quinta-feira, 9 de julho de 2020

Ser Feliz: Dar Fruto a Cem por Um

Reflexão de Georgino Rocha 
para o Domingo XV do Tempo Comum



Jesus sai de casa, em Cafarnaum, e vai sentar-se à beira mar, assim narra Mateus o início de um dia de trabalho. Aqui, ocupado com os seus sonhos da missão, vê-se rodeado de numerosas pessoas desejosas de o ouvirem. Ao vê-las, levanta-se, entra numa barca, afasta-se da margem e começa a falar em tom familiar, narrando a parábola do semeador que lança à terra a semente. Mt 13, 1-23
O Papa Francisco, no seu comentário intitulado “limpar o terreno do nosso coração” afirma: “A parábola diz respeito sobretudo a nós: com efeito ele fala mais do terreno que do semeador. Jesus faz, por assim dizer, uma «radiografia espiritual» do nosso coração, que é o terreno sobre o qual a semente da Palavra cai. O nosso coração, como um terreno, pode ser bom, e então a Palavra dá fruto – e muito -, mas pode também ser duro, impermeável. Isto acontece quando ouvimos a Palavra, mas ela escorrega, precisamente como numa estrada: não entra”. .
A narração da parábola de Mateus compara a Palavra de Deus a uma semente, cheia de vigor, que o agricultor lança à terra. Jesus tem perante si a multidão encantada com os seus ensinamentos e quer iniciar os discípulos na compreensão dos mistérios do Reino. Está na margem do Lago de Tiberíades, onde se encontram barcos arrumados após a faina da pesca.
Mateus – o autor do relato – escolhe este cenário para dar início à parábola do semeador, a primeira de sete. De permeio, aduz a razão de Jesus optar por lhes falar em parábolas: “Abrirei a minha boca em parábolas e proclamarei coisas ocultas desde a criação do mundo”.
As “coisas ocultas” referem-se ao Reino de Deus, presente de forma velada na humanidade e agora anunciado explícita e publicamente por Jesus. Reino que é presença benfazeja, garantia de situações mais humanizadas, gérmen de um plenitude desejada, realidade promissora sujeita às leis do tempo e condicionada pelas forças que se cruzam na natureza e na história. Reino que, sendo de Deus e tendo o seu dinamismo, é realizado por Jesus e prosseguido por aqueles que aceitam a sua palavra e se fazem seus discípulos (Igreja nascente). Reino que é “justiça, paz e alegria no Espírito Santo” Rm 14, 17.
“Felizes os vossos olhos porque vêem e os vossos ouvidos porque ouvem” declara Jesus, com selo de garantia sem prazo de limite de validade, aos discípulos desejosos de compreenderem o alcance do que estava a acontecer. Felizes os que têm o olhar puro e apurado, descobrem as sementes do reino, quais sinais da presença de Deus no mundo, e exultam com os esforços humanos por lhes dar rosto pessoal na convivência social e nas comunidades cristãs.
Felizes os que ouvem os gemidos de tantos milhões e as boas notícias de quem procura ajudá-los na sua libertação do jugo infernal da fome, da sede, da doença, da ignorância, da guerra. Felizes os voluntários de todas as causas humanitárias que testemunham confiadamente os valores da solidariedade fraterna, do compromisso libertador, da entrega generosa por amor de doação. Esta é a boa semente que produz a cem por um.
“O bem tende sempre a comunicar-se. Toda a experiência autêntica de verdade e de beleza procura – afirma o Papa Francisco - por si mesma, a sua expansão; e qualquer pessoa que viva uma libertação profunda adquire maior sensibilidade face às necessidades dos outros. E, uma vez comunicado, o bem radica-se e desenvolve-se” (A Alegria do Evangelho, nº 9).

Pe. Georgino Rocha

Corrupção, Peculato, Fraude...

«Corrupção, peculato, fraude, todas estas são características que existem por todo o lado. É lamentavelmente a forma como a natureza humana funciona, quer queiramos ou não. O que economias bem-sucedidas fazem é mantê-las no mínimo. Ninguém alguma vez conseguiu eliminar qualquer dessas coisas»

Alan Greenspan (1926-), 
economista

Publicado em Escrito na Pedra do PÚBLICO de hoje

Nota: Se não as pudermos eliminar, isso não significa cruzar os braços. Importa lutar até ao fim dos nossos dias... 

quarta-feira, 8 de julho de 2020

O “médico dos pobres” é para sempre de Aveiro

Mário Sacramento com a esposa
«Ontem, Vasco Sacramento, nu­ma intervenção a propósito do descerramento de uma placa de homenagem ao seu avô, Mário Sacramento, recordou um excerto muito especial do “Livro de Amizade”. O texto fora escrito pela sua avó, Cecília Sacramento, e recordava um episódio marcante na sua vida, quando ela e o marido (Mário Sacramento) foram presos pela PIDE e ela, grávida de oito meses, acabou por perder a criança. E, a propósito, ela escreveu: “Os olhos vêem tudo, até fechados”, e é assim que Aveiro deve olhar para a placa que ontem foi descerrada no N.º 50 da Avenida Dr. Lourenço Peixinho, junto à porta de entrada do antigo consultório do avô Mário, popularmente conhecido como o “médico dos pobres” porque se disponibilizava, sem reservas, a receber e tratar doentes independentemente de poderem pagar a consulta.»

Ler mais no Diário de Aveiro de papel 

Nota: Texto publicado no DA online 

terça-feira, 7 de julho de 2020

Os dóris nos naufrágios

António da Rocha Santos, sobrevivente do naufrágio do Ilhavense II, recorda como as dóris foram o único meio de salvação da tripulação enquanto o lugre envolto em chamas afundava. 

Dóri com pescador. Foto da rede global

O incêndio deflagrou mais ou menos por volta das 8 horas da manhã na casa da máquina, foi impossível regular o incêndio. Entretanto foi pedir o SOS cerca das 8.30 e o capitão deu ordem de evacuação, tive de ir buscá-lo porque era uma fumarada terrível e ele já estava um bocado atrapalhado. Entretanto saltámos para os dóris sem ter a certeza se o SOS tinha sido enviado ou não. Foi um naufrágio rápido. As condições metrológicas a piorarem, ventos de oeste, chuva, mar de vaga e nós nos dóris! Eu fiquei num dóri com três tripulantes, fui o penúltimo a saltar e depois foi o capitão. Passámos momentos muito amargos e aflitivos! Estivemos assim cerca de 12 horas no mar! Por volta das 20.30, já praticamente noite, avistámos um projetor a varrer o horizonte, uma luz lá ao longe e ficámos então esperançadíssimos. Era o USCGC Mendota, aproximando-se dos dóris, parou a máquina, ficou à deriva do lado do barlavento e estendeu as redes no costado do navio e fomos resgatados! 

António Tomé da Rocha Santos 

Era o imediato do Ilhavense II quando naufragou a 26 de Agosto de 1955. 
Desempenhou funções de piloto, imediato e capitão

Fonte: Agenda "Viver em..." da CMI

segunda-feira, 6 de julho de 2020

José Régio - Toada de Portalegre



Em Portalegre, cidade 
Do Alto Alentejo, cercada 
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros, 
Morei numa casa velha, 
Velha, grande, tosca e bela, 
À qual quis como se fora 
Feita para eu morar nela... 
Cheia dos maus e bons cheiros 
Das casas que têm história, 
Cheia da ténue, mas viva, obsidiante memória 
De antigas gentes e traças, 
Cheia de sol nas vidraças 
E de escuro nos recantos, 
Cheia de medo e sossego, 
De silêncios e de espantos, 
– Quis-lhe bem como se fora 
Tão feita ao gosto de outrora 
Como ao do meu aconchego. 
Em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada 
De montes e de oliveiras 
Do vento soão queimada 
(Lá vem o vento soão!, 
Que enche o sono de pavores, 
Faz febre, esfarela os ossos, 
E atira aos desesperados 
A corda com que se enforcam 
Na trave de algum desvão...) 
Em Portalegre, dizia, 
Cidade onde então sofria 
Coisas que terei pudor 
De contar seja a quem for, 
Na tal casa tosca e bela 
À qual quis como se fora 
Feita para eu morar nela, 
Tinha, então,
Por única diversão, 
Uma pequena varanda 
Diante de uma janela. 
Toda aberta ao sol que abrasa, 
Ao frio que tolhe, gela, 
E ao vento que anda, desanda, 
E sarabanda, e ciranda 
De redor da minha casa, 
Em Portalegre, cidade 
Do Alto Alentejo, cercada 
De serras, ventos, penhascos e sobreiros, 
Era uma bela varanda, 
Naquela bela janela! 
Serras deitadas nas nuvens, 
Vagas e azuis da distância, 
Azuis, cinzentas, lilases, 
Já roxas quando mais perto, 
Campos verdes e amarelos, 
Salpicados de oliveiras, 
E que o frio, ao vir, despia, 
Rasava, unia 
Num mesmo ar de deserto 
Ou de longínquas geleiras, 
Céus que lá em cima, estrelados, 
Boiando em lua, ou fechados 
Nos seus turbilhões de trevas, 
Pareciam engolir-me 
Quando, fitando-os suspenso 
Daquele silêncio imenso, 
Eu sentia o chão a fugir-me, 
– Se abriam diante dela 
Daquela 
Bela 
Varanda 
Daquela 
Minha 
Janela, 

Em Portalegre, cidade 
Do Alto Alentejo, cercada 
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros, 
Na casa em que morei, velha, 
Cheia dos maus e bons cheiros 
Das casas que têm história, 
Cheia da ténue, mas viva, obsidiante memória 
De antigas gentes e traças, 
Cheia de sol nas vidraças 
E de escuro nos recantos, 
Cheia de medo e sossego, 
De silêncios e de espantos, 
À qual quis como se fora 
Tão feita ao gosto de outrora 
Como ao do meu aconchego... 
Ora agora, 
Que havia o vento soão 
Que enche o sono de pavores, 
Faz febre, esfarela os ossos, 
Dói nos peitos sufocados, 
E atira aos desesperados 
A corda com que se enforcam 
Na trave de algum desvão, 
Que havia o vento soão 
De se lembrar de fazer? 
Em Portalegre, dizia, 
Cidade onde então sofria 
Coisas que terei pudor 
De contar seja a quem for, 
Que havia o vento soão 
De fazer, 
Senão trazer 
Àquela 
Minha 
Varanda 
Daquela 
Minha 
Janela, 

O testemunho maior 
De que Deus 
É protector 
Dos seus 
Que mais faz sofrer? 
Lá num craveiro, que eu tinha, 
Onde uma cepa cansada 
Mal dava cravos sem vida, 
Poisou qualquer sementinha 
Que o vento que anda, desanda, 
E sarabanda, e ciranda, 
Achara no ar perdida, 
Errando entre terra e céus..., 
E, louvado seja Deus!, 
Eis que uma folha miudinha 
Rompeu, cresceu, recortada, 
Furando a cepa cansada 
Que dava cravos sem vida 
Naquela 
Bela 
Varanda 
Daquela 
Minha
Janela

Da tal casa tosca e bela 
À qual quis como se fora 
Feita para eu morar nela... 
Como é que o vento soão 
Que enche o sono de pavores, 
Faz febre, esfarela os ossos, 
Dói nos peitos sufocados, 
E atira aos desesperados 
A corda com que se enforcam 
Na trave de algum desvão, 
Me trouxe a mim que, dizia,
Em Portalegre sofria 
Coisas que terei pudor
De contar seja a quem for, 
Me trouxe a mim essa esmola, 
Esse pedido de paz 
Dum Deus que fere ... e consola 
Com o próprio mal que faz? 
Coisas que terei pudor 
De contar seja a quem for 
Me davam então tal vida 
Em Portalegre; cidade 
Do Alto Alentejo, cercada 
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros, 
Me davam então tal vida
– Não vivida!, mas morrida 
No tédio e no desespero, 
No espanto e na solidão, 
Que a corda dos derradeiros 
Desejos dos desgraçados 
Por noites do tal soão 
Já várias vezes tentara 
Meus dedos verdes suados... 
Senão quando o amor de Deus 
Ao vento que anda, desanda, 
E sarabanda, e ciranda, 
Confia uma sementinha 
Perdida entre terra e céus, 
E o vento a traz à varanda ~
Daquela 
Minha 
Janela

Da tal casa tosca e bela 
À qual quis como se fora 
Feita para eu morar nela! 
Lá no craveiro que eu tinha, 
Onde uma cepa cansada 
Mal dava cravos sem vida, 
Nasceu essa acaciazinha 
Que depois foi transplantada 
E cresceu; dom do meu Deus!, 
Aos pés lá da estranha casa 
Do largo do cemitério, 
Frente aos ciprestes que em frente 
Mostram os céus, 
Como dedos apontados 
De gigantes enterrados...
Quem desespera dos homens, 
Se a alma lhe não secou, 
A tudo transfere a esperança 
Que a humanidade frustrou:
E é capaz de amar as plantas,
De esperar nos animais, 
De humanizar coisas brutas, 
E ter criancices tais, 
Tais e tantas!, 
Que será bom ter pudor 
De as contar seja a quem for! 
O amor, a amizade, e quantos 
Sonhos de cristal sonhara, 
Bens deste mundo, que o mundo 
Me levara, 
De tal maneira me tinham, 
Ao fugir-me, 
Deixando só, nulo, atónito, 
A mim que tanto esperava 
Ser fiel, 
E forte, 
E firme, 
Que não era mais que morte 
A vida que então vivia, 
Auto-cadáver... 
E era então que sucedia 
Que em Portalegre, cidade
Do Alto Alentejo, cercada 
De serras, ventos, penhascos, oliveiras e sobreiros, 
Aos pés lá da casa velha 
Cheia dos maus e bons cheiros 
Das casas que têm história, 
Cheia da ténue, mas viva, obsidiante memória 
De antigas gentes e traças, 
Cheia de sol nas vidraças 
E de escuro nos recantos, 
Cheia de medo e sossego, 
De silêncios e de espantos, – A minha acácia crescia. 
Vento soão!, obrigado 
Pela doce companhia 
Que em teu hálito empestado, 
Sem eu sonhar, me chegava!
E a cada raminho novo 
Que a tenra acácia deitava, 
Será loucura!..., mas era 
Uma alegria 
Na longa e negra apatia 
Daquela miséria extrema Em que vivia, 
E vivera, 
Como se fizera um poema, 
Ou se um filho me nascera.

In "FADO"

José Régio


Nas buscas do confinamento, achei hoje a foto que regista a minha passagem pela Casa do Poeta José Régio, em Portalegre, onde foi professor do Liceu. A Casa do Poeta não era um museu tradicional com peças expostas ao jeito museológico. Era, sim, um autêntico armazém de tudo o que o poeta foi encontrando e adquirindo, com predominância de Cristos. 
A cicerone, simpática, lá nos foi explicando o que estava à vista, mas o que mais me marcou foi o original da Toada de Portalegre, pousada na escrivaninha alta para o escritor se manter de pé ou sentado em banco alto, precisamente ao lado da janela "toda aberta ao sol"que o inspirou. Ficou-me para a vida. 

F. M. 

Felicidade



"Ninguém é dono da sua felicidade, 
por isso, não entregue sua alegria, 
sua paz e a sua vida nas mãos de ninguém, 
absolutamente ninguém!" 

Aristóteles, 
filósofo grego (300 anos A.C.)

Ria de Aveiro na literatura

Ribeiro Couto 
terá estabelecido relações literárias 
com Mário Sacramento 



RIA DE AVEIRO

Na ria de Aveiro
Quero um pequenino
Barco moliceiro.
Também sou menino.

Na ria de Aveiro
Podeis vir comigo,
Barco moliceiro
Nunca tem perigo.

Nunca se naufraga
Na ria inocente:
Da crista da vaga
Vêm braços à gente.

Quer vão ao moliço,
Quer soltem as redes,
O mar é submisso
Aos barcos que vedes.

Brancas, amarelas,
Na ria de Aveiro
Se espalham as velas:
Brinquedo ligeiro.

Também sou menino,
Ó moças de Aveiro!
Dai-me um pequenino
Barco moliceiro.

RIBEIRO COUTO
1944

Ribeiro Couto (1898-1963) terá passado por Aveiro em 1944 – pelo menos é essa a data do seu poema –, onde se deixou cativar pela graça quase alada dos barcos moliceiros. Caso Curioso, na mesma época estabeleceria relações de Índole literária com Mário Sacramento.“Aveiro e o seu Distrito”, n.º 20, Dezembro de 1975

Helder Pitarma Felgas recordado por amigos

Celebração  no Cemitério da Gafanha da Nazaré, 
dia 13 de Julho, 
14h30



Caros Amigos, conterrâneos e contemporâneos! 

Um grupo de Amigos do Helder Manuel Pitarma Felgas, na proximidade, da passagem dos 50 anos do falecimento (13 de Julho 1970-2020), em Pirada-Guiné, aquando do Serviço Militar nesta ex-Colónia Portuguesa, vem convidar todos aqueles que queiram e possam associar-se, com a sua presença, à Celebração que vai ter lugar no Cemitério da Gafanha da Nazaré, no próximo dia 13 de Julho, pelas 14h30. 
A Celebração vai ser presidida pelo nosso Pároco - Sr. Pe. César Fernandes, que com o Helder tinha(tem) uma coisa em comum, a saber: ambos da mesma família - Paraquedista! O Sr. Pe. César é Ex-Capelão Militar, com a patente de Tenente-Coronel Paraquedista. Em nome de todos os Amigos do Helder, queremos aproveitar para agradecer a disponibilidade do Sr. Pe. César, pois desde o primeiro momento abraçou a causa e disponibilizou-se, apesar de não conhecer o Helder, nem a sua Família. Muito obrigado, desde já, em nome de todos os Amigos! 
A Cerimónia consta do seguinte: 

Fanático, Idiota, Cobarde

"Quem não quer pensar, é fanático; 
quem não pode pensar pensar, idiota; 
quem não ousa pensar, um cobarde"

Francis Bacon (1561-1626), 
filósofo e ensaísta inglês

Em Escrito na Pedra de o PÚBLICO de hoje

Mário Sacramento - Um político inteiro