sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

O QUARTO REI MAGO



Uma lenda russa, recuperada da memória do tempo, narra o percurso de um quarto rei mago que demanda o Recém-nascido em Belém. A sua narrativa afirma que os magos eram quatro e não apenas três.
Melchior, Gaspar e Baltasar são nomes postos pelo Papa S. Leão a estes três conhecidos cujos restos mortais são levados para Colónia, no século XII, por ordem do imperador Frederico Barba Roxa. A essa cidade alemã, acorrem então muitos peregrinos, facto que está na origem da construção de um dos monumentos góticos mais célebres na Europa – a célebre catedral.
Do quarto, somente a lenda russa lembra alguns episódios. Não tem nome nem terra. Ninguém sabe o que faz ou o que diz ao longo do caminho. Apenas consta a dura viagem no seu jumento envelhecido e cansado. Apenas se sabe que no seu alforge leva um pote pequeno de vinho e outro de azeite.
A marcha é lenta, o percurso difícil. O rei lança o olhar por tudo quanto pode ver. Sempre que encontra desolação ou miséria, pára e socorre os aflitos conforme as suas magras posses.
Quando chega a Jerusalém, já tudo o que é conhecido tinha ocorrido: A conversa com Herodes; a assembleia dos sábios conselheiros; a deslocação e o reaparecimento da estrela; a saída precipitada dos outros reis magos que nem sequer deixaram rasto. Apesar de tudo, não desiste e sozinho continua a seguir o que lhe pede o coração. Com muito esforço, consegue chegar a Belém, terra desolada onde reina grande alvoroço e dor. José havia tomado o Menino e sua Mãe, fugindo para o Egipto.
Sem encontrar aquele que procura com tanta persistência – pois mais uma vez tinha chegado tarde –, apenas dá conta do pranto das pessoas e das chagas de tantas mães que lutaram incansavelmente para defender os seus filhinhos perante a fúria assassina dos soldados de Herodes. E então, fica em Belém a dar consolação, a fazer curativos, a prestar socorro. Quando retoma a viagem para o Egipto é já muito tarde.
Ele pressentia que não acompanhava o ritmo dos acontecimentos, mas o seu coração seguia outro relógio – o da compaixão para com os desolados, o da vida dos proscritos e excluídos. A família de Jesus havia partido para Nazaré, evitando cidades sob a alçada dos descendentes de Herodes, perigosos como ele.
E diz a lenda que o quarto rei continuou o seu peregrinar, alimentou a sua esperança confiante e, passados uns anos, vem a descobrir Jesus no Calvário, agonizando entre dois malfeitores. Ajoelhado e contrito, implora do Senhor perdão por nunca se ter encontrado com ele na vida, por ter saído dos “caminhos” normais prescritos pelas leis judaicas, por ter ouvido mais o coração do que a razão. Enquanto assim rezava, escuta a doce voz de Jesus prestes a “apagar-se”: Os teus atrasos no tempo são fruto de um amor generoso e não da tua comodidade. O culto que me apraz é a misericórdia e não o sacrifício. Quando socorrias quem estava em necessidade, era a mim que tu servias e não ao teu egoísmo, interesse ou vaidade. “Amigo, hoje estarás comigo no paraíso”.

Georgino Rocha
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Foto: Gruta de Belém

Imagens da Costa Nova








CASAS TÍPICAS
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As Casas Típicas da Costa Nova já não são o que eram. Eram de madeira, com todas as su-as tábuas pintadas, dando o aspecto de riscas largas. De cores garridas, as casas até começavam a inclinar-se, com a idade e a força do vento, certamente. Hoje, as haabitações que se mostram a quem chega são de material usado na região, tijolo e cimento, e as cores que as decoram exibem combinações mais sofisticadas, embora menos genuínas, porque já não são ao gosto do povo simples. As exigências urbanísticas são decerto mais rigorosas do que antigamente. De qualquer modo, dá gosto chegar à Costa Nova e ver que as suas marcas ainda se mantêm, como sinal do bom gosto pela preservação do passado.


Igrejas de Santo António e de São Francisco

A ADERAV espera que o projecto de re-cuperação das igrejas de Santo António e de São Francisco, em Aveiro, possa ser uma realidade este ano. Depois do alerta, lançado em Julho do ano pas-sado, a associação reuniu com várias entidades, conseguindo trazer o mau estado de conservação daqueles monu-mentos nacionais para a actualidade.
O presidente da direcção, Luís Souto, defende que a execução da obra deve ser integrada nas candidaturas ao Quadro de Referência Estratégica Nacional 2007/2013.
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Leia mais em RTN
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Foto da ADERAV

ÍLHAVO CELEBRA 110.º ANIVERSÁRIO


Ílhavo celebra o 110.º aniversário da restauração do município. As come-morações estão marcadas para 13 de Janeiro. A parte da manhã, inclui, às 10:30 horas, o hastear das bandeiras e, às 11, a missa de acção de graças, na igreja de S. Salvador. Depois do almoço evocativo, realiza-se um Sarau Cultural, no Centro Cultural da Gafanha da Nazaré, com a participação da Filar-mónica Gafanhense e dos grupos folclóricos do município. Para as 19 horas, está marcada uma sessão de Fados de Coimbra, no Salão Cultural da Gafanha do Carmo. As comemorações terminam com um espectáculo de fogo de artifício, na zona da Bruxa, na Gafanha da Encarnação

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Mais uma televisão em Portugal

O Governo vai licenciar um espaço para mais uma televisão generalista. Sou adepto da concorrência, mas estou em crer que vem aí mais uma televisão igual às que temos. A concorrência, numa economia liberal, pode, em princípio, beneficiar o consumidor. No entanto, mais um canal, com fome de clientela, os telespectadores, pode descambar no banal, no pimba, nos programas que nada dizem, mas que atraem gente que gosta de escândalos, do crime de faca e alguidar, do artisticamente pobre. Infelizmente, o povo, quantas vezes mal preparado para escolher qualidade, que forme e informe com verdade, que divirta com elevação, pode ir atrás do que degrada. Mas pode ser que eu me engane e que uma nova televisão se queira impor pela cultura, pela diversão sadia, pela informação isenta e pela formação adequada para as actuais e futuras gerações. FM

Imagens da Ria

Marina da Costa Nova

Ponte de acesso às praias

Pescador solitário


Antes das chuvadas e dos ventos que aí estão, pude apreciar a serenidade da nossa Ria, sem ondas, sem perigos. Não será assim todos os dias, que o Inverno não perdoa. Em dias calmos, porém, a Ria é sempre um convite dirigido aos turistas que gostam do que é belo. E a todos nós, os que nunca se cansam de olhar para ela.




FLORES NOS CINZEIROS

Numa grande superfície, por onde passei, os habituais cinzeiros não estavam cheios de beatas, donde emanava um cheiro nauseabundo. Hoje, as flores naturais ocuparam o lugar da cinza dos cigarros queimados, oferecendo o seu agradável odor a quem passava. E não vi nenhum fumador nem ninguém a protestar. Afinal, os portugueses, quando é preciso, sabem acatar as leis justas e os conselhos oportunos. Num café, onde também entrei, confirmei o mesmo ambiente, livre de tabaco, podendo os clientes respirar o ar puro, tão benéfico à saúde. Os fumadores, contudo, não puseram de lado o cigarro. Alguns fumavam, tranquilamente, ao frio e ao vento, fora do café.

INCÓMODO DE PRECONCEITOS ANCESTRAIS


A anunciada e confirmada conversão de Tony Blair ao catolicismo tem incomodado muita gente. Uns manifestam-se, directamente, sobre o a despropósito desta conversão. Outros, em surdina ou a pretender assobiar para o lado, não conseguem esconder o desconforto. E também não falta quem vá dizendo que, apesar de tudo, o número crescente dos ateus é mais significativo na Europa que uma conversão isolada e, segundo dizem, por meros motivos de família...
Quem anda atento ao que se diz, escreve, mostra e publica, decerto se apercebeu, desde há tempos, do ribombar do trovão e dos rugidos que o pressagiavam. De repente, e sem que nada o fizesse esperar, os diários começaram a pedir entrevistas a gente pouco opu nada conhecida, os editores a publicar livros que, logo na capa, publicitam se publicitam a si próprios, falando de milhões (!) de exemplares vendidos, por se tratar de “um livro que está a abalar o mundo”.
Os entrevistados e os autores podem ser pessoas famosas no campo científico. Alguns até serão. Começamos a lê-los e fica-nos logo e sempre a sensação de que se trata de mais um sapateiro, como o da fábula, que foi além do chinelo do seu normal e competência.
Ninguém tem razão para criticar ou julgar quem livremente se professa crente ou não crente. Mas já não se iliba de poder ser julgado quem da sua opção faz teoria, muitas vezes coxa, àcerca de verdades que constituem o credo de quem tem, na sua fé, a força, o sentido e a razão do seu viver e agir diários.
(...)
António Marcelino
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Ler todo o artigo em CV

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Palheiro de José Estêvão



Um dia destes andei pela Costa Nova. Apreciei, como tantas vezes já tinha feito, o típico casario (que hei-de mostrar), a ria espraiada, com um ou outro pescador solitário, e pouca gente por ali. O frio não aconselhava muito o passeio. Mas ainda pude ver o célebre Palheiro de José Estêvão, com o conhecido registo da passagem do grande Eça pela Costa Nova, que decerto bem conhecia, desde que viveu com o avô paterno em Verdemilho.

Santos fora das escolas?


Em nome de uma sociedade laica, como é politicamente correcto dizer-se agora, de quando em vez vêm à baila uns ataques camuflados à religião, seja ela qual for. O Correio da Manhã lembra hoje que as Escolas não superiores podem optar por um patrono, mas recomenda que não se opte por Santos. Diz aquele diário que são instruções do ministério da Educação.
Eu fui educado a admirar, sobretudo, os sábios, os santos e os artistas. Por razões óbvias: os sábios contribuem, com os seus estudos e genialidades, para o progresso das ciências, melhorando a qualidade de vida das pessoas; os santos dão-nos o exemplo do amor a Deus, da caridade, do respeito pelos outros, da entrega sem limites à causa do bem, da verdade e da justiça; e os artistas contribuem, com múltiplas expressões, para um mundo mais belo.
Se agora se marginalizarem os santos, que são sinais evidentes da nossa identidade, o que virá a seguir? Que os pais não possam baptizar os filhos, dando-lhes nomes de santos? Que as autarquias retirem da toponímia os nomes dos santos? Que as escolas assumam como patronos jogadores de futebol? Ou gente do Jet Set? Ou apenas políticos?
Francamente! Esta gente anda toda maluca!
Deixem, por favor, a comunidade educativa (pais, alunos, professores, forças vivas das freguesias) fazer as suas opções, livremente, sem pressões nem limitações. Não venham com leis ridículas, em nome de uma putativa sociedade ideal.

Fernando Martins

ESTADO: ENTIDADE SEM ALMA


O Estado, como já aqui tenho dito tantas vezes, é uma entidade cega e sem alma. Penso que ninguém ficará zangado por eu sublinhar esta realidade. Em nome dos objectivos que define, corta a direito, sem olhar às pessoas, para quem o Estado, afinal, vive. E não o contrário, como muitos julgam. Aí está, na rua, a contestação do povo, por causa do encerramento dos SAP (Serviços de Atendimento Permanente).
Quando tanto se prega a valorização dos serviços de proximidade, que dão tranquilidade às pessoas, o Estado pensa unicamente nos custos económicos e na necessidade de redução da dívida pública, a todo o custo, esquecendo-se, como um dia disse o Presidente Jorge Sampaio, que “há vida para além do défice”.
Mas há mais:
Quando, neste País, o Estado não tinha capacidade nem hipótese de responder a muitas questões sociais, foi o povo, em muitos casos liderado pela Igreja Católica, quem se mexeu para criar instituições que ajudassem as famílias. Daí nasceram as instituições sociais, com as suas creches, jardins-de-infância, lares e ATL. De mãos dadas com as Misericórdias e outras associações, criaram-se espaços para ajudar quem precisasse de trabalhar durante o dia, contrataram-se empregados, montaram-se instalações adequadas às mais diversas situações e receberam-se utentes. Tudo bem. O Estado comparticipou, sem nunca assumir os apoios necessários. As instituições que resolvessem as suas dificuldades.
Há anos resolveu avançar com jardins-de-infância e, mais recentemente, com as ATL, sem ter em conta os serviços particulares existentes nas diversas freguesias e sem responder, cabalmente, ao que precisam as famílias.
Frio, implacável, sem alma, sem respeito por ninguém, o Estado não quer saber do muito que as instituições fizeram pelas suas comunidades. Cria espaços paralelos e ignora as situações de quem se deu ao povo.
O mínimo que se esperava é que houvesse diálogo, mas o Estado, como se tem visto, não está vocacionado para isso. Corta a direito sem olhar a meios.

Fernando Martins
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Nota: Foto do meu arquivo de uma ATL

Mensagem do Bispo de Aveiro para o Dia Mundial da Paz




"Andamos todos tão preocupados com a paz! E esquecemos tão facilmente que a família é o seu habitat natural, a sua escola permanente, o seu ambiente propício, o seu fundamento necessário.
Pretender promover a paz e o progresso e desamparar a família humana é um contra-senso e um paradoxo.
A sociedade civil e o Estado não podem esquecer esta realidade nem menosprezar o esforço da Igreja no serviço da família nas suas mais diversas vertentes e concretamente como educadora da paz das consciências, da harmonia dos esposos, do encontro de gerações, da comunhão entre pais e filhos e do equilíbrio social.
Valorizemos a família humana, nos seus princípios essenciais, nos seus fundamentos indestrutíveis, nos seus valores cristãos e construiremos a paz no coração humano e na comunidade humana
."
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Ler a Mensagem em Ecclesia

terça-feira, 1 de janeiro de 2008

DIA MUNDIAL DA PAZ


PAZ


Paz de lareira acesa.
A vida sem horário
E os dias aquecidos.
Dias acontecidos
Num outro calendário.

Hibernação da alma
No corpo aconchegado.
Nenhum grito dorido
A bater ao ferrolho adormecido
Do sossego acordado.

Tréguas em toda a frente
De batalha.
O coração contente
Porque ninguém lhe ralha
De pulsar calmamente.

Miguel Torga


In “Poesia Completa”

TECENDO A VIDA UMAS COISITAS - 58



Caríssima/o:

Ao espalmar a primeira folha de 2008, fica bem assomar à janela da vida e espreitar para, como se faz ao lume, espevitar a fogueira e reencontrar desafios que fomos pondo à margem.

1. Quero, contudo, que a primeira palavra, seja para o Professor Fernando; não para o parabenizar – ele faz o que gosta - mas para o encorajar (e se for preciso empurrar) a que continue este seu blogue com renovado fulgor. E, já agora, fica também a minha gratidão pelo espaço que me faculta. Que pena tenho de o não utilizar como mereceria!

2. De entre os muitos desafios que aguardam na prateleira, saltou, quase sem lhe dar autorização, o “que nos leva à Escola”! E como já disse alguém: “É sempre bom regressar à Escola!”
Foi uma cândida menina-senhora que um dia me interpelou nesse sentido. Mas do muito que me indiciou apenas rabiscarei sobre a escola/ensino na Gafanha de há 60 anos.

3. Dedico estes apontamentos a meus Pais – que, não sabendo ler nem escrever, sempre se esforçaram por dar os filhos à Escola – e meus Professores a quem sou devedor do muito que me entregaram e de que tão pouco aproveitei!

4. Os “retratos à la minuta” que forem saindo os envio desde já a meus Netos na esperança de que completaremos mais um «caderno de família» que nos ajudará a crescer no respeito do passado.

5. Apresentarei as minhas achegas, despretensiosas e quase inúteis – a vós completá-las, corrigi-las, aumentá-las, substituí-las ou rejeitá-las. Não preciso de o dizer porque já o sabeis: sou um aprendiz e, feliz me sinto, quando aparece alguém que me oferece algo de novo. Seja com este espírito e este propósito que vamos estender a toalha – a mim apenas o carrear dos talheres, esperando que outros os disponham e nos regalem com as iguarias.

Bom Ano!

Manuel
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Nota: Escola da Ti Zefa, hoje oficina de José Manuel Pereira

BOM ANO DE 2008




Que o novo ano nos traga a alegria de viver com a esperança de largos horizontes, que nos façam sentir a beleza do bem, do bom e do belo.

Bom ano de 2008, com votos de boas festas.


Fernando Martins

segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

DIA MUNDIAL DA PAZ - MENSAGEM DO PAPA


Família Humana,
Comunidade de Paz

"Condição essencial para a paz nas famílias é que estas assentem sobre o alicerce firme de valores espirituais e éticos compartilhados. No entanto, é preciso acrescentar que a família experimenta autenticamente a paz quando a ninguém falta o necessário, e o património familiar – fruto do trabalho de alguns, da poupança de outros e da colaboração activa de todos – é bem gerido na solidariedade, sem excessos nem desperdício. Para a paz familiar, portanto, é necessária a abertura a um património transcendente de valores, mas, simultaneamente, há que não menosprezar a sapiente gestão quer dos bens materiais quer das relações entre as pessoas. O falhanço nesta componente tem como consequência a quebra da confiança recíproca devido às perspectivas incertas que passam a pairar sobre o futuro do núcleo familiar."
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Toda a Mensagem em Ecclesia

domingo, 30 de dezembro de 2007

As prendas de Natal

DEUS ANDA PELA COZINHA

Há pessoas com uma intuição especial para escolher prendas de Natal para os familiares e amigos. Eu, confesso, tenho algumas dificuldades. Normalmente dou aquilo de que gostei. Sobretudo livros já lidos e que me encantaram. Esse meu hábito já mais do que uma vez foi contestado por familiares, alegando que aquilo de que gosto pode não dizer nada a quem ofereço. Contudo teimo nesse meu comportamento, por não ver outra saída.
Neste Natal, por exemplo, recebi livros que me deliciaram. Já dei uma vista d’olhos a alguns e percebi que os meus familiares e amigos acertaram em cheio. Deles talvez venha a falar ao longo do ano.
Há um, porém, que se lê num fôlego e que me encantou durante a tarde de ontem. Já tinha ouvido falar dele, mas não tinha sentido apetência pela sua aquisição e pela sua leitura. Nem sequer tinha dado conta de que o prefácio, texto fundamental, era do conhecido padre e poeta José Tolentino Mendonça, já de si garantia de um trabalho de qualidade. O meu amigo acertou, portanto.
O livro – A BÍBLIA CONTADA PELOS SABORES – contém receitas de Albano Lourenço na Quinta das Lágrimas, com fotografias, excelentes, de Valter Vinagre (não podia faltar). A ficha técnica diz ainda que a edição é da Assírio e Alvim e que a revisão é de António Lampreia (também vem a calhar).
Da Bíblia, (Antigo Testamento e do Novo Testamento) e da tradição cristã são as receitas de entradas, sopas, peixes, carnes e sobremesas, todas elas de fazer crescer água na boca, para além de serem um desafio à nossa capacidade de as elaborarmos, tendo por tema, numa roda familiar ou de amigos, as propostas culinárias dos tempos de Jesus entre nós e antes d’Ele. E depois d’Ele, está bem de ver.
José Tolentino Mendonça brinda-nos com um prefácio que é uma belíssima lição bíblica, daquelas que se lêem com gosto, com a garantia de que “Deus anda pela cozinha”. Diz o prefaciador, logo nas primeiras linhas: “Literalmente, a Bíblia é para comer. É odorosa, recôndita, vasta como a mesa celeste, íntima como a mesa materna, grata ao paladar, engenhosa, profusa, profícua. Descreve os copiosos bosques profanos e as ofertas alimentares sagradas, recria ascetismos e deleites, conta com a esporádica caça e os pastos cevados, com comidas frugais de viagens e banquetes há muito anunciados. Não é insólito que se olhe atentamente para a cozinha da Bíblia.”
Claro que não vou transcrever todo o prefácio, embora gostasse de o partilhar com os meus leitores. Mas fica aqui, ao menos, um cheirinho do que foi cozinhado para este livro, na Quinta das Lágrimas, lá para as bandas de Coimbra, de tantos encantos, bem à vista no livro.

E já agora, com a devida vénia, deixo uma receita, do mestre Albano Lourenço, que todos podem experimentar:

Guisado de ovelha com lentilhas e uvas(Antigo Testamento)

1,2 Kg de pá de ovelha
3 cebolas
6 dentes de alho
2 dl de azeite
4 folhas de louro
100 g de lentilhas
200 g de uvas
4 dl de vinho branco

Demolhe as lentilhas. Frite a carne partida em pedaços em azeite e retire. Continue a fritar a cebola e os alhos picados. Refresque com vinho, junte o louro e reduza um pouco. Junte a carne e cubra com água. Deixe cozer mais ou menos 40 m até estar quase cozinhada. Junte as lentilhas, deixe cozer e retire do lume. Junte as uvas cortadas ao meio sem grainhas.

Bom apetite, deseja o

Fernando Martins

TECENDO A VIDA UMAS COISITAS - 57


O PRÍNCIPE E A ARANHA

Caríssima/o:

Seja então esta a última lenda das terras que fui/fomos percorrendo. Passa-se na Escócia que, se bem nos lembrarmos, foi lá que iniciei esta caminhada.
A versão que me caiu sob os olhos diz assim:

«Num país longínquo, vivia um príncipe que julgava que no mundo havia coisas e animais que não serviam para nada.
Dizia com muito mau humor:
- As moscas servem unicamente para nos incomodarem. As aranhas servem para sujar tudo com as suas sujas teias.
Em certa ocasião, esse príncipe perdeu uma batalha e, perseguido pelos seus inimigos, teve de fugir através de um bosque. Sentiu-se perseguido, dia e noite. Estava já tão cansado que, a determinada altura, pôs-se a dormir junto ao tronco de uma árvore.
Foi acordado por uma forte picadela de uma mosca. Viu que, bem perto dele, estavam os seus perseguidores e correu a refugiar-se numa gruta.
Os seus inimigos aproximaram-se. Olharam para a gruta e um deles disse:
- Aqui dentro não deve estar ninguém.
Um outro perguntou:
- Porque dizes isso?
Replicou-lhe o primeiro:
- Porque a entrada da gruta está coberta por uma grande teia de aranha. Se alguém tivesse entrado, estaria despedaçada.
Ficaram convencidos e afastaram-se.
Foi deste modo que o príncipe se salvou. E, desde então, deixou de pensar que, na natureza, há coisas inúteis. Ficou a saber que até as moscas e as aranhas servem para algo.»
[«Sonhar e desenhar um Mundo melhor» - Manual Infantil, da Acção Católica Rural, pág. 85]

À Ana Maria entrego esta lenda. Por si, descobrirá que Rei é este que, vindo da Escócia, foi Rei de Inglaterra e colocou no seu brasão a teia da aranha!


Feliz e Próspero Ano Novo!


Manuel


Foto de Manuel Olívio

sábado, 29 de dezembro de 2007

PORTAL DE BELÉM



Quem se aproxima do “portal de Belém” com olhos de ver não apenas as aparências, mas a realidade profunda, não deixa de ficar admirado com tanta ternura e carga simbólica: Uma família simples que não é propriamente modelo-tipo de família humana em qualquer parte do mundo, mas apresenta um estilo de vida familiar de valor universal. Um estilo de vida que há-de estar presente em todas as configurações históricas de qualquer família: o acolhimento da vida, o respeito pelo outro, o amor na relação, a ternura nos gestos de comunicação, a solidariedade nas tarefas a realizar, o lar a construir progressivamente, a liberdade crescente articulada com a autoridade exercida, a atenção à individualidade de cada um e a comunhão vivenciada por todos.
O Menino Jesus vê-se aconchegado pelo desvelo de Maria e de José. O seu olhar penetrante projecta-se em sonhos de humanidade feliz em que todas as crianças podem ver nascer o sol com sorrisos de alegria e de esperança.
Maria simboliza a Mãe solícita. As suas mãos abertas – qual berço preparado para acolher a vida nascente – expressam bem a atitude de quem está ao serviço da vida com disponibilidade total em qualquer momento e circunstância.
José é o rosto do homem sério e bondoso. Face aos acontecimentos, vai até onde pode na sua reflexão e deixa lugar à fé que a revelação lhe oferece. A responsabilidade legal que assume perante a sociedade constitui uma luz que se projecta em todos os tempos.
“Levanta-te, toma o menino e sua mãe” é palavra-mensagem que condensa a força simbólica do “portal de Belém”. Para ontem, hoje e amanhã.
Hoje, quantas crianças correm perigo na rua, nas redes de prostituição, nos países em guerra nos lares com violência, nas famílias sem valores dignos da condição humana e cristã, nas escolas redutoras da sua função educativa à simples instrução, nas comunidades eclesiais sem espaço adaptado nem linguagens acessíveis.
O portal abre-se facilmente a quem cultive sentimentos humanos. A fome e a miséria face à abundância e desperdício; a falta de água e de medicamentos perante o consumismo desenfreado, o fanatismo religioso que faz vítimas sem conta, a injusta distribuição dos bens, as famílias desestruturadas, a publicidade sedutora e o patamar social de expectativas que não pode ser correspondido pela magreza dos ordenados e das poupanças.
O mundo exposto ao nosso simples olhar, a par de enormes esforços de alguns e grandes gestos de generosidade de muitos, cria situações de revolta, aumenta as desigualdades e introduz factores de angústia e depressão.
A situação de hoje clama por homens como José que saibam erguer-se e tomar a defesa do Menino e de quantos nele estão retratados; por homens que prefiram correr riscos a continuar na comodidade egoísta; por homens que escutem a consciência mais que os interesses; por homens que queiram viver o amor gratuito, brasão do portal de Belém, o lar da família, a casa do pão.

Georgino Rocha

Coro de Câmara Nossa Senhora da Nazaré




Como noticia a Rádio Terra Nova, o Coro de Câmara Nossa Senhora da Nazaré apresenta-se hoje, pelas 21 horas, na igreja matriz da Gafanha da Nazaré.
Luís Lé, fundador do coro, adianta que a ideia de criar este grupo coral nasceu de uma conversa de café e sublinha que a primeira parte desta primeira apresentação pública consta de um concerto de órgão.
Congratulo-me com a criação de um Coro de Câmara na Gafanha da Nazaré, terra onde o gosto pela rainha das artes é bem conhecido de todos, como o atestam os diversos corais, grupos musicais e escolas de música. Desta cidade, têm saído inúmeros executantes, em várias áreas musicais, sendo certo que haverá lugar para todos.

ARES DO INVERNO


Apesar das iluminações de Natal, que emprestam ao ambiente um ar de beleza, a verdade é que o frio de Inverno está presente, ali à volta do Fórum, com a ria a seus pés. Bem o senti, quando tirei esta foto. Aliás, as árvores nuas mostram bem que os tempos que correm não dispensam os casacos, casacões e sobretudos. Que assim seja, para depois, quando a Primavera chegar, sabermos apreciar as temperaturas agradáveis que tanto nos fazem sorrir.

QUE SORTE A SUA!


Em 2006 estive hospitalizado duas vezes. A primeira, num hospital coimbrão, e a segunda, no Hospital Infante D. Pedro. Em ambos fui muito bem acolhido e tratado. Nunca me cansei de dizer isto, porque há muito o hábito de se criticar, por isto ou por aquilo, os serviços hospitalares.
Num desses internamentos, a minha enfermaria estava relativamente perto de uma outra destinada a doentes pulmonares. Nas minhas caminhadas, de que necessitava para desentorpecer as pernas, passava por ali frequentemente. Havia, num ou noutro corredor, dísticos a proibir o fumo. Nem assim, porém, faltava quem se refugiasse num ou noutro recanto, para fumar um cigarrito, às escondidas dos médicos e enfermeiros.
Numa das minhas caminhadas cruzei-me, certo dia, com um senhor simpático e de palavra fácil, que me saudou em jeito de despedida. Realmente, estava de partida, depois de uma operação a um pulmão.
Conversa puxa conversa, fiquei a saber do que sofria. Cancro nos pulmões. Esta era já a segunda intervenção cirúrgica a que se sujeitara. Estava de regresso a casa. Adiantei, então, que estava com muito bom aspecto, desejando-lhe rápido restabelecimento. De pronto, respondeu-me:
- Olhe, meu amigo, o que importa é que estou aqui; sinto-me bem, mas não tenho ilusões; se soubesse o que sei hoje, talvez nada disto me teria acontecido.
E continuou, com ênfase, a contar a sua história:
- Desde novo, habituei-me a fumar, convencido de que isso me dava uma personalidade adulta. Eu gostava de ser como alguns senhores que conhecia, senhores que, antes de começarem uma qualquer conversa, puxavam primeiro do cigarro, acendiam-no com calma, atiravam o fumo para o ar e depois é que falavam. Eu via, nesses rituais, sinais de alguma elegância, de algum nível intelectual, de alguma importância.
- E depois?
- Depois, nunca mais parei. De um maço passei a dois. A seguir veio o terceiro… Por fim a tosse, o catarro, os vómitos de manhã, a neura quando tentava evitar o cigarro, o cansaço, as dores. O médico recomendou-me os exames da praxe. O diagnóstico deixou-me arrasado. Tinha de ser operado. Esta é a segunda vez… mas sei que o cancro continua comigo. Eu sinto-o!
- Pode ser que agora…
- Não tenho qualquer dúvida! Mais tarde ou mais cedo, ele volta.
- Claro que agora prega sempre os malefícios do tabaco…
- As pregações, pelo que tenho visto, não resultam… Os meus amigos continuam a fumar. Só uns três é que deixaram de fumar, mas não foi por qualquer pregação.
-Então?
- Foi por terem visto quanto se sobre quando o cancro ataca. Vieram visitar-me e ficaram tão impressionados com o que viram, que nunca mais pegaram no cigarro. Gente aflita com falta de ar, gente sem cordas vocais, gente com a boca a ser destruída, enfim, um horror. Não foi preciso nenhum médico, nem nenhum tratamento. Acho até que, se fosse possível, os fumadores podiam e deviam passar por uma enfermaria destas. Só vendo este sofrimento é que se acredita no mal que o tabaco faz.
Entretanto chega um familiar, talvez filho, para o levar. Ao despedir-se de mim, ainda perguntou:
- Fuma?
- Não.
- Que sorte a sua! Adeus.


Fernando Martins

A LOGOTERAPIA DE VIKTOR FRANKL




Num tempo em que o mundo é atravessado por enormes perplexidades e as pessoas são assaltadas pela dúvida, pelo desânimo e até pelo niilismo, quereria, no décimo aniversário da sua morte, deixar uma homenagem a um homem que, na situação mais degradada e degradante dos campos de concentração nazis, mostrou como e porquê é possível manter a dignidade. Refiro-me a Viktor Frankl, fundador da chamada terceira corrente de psicoterapia de Viena: a logoterapia.
Ele próprio sintetizou o núcleo do seu pensamento: "O que é, na realidade, o Homem? É o ser que decide o que é. É o ser que inventou câmaras de gás, mas ao mesmo tempo é o ser que entrou nelas com passo firme, murmurando uma oração."
A logoterapia parte de uma concepção filosófica que tem o Homem enquanto pessoa como centro. O impulso primário da pessoa não é, como pensou Freud, a vontade de prazer, também não é a vontade de poder, como queria Adler, mas a vontade de sentido.
Este sentido não se inventa, mas descobre-se: numa obra, num amor, numa tarefa a realizar. No fundo, cada um tem de perguntar: o que é que a vida quer de mim? "Em última instância, viver significa assumir a responsabilidade de encontrar a resposta correcta para os problemas que a vida coloca e cumprir as tarefas que ela continuamente aponta a cada pessoa."
O que distingue então Frankl de Freud e de Adler é que enquanto estes reduziam o Homem a um ser que procura a satisfação dos impulsos em ordem ao restabelecimento de um equilíbrio homeostático intrapsíquico, para Frankl, ele não é só um sistema psicológico. É preciso compreendê-lo na sua totalidade: corpórea, psíquica e espiritual. "A realidade humana refere-se sempre a algo para lá de si mesma. Está dirigida para algo que não é ela mesma. Os seres humanos procuram mais para lá de si mesmos: um sentido no mundo. Procuram encontrar um significado a realizar, uma causa a servir, uma pessoa a quem amar. E só assim os seres humanos se comportam como verdadeiramente humanos."
No indescritível sofrimento dos campos de concentração - ele, que perdeu lá a mulher, o pai e a mãe, era o prisioneiro número 119 104 -, aprofundou a importância que têm as ideias para a forma de viver. Pôde constatar que, se eram as pessoas com vida interior e intelectual mais intensa que sofriam mais, também eram elas que tinham maior capacidade de resistir. Aí, percebeu que "quem tem algo por que viver é capaz de suportar qualquer como". Por isso, referia aos companheiros de desgraça "as muitas oportunidades existentes para dar um sentido à vida. Este infinito significado da vida compreende também o sofrimento e a agonia, as privações e a morte. Assegurei-lhes que nas horas difíceis havia sempre alguém que nos observava - um amigo, uma esposa, alguém que estivesse vivo ou morto ou um Deus - e que de certeza não queria que o decepcionássemos." Frankl constatou que os prisioneiros que perdiam a fé e a esperança no futuro punham em risco a saúde e a própria sobrevivência. Mas também viu que há o que ninguém pode tirar ao Homem, mesmo num campo de concentração: "a última das liberdades humanas - a escolha da atitude pessoal perante um conjunto de circunstâncias - para decidir o seu próprio caminho." Mesmo "essa tríade trágica na qual se incluem a dor, a culpa e a morte, pode chegar a transformar-se em algo positivo, quando se enfrenta com a postura e a atitude correctas."
Quando as pessoas não encontram sentido, surgem as neuroses que chamou noógenas: não provêm de conflitos instintivos ou inconscientes, mas da falta de sentido e atingem o núcleo mais íntimo da pessoa. A logoterapia é precisamente terapia de encontro de sentido: ajuda cada um a descobrir o sentido pessoal da sua vida a realizar.
Na busca de sentido último, o Homem, inconscientemente, procura Deus - O Deus Inconsciente é o título de uma das suas obras.
No nosso tempo, já não é o sexo que é reprimido, mas o que é espiritual e religioso. Daí, a falta de sentido, de orientação, e, consequentemente, o tédio e o vazio.

Anselmo Borges

In DN

Prenda de Natal




Quando tinha 14 anos recebi uma prenda de Natal a que na altura não atribuí o verdadeiro valor. Apesar de não ostentar a referência CE (inexistente na época), cumpre todas as regras de segurança agora exigidas e mais algumas suplementares: não contém sais de chumbo ou peças miúdas desmontáveis, arestas cortantes ou cantos pontiagudos, não debota ou encolhe, é indeformável, não provoca alergias e embora haja quem a queira fazer passar de moda continua a dar conforto e bem-estar, ficando sempre bem a qualquer pessoa, independentemente do sexo. Posso até dizer que tem melhorado com a idade, ou sou eu que lhe vou dando cada vez mais valor. Um autêntico bem de capitalização contínua.
Nesse tempo em que frequentava o ensino secundário, era comum o uso de bicicleta de casa para a Escola Técnica em Aveiro. Nos dias de chuva havia algum desconforto, pois entre a Gafanha e Aveiro não havia qualquer abrigo na velha estrada que acompanhava a ria e as previsões de tempo para o percurso normalmente falhavam. Agasalho adequado não tinha, excepto às vezes um guarda-chuva, quando o tempo prometia logo de manhã. Quando chovia mesmo e era apanhado no percurso com ou sem guarda-chuva, a água entrava pelo pescoço, descia pela espinha abaixo e ensopava o selim que na altura era de coiro. Era nesse estado que chegava a casa, onde a minha mãe já tinha a fogueira acesa para me aquecer e enxugar alguma roupa insubstituível.
Um dia em que não choveu, no princípio de Dezembro, quando à noite cheguei a casa, o meu pai chamou-me, abriu uma bolsa de oleado em forma de pasta, dela tirou um fato impermeável castanho e mandou-me vesti-lo. Assentava-me como uma luva. Fez-me lembrar um domingo, uns anos atrás, em que o meu pai regressou da missa da manhã, mais tarde, trazendo-me dois piões acabadinhos de fazer por um amigo a quem contou um sonho que eu tivera, onde possuía o pião mais lindo do mundo. Brinquedo que ainda não me tinha passado pelas mãos. Só promessas: “quando o pai vier…” (da pesca do bacalhau). Estes piões eram ainda mais bonitos. Fiquei a pensar quanto esta nova surpresa lhe haveria de ter custado e no esforço de tal aquisição. Mas não tive muito tempo para meditar. O meu pai disse: “pois fica-te muito bem mas não é teu; alguém o deixou cair e precisa dele para ir para o trabalho. Vou pedir para anunciar o achado nas missas por aqui à volta; se até ao Natal ninguém o reclamar fica a ser a tua prenda do Menino Jesus." Despi o fato, a minha irmã dobrou-o, meteu-o na bolsa e passou-o à minha mãe que o guardou na caixa de milho que era o seu cofre-forte. Não era fechado à chave mas ninguém ousava abri-lo.
O meu pai trabalhava num dos navios de ferro que passavam o Inverno fundeados no canal de Aveiro e tinha encontrado o fato caído na ponte de madeira que fazia a única ligação de Aveiro para a Gafanha. No dia seguinte voltou a haver chuva que se prolongou até às férias do Natal. Nos três domingos que antecederam o Natal, o meu pai relembrava o anúncio nas missas, ninguém reclamava o fato e eu acalentava a esperança de vir a ser o seu novo utilizador. Chegou a manhã do dia de Natal, fomos à lareira em busca das prendas, eu esperava um embrulho grande mas nada disso: um par de meias e uns bombonzitos; a mais beneficiada era sempre a minha irmã mais nova, que ainda tinha parte no nosso quinhão, senão fazia um berreiro danado que deliciava o meu pai. Em compensação o Menino Jesus ia aparecendo nos dias seguintes tentando equilibrar as coisas. Quanto à promessa do fato não valia a pena falar; quando, em qualquer altura, perguntava à minha mãe se, por exemplo, era quarta-feira, ela apenas respondia: “até à meia-noite.” Portanto eu já sabia a resposta.
Estávamos para começar o almoço de Natal, bateram à porta. A minha irmã foi vigiar e disse ao meu pai que era um rapaz do meu tamanho. Eu engoli em seco. Ele levantou-se e foi atender. Ouvi perguntar: “Foi alguém daqui que encontrou um fato impermeável? O meu pai retorquiu: "é verde ou vermelho?” Respondeu o rapaz: “O meu era castanho.” A minha mãe levantou-se e ouviu-se a tampa da caixa de milho bater ao fechar. Num ápice, a minha prenda de Natal voou para as mãos de um desconhecido. Passado algum tempo, o meu pai sentou-se à mesa, olhou para mim e disse: “não fiques triste, ele é o amparo da mãe e dos irmãos e aquela é a única prenda de Natal que teve e já era sua; vais ver que não te fará falta e isso vai ser a tua prenda todos os Natais. O Menino Jesus não se esquecerá de ti.”

João Marçal

Em homenagem aos meus pais,
João Maria Marçal e
Laurinda de Oliveira

sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Fórum::UniverSal - 9 de Janeiro


Nuno Rogeiro no CUFC

O politólogo Nuno Rogeiro vai estar no CUFC no dia 9 de Janeiro, quarta-feira, pelas 21 horas, para falar sobre “A Dignidade Humana das Nações”. A moderação é de Isabel Segadães. Trata-se de uma iniciativa integrada no Fórum::UniverSal, destinada a universitários, em particular, e à sociedade aveirense, em geral.
A presença de Nuno Rogeiro no CUFC, pela segunda vez, é uma boa oportunidade para se ouvir alguém que disserta, como poucos, sobre assuntos de política internacional.