sábado, 10 de outubro de 2009

Neurociências e liberdade




Com a biotecnolgia o novo continente científico é o cérebro, e a pergunta é se, com os avanços neste domínio, o enigma do homem será finalmente superado ou se, pelo contrário, ele permanecerá. Grandes debates se travam entre as neurociências e a filosofia, precisamente por causa de temas candentes e incendiários, como a subjectividade, a autodeterminação, a vontade livre.



Sobre estas questões, o conhecido filósofo e professor da Universidade de Tubinga Manfred Frank acaba de dar uma longa entrevista ao alemão DIE ZEIT. O que aí fica reflecte esse debate.



A questão da subjectividade pertence ao núcleo da reflexão humana. Embora algumas correntes filosóficas falem da sua dissolução, penso que o sujeito é ineliminável. Argumento, mostrando que a condição de possibilidade de objectivar - no caso do homem, de objectivar-se - é o sujeito, de tal modo que, por mais que objective de si mesmo, o homem nunca se objectivará completamente, já que continuará a ser o sujeito que (se) objectiva.



M. Frank também afirma que nunca será possível reduzir a consciência e o espírito a processos neuronais, e isso "por razões de princípio". Há uma questão de princípio: como explicam as neurociências a passagem de processos físicos inconscientes a processos mentais conscientes? "Não é possível substituir o saber sobre nós mesmos por um saber objectivo sobre o mundo." A subjectividade cai fora do mundo, não pertence ao mundo dos objectos.



O "eu" do autoconhecimento não é redutível àquilo a que nos referimos com nomes ou caracterizações. "A autoconsciência é um conhecimento único, reflexivo, no qual uma pessoa se refere conscientemente a si mesma, mas a si mesma em posição objectiva. Como poderia ela, porém, captar este eu-objecto como ela mesma enquanto sujeito, se, antes desta apresentação objectiva, não tivesse tido uma consciência inobjectiva de si?" Esta consciência inobjectiva quer dizer vivida, pré-reflexiva.



Permanece uma questão: "Quando identifico espírito com matéria, não identifico matéria com matéria." Trata-se como que dos dois lados de uma moeda, mas as condições de verdade do neuronal não se identificam com as do espírito: as primeiras encontram-se num tratado de fisiologia enquanto as dos estados mentais são verificadas introspectivamente, como viu Descartes. Isso é experienciado também ao nível do vocabulário, que é diferente para descrever o psíquico e o estado físico correspondente: não teria sentido exprimir a inclinação amorosa por alguém, descrevendo os processos electromagnéticos no cérebro.



A tese de neurocientistas que afirmam não haver, por detrás do alegado livre arbítrio, senão processos neuronais, que determinam a vontade, contradiz não só a compreensão jurídica de responsabilidade mas também a nossa própria autocompreensão: queremos ser autores racionais de mudanças no mundo - tentamos "tomar decisões racionais".



Para lá dos sistemas jurídico-penais, que pressupõem a liberdade, um exemplo. Suponhamos que alguém tropeça, sem querer, e, ao cair sobre outra pessoa, esta é apanhada por um carro e morre. Distinguimos muito bem esta situação daquela em que alguém empurra intencionalmente outra pessoa. E há esta virtude admirável: resistir moralmente à maioria. Os opositores ao Terceiro Reich "merecem o nosso sumo respeito", precisamente porque foram poucos e capazes de enfrentar a morte. Aí, "os neurocientistas têm muito para justificar no sentido de dar conta do correcto normativamente dessas decisões a partir de processos neuronais".


Tudo o que é essencial, quando pensamos na humanidade, "vinculamo-lo ao pensamento da subjectividade e não à nossa representação do cérebro. São sempre pessoas, sujeitos, que consideramos como criadores de literatura, cultura ou religião". Afinal, "temos cérebros e somos eus". Daí poder formular-se o imperativo categórico de Kant nestes termos: "Nunca trates os seres humanos como coisas, mas sempre como sujeitos e pessoas." Se o mundo consistisse só em objectos, não haveria ninguém a quem dirigir o preceito: "Porta-te decentemente com os outros sujeitos."



Para começar o dia


Grande Veleiro Canadiano Concordia entre nós



No seguimento da Regata dos Grandes Veleiros, realizada em 2008, com reconhecido sucesso que instituiu o Município de Ílhavo e o seu Porto de Aveiro com “friendly port”, vai estar entre nós mais um grande veleiro, o Concordia, pertencente a uma universidade privada do Canadá, a “West Island College International”.

O “tall ship class A” - SV Concordia - chega ao Porto de Aveiro no próximo dia 14 de Outubro, quarta-feira, aqui permenecendo durante cinco dias (largada a 18 de Outubro), com visitas em horário a definir proximamente.

A sua tripulação de 57 pessoas (dos quais 48 Alunos) terá um programa cultural e turístico durante o tempo da estadia, com centralidade no Município de Ílhavo.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

País real ou "Portugal dos pequeninos"?




Cada vez aparece mais lúcida e actual a expressão “país real”. Esse país que, de norte a sul, trabalha no campo ou nas empresas, nos serviços ou nas escolas, que luta pela justiça e pelo bem-estar, que sofre injustiças de que ninguém se acusa, solta gritos que ninguém ouve. País real, como lhe chamou Sá Carneiro, é este povo desconhecido de muitos que dele falam eloquentemente e até dizem que é ele quem ordena, e se julgam mesmo, ciclicamente, os legítimos delegados e defensores dos seus direitos.

Só conhece o país real quem se cobre com o pó dos seus caminhos, suja os pés na sua lama, gasta tempo a ouvir quem nele luta e é a reserva nacional do bom senso, da honestidade, do trabalho, do respeito, da verdade e da justiça a toda a prova. Povo que cresceu com a chave sempre na porta, aberta, como o coração, a quem chegava e, agora, se vê ameaçado e inseguro nas suas pessoas e bens, vendo admirado, incólumes e à solta, os profissionais da mentira, do assalto aos bens alheios, do ataque infame a idosos indefesos, do crime frequente. Povo com centenas de milhares de portugueses que não querem o pão dos subsídios, mas o salário justo de um trabalho certo.

Pó e lama deste povo significam a dor e os sacrifícios de milhões de portugueses que, aqui ou lá fora, lutam para viverem uma existência de pessoas, que muitos não a tiveram antes, e poderem transmitir aos filhos, com a educação que os prepare para a vida, os valores duradoiros que a tornam digna.

Pó e lama é a carência sofrida de muita gente que ainda não dispõe de meios para cuidar a tempo da saúde, nem possibilidade de uns dias de férias repousantes, necessárias e justas. É o esforço inglório de milhares de jovens para quem um diploma de curso é pouco mais que um papel inútil, e vêem voar o tempo, sem lobrigarem trabalho e condições para constituir uma família com estabilidade. É a dor inconsolável de muitos idosos que trabalharam uma vida inteira sem horários, antes do sol nascer e para além do sol se pôr, e, que hoje, sofrem com a míngua do pão, cada dia mais caro, e a premência de ter de contar os tostões para poder comprar remédios indispensáveis. Os passeios gratuitos por todo o país, com almoço incluído, que os políticos lhes proporcionam, não apagam carências essenciais do dia a dia, nem enxugam lágrimas choradas no silêncio das noites sem fim e, agora, de uma casa sem gente.

Muitas coisas melhoraram neste pai real. Mal seria se assim não fosse. Mas não se atribuam honras próprias ao que se faz por dever e sempre com o dinheiro que não é dos que governam. Nenhum bem social é favor, a que título seja, de políticos generosos.

Ao lado deste país há outro que, também, é Portugal. Quem vir os canais de televisão em concorrência, onde cada vez mais vale tudo, ler os jornais que procuram fugir à falência, vendendo títulos enganosos, folhear, ainda que só nas salas de espera dos consultórios médicos, as revistas cor-de-rosa que desvirtuam a vida e os sonhos de muita gente; quem reduzir os seus horizontes humanos e sociais ao mundo do futebol, perceber os objectivos, públicos e ocultos, de algumas juventudes partidárias, e mesmo de gente adulta que navega nas mesmas águas, observar a saída apressada das tocas e esconderijos dos que nela escondidos na hora da luta, investem logo que lhes cheira a proventos possíveis da morte ou da infelicidade de outros do seu mundo, ficará, com uma ideia razoável, ainda que não perfeita, do que é o “Portugal dos pequeninos”.

Intrigas e coscuvilhices políticas, até ao extremo, dão horas intermináveis a politólogos, jornalistas, políticos profissionais, gurus do pensamento e do saber, que esclarecem pouco e intoxicam muito. Tudo gente que só tem certezas, fala e não deixa falar, só as suas opiniões são verdades incontestáveis. Neste momento, Portugal são apenas duas pessoas. O resto é gente que não interessa. Neste país de gente pequena, os modelos em promoção reduzem-se a políticos vazios, futebolistas de milhões, gente fútil de telenovelas e passarelas… O povo que trabalha, esse não tem história.

António Marcelino

Para começar o dia: OBAMA Prémio Nobel da Paz


Obama

Acrescidas responsabilidades para Obama


Para começar o dia e o fim-de-semana nada, nada melhor do que uma excelente notícia. Obama, o Presidente dos EUA, é Nobel da Paz. Não pela obra feita, mas essencialmente pela esperança que espalhou no mundo de uma nova ordem social. Uma nova ordem social de mais paz, de mais solidariedade, de mais justiça.
Por mais justos que sejam os prémios, por mais oportunas que sejam as distinções e as honras, há sempre quem desdenhe, quem critique, quem discorde e quem diga mal das escolhas feitas. Contudo, penso que neste caso as discordâncias até servem para sublinhar a importância do Nobel da Paz atribuído a Obama. O Presidente da mais poderosa nação da Terra recebe com o prémio, talvez o mais apetecido, uma acrescida responsabilidade nas respostas aos problemas que dele todos esperam.

FM

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Crónica de um Professor: Negligência médica



Nesta era da globalização, é um lugar comum dizer-se que a comunicação está à distância de um click do rato, no computador.
Todos sabem e estão atentos aos rápidos progressos que as novas T.I.C.s (tecnologias de informação e comunicação) têm operado e o quanto têm influenciado a celeridade dos contactos interpessoais.
Sim, é um facto incontestável, a rapidez com que hoje se comunica. Partindo deste pressuposto, esperar-se-ia que as relações humanas fossem mais profícuas e até incrementadas. Seria, numa sociedade moderna que acompanha esta evolução tecnológica a seu favor.
O episódio que vou relatar, vem, infelizmente contrariar esta realidade e pôr a nu os podres duma sociedade enferma, em termos de comunicabilidade.
Tive conhecimento através de pessoa amiga, dum caso de omissão em efectiva comunicação.
Aconteceu ali na Costa Nova, quando por imperativos de solidariedade humana, uma pessoa chamou os serviços do INEM, para socorrer um senhor que estava a sofrer aquilo que se pensava ser um acidente vascular cerebral. Pelo menos, foi isso que pareceu à senhora, detentora de uma provecta idade, cuja longa experiência de vida lhe consente fazer este diagnóstico clínico. Dada a gravidade da situação, a senhora insistia na urgência da vinda do INEM, relatando sumariamente os sintomas do acidentado. Do lado de lá da linha telefónica, ouvia uma voz feminina a inquirir com uma curiosidade mórbida, em contextos destes, todos os sintomas e reacções do indivíduo, em questão. Estranhando tal atitude, nesta situação de urgência interventiva, insistia a senhora que não se podia estar com aquela minúcia, já que ali, estava a vida duma pessoa em jogo. Foi tal a demora no atendimento do pedido de socorro, que o nervosismo começou a apoderar-se dos familiares do doente e no auge do desespero, chegou a haver uma troca ácida de palavras, entre os dois lados da linha O senhor entrou em paragem respiratória, que se a princípio era intermitente, passou a ser contínua…acabando o senhor por falecer.
Aí, vem ao de cima a inoperância dos serviços médicos de instituições como o INEM, ou…de pessoas inaptas para o serviço que desempenham.
Chegaram a vir, tarde e a más horas, justificando a demora com a ocorrência de chamadas indevidas de pessoas que brincam com estas situações da emergência médica. Fica a pergunta: será que haverá criaturas tão desmioladas que se põem a brincar com coisas tão sérias como a vida das pessoas? Custa a crer que haja de facto brincadeiras deste mau gosto, que sirvam de justificação para se perderem vidas humanas. E…ainda que tais situações tenham já, ocorrido, pontuais, depreende-se, nunca se poderá fazer uma generalização. É de lamentar, profundamente, que tais erros humanos ainda aconteçam em pleno século XXI.
E…lá no fundo fica a perplexidade da pergunta: tendo isto ocorrido no dia 5 de Outubro, será que o pessoal também fechou a loja para desfrutar do feriado e deixou lá alguém incompetente para as funções de alta responsabilidade que lhe estão acometidas?
Perdeu-se uma vida e nada no mundo poderá ocupar o vazio que ela deixou.
Fica aqui o aviso: a família da vítima tenciona recorrer judicialmente para apurar das responsabilidades e muito bem!

M.ª Donzília Almeida

08.10.09

O FIO DO TEMPO: Povo que Participas?


AMÁLIA
NO TOPO
DA MONTANHA


1. A incontornável Amália (1920-1999) tanto cantava com a nostalgia lusitana «povo que lavas no rio…». As tábuas de Amália continuam a ecoar, quer numa maravilhosa nova geração de fado quer na candidatura do Fado Português a património da Humanidade na UNESCO. Uma ideia que dá que pensar é como o fado, a cantiga da alma das gentes, fez um caminho admirável até aos palcos internacionais, percurso esse de uma irreverência criativa, mas que, predominantemente, revela uma face saudosa que muitas vezes, mais que mobilizar activamente, poderá fazer parar nostalgicamente. Não é linear, nem o fado tem muitas regras, como se sabe… Sabe-se e reconhece-se a originalidade do fado, enaltecido por tantos nomes que terão na Amália o topo da montanha.

2. Se muitos sentimentos reflectidos no fado poderão até ser reflexo de conjunturas sociopolíticas, a verdade é que a canção portuguesa nunca se deixou aprisionar e traz sempre consigo a ânsia de novos mares a navegar. Também é verdade que pertencerá à história da identidade nacional, sem mitologias excessivas, que o fado como destino da aceitação de tudo e tristeza que paralisa reflecte-se naqueles estudos europeus ou mundiais que volta e meia nos dizem que somos mais tristes que alegres, nostálgicos do passado que empreendedores do futuro(?). Claro que o fado não tem culpa de nada, ele acontece, reflecte, manifesta, espelha… O fado poderá aliar a memória da tradição ao projecto visionário e aventureiro do amanhã? Claro que sim, as gentes do povo têm a “caneta” nas mãos em cada dia…

3. Não parece mas eis-nos diante de outro acto eleitoral de altíssima responsabilidade cívica. O fado de que tudo está mal ou tudo está bem (até porque tal nunca é verdade) não pode aprisionar e limitar a intervenção dos cidadãos. Povo que participas…! Mais que uma questão que seja a afirmação convicta de todos serem actores da construção do bem comum. Só a participação dá razões para a exigência! Dar frescura ao fado!

Alexandre Cruz

Universidade Sénior da Fundação Prior Sardo



                               
Portas abertas à partilha de saberes


Comecei o meu dia no blogue com artes. Penso que as artes devem estar sempre nos nossos horizontes, porque a beleza dá outro sentido à vida. Tal como a bondade, a tolerância e o amor. Mas hoje também poderia começar com outros temas enriquecedores, como a solidariedade, a disponibilidade e a beleza da partilha. É que, a abertura do ano lectivo da Universidade Sénior da Fundação Prior Sardo, que ocorreu da parte da manhã, suscitava isso mesmo.
Mais de meia centena de pessoas interessadas em partilhar saberes e alguns jovens (e menos jovens) disponíveis para as acompanhar e animar, nessa troca de conhecimentos, marcaram significativa presença na sede da Fundação Prior Sardo.
Afinal, e ao contrário do que muitos pensam, há gente que gosta de dar e de receber cultura e valores, que emprestam mais vida à vida de cada um e de todos.
Gostei de tudo, mas não posso deixar de valorizar o precioso contributo de jovens, abertos ao convívio com uma geração mais idosa, que não velha. Idosos que não são velhos são aqueles que acreditam que o saber não ocupa lugar, que há continuamente razões para aprender mais e para dar o seu saber a outros.
Jovens que podiam ser meus netos, mas que ali estavam animados pelo prazer de pôr em comum o que podem (e podem muito) e sabem dar.
Quando vejo uma certa juventude mais voltada para futilidades, mais aprecio esta, que cultiva a solidariedade, a disponibilidade e a beleza da partilha.

FM

Nota: Inscrições e Informações na sede.

 

ARTE PARA COMEÇAR O DIA: Sobre a Igreja de Santa Maria, de Siza Vieira


Igreja de Marco de Canavezes

A substância dos sonhos é a luz

A igreja de Santa Maria nasceu duma necessidade, mas depressa se tornou num sonho. Há realidades assim: nascem como nascem os dias, previsíveis, com uma determinação habitual. E depois, há um lanço de luz, um encontro essencial, uma notícia, sei lá, uma dobra do tempo súbita e surpreendente, que tudo alteram. A igreja de Santa Maria (na altura, apenas a igreja nova) era mais uma igreja que era necessário construir, como muitas vezes e em muitos lados acontece. Um dia, talvez ao acordar, tomei consciência do fardo enorme que os meus ombros teriam de suportar. O que fazer, como fazer, por onde começar?

Nuno Higino

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quarta-feira, 7 de outubro de 2009

O FIO DO TEMPO: Ajudar é em tempo real



1. O turbilhão do sismo e tufões tem marcado os dias difíceis da costa asiática. Indonésia e Filipinas, especialmente, foram fustigadas por tragédias naturais que nos devem deixar a pensar. As designadas sociedades de bem-estar ocidental são, volta e meia, abaladas por imagens de tragédias cuja proveniência sendo de longe se fazem bem perto. Se o tsunami de 2004 teve grande impacto na consciência do mundo, seja registado o dado histórico que estas chuvas torrenciais de há mais de uma semana bateram os máximos registados desde 1976, tendo inundado mais de 80% de Manila (capital das Filipinas) e provocando centenas de mortos e desaparecidos. Em zonas do planeta tão frágeis, em termos de construção civil para as gentes do povo, poder-se-á dizer, o safanão da natureza provocou estragos em casas e edifícios atingindo alguns milhões de pessoas.

2. Números são números, pouco valem, porque o que conta é cada pessoa que sofre. Esta visão personalista da vida e dos valores humanos aplicados na solicitude para com cada ser humano faz-nos ficarmos sensibilizados para com cada situação. É esta a alma que é a chama sempre nova da multidão de missionários modernos que são presença de apoio humanitário. Muitas coisas (mesmo passos e ideias em termos de clubismos ou visões sociopolíticas e religiosas) poderão ser questionáveis, mas o que nunca o será é o espírito do «amor ao próximo», esta a autêntica escola da vida que gera futuro. Nesta hora da tempestade merecem lugar de apreço especial as organizações que largam a teoria e partem para o lamaçal. Apoio em termos de saúde e de alimentação são nesta hora a presença da «salvação».

3. Milhares de pessoas soterradas, cerca de mil mortos e uma multidão de deslocados. Nesta hora da necessária ajuda em tempo real a AMI – Assistência Médica Internacional está lá (www.ami.org.pt). Nas Filipinas e Indonésia, como em tantos outros locais, aqui e ali, é hora do essencial: gerar espírito de serviço.

As minhas reportagens: Banco do Tempo de Ílhavo


Maria das Dores, Jorge Neves e Maria de Lurdes


O Banco do Tempo
é o único que não vai à falência


“Aqui, no Banco do Tempo (BT), não queremos dinheiro nem subsídios de ninguém, apenas queremos dar horas e receber horas; o BT é o único que não vai à falência.” No final da entrevista, Jorge Neves, um dos coordenadores do BT de Ílhavo, sintetizou de forma lapidar o que é esta estrutura, criada pelo Graal.
Aposentado das suas obrigações profissionais, pensava que ficaria livre, mas está completamente ocupado. “110 por cento envolvido em trabalhos de casa, pertenço ao Grupo Poético de Aveiro, digo poesia e estou no BT”, disse.
O “bichinho” da solidariedade surgiu-lhe quando o Diniz Vizinho, “que é o maior entusiasta deste projecto”, o convidou, em 2008, para o ajudar a reorganizar o Banco, que estava um tanto ou quanto adormecido, depois de ter sido criado em 2002.
As dificuldades que encontraram foram muitas, mas tudo se compôs e hoje já há 50 pessoas que aceitaram trocar horas, ao jeito do espírito de vizinhança, o qual está a perder-se com o corre-corre da vida dos nossos tempos.
Segundo Jorge Neves, “os ilhavenses mostravam-se um pouco cépticos, à espera do que isto iria dar; também mostravam algumas reticências em admitir que alguém entrasse em suas casas, para partilharem ajudas”. E acrescentou: “As pessoas gostam mais de dar do que pedir.”
Sabendo que é cada vez maior o número de idosos nas nossas comunidades, graças à esperança de vida que continua a crescer, Jorge Neves adiantou que muitos ficam “inactivos e descrentes da vida, caindo na solidão”. Torna-se necessário, por isso, envolver essas pessoas em tarefas que lhes dêem prazer. E explicou: “durante a vida profissional faziam sempre as mesmas coisas, deixando de lado gostos que ficaram à espera de poderem ser realizados; agora podem concretizá-los, porque têm tempo para isso; só precisam de ser estimulados, tarefa que nos cabe a nós.”
Recordou o caso de uma senhora que vive só, porque os filhos trabalham e residem longe. “Um dia foi apanhar umas folhas de couve ao quintal para uma sopinha; sentiu-se mal e caiu; sem poder levantar-se, ali ficou 24 horas, suportando o frio da noite e a angústia de não ter quem lhe valesse. Passado esse tempo, uma vizinha estranhou a sua ausência e foi encontrá-la naquela situação. Felizmente resistiu.”
“Este exemplo – sublinha – leva-nos a cultivar o gosto de olhar para o lado, porque a solidariedade não é nem pode ser uma palavra vã; tem mesmo de ser vivida e trabalhada 100 por cento, por cada um de nós e por toda a comunidade.”
Maria de Lurdes está no BT desde o início. A primeira fase foi desanimadora, mas agora, felizmente, há mais motivação. Neste momento dedica quatro horas semanais à confecção de bonecas, em colaboração com Maria das Dores, para serem enviadas para a Guiné.
Muito importante foi, sem dúvida, conseguir estimular um vizinho que ficou sem as pernas de um dia para o outro. Como é membro do BT, envolveu-o na tarefa das bonecas. “Quando lhe falei para colaborar, ele ficou muito emocionado”, frisou a Maria de Lurdes. E explicou: “O BT tem de olhar para casos de pessoas que estão em situação difícil e que precisam de incentivos, para não pensarem nas doenças.”
A Maria de Lurdes confessa que não gosta muito da cozinha. “Se puder fugir da cozinha, fujo!” Por isso, pediu ao banco alguém que a pudesse ajudar na confecção de comida para uma filha, que exerce a sua profissão no Porto. E lembrou que os pedidos e ofertas de horas têm de ser feitos no BT, directamente ou pelo telefone. “Isto não é um clube de amigos”, referiu.
Uma senhora aderente logo se prontificou a fazer aquilo que a Lurdes desejava. Como as trocas podem não ser directas, outros membros do banco trataram-lhe do jardim e pintaram-lhe uma parede. A Lurdes, contudo, já foi passar a ferro.
Maria das Dores, que colabora na confecção das bonecas, também aderiu ao BT desde a primeira hora. Ofereceu-se, no acto da inscrição, para estar com idosos necessitados de companhia, escrever cartas e ler a quem não o possa fazer, ajudar em tratamentos, seguindo instruções de enfermeiros, e cuidar de crianças.
Considera importantíssimo o espírito de entreajuda, o que a leva a falar do BT, com o objectivo de cativar mais gente para este serviço. Os que aderem precisam, naturalmente, de ser apoiados na integração. Mas a Maria das Dores ainda lembrou outras tarefas, entretanto programadas. Como Ílhavo é uma terra de marinheiros, sabe-se que muitos homens, com carro próprio, já não podem conduzir, estando impossibilitados de ver o mar e de passar pelas nossas praias. Pois isso vai ser feito, com alguém do BT a conduzir os seus carros.
Jorge Neves esclareceu que os membros do BT não são apenas pessoas reformadas ou aposentadas. “Temos bastantes com os seus empregos, incluindo crianças.” Crianças? E apontou três exemplos: “Uma, depois de ouvir histórias contadas pela avó, começou a contar-lhe as suas próprias histórias; outra veio ao banco pedir que lhe indicássemos uma colega que quisesse passear com ela de bicicleta; outra, menina de 13 anos, ofereceu-se para fazer fosse o que fosse; as primeiras tarefas foram passar a ferro no Lar de São José e andar com velhinhos nas suas cadeiras de rodas.”
O Lar de São José foi o aderente n.º 1. Nessa linha, o BT substitui alguma voluntária que falte, na hora de passar a ferro, e no Verão disponibilizou-se para conduzir o autocarro do lar, transportando os idosos para a praia e acompanhando-os.
O BT de Ílhavo está ligado ao Banco Central, coordenado pelo Graal. Há uma rede de 27 BT no país, todos motivados para apoiar a família e a conciliação entre a vida profissional e a vida familiar, através da oferta de soluções práticas da organização da vida quotidiana. Desta forma, pretende-se construir uma cultura da solidariedade, promovendo o sentido de comunidade, o encontro de pessoas que convivem nos mesmos espaços e a colaboração entre gerações. No fundo importa construir relações sociais mais humanas, valorizando o tempo e o cuidado dos outros, estimulando os talentos e promovendo o reconhecimento das capacidades de cada um.
Em Ílhavo, o BT mantém uma parceria institucional com a paróquia de São Salvador, contando com apoios pontuais da CGD (para a confecção de cartazes), Jornal Ilhavense e Rádio Terra (para a difusão dos ideais e projectos do banco) e Junta de Freguesia (para despesas de água, luz e telefone).

Fernando Martins
 

Caras e corações


Será que existe a razão pura? Sem mancha de interesses ocultos, envolvências afectivas, ziguezagues de simuladores ardilosos? Segundo Kant essa razão cristalina, límpida, transcendental, criaria a grande base da ciência. Se é possível ter acesso à ciência, também é possível ter acesso ao bem.
Que terá tudo isto a ver com as eleições, concretamente as autárquicas?
A verdade do governo da cidade não vem muitas vezes duma ideologia, dum projecto, duma razão pura e objectiva. Nem sequer dos confrontos teatrais ou cómicos largamente expandidos nas televisões. Desta vez não há figuras mitificadas pelos media.
Estamos perante um voto de proximidade, vizinhança, com nome familiar, presença nos acontecimentos da comunidade, que ajuda a desenhar a cidade velha e a construir a nova cidade. Mas também a rua, o bairro, o muro, a casa, a janela, o canteiro das flores e o candeeiro em frente. Esse rosto tem poder, o seu governo, os seus ministros, que se reúnem, discutem e decidem. Aprovam e recusam, erguem e derrubam. Tudo ao pé da porta, com gente que a terra viu nascer, fazer-se doutor ou engenheiro, ou nunca aprendeu nada na vida a não ser passear-se por gabinetes e riscar sentenças. Certas ou erradas, desabam sobre o quotidiano da comunidade, no caminho que percorre, no asfalto às ondas ou nas estátuas por vezes inúteis que nada assinalam a não ser quem as mandou construir. Mas também quem se dá pela comunidade, a acompanha na sua festa e na sua dor. Quem vê e acompanha por dentro os grandes tempos e as rotinas da aldeia deserta e esquecida.Com testemunhos históricos: o pelourinho, a igreja, a escola, festa anual e esse orgulho com que cada um diz que esta é a sua terra.
Grande parte dos votos tem este cenário e recai sobre pessoas mais que conhecidas. Por isso se pergunta: será que o coração deixa funcionar a razão na eleição dos governantes locais? Será a comunidade lúcida na escolha dos homens e mulheres que vão gerir os seus destinos? Não será necessário escolher os melhores em vez dos mais amigos e simpáticos? Haverá democracia na miscelânea de interesses imediatos e de conluios com caciques com fachada de benfeitores?
Evocar Kant para lembrar que a razão deve funcionar nos grandes tempos pessoais e comunitários, é apenas aceitar que importa ver corações para além das caras. E que, como disse Jesus: “a verdade vos libertará”. (João 8, 32)

António Rego

terça-feira, 6 de outubro de 2009

IMIGRANTES: Portugal é o país mais generoso




Ao nível do acolhimento dispensado aos imigrantes, as Nações Unidas consideraram o nosso País como o mais generoso de todos. Assim  o afirma o Relatório do Desenvolvimento  Humano de 2009, ao sublinhar que Portugal foi considerado o mais bem classificado na atribuição de direitos aos imigrantes, em especial nas áreas da educação e da saúde. Por isso,  não vale a pena passarmos a vida a gritar que somos maus em tudo. Não somos. Neste como noutros sectores, estamos, afinal, bem classificados.

AMÁLIA: A minha simples homenagem


O FIO DO TEMPO: O lugar da UNESCO




1. Olhando os sinais do mundo, para além da agitação de campanha do nosso quotidiano mais próximo, valerá a pena reparar em importantes passos andados na UNESCO. Se a educação, nos países de liberdade democrática, é apresentada como o factor essencial de progresso humano e social, então as instâncias mais amplas na proposta de indicativos para a educação hão-de ter lugar de referência central. A UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), cujo lugar-sede é em Paris, é uma dessas organizações primordiais que têm emanado continuamente e com pertinência documentos, recomendações e conclusões a propósito das mais variadas matérias.

2. A UNESCO foi fundada a 4 de Novembro de 1946, «com o objectivo de contribuir para a paz e segurança no mundo mediante a educação, a ciência, a cultura e as comunicações». Com propósitos tão nobres o seu lugar haveria de sair reforçado, sendo os seus preciosos documentos resgatados do público especializado para o público em geral. Por vezes é estranho observar como, quer na sociedade do conhecimento e da comunicação, quer nos designados sistemas educativos formais, ainda há tão pouco lugar para estes grandes documentos estruturantes, pensados por investigadores de diferentes formações e culturas. Como é possível que sobre determinados assuntos de plena actualidade haja tão pouco lugar para o pensamento daqueles que já passaram pelas mesmas dúvidas socioeducativas que hoje temos?

3. A UNESCO a 23 de Setembro elegeu para directora-geral a diplomata búlgara Irina Bukova. É a primeira mulher eleita para a responsabilidade de presidir à UNESCO. Do seu programa de ideias destacam-se, no espírito das raízes da organização, o respeito pela cultura da paz e o património cultural como factor de desenvolvimento. Eleição que honra a instituição em fase de renovação e que poderá despertar a comunidade para que o lugar da UNESCO seja a casa de cada um.

Alexandre Cruz

Por que razão prefiro o jornal i?




Nunca gostei de virar a cara a novos projectos jornalístico. Acontece, porém, que a maioria das vezes me fico pelos primeiros números e logo desisto, quando verifico que, afinal, é mais do mesmo. Com o i não foi assim. Fui-me habituando à arrumação diferente e a uma escrita simples, objectiva, sintética. As crónicas e reportagens, de um modo geral, dizem o essencial, com sínteses bem elaboradas e sem mais complicações.

Os editoriais, marcados pela actualidade, são esclarecedores. Entrevistas que não cansam e temas que muitos esquecem. Enfim, um jornal que se lê com agrado, fácil de manusear, com as folhas presas por agrafos, evitando o tempo que se perde para o manter em ordem.

Foi tudo isto, e mais, o que disse a quem me tem questionado por mudar de jornal diário. Até no quiosque estranharam a mudança. Mas a vida tem destas coisas. Quando é preciso mudar, não podemos nem devemos ficar agarrados a sentimentalismos.

Curiosamente, há dias li a notícia de que o director do i havia sido convidado para um congresso, na Índia, de directores de jornais, porque se tratava de um jornal inovador. Hoje, li que o “Guardian” classificou o i como um dos jornais mais inovadores do mundo. E acrescenta a notícia: “Depois de apresentar as quatro secções do novo diário português como ‘radicalmente invulgares’, o britânico salientou o design do jornal, por ‘responder àquilo que os leitores procuram’”. Agora, só leio o PÚBLICO quando sei que nele escrevem cronistas que aprecio. Afinal, não me enganei com a mudança.

FM

Rir é, mesmo, o melhor remédio

O riso é remédio santo para muitos males



No Diário de Aveiro vi uma notícia que me despertou a curiosidade e que merece uma atenção especial. Fala ela de Mónica Arvins, que abriu uma turma de Risoterapia, na Gafanha da Nazaré. Pela novidade e talvez oportunidade, quando a sociedade nos obriga, com frequência, a andar tristonhos e cabisbaixos, vale a pena pensar numas boas risadas programadas e sabiamente orientadas. Leia aqui e não fique parado. O riso, afinal, desde tempos imemoriais, é remédio santo para muitos males.

Ainda a Praia dos Tesos


São Jacinto ao fundo

Praia tranquila e de águas baixas


Há tempos falou-se muito da Praia dos Tesos, a propósito da praiazinha que o Jardim Oudinot nos oferece. Jornais e rádios falaram dela diversas vezes e eu próprio fui na onda. Depois vieram os protestos, oportunos, de alguns amigos meus, que não aceitaram bem, com razão, o meu lapso. Fiquei de esclarecer o meu engano, mas a verdade é que não o fiz a tempo e horas.

O meu amigo Diamantino Ribau, contudo, foi mais além. Pegou num papel e fez a planta da verdadeira Praia dos Tesos, com pormenores de quem tem excelente memória, para me ajudar a recordar, com precisão, o local exacto dessa praia.

Passei com ele um bom bocado a reviver pessoas e factos que ajudaram a fazer a história, irrepetível, daquela praia, que nada tinha a ver com gente sem dinheiro.

A Praia dos Tesos ficava, pois, frente a São Jacinto, um pouco depois do campo de futebol, onde a União Desportiva Gafanhense e depois o seu sucessor, o Grupo Desportivo da Gafanha, treinava e recebia os clubes visitantes para jogos de muito entusiasmo. Um pouco adiante, havia um largo, redondo, a que chamavam campo dos cavalos. A seguir, vinha a praia. Era, na verdade, uma praia tranquila, frequentada por famílias com crianças e não só. Num espraiado, a água da ria permitia que crianças brincassem à vontade, porque não havia  fundos abruptos e perigosos, por isso. Apenas chegava aos joelhos, se tanto.

Essa ideia de lhe chamarem Praia dos Tesos talvez tenha saído da cabeça de alguns, que identificavam as Praias da Barra e da Costa Nova como as praias de gente rica. Seria?

Fernando Martins

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

5 de Outubro de 1910: efeméride pouco festiva






Uma sociedade mais justa
é possível e necessária entre nós


Hoje não me apeteceu celebrar a implantação da República no nosso País, que teve lugar há precisamente 99 anos. Só porque me lembrei do que aconteceu em Portugal, desde esse dia até ao 25 de Abril. No entanto, quem quer olhar o país e o mundo pela positiva tem de acreditar nos homens que dia a dia desejam construir um mundo melhor.

O Presidente da República, Cavaco Silva, exortou, em cerimónia significativa,  à união em torno dos “grandes ideais republicanos”, sublinhando que esses ideais exigem um “esforço acrescido para a concretização da ética republicana e para a transparência na vida pública”. E isso mesmo devia levar-nos a acreditar que é sempre tempo de se iniciar o caminho da dignificação da nossa democracia, ligada quase há 100 anos ao regime republicano.

É certo que devemos esquecer guerras fratricidas entre portugueses, que a implantação da República suscitou e até alimentou, e temos de reconhecer que, 100 anos após essa data, existem razões mais do que suficientes para crer que uma sociedade mais justa é possível e necessária entre nós.

Depois da primeira república, marcada por desordens, perseguições, assassínios e fuga às mais elementares regras democráticas, que geraram o caos e deram lugar à ditadura da segunda república do chamado estado novo, estamos agora na terceira, já com 35 anos de vida.

Uma vida com 35 anos de idade é uma vida adulta, mas nem sempre os comportamentos dos portugueses, os actuais republicanos, identificados com uma nova ordem social para o nosso País com tantos séculos de existência, têm sido os adequados para uma sociedade mais fraterna e mais democrática. Nos últimos tempos, como é sabido, têm sido muitas as ofensas à verdade e à liberdade, bem como ao sonho de um País novo, de mais progresso e de mais justiça social, que nem me apetece cantar essa efeméride. Pode ser que um dia destes acorde com outra disposição.

Fernando Martins

A Hora da Saudade no Rádios Antigos no Ar


Pesca do Bacalhau


A Hora da Saudade, de que há meses falei no meu Pela Positiva, foi agora recordado pelo coleccionador António Rodrigues, no seu site Rádios Antigos no Ar. Tema para eu, como outros, reviver, porque o assunto, na época em que aconteceu, suscitava grande interesse. Hoje, praticamente, ninguém evoca a Hora da Saudade, que levava pelos ares a nossa voz emocionada e feliz, até junto de familiares que labutavam no alto mar por uma vida melhor para os seus. Leia mais aqui.

Rio de Janeiro, Olimpíadas 2016





Estes acontecimentos,
do desporto como educação social,
inspiram o melhor

1. Já há bastante tempo que o Brasil é considerado uma potência económica emergente. Este referencial de «potência económica» pouco interessará se a sua aplicação em termos de desenvolvimento humano não se reflectir em progresso social. O Brasil pertence ao grupo designado BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China), países que, quer pela sua grandeza geográfica quer, especialmente, pelo seu potencial em determinadas áreas, afirmam-se como líderes em termos regionais e mundiais. A grandeza do Brasil (que engole a Europa!), país irmão de Portugal, reflecte bem o paradigma intercultural que é característico dos países de cultura em língua portuguesa. Sejamos claros, a CPLP (comunidade dos países de língua portuguesa) “agradece” a confirmada capacidade de liderança do Brasil!

2. A segunda década do século XXI terá no seu meio dois acontecimentos incontornáveis que trazem o país do samba para a ribalta mundial. No ano 2014 o Brasil receberá o Campeonato do Mundo de Futebol da FIFA, dois anos depois o Rio de Janeiro recebe a edição dos Jogos Olímpicos. É palavra obrigatória dizer-se que se trata dos dois maiores acontecimentos desportivos mundiais, com o que tudo isso acarreta de milhões visitantes capacitando as grandes cidades brasileiras para acolher tamanhos eventos. As primeiras olimpíadas que «falam português» são, para a cidade maravilhosa, uma altíssima responsabilidade. Como o presidente Lula da Silva referiu, embora pareça que não falta muito tempo, cada ano e cada mês têm metas humanas e sociais de construção a atingir.

3. A obra e a alma que estes acontecimentos transportam, para além de tudo e depois de tudo, representam, para o Brasil como para a América Latina, um fortalecer da esperança social. Sabe-se da convulsão que alguns países atravessam e da necessidade de um Brasil consistente para os equilíbrios geopolíticos regionais. Estes acontecimentos, do desporto como educação social, inspiram o melhor.

Alexandre Cruz

no outono da tua nossa solidão



na minha língua

com esse giz
com esses
pontinhos brancos
que nascem
na minha
nossa rua
escrevo o teu nome
nas fronteiras cegas
da minha
nossa língua
da tua
nossa lua


no copo vazio
da tua
nossa aventura
no deserto
da tua
nossa cidade


no outono
da tua
nossa solidão
beijas sapos
com timidez


príncipes
donzelas
cavalos suados
feridas abertas
livros despidos
ou
apenas
a música
dos teus lábios
na minha língua

orlando jorge figueiredo

domingo, 4 de outubro de 2009

Boris Altivo




Boris altivo
.

Bonacheirão
Obediente
Reguila
Irreverente
Sorninha!

Donzília Almeida

Dia Mundial do Animal

Tita

Totti
Animais nossos amigos


Cá em casa há animais tratados como gente. A Tita e o Totti (canídeos) e a Guti e a Biju (felinos). A Tita e o Totti usufruem de um quintal amplo e de algumas divisões da casa. São animais asseados, tratados a rigor, vigiados pelo veterinário, alimentados com rações seleccionadas e com amigos que brincam com eles. Costumo dizer que só lhes falta falar. Entendem o que dizemos e interpretam bem os nossos sentimentos. Estão alegres quando estamos alegres e tristes quando estamos tristes. Conhecem-nos pelo nome, percebem quando acordamos, chamam-nos quando precisam da nossa atenção, envolvem-nos, como se cordas fossem, para nos levarem para o quintal. Aí, dão sempre umas corridas, ladram a qualquer ave que se cruze com eles, gritam quando pressentem um ratito. Mas se regressamos a casa, logo deixam tudo para nos acompanharem.

Dormem a sesta como qualquer ser humano, agitam-se com qualquer petisco e procuram o aconchego da família quando troveja. Não gostam de foguetes nem de ciclistas que passem pela rua. Se os deixássemos, era perseguição certa. Nunca percebi porquê.  Qualquer animal estranho desperta neles uma curiosidade muito grande. Há dias, num quintal vizinho, apareceu uma cabra. Ficaram admirados. A primeira reacção foi ladrar; depois, tempo sem fim a contemplá-la.

As felinas são diferentes. Mãe e filha dormem sem conta nem medida. Nos seus aposentos, sótão e outras salas, onde não mora ninguém, vivem a sua solidão e a sua independência. Comem e dormem regaladas, sob a paciência de quem sabe.  De quando em vez descem tranquilas e vão espreitar o ambiente pela janela. Ali ficam absortas nos seus pensamentos misteriosos. Depois descem ao quintal, mas cedo regressam, decerto com saudades da pacatez que as anima. Não incomodam ninguém e também não gostam que as incomodem a elas.

Dentro de casa são elas quem manda. O Totti e a Tita têm-lhes muito respeitinho. Nem conseguem cruzar-se com elas. Mas no quintal, ai delas se não fogem desabridamente.

É bom sentir a amizade dos animais. É uma amizade leal e franca. Não é verdade que há gente que diz, com propriedade, que, “quanto mais conheço os homens, mais gosto dos animais”? Eu também, em alguns casos, claro!

FM

Bilhete-Postal


Meu Pai, meu Filho, meu Espírito Santo

Estendo as mãos à caveira da noite, e a criatura que sou consome-a a areia do vidro do tempo. nada digo que não te pertença, nada escrevo que não corra à eternidade.
De cada vez que caio subo mais alto, e ao encontrar-te, voo acima de mim mesmo. Aquieto-me contigo, com o pão e o vinho, e não há luz que pese como o absoluto cristal do ar.
Mas quando o teu rosto se afasta, e a treva se desdobra, o Mundo fica um caroço de mágoa que endurece no lugar do coração.
Livra-me da tua ausência. Fica comigo enquanto o dia acaba.

Mário Cláudio

In Cartas a Deus