

1. Esta quadra do ano é assinalada, de norte a sul do país e também em Aveiro, pelo espírito festivo dos estudantes, no seu diálogo com a sociedade envolvente e na manifestação pública da força das academias. Como se diz, tendo de haver tempo para tudo, trata-se de uma época saudável de festa, de encontros partilhados nos mais variados níveis, da cultura ao desporto, da música aos tradicionais cortejos académicos, passando pelos festivais de Tunas (o magnífico FITUA!), entre nós concluindo a Semana Académica com o momento celebrativo da bênção dos finalistas. Cada momento de festa, como cada dia, merecerá a melhor atenção; mas não poderá nenhum momento isolado infeliz diminuir o sentido comunitário das festas académicas. 2. O olhar crítico e derrotista poderá dizer que “não estamos em tempo para festas”. Com esta visão menor nunca se avançaria nada para lado nenhum. Tudo na justa medida terá o seu lugar e esta expressão de tradição típica nossa acaba por ser um sinal de vitalidade das gentes das próprias comunidades académicas. Pode-se aplicar a mesma mensagem das festas populares dos nossos lugares e nas nossas gentes: quando já não existir sequer motivação para estas realizações será sinal de comunidade sem laços comuns, desagregação do sentido de unidade colectiva. A festa nunca dependerá (essencialmente) da fartura ou crise económica, mas da vontade e motivação das pessoas e este é um valor inestimável a preservar. Querer será poder! 3. O rasgo de criatividade que percorre o país nas festividades dos estudantes do Ensino Superior também poderá ser um “ar fresco” de estímulos positivos e enérgicos… Diria o outro que de nada vale o “chafurdar” na crise! O tempo da vida é dom único, o valor mais precioso do mundo. Um tempo de pausa convivial nunca foi nem será incompatível com o rigor e o compromisso dedicado, mas também um desafio de frescura e qualidade lançado a todos. Aveiro é nosso e há-de ser! Assim seja! Alexandre Cruz

Pescadores na Praia da Barra

No molhe da Meia-Laranja, mesmo com céu enevoado, os pescadores não faltaram. E eram bastantes, um pouco por todo o lado. Na minha passagem, apenas vi um peixe a sair da água, preso ao anzol. Mas os pescadores lá estavam, pacientemente, à espera da sorte, ou do saber.

AVEIRO: Bênção dos Finalistas

Mensagem do Bispo de Aveiro

Bispo de Aveiro na Bênção dos Finalistas de 2008 (Foto do meu arquivo)

CONFIANTES NO FUTURO
AGARRAI O PRESENTE COM DETERMINAÇÃO
A festa da bênção chegou, finalmente! É um dia feliz e promissor, pólo de convergência de esforços e lazeres, de êxitos e fracassos, início de uma aventura que se deseja ainda mais feliz e afirmativa. É uma data assinalável na vida académica que encerra um ciclo de sonhos e abre horizontes novos a uma outra fase repleta de aspirações e ansiedades. É uma oportunidade única e solene na história da vossa afirmação pública que vos ajuda a assumir a complexidade do presente, a reconhecer o valor do passado e a dar largas às dimensões do futuro. Por isso, a quereis celebrar com entusiasmo confiante, na companhia dos vossos familiares e amigos, em campo aberto e espaço público, de forma livre e assertiva, na presença de colegas e outros membros da instituição académica; por isso, a quereis celebrar em assembleia cristã que realiza a eucaristia dominical a que presido com a maior alegria. Conseguistes! Podeis afirmá-lo com a certeza da experiência feita no dia-a-dia que, de vez em quando, teve de enfrentar surpresas e recriar energias. Aprendestes a assumir os desafios da vida, a descobrir as energias positivas dos obstáculos, a transformar as dificuldades em possibilidades e as crises em oportunidades; por isso, à ciência e à tecnologia, sempre apreciáveis, fostes juntando a sabedoria da relação humana, do valor das coisas, da riqueza do tempo, do alcance das opções, do sentido da vida; aprendestes a viver o dinamismo da esperança e a ética da responsabilidade. Aprendestes e quereis testemunhá-lo! Parabéns e oxalá que esta sabedoria vá crescendo com os anos, com o exercício competente de uma profissão responsável, com a cooperação em serviços de cidadania, com o envolvimento em acções de voluntariado. A maneira construtiva de estar e intervir na sociedade relaciona-se muito com esta sabedoria aliada às outras capacidades e competências que humanizam a pessoa e desvendam o sentido da vida e da história. Sem uma visão englobante e sábia, fica-se prisioneiro de um saber específico, sectorizado, parcelar, desarticulado do conjunto social. E fica em risco a qualidade da sociedade e das suas múltiplas instituições que dependem, em grande parte, da consciência cívica dos seus membros em relação ao bem comum e da competência dos seus responsáveis nas áreas que lhes estão confiadas. Aliás o futuro harmónico da sociedade – como o demonstra a história recente - depende mais daquela sabedoria do que das competências científicas e técnicas. Conseguistes! E haveis de conseguir ao longo da vida a realização superior do vosso ideal: ser feliz e fazer felizes os outros, aprender a saber e comunicar sabedoria, afirmar a individualidade e reforçar a sociabilidade, valorizar o que se alcança e dar alento ao que se deseja, escutar a voz da consciência onde ressoa a vibração dos sons do Transcendente, do Deus de Jesus Cristo, nosso amigo e confidente. Oxalá possais contar com o apoio indispensável para tão legítima aspiração e ousada ambição. Oxalá tenhais coragem de procurar grupos e associações que correspondam aos vossos anseios e proporcionem espaços de diálogo que facilitem o encontro de respostas. Contai com a disponibilidade da Igreja e dos seus movimentos apostólicos. Este serviço de acolhimento e busca faz parte da sua missão. Caros finalistas, como experimentastes ao longo do vosso curso, não se pode viver sem esperança. É ela que garante o dinamismo da vida. É ela que perspectiva o presente rumo ao futuro. É ela que recarga energias para prosseguir esforços. Mas a esperança precisa de um fundamento sólido e de um horizonte iluminado, de uma rocha que lhe sirva de âncora e de um ideal que lhe proporcione o feixe de luzes do farol. Que possais viver esta segurança na liberdade e alcançar esta luz na verdade, é o meu desejo sincero no dia feliz da festa da vossa bênção que, espero, se há-de prolongar por muitos anos. Aveiro, 3 de Maio de 2009
António Francisco dos Santos,
Bispo de Aveiro
NOTA: Antecipo a publicação da Mensagem do Bispo de Aveiro, para uma maior vivência da festa e Bênção dos Finalistas.

intervenção social e eficiente

Folgo em saber que o Conselho Local de Acção Social do Município de Ílhavo (CLAS) reiterou, na sua última reunião, a importância do trabalho desenvolvido pelo Serviço do Atendimento Social Integrado, no sentido da concretização de uma intervenção social racional e eficiente, justa e preferencialmente geradora de estruturação da vida dos cidadãos necessitados, com o envolvimento de toda a comunidade e numa busca incessante de crescimento qualitativo. Nessa linha, importa que todos se mobilizem, tendo em visto a ajuda aos mais necessitados, em tempo de crise.

Fonte: CMI

Grupo Poético de Aveiro: mais um número da revista Folhas – letras e outros ofícios

Contributos para os 250 anos da elevação de Aveiro a cidade
O Grupo Poético de Aveiro, que surgiu em 1993 como associação cultural empenhada no desenvolvimento, promoção e divulgação da poesia e da cultura de expressão portuguesa, irá brevemente editar mais um número da revista folhas – letras e outros ofícios, o número doze. Pretende com ele prestar um contributo para o assinalar dos 250 anos da elevação de Aveiro a cidade. Não que a revista deixe de ser o que é, um espaço aberto a todo o tipo de colaboração escrita, sobretudo poética, desde que a mesma apresente a dignidade que convém a uma revista literária. Neste espaço cabem os novos autores, ainda que nunca tenham publicado, e cabem os consagrados, ainda que diariamente apareçam em várias publicações. Além da livre temática porque sempre se tem pautado a nossa revista, propomos desta vez o tema Memórias da cidade e das suas gentes, a todos os que, disponíveis para tal, não queiram deixar morrer este ou aquele episódio marcante, este ou aquele personagem inspirador ou inspirado, este ou aquele rincão ou espaço que se foi tornando confluente, onde os aveirenses dos diversos bairros e estratos sociais se foram fazendo sábios. A nossa esperança é ajudar a salvar a memória do que ainda possa ser salvo mas, também, salvar a arte de viver com a riqueza e a consciência do passado, longe ou perto, que fez esta cidade. Contamos com a vossa colaboração, maior ou menor, sem quaisquer preconceitos ou restrições. Aguardamos as vossas contribuições, em poesia ou prosa, não esquecendo que a publicação dos trabalhos estará sujeito à habitual selecção do grupo coordenador da nossa revista. Nota: Os trabalhos podem ser enviados até 8 de Maio de 2009, por correio electrónico para: grupopoeticoaveiro@gmail.com ou por correio normal para: Grupo Poético de Aveiro - Casa Municipal da Cultura - Praça da República-3800 Aveiro A Direcção

terça-feira, 28 de abril de 2009

Laurinda Alves dispensada pelo PÚBLICO

O PÚBLICO dispensou a colunista Laurinda Alves, alegando exigências de contensão nas despesas. Tanto quanto sei, os restantes colunistas continuam ao serviço do diário que costumo ler desde o primeiro número. Fiquei triste, porque aprecio os escritos desta jornalista e escritora, fundamentalmente por seguirem a linha que há muito defendo, de apostar numa forma de estar na vida, sempre pela positiva. Tive pena, porque o PÚBLICO deixou de ter nas suas páginas uma profissional que aprecio, tal como muitos outros leitores.
Presumo que não houve na decisão do director, José Manuel Fernandes, uma motivação política, já que Laurinda Alves é candidata a eurodeputada pelo MEP (Movimento Esperança Portugal). A ser assim, é grave. Outros colunistas, contudo, na mesma posição, isto é, também candidatos a eurodeputados, Vital Moreira e Rui Tavares, pelo PS e pelo BE, respectivamente, ainda não foram despedidos, que eu saiba.
Num comentário que escrevi no seu blogue, não deixei de lhe manifestar a minha solidariedade, ao dizer-lhe que espero continuar a ler o que ela vier a escrever, onde quer que seja, porque Laurinda Alves tem o condão de nos ajudar a pensar. Só espero que ela não demore a fazê-lo. Estou convencido de que não hão-de faltar órgãos da comunicação social à altura da jornalista que o PÚBLICO dispensou.
Fernando Martins

Tempo e acção das perguntas

1. À situação que se vem vivendo nos últimos meses junta-se agora o alerta de saúde pública que a OMS – Organização Mundial de Saúde confirmou devido à chamada gripe mexicana. É como se de repente um conjunto de elementos se juntassem diante dos quais urge (re)agir na perseverança confiante dos grandes valores que poderão fermentar novas vias de solução, um dos quais é a solidariedade. Os tempos que vivemos são de reposição das grandes questões, de modo a reinventar para novos quadros de problemas as inovadoras respostas. Não chegam as respostas habituais diante de cenários efectivamente novos. Para descortinar amplas soluções, assim, torna-se imperativo, consequentemente, a arte de saber relançar as questões essenciais, desmistificando certas visões mecanizadas e abrindo novas vias. 2. As perguntas sobre os valores, as políticas, a sociedade civil, as economias, a justiça, a saúde, as redes sociais, a subsidiariedade, a solidariedade global como o desafio do século, o respeito ambiental… hoje entrecruzam-se não havendo margem para respostas simplistas. Há empresários heróis, existirão gestores oportunistas; há trabalhadores dedicadíssimos, existem trabalhadores “à boleia”; existem dados da economia com pressupostos de responsabilidade social, e existem outras visões e práticas que reflectem a noção “selvagem” que estás nas mãos que as comandam. Este tempo das grandes questões ajuda a diferenciar para não generalizar mas sim: compreender. Importa, por isso, fugir às épocas políticas pródigas em maximizar intencionalmente, urge que todo o político dos cidadãos se envolva na reflexão que pode gerar mais fruto. 3. Da organização da CEP, está agendado um grande Simpósio para 15 de Maio (no Centro de Congressos de Lisboa, antiga FIL), com a temática: Reinventar a solidariedade (em tempo de crise) – reconhecer, inspirar, mobilizar. Site: http://www.reinventarasolidariedade.org/ Reflexão aberta à sociedade civil!
Alexandre Cruz

Bênção dos Finalistas da Universidade de Aveiro

Domingo, 3 de Maio, 11 horas, na Alameda da Universidade

UM PASSO NO FUTURO


Num tempo que voou, Porque o vivemos a brilhar, Foram anos, trabalhos, cadeiras e canseiras sem parar! A todos, foram imensos, Eis chegada a hora de reconhecer: Olhar para trás, sentir o vencido mar, À Ria, às gentes de Aveiro agradecer! E se ao futuro a incerteza pertence Na hora sempre sofrida de partir, Fica-nos o sabor bem especial Da arte da esperança sentir! A Bênção é a nossa festa especial, Finalistas da academia vamos cantar! É o dia da unidade e grito maior Que nos leva aos céus a Deus louvar! Será, em mesa universal, a aula maior Onde a abundância da paz todos encanta…, Símbolos e Cursos, na Alameda, projectam o melhor… O sonho, o futuro, triunfo de agiganta!

Pobreza em Portugal continua, 35 anos depois do 25 de Abril

O antigo Presidente da República Mário Soares disse ontem, como ouvi na rádio, que se envergonhava de, passados 35 anos após o 25 de Abril, ainda não ter sido erradicada a pobreza entre nós. O País foi democratizado, a descolonização aconteceu, mas o desenvolvimento tarda em instalar-se na nossa sociedade. Os três D, afinal, estão em grande parte por cumprir. Mas a pobreza, santo Deus, é que teima em criar raízes em Portugal. As dificuldades dominam a situação e os pobres estão cada vez mais pobres. Como é isto possível? Quem pode andar por aí sem se envergonhar?

Gripe suína mostra a nossa fragilidade

A fragilidade em que vivemos está bem patente na ameaça de pandemia que aí está, com a gripe suína a preocupar toda a gente. Foi há tempos a gripe das aves, como tem sido com outras doenças. O homem vive, realmente, na corda bamba. E se é verdade que algumas pandemias podem ser anunciadas, como esta está a ser, também é certo que há outras que se insinuam sem ninguém dar por ela. Em Portugal, pelo que se sabe, ainda não entrou. Mas todo o cuidado é pouco. E já repararam que a mola real das pandemias assenta na globalização?

Inclusão do semelhante

Ser diferente ou existir em minoria é o estandarte para reivindicar a bandeira da inclusão. E com justiça, pois nunca são de monta as diferenças evocadas para distinguir pessoas, grupos ou etnias. A unir todas as particularidades está essa circunstância única que é a dignidade da pessoa: uma condição antes de ser um direito.
O problema não se colocará, no entanto, apenas em contextos de diferença. Também onde reina a semelhança não são poucos os episódios de exclusão, de diferenciação, de distinção subjectiva de pessoas, ideias ou projectos. E com o prejuízo que decorre dessas atitudes: para o próprio grupo, como também para toda a sociedade. São mais notórias essas “falsas-diferenças” quando emergem na história do presente exemplos de grandes feitos à custa da construção da unidade entre pessoas, ao redor de causas, sejam elas nacionais ou religiosas, mas sempre humanas. É o caso de S. Nuno de Santa Maria, o Condestável que rejeitava apenas o erro, o perverso, o corrupto para catalisar esforços em benefício de objectivos maiores. E com resultados históricos, uma Nação, e pessoais, a santidade, que estão agora diante de tudo e de todos. São também mais necessários os pequenos e os grandes contributos, todos os recursos, quando se quer “reinventar a solidariedade” que proporcione dignidade de vida a todas as pessoas, devolva a justiça e a paz às sociedades e permita a existência a todos os seres. São ainda esperadas atitudes solícitas de homens e mulheres que optam por de serem sinais e agentes de um novo Reino, proclamado há 2000 anos, apostado em fazer da ordem natural das coisas a lei por excelência para a relação entre pessoas e para o governo das coisas. Cada um na sua circunstância e seguindo sempre as pisadas de um Mestre que em todos os momentos fez a vontade d’Aquele que O enviou. Na era da fragmentação das pessoas, das coisas, do tempo e do espaço, urge devolver a continuidade e a estabilidade a projectos que visam a construção da dignidade humana. Na espera paciente por resultados positivos e duradouros e na inclusão de todas as partes: as que são diferentes e também as que são semelhantes. Paulo Rocha

Um poema de Domingos Cardoso

Palavras
Puras... são como um cristal as palavras Que baixinho ao ouvido me segredas; Com elas o meu peito inteiro lavras, De alva paixão semeias labaredas. Doces... palavras são como a fina trama Desse tear de enredos em que teces Os límpidos lençóis da nossa cama E onde, abraçada a mim tu adormeces. Frágeis... palavras são como a branca taça Por onde tomo um leve e suave trago: Bebendo, longamente, a tua graça, Perdido em teu sorriso eu me embriago. Leves... palavras são como a clara brisa Passando, fresca, ao fim das tardes calmas E o segredo que nelas se eterniza, É o que mantém unidas nossas almas.
Domingos Freire Cardoso

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Desafios do Condestável

1. Corria o ano de 1360, a 24 de Julho, segundo os historiadores em Cernache do Bonjardim nascia Nuno de Santa Maria. Aos treze anos torna-se pajem da rainha D. Leonor, sendo acolhido na corte e acabando pouco depois em cavaleiro. Quando da morte do rei D. Fernando I (a 22 de Outubro 1383), sem ter gerado filhos varões verifica-se o vazio no poder, a que seu irmão D. João Mestre de Avis responde envolvendo-se na luta pela coroa pretendida pelo rei de Castela. Os contextos difíceis da história da época de trezentos, sofrendo de profundas mazelas e de grave crise social, reclamavam visões e posturas claras de defesa da identidade e do património nacional, não que tal represente com os olhos de hoje um nacionalismo cego mas um dever de zelo comunitário inalienável. 2. Nuno Álvares Pereira toma o partido da defesa da nacionalidade no proteger D. João, o qual o nomeou Condestável, estratega e comandante supremo do exército, missão que levou a efeito com sucesso registando-se a 14 de Agosto de 1385, ao fim de muitas, a simbólica vitória de Aljubarrota que poria fim à crise da sucessão. Faz parte da história e da identidade dos portugueses – mesmo que sem mitologias – que, com a chegada de D. João I à coroa, se inicia uma nova era no desígnio das gentes da costa ocidente europeia, facto este (da base de sustentabilidade para o encontro de culturas operado nas descobertas) que também muito se deve à educação em valores universalistas dada aos filhos de D. João e Filipa de Lencastre. Um conjunto de valores e de confianças perpassaram nas gentes da época que, à semelhança de Nuno e D. João, terão sido pilares da edificação comunitária. 3. Muito se escreveu e se disse, nos vários prismas, sobre o acontecimento que no passado domingo elevou à santidade o militar com alma, apelidado na sua morte de “Santo Condestável” (Páscoa de 01-04-1431). Apurar a memória também será “desatar” alguns dos problemas actuais! Alexandre Cruz

O que os ovos moles tiveram de mudar para poderem ficar precisamente na mesma

Foram vários os caprichos da União Europeia que, por exemplo, roubou aos ovos moles a possibilidade de se aconchegarem em tabuleiros de madeira e os fez acamar em desconfortáveis grelhas de inox. Mas este mês chegou a hora da retribuição. As mais antigas e tradicionais doceiras, como a dona Silvininha, podem dormir descansadas, que a receita original já está protegida pela lei. Por Graça Barbosa Ribeiro (texto) e Paulo Pimenta (fotos), no PÚBLICO

O Condestável já não mobiliza ninguém

Em seis séculos, o Condestável perdeu capacidade de mobilizar o país e a Igreja. O homem a quem se reconhecem virtudes éticas mesmo na guerra e que foi capaz de renunciar a títulos e bens para andar descalço por Lisboa a pedir para os pobres não criou agora, com a sua canonização, grandes entusiasmos por parte do Estado, nem dos católicos. Esse vazio foi, aliás, ocupado (legitimamente) por sectores conservadores da Igreja e pela causa monárquica. Certo que o acontecimento de ontem era religioso. Mas quando o Estado se associa com entusiasmo a celebrações de futebóis, causa estranheza não ver mais empenho em relação a uma figura que marcou a História do país - para o bem ou para o mal, admitam-se as opiniões. 
A Igreja também não foi capaz ainda de vincar um discurso rigoroso e actual em relação ao novo santo - as duas intervenções do Papa, ontem, são disso exemplo. A hagiografia tem oscilado entre a "exaltação patriótica" do militar - que o patriarca de Lisboa teve a preocupação de rejeitar - e as virtudes e histórias que às vezes se confundem com lendas. Como dizia o cardeal Policarpo, faz falta que a história investigue mais a figura do Condestável. 
Falta outra coisa, que a canonização evidenciou: o segredo em que os responsáveis católicos colocam os processos das curas que permitem as beatificações e canonizações não ajuda a dar credibilidade a tais acontecimentos. Sentiu--se isso com a beatificação dos videntes de Fátima, sentiu-se de novo agora.
Ontem, o cardeal Saraiva Martins declarava-se "feliz" pela conclusão do processo, após "tanto trabalho" que teve para concluir em três meses o que levaria "cinco a seis anos". Ora, as dúvidas surgidas em tantos sectores da opinião pública (incluindo a católica) não podem ser olhadas de soslaio pelos responsáveis da Igreja. Para que os santos sejam mesmo modelos para quem os quer seguir.

António Marujo 27.04.2009

domingo, 26 de abril de 2009

A liberdade como tarefa

1. Por estes dias das comemorações do 25 de Abril, talvez mais que o hábito de cada ano até pela conjuntura social e política (de três eleições), ouviram-se da parte dos cidadãos as maiores generalizações, estas que são sempre reflexo de questões e valores ainda não justamente diferenciados e por isso não sábia e sadiamente amadurecidos. O valor da liberdade, mesmo que com a subjectividade que encerra, não é como um jogo de números ou um resultado de futebol. Pelas rádios nacionais de maior audiência, muitos foram os fóruns dedicados ao designado 25 de Abril. Muita da intervenção dos cidadãos revelou, dizemos, sinais preocupantes em termos cívicos, parecendo desnorteado o equilíbrio do bom senso e transvazando sempre para os «outros» os males do país, este também um hábito discursivo das lideranças políticas revelador do estado de sítio desculpabilizador. 2. O dizer-se num “de repente” radiofónico que, em termos do valor liberdade, antes era tudo mau e agora é tudo bom, ou, ao contrário, que agora é tudo bom mau e antes é que era bom, manifesta, mais que uma autêntica precipitação incorrecta em relação à história, um reflexo da maturidade cívica (ou não) da sociedade portuguesa. Esta forma típica simplista de analisar as questões ampla e profundamente complexas de modo rápido e pragmático, tem feito de nós mais um país de solavancos emocionais que de consistências de projectos envolventes em razão comunitária. Persistir na conclusão de que se algo no presente está mal (ou bem) resulta como consequência directa do que aconteceu há uma, duas ou três décadas, continua a dar aquele sinal do compromisso adiado das renovações urgentes no presente. 3. Os ângulos da liberdade serão infinitos, mas é certo que no tempo da história desafiam à garantia dos pilares da ética (pessoal e social) de responsabilidade. Será nesta bitola, não linear nem simplista, que haveremos de compreender que a liberdade nunca é um dado mas uma tarefa (diária) de todos! Alexandre Cruz

TECENDO A VIDA UMAS COISITAS – 128

BACALHAU EM DATAS - 18



A PESCA NOS DÓRIS

Caríssimo/a: 
Falar nos dóris, na pesca nos dóris, leva a minha geração a recuados tempos em que nos víamos transportados para bordo do navio acabadinho de atracar onde íamos abraçar o familiar roído de saudades... Quantos dias nos sentámos a olhar para a vela que o tio Mário içava no quintal para a enxugar e experimentar como reagia aos sopros da nortada! No fio secava a roupa que em breve seria ensacada para a nova viagem!... Ou então no Esteiro, a remos ou à sirga, no bote do tio naquelas aventuras pesqueiras que nos deliciavam... De outra vez, na seca do Coimbra, o Pai e o tio Manel ajustaram a reparação e a construção de botes novos... Recordar conversas de familiares e amigos... Oh, palavras mágicas de naufrágios, incêndios, conflitos, pescas quase milagrosas!...
Façamos silêncio, ponhamos o dedo na página 19 do livro “Nos Mares do Fim do Mundo”, de Bernardo Santareno, e que o tempo pare:


A PESCA À LINHA

«Louvado seja o bom Jesus, Nosso Senhor! ... » É a hora. São quatro da manhã. Os homens vão saltando dos beliches à medida que acordam e, ainda ensonados, benzendo-se, respondem ao vigia: «Que nos remiu em sua santa Cruz, louvado seja!» É madrugada e as sombras que cobrem o mar recuam ante a claridade frígida, cor de pérola, que alastra sobre o Oceano. Não há brisa, é dia de pesca. Almoço frugal logo em seguida e, preparados os botes (os dóris), prontos anzóis, linhas e isco: - «Arriando, com Deus!» Lá vão, cada qual no seu barquito, para a grande aventura quotidiana. E cada qual pensa, o coração sempre apertado neste momento: «Voltarei hoje? Ai, minha Nossa Senhora ... » Há um que leva aos lábios uma medalha - Senhora da Nazaré, Senhor dos Navegantes ... - que traz pendurada ao peito; outro, disfarçando mal, acaricia o retrato dos filhos que tem oculto no bolso; outro ainda, mais novo, um «verde», em vago sorriso crispado pelo frio e pelo medo, promete como quem reza: «Hei-de fazer a nossa casa com o dinheiro desta viagem, Maria, ... casaremos pelo Natal! ... » - «Arriando, com Deus!» Todas as madrugadas o capitão os despede com este mesmo grito e, em cada dia, ele fica longo tempo debruçado na amurada, apreensivo, com uma asa nostálgica a sombrear-lhe os olhos duros ... Esta é a pesca à linha, nos bancos da Terra Nova e da Gronelândia. Quem pesca assim? Só os portugueses, no mundo inteiro! Lá vão eles: um homem e um barquito frágil .. frente ao mar tão forte e tão volúvel, à neblina que pode tornar-se cerrada, ao vento que pode levantar-se rijo ... Um homem sozinho, frente ao infinito!! E cada barco alivia no mar, com a escrita da sua quilha, o peso duma interrogação ansiosa, logo apagada pela espuma leve e branca ... Aí pelas duas, três horas da tarde, os dóris começam a voltar ao navio . Mas às vezes não voltam: sob o peso excessivo do pescado, ou pela fúria súbita da brisa, o barco afunda-se ... Outras vezes, a névoa densíssima fá-los perder o navio-mãe: e são longos dias à deriva, sem água, sem alimentos, até que ... - «O Zé Robalo não voltou!» Lá na curva do horizonte, o Sol, redondo, enorme e vermelho, desce rápido, logo sugado pelo mar impassível .. : redondo e rubro, como o rosto dum deus pagão, sangrento e implacável. - O Zé Robalo não voltou! ... “Ah, mar! ah, mar dum cão! malvado, mar terrible! na há pior matador qu'ati. na há pior castigo qu'a vida dum pescador!”» Ai, ó meus amigos,e a Mulher e os Filhos só após a entrada do navio, já lá vão uns meses, é que choram que “o Zé Robalo não voltou!...”. 

Manuel

sábado, 25 de abril de 2009

Onde estavas no 25 de Abril?


"Onde estavas no 25 de Abril? Esta pergunta, que Baptista-Bastos fixou sobre a revolução dos cravos, baila muito na minha cabeça. Também eu me questiono com ela, quando o 25 de Abril vem. E afinal onde estava, realmente? Quando a liberdade veio, com a força para muitos de nós desconhecida, tinha eu já 35 anos. 
Na manhã desse dia, levantei-me sem saber de nada. Como a grande maioria dos portugueses. Estava destacado, profissionalmente, para uma tarefa do Ministério da Educação, ao tempo chefiado por Veiga Simão. Animava bibliotecas populares e outras, promovia e apoiava cursos de adultos, dinamizava instituições de cultura e recreio, formava bibliotecários e preparava professores para a difícil missão de ensinar gente crescida a ler e a escrever. Gostava muito do que fazia. 
Nesse dia, o concelho de Sever do Vouga estava na agenda. Saí de casa e meti gasolina na Cale da Vila. Nesse ínterim, liguei o rádio portátil para ouvir as notícias. Perplexo, achei estranho sentir o rádio confuso. Avaria? Não. Uma voz anunciava o que estava a passar-se em Lisboa."

Fernando Martins
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35 anos depois

Hoje, é como se vivêssemos (ou vivemos mesmo?)
numa democracia deprimida. Que se passou?


Para a abertura da exposição "Abril, ânimos mil", na Galeria da Associação 25 de Abril, em Lisboa, António Colaço desafiou-me para um intróito: "De que falamos, quando falamos de ânimo?" 

1. A identidade humana é narrativa. Mas a história narrada de cada um(a) é sempre incomensuravelmente incompleta, pois seria preciso narrar a história do universo todo, donde vimos e onde somos, até ao big bang - a grande explosão. O universo é dinamismo, que se vai configurando em estruturas cada vez mais complexas, numa história com 13.700 milhões de anos e aberta. De que falamos, quando falamos de ânimo? Deste dinamismo cósmico que se autoconfigura, da cosmogénese, da biogénese, da hominização. Deste dinamismo em luxo e luxúria, presente em milhares de milhões de galáxias e em expansão. 
2. A estrutura mais complexa que conhecemos é o Homem. De que falamos, quando falamos de ânimo? Do Homem, no dinamismo da liberdade, com duas possibilidades: liberdade criadora e liberdade destruidora. O dinamismo do mundo, agora consciente e livre, na e pela relação, constrói; curvado sobre si mesmo, devora-se e destrói. 
3. De que falamos, quando falamos de ânimo? Do amor cósmico, esse amor que tudo move, como disse Dante. É também esse amor - energia e dinamismo - que une a história dos povos. Por causa da liberdade, também eles criam e dinamizam ou oprimem e destroem. De que falamos, quando falamos de ânimo? Também falamos da Revolução dos Cravos, de Abril. Foi o júbilo do "dia inicial inteiro e limpo", sob o desígnio de democratizar, descolonizar, desenvolver. E assim se fez, mesmo se a descolonização foi inevitavelmente dramática, a democratização feita aos solavancos, o desenvolvimento, pouco e sobretudo pouco racional. Mas o que éramos e o que somos!... Não há nada que pague a liberdade, a democracia, recuo do analfabetismo, fraternidade de povos, igualdade de homens e mulheres. É disso que falamos, quando falamos de ânimo. 
4. Mas, hoje, é como se vivêssemos (ou vivemos mesmo?) numa democracia deprimida, quase impotente, sem ânimo. Que se passou? Ele foi a sofreguidão do ter sobre o ser, na ganância louca do consumo de teres, na perda de valores fundamentais, da honra, da dignidade e do espírito. Continua vivo o individualismo dos portugueses: não conseguimos interiorizar que o que é bom para Portugal é bom para mim. A situação do ensino não é felicitante. Ah!, aquela abertura apressada e sem critério de Universidades, para ganhar eleições! O fosso entre os muito ricos e os muitos pobres é cada vez mais fundo e parece que o maior da União. A corrupção campeia. Quem acredita ainda no sistema judicial? E os jovens desinteressam-se pela política, como que para evitar um lugar mal frequentado. Que Abril foi esse que, passados 35 anos, ainda permite 2 milhões de pobres? E quem sabe o que vem aí? Ainda é de ânimo que falamos, quando o que nos visita é o desânimo? Sim, é ainda de ânimo, se o desânimo se tornar força dialéctica para a sua autosuperação. 
5. O que aqui nos trouxe foi a arte. Sem beleza, não há salvação. O artista imita a natureza: não a natureza naturada, mas a natureza naturante, o dinamismo e o ânimo que habitam o universo enquanto força criadora originária. O artista é, por isso, génio: gera beleza a partir da fonte dinâmica do mundo e anima a esperança. O mundo não é estático: está em processo e é processo. As suas possibilidades ainda se não esgotaram, e essa é a razão por que o ânimo não é apenas psicológico, mas ontológico, da ordem do ser. O processo do mundo ainda não transitou em julgado. Abril também não. Caídas as máscaras, poderemos reencontrar o ânimo daquela manhã primeira. Se foi possível no passado, porque não há- -de sê-lo no presente e para o futuro? A beleza abre ao futuro e à Transcendência e é promessa de ânimo, mesmo quando faz falar a arma da crítica e da sátira político-social. É disso que falamos, quando falamos de ânimo. 

Anselmo Borges

25 de Abril de 2009

Era o 1º ano da sua actividade profissional. Encontrava-se a leccionar numa escola do concelho, a mais próxima da sua residência, da altura. A manhã acordara-a tranquila e preparava-se para mais um longo dia, trabalho árduo, mas compensador. Escolhera esta profissão, não por imposição de alguém, muito menos por qualquer conveniência de qualquer nível. Fora a escolha do coração, no mais amplo sentido da palavra. Alguém com alguma responsabilidade havia-a “empurrado”, sem sequer ter dado aquele empurrãozinho de que hoje tanto se fala. Foi uma personagem marcante na sua vida e, sem dúvida que influenciou, que marcou indelevelmente o seu percurso profissional. 
Refere-se à sua English teacher do 5º ano do Liceu, altura em que era feita a escolha da carreira profissional. Recorda-se tão bem desta criaturinha de estatura mediana, tal qual a sua, o carro que usava na altura, até a própria indumentária lhe ficara retida na memória. O nome também tinha algo em comum, pelo menos naquilo que caracteriza a mulher portuguesa, especialmente em épocas passadas, Maria Helena Pedroza! Que gratas recordações lhe traz este nome! Tanto a marcou, que se tornou uma aluna diligente, sem, para isso, fazer qualquer esforço, já que estudar Inglês era um enorme prazer. 
Fica aqui a homenagem pública e um profundo sentimento de gratidão pelos horizontes que lhe fez abrir! O carácter nobre desta profissão, que tem por objectivo lapidar diamantes brutos, ganha espírito de missão! Bem-haja! Foi neste contexto de actividade, que a jovem teacher acolheu a notícia do dia 25 de Abril de 1974. A medo e com todas as cautelas, o acontecimento foi divulgado. 
A princípio, surgiu a música clássica a preencher a programação de todas as estações de rádio, que deu o lamiré daquilo que estava a ocorrer no nosso país. Num país, mergulhado num sistema político totalitário, havia 40 anos, foi uma efeméride que provocou reacções antagónicas e paradoxais. Sem me alongar na análise duma revolução, deixando isso para os experts na matéria, gostaria apenas de fazer algumas reflexões sobre o assunto. Iniciara nesse ano a minha carreira docente e assisti, ao longo da minha já longa existência, às mais variadas e inquietantes reformas no sistema educativo. 
De tudo o que tem germinado no terreno pantanoso deste campo de acção, resta-me uma amarga constatação. Os professores têm vindo a perder direitos, ao longo de décadas conquistados, sem que esse acréscimo de dedicação à escola tenha revertido em melhorias das aquisições dos nossos alunos. O que a sociedade civil tem vindo a verificar é uma progressiva degradação da formação académica, apesar do muito show off que as escolas fazem para atestar a sua prova de vida! 
O professor foi transformado num (in)competente (!?) burocrata em que a quantidade de papéis é inversamente proporcional ao sucesso alcançado pelos alunos. A tutela manda! A tutela assim quer e o professor, como qualquer subalterno, obedece a contragosto, consciente de que estamos a caminhar para uma hecatombe. Os diversos movimentos de contestação da classe docente, amplamente divulgados, comentados pela comunicação social e aplaudidos por uma grande parte da população, atestam e reflectem o mal-estar existente na classe e a inoperância de sucessivos governos em resolver a sua problemática. 
Quem por vocação está no sector, confrange-se com o estado de coisas da educação em Portugal e sente-se impotente para o alterar, pese embora toda e qualquer discordância do sistema vigente. Fica uma questão: será que ainda estamos na infância duma democracia que pretende instalar-se neste jardim florido, à beira-mar plantado? Se assim é… puxa que esta criança teima em ficar, eternamente, no estado infantil! Quebremos as amarras, as mesmas que os capitães derrubaram nessa bendita madrugada, há 35 anos atrás! Deixemo-la chegar ao estado adulto… pois já tem idade para isso!


Mª Donzília Almeida 23.04.05