Crónica de Frei Bento Domingues
no PÚBLICO de hoje
Frei Bento Domingues |
1. No domingo passado, imediatamente depois da missa, na exígua sacristia, com uma fila de pessoas para atender, um amigo atirou-me a pergunta:haverá mesmo ressurreição? Respondi-lhe que o melhor seria ficarmos os dois a ler, a pensar, a escrever e a rezar essa interrogação durante toda a Semana Santa e não apenas a da liturgia oficial.
Entretanto, a morte de amigos ou de amigos de amigos, uns muito novos, outros mais idosos — umas vezes de modo fulminante, outras, depois de longo tempo de sofrimento — não descansou. Em muitas situações não é, em primeiro lugar, a chamada “ressurreição dos mortos” que mais nos interroga. Essa é, segundo a confiança cristã, cuidado de Deus. Mas a ressurreição de mulheres ou maridos vivos, com a morte na alma, sós, com crianças muito pequenas para criar, é nosso encargo.
Quando se mata para sempre o emprego de adultos na força da vida e se deixam os jovens, anos a fio, à espera de nada; quando se cortam nas pensões dos reformados e os idosos são reduzidos a sobrantes, a descartáveis, que fazer? Sem uma política de insurreição das comunidades católicas e das suas hierarquias eclesiásticas, pode ser alienante falar de ressurreição. Sem um levantamento cristão contra a injustiça, expulsámo-nos do amor transformante, da caridade teologal, como nos recorda o Papa Francisco.