domingo, 31 de janeiro de 2021

Natureza triste

 

A natureza triste está bem patente nesta imagem. Para além da tristeza da natureza, eu pressinto o desânimo de muita gente por não vislumbrar um futuro risonho a curto prazo.

Pandemias da História


 NOTA: Publicado no PÚBLICO de ontem. 

Leituras para o confinamento: O CÂNONE


“O CÂNONE” é um livro que ouso propor para este período prolongado de confinamento que estamos a viver. Trata-se de um livro com 533 páginas para serem lidas ao sabor da maré, já que apresenta cerca de 50 escritores portugueses já falecidos, com lugar cativo nas estantes de quem gosta mesmo de ler. Para além dos estudos referentes aos selecionados, o livro contém referências a grupos, escolas, movimentos e revistas.
Os responsáveis pela edição de “O CÂNONE”, António M. Feijó, João R. Figueiredo e Miguel Tamen, escolheram os escritores a seu gosto, nem outra atitude seria de esperar. E para tranquilizar os eventuais leitores digo que os ensaios e outros escritos apresentam-se em poucas páginas, pelo que não cansam ninguém.
Na contracapa diz-se que “Foram incluídos ensaios sobre autores conhecidos e celebrados, como Gil Vicente, Eça de Queirós e Fernando Pessoa; e sobre autores menos conhecidos ou celebrados, como o rei Dom Duarte, Frei Luís de Sousa ou Irene Lisboa”. E como curiosidade para mim, no mesmo espaço afirma-se que Florbela Espanca, também incluída em “O CÂNONE”, tem sido menosprezada por “quase todos os críticos”.
Ainda se sublinha que os grandes escritores não foram escolhidos “por consenso ou por votação popular, mas por terem sempre leitores, mesmo que poucos, ao longo do tempo”.
Ao pegar nesta obra, segui uma tendência natural: fui à cata de escritores mais ou menos conhecidos, porém já lidos por mim. Comecei por Agustina Bessa-Luís vista por Pedro Mexia, um conhecido poeta e crítico literário que leio há bons anos. E a partir dai, fui saltando ao sabor dos apetites, próprio de quem está confinado e com tempo para tudo.
Mais uma nota curiosa: os autores dos ensaios e estudos críticos não se limitaram a aplaudir os escritores selecionados; avançaram com considerações interessantes que o leitor comum, como eu, jamais lá chegaria. E “O CÂNONE” também vale muito por isso.
A edição é da Fundação Cupertino de Miranda e Edições Tinta-da-China.

Fernando Martins

Os cristãos e a política

Crónica de Bento Domingues 
no PÚBLICO

Hoje, diante de propostas políticas que abertamente procuram dividir, de forma maniqueísta, a sociedade entre bons e maus, puros e impuros, a pergunta do Evangelho é-nos devolvida, de novo, com maior agudeza: diante destas injustiças, de quem é que me faço próximo?


1. Alguns cristãos de várias denominações (católicos, metodistas, evangélicos, anglicanos, menonitas e presbiterianos) uniram-se em valores base para as eleições presidenciais, mediante a assinatura de um Manifesto. O 7Margens divulgou-o. Não teve a cobertura mediática que a sua significação merecia, não tanto pelo seu número, mas pelo próprio gesto ecuménico, em consonância com o oitavário de oração pela unidade dos cristãos. Mais adiante, tentarei mostrar o seu alcance no contexto da nova teologia política.
Sou dos que se manifestaram contra a febre da criação de partidos confessionais em Portugal, a seguir ao 25 de Abril de 1974 [1]. A eclesiologia do Concílio Vaticano II (1962-1965) tinha superado o papel que, no passado, tinha justificado as chamadas democracias cristãs [2]. Era preciso evitar o uso do nome de Cristo, directa ou indirectamente, para cobertura de práticas económicas, sociais, culturais e políticas em contradição com a sua mensagem e a sua intervenção histórica testemunhada no Novo Testamento.
Muitos cristãos que, nessa altura, se manifestaram contra partidos confessionais envolveram-se em várias organizações políticas, como era normal no pluralismo que se defendia. Para muitos dos católicos, que tinham perdido a esperança nas reformas da Igreja, que o referido Concílio tinha proposto – os chamados vencidos do catolicismo –, o envolvimento na política partidária passou a ser um substituto da religião. Acabaram por engrossar a ambígua designação dos chamados católicos não praticantes.

sábado, 30 de janeiro de 2021

O sentido da vida. 3. Sofrimento e sentido

Crónica de Anselmo Borges 
no Diário de Notícias

A nossa vida não tem sentido, quando não vale para ninguém. No entanto, suportamos e superamos sofrimentos e fracassos, se alguém nos reconhece

Há uma vivência radical que põe o pensamento em sobressalto. Cada um de nós sabe que não esteve sempre no mundo, isto é, que nem sempre existiu e que não existirá sempre. Houve um tempo em que ainda não existíamos, ainda não vivíamos, e haverá um tempo em que já não existiremos, já não viveremos cá, deixaremos de viver neste mundo. Nesta constatação, experienciamos que somos de nós, somos donos de nós - essa é a experiência da liberdade -, mas não nos pertencemos totalmente, não somos a nossa origem nem temos poder pleno sobre o nosso fim. Viemos ao mundo sem nós - ninguém nos perguntou se queríamos vir - e um dia a morte chega e leva-nos pura e simplesmente. Não nos colocámos a nós próprios na existência nem dispomos totalmente do nosso futuro, não somos o nosso fundamento. Aqui, perante a certeza de que nem sempre estive cá e de que não estarei cá para sempre, pois morrerei, ergue-se, enorme, irrecusável, a pergunta: donde vim?, para onde vou?, qual é o sentido da minha existência?, que valor tem a minha vida?
Esta pergunta formula-se em relação a todos os seres humanos, à vida em geral, a toda a realidade: porque é que há algo e não nada?, perguntaram Leibniz e Heidegger, entre outros, mas ela diz respeito concretamente a cada um, a cada uma, de modo existencial e tem carácter ao mesmo tempo teórico e prático, uma vez que implica a liberdade. Ela é a pergunta mais originária e fundamental, como bem viu Albert Camus: "Se a vida tem ou não tem sentido, essa é a questão metafísica". De facto, o ser humano não pode viver sem sentido. Aliás, a existência humana está baseada na convicção do sentido.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Acompanhar as famílias no luto

Carta Pastoral do Bispo de Aveiro
sobre os dramas da pandemia 

O cristão deve agir com amor, sinceridade, equilíbrio e fé

O Bispo de Aveiro, D. António Moiteiro, acaba de publicar na página  da Igreja Aveirense uma Carta Pastoral, onde reflete a visão cristã sobre os dramas causados pela pandemia do Covid-19. A Carta — VEDE COMO ERA SEU AMIGO…— dá pistas para todos acompanharmos as famílias enlutados, cujo número não cessa de crescer. “É necessário estar atento àquilo que possa ajudar a conviver com a perda de uma pessoa querida: consolar a quem está em situação debilitada, para que possa restabelecer o equilíbrio e elaborar o processo de luto”, afirma o Bispo de Aveiro, acrescentando que “o cristão deve agir com amor, sinceridade, equilíbrio e fé”, mas ainda explica que “a morte do corpo é somente o começo da vida eterna”.
D. António diz que a perda de alguém traz, inevitavelmente, muita dor e sofrimento. E frisa que “ajudar as famílias a viver o luto envolve um olhar amplo sobre a realidade que vivemos, mas também se inspira no Evangelho, como possibilidade de delinear ações que elevem o ser humano e a sua dignidade perante as perdas”. Reconhece que “cada um vivencia o luto de acordo com a sua personalidade, com as suas perceções, resiliência, e de acordo com os laços que se estabeleciam com a pessoa que partiu,”  adiantando que a comunidade cristã, “precisamente por ser comunidade, deve estar presente e acompanhar estes momentos e passos decisivos da vida dos seus membros, manifestando comunhão e solidariedade”.
Chama ainda a atenção para a necessidade de se “refletir e atualizar o modo como acompanhamos as famílias enlutadas nas nossas comunidades”, estando atentos “àquilo que possa ajudar a conviver com a perda de uma pessoa querida: consolar a quem está em situação debilitada, para que possa restabelecer o equilíbrio e elaborar o processo de luto”. E sublinha que um grupo constituído na paróquia “pode servir de grande conforto e ajudar a superar a dor”.

F. M.

Pode ler a Carta Pastoral aqui

O agir de Jesus provoca admiração e espanto

Reflexão de Georgino Rocha 
para o Domingo IV do Tempo Comum

"E com o Papa alarguemos o nosso olhar e credenciemos o nosso agir, juntando-nos a tantos/as que todos os dias plantam uma semente de um mundo melhor" 

Com o núcleo dos discípulos recém-chamados – é significativo que sejam irmãos, sinal da fraternidade, Jesus dirige-se a Cafarnaum, cidade que lhe serve de base para a missão que vai iniciar. Marcos, o autor do relato, após fazer a apresentação do Messias, traz para primeiro plano a situação religiosa das pessoas envolvidas nos episódios narrados. Designa-a por cegueira e vai dizendo de quem: das autoridades, do mundo/multidão, dos discípulos. Mc 1, 21-28. 
Elabora um texto emblemático, com as cenas ocorridas na sinagoga onde Jesus, como bom judeu, tinha ido em dia de sábado e começou a ensinar. A primeira, refere a reação das pessoas à sua “homilia”. “Ficaram admiradas com o seu ensinamento” porque “ensinava como quem tem autoridade”. A segunda, relata o exorcismo feito a um possesso que ali se encontrava e bradava: “Eu sei quem Tu és: Tu és o Santo de Deus!”. Jesus responde-lhe: “Cala-te e sai dele”. E assim acontece. A assembleia fica assombrada e pergunta-se: “O que é isto? Um ensinamento novo, dado com autoridade. Ele manda até nos espíritos maus e eles obedecem”. E Marcos acrescenta: “A sua fama espalhou-se por toda a parte, em todas as redondezas da Galileia.