sábado, 10 de novembro de 2007

QUASE LHES PERDOO OS 80 MILHÕES



Não sei o que se passou exactamente em Fátima em 1917. Sei que os "videntes" não viram Nossa Senhora no sentido do nosso ver terreno, como quando vemos as plantas ou o céu ou as pessoas.
Embora se possa ser católico e não acreditar em Fátima - pude constatar que teólogos estrangeiros eminentes, de visita a Portugal, não manifestaram interesse em ir lá -, não me custa aceitar que tenha havido aí uma experiência religiosa, mas, evidentemente, no horizonte de compreensão próprio de crianças e no quadro de esquemas de uma religiosidade popular. Assim se explica, por exemplo, que Nossa Senhora tenha "mostrado" os horrores do inferno aos pastorinhos, o que não é uma atitude particularmente maternal, quando se pensa em crianças de 10, 9 e 7 anos. Aí está um exemplo de religião sacrificial e dolorista, como se transmitia nas pregações da altura. Isto significa que o Evangelho é que deve ser a medida crítica de Fátima e não o contrário.
Seja como for, Fátima impôs-se, e de modo impressionante, a nível nacional e internacional. Ali se congregam multidões de milhões de pessoas. A quase totalidade dos portugueses já passou por lá, e as peregrinações são diárias. Há pouco tempo, um jornalista atirou-me, provocatoriamente: "Nossa Senhora de Fátima é a maior mulher de Portugal, a mais influente." Eu diria que sim, sendo depois preciso analisar essa influência.
Em princípio, é uma influência positiva. Há excessivo sofrimento no mundo: físico, material, moral, psíquico, espiritual... E Fátima, como diz frei Bento Domingues, é o cais de todas as lágrimas dos portugueses. Ali vão buscar alguma paz, alívio, conforto, conselho, esperança. Ali desabafam as suas mágoas. Quem melhor do que "a Mãe" poderá entender o que se passa no coração dos homens e das mulheres? E aí está a razão por que, pelo menos em parte, Fátima passa ao lado do "controlo" da hierarquia. As pessoas vão lá numa relação muito íntima, pessoal e única, com Nossa Senhora e com Deus. E ninguém tem nada com isso. Ainda estou a ver na televisão: quando o cardeal Sodano começou a "revelar" o "terceiro segredo de Fátima", os peregrinos continuaram, serenos, nas suas devoções e nos seus diálogos com "a outra dimensão".Inaugurou-se no dia 13 de Outubro a igreja da Santíssima Trindade. Fui confrontado com a pergunta do escândalo: Como é possível gastar ali 70 milhões de euros (80, com os acessos)? Não há tantos pobres? (É realmente uma vergonha nacional haver dois milhões de pobres - desses, 700 mil têm de (sobre)viver com seis euros por dia).
Costumo responder que se deveria ser mais contido nos gastos. Como diz Carlos Fiolhais, os portugueses gostam de conjugar o verbo derrapar, e até em Fátima houve derrapagem de 40 para 70-80 milhões de euros.
Mas também não tenho uma visão miserabilista da existência. O Homem não vive só de pão. Depois, quem pagou são os peregrinos, que têm direito a algum conforto. Que dizer do desperdício do excesso de estádios de futebol vazios?
Acima de tudo, foram convocados artistas de renome, nacionais e estrangeiros, e o que resultou é simplesmente belo. Agora, Fátima é um conjunto harmonioso no seu todo, que alguém já comparou a um barco. Ah!, aquele Cristo crucificado no interior da igreja, meio selvagem, fixando, de olhos abertos, cada um: ele é a mensagem de convocação para a Vida e a Liberdade; aquela Virgem, finalmente uma jovem rapariga airosa, de braços abertos acolhedores; aquele grande painel do presbitério, símbolo da Jerusalém Celeste: a esperança da Humanidade com Deus e a sua glória!
Jesus foi confrontado com o luxo de uma libra de perfume de nardo puro - o seu preço correspondia a um ano de salário - que uma mulher lhe derramou sobre a cabeça. Os discípulos ficaram indignados: "Para quê este desperdício? Podia vender-se por bom preço e dar-se o dinheiro aos pobres." Jesus respondeu que não faltariam oportunidades a quem lhes quisesse fazer bem.
A religião sem a beleza é inverdadeira. Sem o gratuito - a graça -, é uma desgraça.

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

POR CADA SEMANA É ENCERRADO UM LAR DE IDOSOS

Presidente de IPSS escuta utente de lar (foto do meu arquivo)

As notícias de hoje dão conta de que por cada semana encerra um Lar de Idosos. Inexistência de alvará e falta de condições para ser desenvolvido um trabalho competente e digno do respeito de que precisam os utentes estarão na base das decisões dos departamentos do Estado que superintendem nestas questões.
Paralelamente a estas situações, há registo de maus-tratos e de explorações em alguns lares, onde se esperava que houvesse um ambiente acolhedor, marcado pela bondade, pela compreensão, pela atenção sem limites, pela disponibilidade caritativa. O idoso, que tanto deu, normalmente, à sociedade, em geral, e à família, em particular, precisa de carinho e de cuidados especiais e próprios de quem se sente retirado do seu “cantinho”. Não está numa pensão qualquer, muito menos num armazém de velhos que esperam simplesmente pela morte. Pode ter sido abandonado pela família e pelos amigos, o que acontece frequentemente, mas não pode nem deve ser esquecido pela sociedade. Aqui, portanto, o Estado tem a obrigação de estar atento a casos muito tristes de exploração a tantos níveis de que sofrem alguns idosos.
Já visitei, em trabalho jornalístico e de dirigente da solidariedade social, muitos Lares de Idosos. Uns que são autênticos modelos de bem tratar os utentes, mas outros que não passam de caixotes do lixo, para onde atiraram os idosos, quais trapos velhos que urge arrumar num canto, para que ninguém mais os veja. Para que sejam pura e simplesmente esquecidos. Para que se tornem mortos vivos, com os olhares perdidos em horizontes sem luz… e sem vida digna. Por isso, o meu aplauso para quem trata os idosos como pessoas, mas também para os serviços que estão atentos a quem não respeita os utentes dos Lares.
Fernando Martins

INCÓMODOS DA ESCOLA PELOS RESULTADOS CONHECIDOS


Os problemas da educação e da escola, ao lado dos da saúde, são entre nós os mais preocupantes para as pessoas. Não são os únicos, mas certamente os que mais doem.
Com dados do Ministério publicaram-se, a nível nacional e por escolas, resultados do secundário e de português e matemática do 3º ciclo, do ano escolar 2006/2007. Há sempre quem critique esta publicação e quem elogie a coragem de se fazer. Leituras diversas e carregadas de conceitos e preconceitos, consoante de onde o vento sopra.
Um dado que se vem afirmando em cada ano, e no ano que terminou foi ainda mais eloquente, refere-se aos resultados das escolas privadas, em confronto com os das escolas estatais. Tal confronto não agrada aos que, de há muito tempo, vêm denegrindo o ensino particular, e ponho neste campo alguns responsáveis dos sindicatos de professores. Nem agrada àqueles que vão asfixiando estas escolas, cortando turmas, regateando acordos, demorando pagamentos, multiplicando inspecções, calando legítimas opções dos pais, exigindo coisas, em relação às quais fazem vista grossa quando se trata das escolas do Estado. Esta atitude é a do Ministério e dos seus executivos, desde as direcções regionais às distritais, incluindo ainda alguns zelosos responsáveis locais, vizinhos do lado de uma escola com êxito e criatividade, mas que escapa à sua jurisdição. Tudo sugere alguma reflexão com dados que escapam a muita gente, não esquecendo que é complexa a grelha de leitura dos resultados finais.
O ensino privado responde aos requisitos legais e não é um favor do Estado. É um direito constitucional e, por isso mesmo, democrático e merecedor de respeito e apreço. Constitui um serviço público e, pelo que se vê, no seu conjunto com algum êxito e reconhecida qualidade. Não se pode considerar meramente supletivo do Estado, como alguns teimam em o afirmar. Um serviço diversificado, que vai de escolas reputadas dos meios urbanos com contratos simples, e longas listas de pedidos de inscrição, até às escolas de dimensão média, disseminadas pelo país, muitas delas com contratos de associação, dispensando aos seus alunos, a par das do Estado, ensino gratuito.
A rede pré escolar, com muitas escolas privadas e atendendo à dupla dimensão escolar e social, por isso mesmo com prolongamentos normais de horário, exigência à qual o Estado acabou por ter de se vergar, foi durante anos rede quase única ao encontro dos pais. Sofre agora um tipo de depreciação, que vai até à dispensa dos seus serviços, em troca de medidas pouco realistas e pressões ideológicas e profissionais, a que o governo se tem vindo a submeter e a que procura dar soluções de gabinete.
No furor da revolução militar assaltaram-se escolas privadas de vilas e aldeias que, por esse país fora, levaram durante décadas o ensino para além do elementar ao povo e permitiram a muita gente humilde ter acesso à universidade e a empregos qualificados. Depois criaram-se escolas estatais, inviabilizando as já existentes. O país empobreceu-se com esta duplicação dispensável e injusta, que o colectivismo estatal exigia e a Constituição socialista procurou consagrar. No fundo, um ataque claro à Igreja, por parte daqueles que se incomodavam pelo seu serviço aos mais pobres.
Fez-se crer que as escolas particulares eram elitistas e para os ricos. O atrevimento da ignorância e da má fé! Se havia e felizmente ainda há escolas mais qualificadas, será que isso é ou foi alguma vez um prejuízo para o país? O Estado tem como dever garantir a todos educação e ensino qualificados. Que o faça quem melhor o pode fazer, sem que os pais, que pagam os seus impostos, sejam onerados pela escolha da escola. Por essa Europa muitos já perceberam que o Estado, se não pode descuidar a educação, não tem que ser ele, necessariamente, o educador de crianças e jovens. Educar é missão de quem melhor a sabe e pode realizar. É a isso que os alunos têm direito.
Dignificar os professores porque indispensáveis, embora a escola não exista por causa deles; inovar, porque sem criatividade nada se qualifica; dar à escola autonomia administrativa e pedagógica, porque só assim se pode educar e melhorar o ensino. Há que respeitar quem trabalha e tem resultados. O país precisa de quem o dignifique e enriqueça.
António Marcelino

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

ARES DO OUTONO


Cada arbusto, por mais simples e modesto que seja (se é que há arbustos simples e modestos), é um mundo de cores variadas e de formas incrivelmente belas. Como este arbusto do meu quintal, visto em dia claro, como foi o de hoje. Vejam a variedade de tonalidades, de formas, de espaços esparsos por onde se escoa a luz, como que à procura de gente.

Na Linha Da Utopia



FERNANDO VALENTE, A HOMENAGEM


1. É com emoção que estas palavras são escritas. Afinal, a todas as expressões de arte pertence a emoção sensibilizante, essa que nos transporta para uma nova dimensão de recriar o tempo e reinventar as possibilidades da história. Já passaram dez anos, parece que a notícia chocante aconteceu “ontem”. A história da música portuguesa recente regista e assiná-la o nome de Fernando Valente. Uma valentia surpreendente e irreverente inscrita naqueles que habitam o génio, este que, vivendo da superação contínua, não tem quaisquer fronteiras nem barreiras, antes anseia ardentemente por todo o futuro…
2. Aveiro presta homenagem a uma vida que começou em Canelas (Concelho de Estarreja), terra de músicos centenários que respira o ritmo da Banda Bingre Canelense, colectividade fundada em 1865 (com 141 anos de actividade ininterrupta, sendo a associação mais antiga do concelho). O génio nasce (sempre) simples, vivendo e vendo a sua terra, observando as suas gentes e daí retirando o horizonte da aprendizagem, agarrando a decisão de avançar e escalar a paixão musical, trazendo para a ribalta um instrumento pouco animado em Portugal, o Saxofone. Aveiro acolheu o aluno, o músico, o compositor, o docente nos Conservatórios de Música, de Aveiro e de Águeda.
3. Há 20 anos, na linda terra de Canelas, não esquecemos (pessoalmente) a alegria do Compasso Pascal, que ao chegar a casa do Fernando Valente (quando ele tinha possibilidade de estar) a música do seu saxofone genial transparecia esse espírito pascal festivo! Essa sua energia e alegria contagiantes marcaram os dias e os serões de Aveiro. Os bares da cidade, “hoje”, acolhem e celebram a vida daquele que não deixou que a arte cristalizasse na sala de aulas ou no auditório musical elitista. Uma certa “boémia cultural” une-se a uma visão da cultura popular, para todos, não só para alguns, ideal este tão necessário também para a vida das “gentes” contemporâneas e que se encontra bem espelhado na obra de George Steiner (A Ideia de Europa, Gradiva 2005), quando ele diz que “nos cafés e nas avenidas”, aí está inscrita a ideia cultural da Europa das pessoas concretas.
4. Fernando Valente, como que à descoberta, assumiu ser precursor na área musical dos instrumentos de sopro, a coragem de “sair” (para aprender mais), correndo os ares musicais da Bélgica, Espanha, França e Holanda (Amesterdão), cidade que ficará agarrada eternamente ao seu nome no famoso Quarteto de Saxofones de Amesterdão, e que o conduzirá à criação do Quarteto de Saxofones de Aveiro (em 1993). O homem português do Jazz, José Duarte (hoje na Universidade de Aveiro), disse sobre o seu amigo que “morreu fora de mão, em transgressão, como viveu”. José Duarte fala do contra-a-corrente na promoção da cultura musical que foi Fernando Valente, num país onde ela continua tão longe de pertencer à formação dos portugueses. Que outra forma melhor para aprender matemática que pela música?!...
5. Uma região que aprecia e celebra os seus artistas reconhece a sua identidade e cresce na universalidade da cultura e na promoção dos valores fundamentais. É esse o sinal louvável levantado pela Oficina de Música de Aveiro (por ele criada a 1997) e pelo Teatro Aveirense, contando com a parceria apreciável de entidades e colectividades que de norte a sul (e também a Amesterdão) se associam. Será de 9 a 17 de Novembro, com sede no Teatro Aveirense. Participar é engrandecer a música e Aveiro. Com a sua irreverência criativa, e no “lugar” Absoluto da melodia divina, o Fernando está connosco!

Alexandre Cruz

DIAS POSITIVOS

Generosidade dos ricos Diz um princípio clássico da moral que “não basta fazer o bem; é preciso fazer o bem bem feito”. É bom lembrar este princípio, porque de vez em quando achamos que basta fazer o bem. (São Paulo dizia que pregava a propósito e a despropósito. Os tempos eram outros. Hoje, pregar a despropósito é capaz de servir mais para criar anticorpos do que para fazer o bem). Esta reflexão provocou-a uma notícia dos jornais. A Câmara do Porto ofereceu um camião de recolha de lixo à cidade da Beira, Moçambique, e esta recusou-o. E com toda a razão. Então não é que o camião tem 25 anos, precisa de muita manutenção e, ainda por cima, tem o volante à esquerda, quando em Moçambique as viaturas devem ter o volante à direita (conduz-se à inglesa)? Os moçambicanos podem ser pobres, mas não são tontos. Fez-me lembrar que em tempos a tropical Guiné-Bissau teve navios quebra-gelos, oferecidos pela União Soviética… Só lhe faltava o Pólo Norte. Navios já tinha. Como escrevia um jornal moçambicano por estes dias, alguns países da Europa parece que querem transformar a África num depósito do lixo. Esta reflexão de outras geografias pode ajudar-nos a olhar para a nossa realidade. Quando a Diocese de Aveiro dedica o seu plano pastoral aos mais pobres e muitos cristãos o assumem, não devemos esquecer que não basta ser generoso. Há uma dignidade absoluta do pobre. E é preciso saber ser generoso.
J.P.F.
In Correio do Vouga

Semana dos Seminários

DAR VIDA AO SEMINÁRIO

"Dar vida ao Seminário, implica e pressupõe a oração intensa de toda a Comunidade Diocesana, o afecto e a generosidade que as várias iniciativas pastorais e o ofertório da Semana dos Seminários sugerem, revelam e exprimem.
Na medida em que a comunidade do Seminário seja sinal vivo de Cristo que chama novos discípulos e deles faz apóstolos do Reino, o próprio Seminário ajudará as famílias, os grupos, os movimentos apostólicos, os serviços pastorais diocesanos e as Comunidades cristãs a serem, também eles, sinais de salvação para o mundo e lugar vocacional por excelência."


Nota Pastoral do Bispo de Aveiro

AÇORES: Ilha de S. Jorge

Uma sugestão de férias 



A tranquilidade quase perfeita, sob o ponto de vista físico e emocional, pode ser usufruída em Fajã do Ouvidor, na ilha de S. Jorge, Açores. Esta sugestão de férias não é, obviamente, para quem gosta de folias e de barulho, nem para quem gosta de regressar a casa mais cansado do que quando partiu para gozar um período de descanso, longe da azáfama do dia-a-dia. É para os que acreditam que a paz interior e a fuga temporária à rotina também são importante. Para barulho e canseiras temos o resto do ano.

Francisco Sarsfield Cabral no CUFC

Clicar na imagem para ver melhor



GLOBALIZAÇÃO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO HUMANO
:
Francisco Sarsfield Cabral, director de Informação da Rádio Renascença e conhecido jornalista, especializado em assuntos económicos, vai estar no CUFC no dia 14 de Novembro, pelas 21 horas. Falará sobre o tema "Globalização, Economia e Desenvolvimento Humano", mas também estará disponível para responder às questões, postas pelos presentes, suscitadas pela sua intervenção.

Na Linha Da Utopia




AS (RE)VOLTAS DA REVOLUÇÃO RUSSA

1. Foi há 90 anos que ocorreu a chamada Revolução Russa. Após uma série de acontecimentos políticos nesse ano de 1917 que marcariam decisivamente o séc. XX, resultou a eliminação dos Czares e depois do derrube do Governo Provisório (Duma), e, por fim, a instauração do poder soviético bolchevique. Os objectivos estavam conseguidos: a criação da União Soviética (que duraria até 1991), pouco tempo depois do momento marcante que abre a “globalização” (com a “ponte” de João Paulo II) da abertura do Muro de Berlim (1989). Recuperando a história, a revolução Russa (1917) teve duas fases distintas: em Fevereiro (Março no calendário ocidental), o derrube da autocracia do (último) Czar Nicolau II (1894-1917); em Outubro (Novembro no Ocidente, a chamada Revolução Vermelha), o partido Bolchevique, liderado por Lenine (1870-1924) derruba o poder provisório e impõe o governo socialista soviético.
2. As motivações da referida revolução, como no fundo de todas as marcantes revoluções ao longo da história humana, terão sido a prévia concentração dos poderes. No chamado Império Russo, até 1917, reinava a monarquia absoluta dos Czares, poder sustentado pela nobreza rural que era dona da maioria das terras cultiváveis. Com a abertura (possível) dos czares Alexandre II (1858-1881, assassinado) e Alexandre III (1881-1894) à Europa Ocidental, a Rússia monárquica acolhe um desenvolvimento industrial que cedo viria a revelar as problemáticas da exploração no mundo trabalho. Eis o terreno favorável para a criação de novas correntes políticas ocidentais que chocavam com o velho absolutismo, surgindo neste contexto, sob inspiração de Marx (1718-1783), o Partido Operário Social-Democrata Russo. Este, na sua vertente bolchevique, viria a tomar o poder instaurando a União Soviética, e legando no séc. XX páginas de indigna história totalitária (a par de outras).
3. A história não pode ser apagada. Como esta da Rússia, em tantas revoluções, o absolutismo que se derruba é o poder absoluto que se levanta pela sua própria ideologia. Trágica limitação humana habitual da imposição das ideologias que apaga a liberdade de consciência... Ainda, mudam-se os tempos e os líderes vão mudando a “cor da pele”, tantas vezes, no seu oportunismo escancarado… Ou que dizer quando líderes da “cor” afirmam claramente que «hoje, só se pode ser comunista a partir de uma rejeição profunda do que foi a herança do comunismo na URSS, que foi um projecto conspurcado, uma tragédia» (Público, 7 Nov., 4.P2). Então, afinal?! Tantas vezes a história tem sido construída não por convicção mas por reacção, uma história contraditória. E se o argumento da revolução russa foi «a injustiça social, as desigualdades na distribuição da riqueza e exploração dos homens pelos outros homens» (id), então esta mesma ideia tem alimentado tantas revoluções, mas em que esses vitoriosos e defensores da causa acabam por viver o contrário da doutrina, impedindo a verdadeira justiça e igual dignidade.
4. Uma distância entre o discurso da “ideia” e a realidade prática enferma uma evolução saudável e positiva, e tem feito das “revoluções” um cavalo de batalha mais elitista que de serviço ao bem social de todos. Que novas revoluções estarão em gérmen? E quando os cidadãos se aperceberem a sério do seu poder? E como os antigos donos da revolução vão travando a nova? Que história (humana?) esta!


Alexandre Cruz

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Diálogo inter-religioso

Para quando a convivência fraterna
entre cristãos e muçulmanos? O Papa Bento XVI recebeu no Vaticano o rei Abdullah da Arábia Saudita. Em ambiente cordial, discutiram a situação das minorias cristãs nos países islâmicos, onde não são livres de viver a sua fé e de ver respeitados os seus direitos de cidadania. No entanto, nos países ocidentais, os muçulmanos são respeitados e até ajudados a cumprir os seus preceitos religiosos. É certo que se trata de culturas diferentes, mas, mesmo assim, não gostamos de saber que na Arábia Saudita, por exemplo, reina uma ditadura islâmica, capaz de menosprezar e até de perseguir os cristãos. Por isso, espera-se que o Papa consiga sensibilizar o rei Abdullah para a urgência de pugnar pela implementação de democracias tipo ocidental nos países árabes, onde as mulheres passem a ser tratadas como seres humanos com direitos iguais aos homens. Mas também que todos os árabes possam, se e quando quiserem, aderir livremente às religiões cristãs ou outras, sem sofrerem qualquer perseguição por isso. Em Setembro, 138 teólogos muçulmanos, de quase todos os países e correntes, enviaram uma nova carta ao Papa em que aproximam as concepções teológicas e os valores das duas religiões, numa clara atitude de convite ao diálogo inter-religioso, que tarda neste mundo que prega o pluralismo em várias vertentes. E num dos pontos mais significativos dessa carta chegam mesmo a propor a vivência de uma “competição” pelo amor ao próximo, quando frisam que “cristãos e muçulmanos constituem mais de 55 por cento da população mundial, o que faz com que a relação entre estas duas comunidades religiosas seja o mais importante factor para uma paz significativa no mundo”.
FM

PORTO DE AVEIRO: Documento histórico


in “MEMÓRIA DESCRITIVA ou notícia circunstanciada do plano e processo dos efectivos trabalhos hidráulicos empregados na abertura da Barra de Aveiro segundo as ordens de S. A. R. o Príncipe Regente Nosso Senhor”.
:
Publicado pelo PORTO DE AVEIRO

REVISTA À PORTUGUESA



Ontem, no Parlamento, esteve em discussão o Orçamento de Estado, com os resultados previstos de uma vitória que conta, natural e exclusivamente, com os votos do PS, partido que sustenta o Governo. Da análise do Orçamento, os portugueses pouco ficaram a saber, porque os deputados se limitaram a dar um espectáculo bem ao jeito da Revista à Portuguesa, que criou escola lá para as bandas de Lisboa.
Como nas revistas do Parque Mayer, onde não falta nunca um quadro especial, protagonizado, como sempre, pelos actores mais cotados, normalmente cómicos, também ontem isso aconteceu. Na Assembleia da República, marcaram presença todos os tradicionais ingredientes revisteiros, a que os nossos parlamentares já nos habituaram há muito. Desta feita, Sócrates e Santana Lopes, os tais actores principais da Revista, brindaram-nos com frases bem medidas e oportunas, mas que nada tinham a ver com o Orçamento. Tinham a ver, isso sim, com o apelo às palmas acaloradas e aos risos cúmplices, de ambos os lados da contenda, para desopilar o fígado… As televisões estavam à espera para mostrar tudo, até porque o espectáculo revisteiro tinha sido bem preparado e bastante divulgado, para ninguém perder pitada. Do que interessava aos portugueses e do seu futuro, nicles!
Fernando Martins

ARES DO OUTONO


CANÇÃO DE OUTONO


No jardim deserto,
Já Novembro perto,
Desfolhei as rosas últimas a dar.
Jóias maltratadas,
Rosas desfolhadas!
Só o seu perfume vai ficar no ar.

Recolhi os versos
– Breves universos –
Que atirara ao vento para os espalhar,
Queimei-os, rasguei-os.
Secaram-me os seios…
Só rimas e ritmos vão ficar no ar.

Saudades, lembranças
De vãs esperanças,
Fiz covais no peito para as enterrar.
Nada mais me importa.
Fechem essa porta!
Só um pó doirado vai ficar no ar.

José Régio
In “Música Ligeira”

Na Linha Da Utopia



É SÓ VIR NA TV!

1. Os instrumentos de comunicação vão ocupando o lugar referencial central. São admiráveis, mas desafiam fortemente o utilizador… que vai valorizando mais o parecer - aparecer (por isso o ter), e perdendo o SER, a essência, o essencial da própria vida. Nada de novo a que já não estejamos de tal forma habituados que já nem damos por isso. Mais que nunca, hoje, a TV põe e dispõe, constrói e destrói. Das estrelas e vedetas do mundo do espectáculo e desporto, às políticas e (des)culturas, a tudo e em tudo a televisão - hoje on-line – quer garantir uma plateia mundial em que, mesmo no meio da informalidade dos entretenimentos, procura uma formalidade que, de tanto repetir nas imagens, passa a ser mesmo “verdade”, mesmo que não o seja. A frase que tantas vezes se diz de que “veio na televisão” é o espelho cabal deste estatuto de uma ilusão infalível. Puro engano!
2. Há dias, quando da edição de duas publicações de figuras bem conhecidas da praça pública (Miguel Sousa Tavares e José Rodrigues dos Santos), alguém da área questionava para quê tanta divulgação publicitária de pessoas que já têm um palco habitual o que levaria a prescindir de tanto markting. Nessa conversa radiofónica, então, começou-se a explicar todo este gigantesco processo de bastidores que depois quer resultar na “obrigação” de o cidadão comprar o produto. E este efeito de impressão no espectador é tanto mais poderoso quanto menos visão crítica uma comunidade social tiver. Ir sempre atrás da última moda, tantas vezes (veja-se em Portugal o megacaso do telemóvel - no mundo somos dos maiores!..) será sinal de que algo de estruturante no plano cultural nos continua a faltar. Para já não dizer quando falta o dinheiro!...
3. Se ao poder da mágica TV pertence já o historial da investigação (mesmo) criminal no nosso país, lembre-se que a “ponta” de alguns novelos (como por exemplo o da Casa Pia) têm nascido das comunicações sociais, a verdade é que uma nova força denunciadora e poderosa se vai consolidando. O caso de situações de campanhas positivas ou de casos grotescos de indignidade, de saúde, mesmo a denúncia de ineficácia e incúria de instituições (públicas ou privadas) torna a televisão um meio poderoso e de delicada atenção. Em situações especialmente gritantes (como a recente da professora, em termos de saúde, claramente incapaz de leccionar) os cidadãos descobriram na TV um aliado especial que também “precisa” dessas notícias… As autoridades responsáveis da devida tutela ganham visibilidade pela negativa, e claro, como há que rapidamente acalmar as águas, a situação tem solução rápida. Do mal, o menos! Mas…nas sociedades ditas de desenvolvidas não é uma questão de TV mas de humanidade diária…

Alexandre Cruz