segunda-feira, 12 de outubro de 2009

O FIO DO TEMPO: Arregaçar as mangas!





1. Se fosse possível quantificar a energia investida nas campanhas e esta ser transferida para o «day after (dia seguinte)» aos actos eleitorais não havia país que não avançasse! Mesmo integrando as diferentes formas de olhar o futuro…, a verdade é que no “meio” dos programas a realizar muito terreno resulta como semelhante em ordem ao bem comum e a uma sociedade mais justa. É a hora de arrumar a tenda das campanhas, é momento de tirar os cartazes e devolver às rotundas das nossas avenidas a sua autêntica finalidade circulante. Cada acto eleitoral mobiliza ao seu jeito. Das europeias às nacionais (legislativas) e destas às locais (autárquicas), chega a hora de arregaçar as mangas em ordem a cada dia fazer o melhor possível.

2. Como já não havia memória, o país viveu três actos eleitorais seguidos. A esperada mobilização, e sendo verdade que a sequenciação das eleições daria razões para crescente interesse e mais participação, deu lugar a uma certa saturação e indiferença. Das campanhas e do estilo argumentativo de “fazer” política muitas são as lições que sempre se podem tirar, bastará haver grandeza e interesse para tal. Haverá? Nunca no dia seguinte se pode aceitar comodamente que tudo continue como dantes. Diante de tantos desafios da sociedade actual, é sentido esse «rasgo» constante que impele ao sentido dinâmico e evita o fecho do descompromisso? A cidadania activa e participativa não se pode acomodar no final do acto eleitoral, deve, antes, procurar implementar dinamismos novos, estimulantes e comunitários.


3. São heróis e grandes portugueses os que servem no designado poder local, na condição de se viver para servir. Na limitação dos meios de que dispõem têm de fazer o milagre da multiplicação e do contínuo mobilizar de recursos tirando o melhor de cada rua, terra, paisagem, tradição com inovação. “Esmiuçou-se” cada cartaz e cada ideia nas campanhas que dá para arrepiar como ainda estamos aí… Avancemos, arregaçar as mangas!

Alexandre Cruz

Universidade Sénior: início de uma caminhada

Ponte da Cambeia

À descoberta da Gafanha

Hoje foi dia de animar um grupo de trabalho na Universidade Sénior da Fundação Prior Sardo. Para iniciar a caminhada, à descoberta da Gafanha, marcaram presença 15 pessoas, adultas, aposentadas, reformadas ou em vias disso, ávidas de conviver e de trocar experiências. Penso que vai ser bom partilhar saberes, sentimentos, impressões e emoções. E sabores, quando houver motivos para isso. Abrindo a alma aos outros, à descoberta, ao conhecimento, porque o homem e a mulher não nasceram, unicamente, para viver isolados e fora do mundo. A solidão, quando desejada, também terá o seu lugar.
Gostei dos primeiros contactos. Gostei de ouvir as razões por que se inscreveram na Universidade Sénior, na Gafanha da Nazaré, recentemente criada. Gostei de sentir que ainda há gente capaz de compreender que é óptimo pôr em comum anseios, alegrias, inquietações e até algumas tristezas. Gostei de ver o espírito de abertura de todos os participantes. A naturalidade com que falavam, a serenidade com que ouviam, a indiferença com que viram o tempo passar. Sem pressas.
Quando penso em tantos reformados e aposentados fechados sobre si próprios e sobre o mundo que os rodeia, quantas vezes presos e conformados à mesa do café, ou tristes a olhar o céu azul e sem capacidade para se abrirem a horizontes novos, tenho pena que não descubram a importância de estar com os outros, alimentando projectos de vida com sentido.
Na próxima segunda-feira, e seguintes, a caminhada continua, à descoberta da Gafanha.

Fernando Martins

Para começar o dia: eleições autárquicas



Glória aos vencedores; honra aos vencidos

Os meus parabéns aos vencedores (que foram muitos, por várias razões) e também aos vencidos, que viveram, de forma concreta, a beleza da democracia. Uns e outros merecem o meu aplauso e a minha promessa de estímulo e de apoio, para que possam continuar a fazer-se eco dos anseios, a diversos níveis, das populações que povoam a nossa sociedade. Afinal, todos saíram vencedores, quanto mais não seja, pela coragem e determinação com que defenderam e propuseram os seus ideais para um mundo melhor. Por isso, "Glória aos vencedores; honra aos vencidos".

FM

domingo, 11 de outubro de 2009

Morreu o único padre casado em Portugal


Rádio Renascença:

Aos 86 anos, o Padre Saul de Sousa
não resistiu a um problema renal



Em 1968, e ainda na Igreja Lusitana, ramo português da Comunhão Anglicana, que permite o casamento dos padres, pediu dispensa para ser aceite na Igreja Católica.
Maria Fernanda de Sousa, recorda como o processo do seu marido esteve três anos no patriarcado: “Até que um dia o Arcebispo de Cízico, que era um senhor assim com barbas muito grandes, numa reunião presbiterial perguntou: ‘Ó Sr. Cardeal (era o cardeal Cerejeira), quando é que manda para Roma o processo do Pe. Saul?’”
O Patriarca mostrou-se renitente, “mas os bispos fizeram tanta força que ele resolveu mandar a carta para Roma. Passados 15 dias Paulo VI respondeu-nos dizendo que podia entrar, só tinha que actualizar a formação católica”
A ordenação deu-se em 1971, e foi a última celebração presidida pelo Cardeal Cerejeira. Nos 38 anos seguintes Saul de Sousa exerceu um ministério único em Portugal, como padre casado.

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Bispo de Aveiro encerra na Gafanha da Nazaré a semana Nacional da Educação Cristã



D. António Francisco:

Riquezas mal distribuídas atrofiam a liberdade e impedem a generosidade




“O olhar triste de tanta gente que connosco cruza nos caminhos da vida deve-se tantas vezes ao excesso de riquezas mal distribuídas que atrofiam a liberdade e impedem a generosidade.” Este foi, no momento que atravessamos, um alerta oportuno do Bispo de Aveiro e membro da Comissão Episcopal da Educação Cristã, D. António Francisco dos Santos, proferido na homilia da eucaristia conclusiva da semana nacional dedicada a este tema, celebrada na igreja matriz da Gafanha da Nazaré e transmitida pela Rádio Renascença, hoje, pelas 11 horas.

Depois de sublinhar a importância que a Igreja Católica dá à família, à escola e à comunidade, “como elos essenciais da sociedade e servidores da educação das crianças, dos jovens e dos adultos”, D. António afirmou que a “vida das nossas terras tem mais sentido e maior encanto com a presença e com o trabalho das escolas ao longo do ano lectivo e com a acção pastoral das comunidades”.

Lembrou “quanto recebemos da família, da escola e da comunidade onde nascemos, crescemos e vivemos”, sendo certo que elas ”modelam o nosso ser e o nosso agir”, preparando-nos para o futuro “como pessoas, como cidadãos e como crentes”.

O Bispo de Aveiro, ao dirigir-se aos sacerdotes, recomendou que todos devem dar especial atenção à catequese em todas as idades, fazendo dela “uma actividade prioritária, suscitando e alimentando nas comunidades uma verdadeira paixão” pela transmissão da fé, nos diversos espaços catequéticos.

D. António Francisco considerou particularmente importante no ministério dos sacerdotes e na acção da Igreja “uma articulação e relação entre a comunidade, a escola e a família”. E acrescentou: “Este diálogo deve implicar um trabalho conjunto entre párocos, famílias, catequistas, professores de Educação Moral e Religiosa Católica e outros agentes educativos, a fim de se apoiarem na sua missão, de lhes proporcionarem um enquadramento comunitário e de procurarem uma maior harmonia entre as acções pastorais, desenvolvidas nas famílias, nas escolas e nas paróquias.”

O prelado aveirense ainda manifestou a esperança de que neste trabalho e nesta missão haja “abertura e co-responsabilidade em todos os que hoje vão ser eleitos para o serviço das autarquias locais”. E frisou que a educação, estando cada vez mais vinculada às autarquias locais “como serviço de proximidade”, deve merecer, a quantos exercem este serviço, “uma progressiva atenção na certeza de que da qualidade do serviço educativo depende o bem das crianças e dos jovens e a construção do bem comum”.

Fernando Martins

O FIO DO TEMPO: O Nobel da expectativa



VOTO DE CONFIANÇA
PARA OBAMA

1. No dia 10 de Dezembro deste ano será o presidente Barack Obama a receber o Nobel da Paz. O facto surpreende pela prematuridade do acontecimento em relação a quem ainda está a começar. Normalmente é mais para o final da vida, com todas as provas dadas, que a atribuição Nobel é concedida. Obama tem antecipado muitas etapas, talvez porque os anos precedentes haviam revelado profundos desencantos e pessimismos. São vastíssimas as reacções ao Nobel que não deixa ninguém indiferente. Se as atribuições do comité norueguês têm sempre um cariz sociopolítico, este ano todas as expectativas foram superadas. De ondas de entusiasmo às suspeitas cépticas, de tudo um pouco pode-se confirmar nas reacções ao Nobel.

2. Poder-se-ão compreender tanto o entusiasmo como a dúvida vigilante. A verdade é que a «Esperança» de Obama surpreendeu a Humanidade e em tempo recorde conseguiu mobilizar os pensamentos num novo olhar diante de problemas antigos. Este voto de confiança e de responsabilidade sobre Obama – ele que muito tem proclamado a Nova Era de Responsabilidade – deixa em aberto o terreno concreto que nas acções precisa dessas inspirações. Como conciliar as ideias inspiradas com a prática crua e dura? Como activar a vontade a roçar a utopia com decisões políticas concretas? Na lógica normal, a atribuição do Nobel viria mais adiante, depois das acções confirmarem as intenções. É neste cenário que esta entrega no 10 de Dezembro, Dia Dos Direitos Humanos, é especial.

3. Se Obama só apresentou até agora «expectativas», então este é mesmo o Nobel das expectativas. O mundo pós-11 de Setembro 2001 precisava delas, pois que os pessimismos também de crise financeira careciam de uma luz de lucidez, nem que fosse só no plano das expectativas saudáveis. A eleição (multiétnica) de Obama abriu esse tempo novo, uma nova mundividência no plano das ideias. Obama é maior que ele próprio. Ele sabe disso. Venham as acções!

Alexandre Cruz

Para começar o dia: A Beleza do Douro



"Beleza não falta em qualquer tempo, porque onde haja uma vela de barco e uma escadaria de Olimpo ela existe." 

Miguel Torga

In Portugal

sábado, 10 de outubro de 2009

TECENDO A VIDA UMAS COISITAS – 152

BACALHAU EM DATAS - 42


Maria Frederico



A FROTA DO ESTADO NOVO

Caríssimo/a:

1943 - «De acordo com o discurso oficial, nasceria a “Frota do Estado Novo”, de barcos fabricados de madeira nos estaleiros nacionais e por operários portugueses, do “tipo CRCB” um modelo caracterizadamente português. Caracterizavam-se as novas unidades da seguinte forma: comprimento total aproximado dos 54 m, deslocação de 1500 t, motor principal de 500 a 650 CV e motores auxiliares de 20 CV movidos a óleos pesados. Capacidade de carga de 720 a 780 t de bacalhau e uma tripulação de 60 pescadores e marinheiros. [...] Dos mais de 15.000 pinheiros calculados para o efeito em Abril de 1943 já tinham sido abatidos 7.000 árvores nos pinhais de Leiria. Apenas os motores viriam a ser adquiridos no estrangeiro, o que , em plena Guerra Mundial, foi visto à luz do discurso oficial como um triunfo dos negociadores portugueses.» [Oc45, 112]

«Em 1943 seriam lançados à água outros navios de referência desse tipo: o BISSAYA BARRETO e o COMANDANTE TENREIRO, ambos de madeira e ambos armados pela Lusitânia, da Figueira da Foz.[3.º momento ainda da renovação da frota bacalhoeira nacional]» [Oc45, 100] (Vd. 1939 e 1941)

É fundada a Sociedade Gafanhense de Pesca, com dois barcos de pesca à linha e um arrastão, empregando à volta de 240 homens.

1944 - «Servindo-se dos seus estaleiros privativos, localizados na Gafanha da Nazaré, a Empresa de Pesca de Portugal, L.da, lançou à água, em 1944, um lugre-motor em madeira, delineado para a pesca do bacalhau, o MARIA FREDERICO. Era um lugre de três mastros, com “linhas airosas”, dois castelos e proa americana, possuidor de 48 m de comprimento, 800 t de deslocação e capacidade para carregar perto de 1000 t de bacalhau. Este navio traçado pelo engenheiro construtor naval Valente de Almeida, ocupou na sua construção 100 operários, orientados por António Pereira da Silva, sócio da empresa armadora.» [Oc45, 114/115]

Neste ano de 1944, 11 dos 41 barcos da frota bacalhoeira eram provenientes da Figueira da Foz.

Entre 1939 e 1944 dos 1639766 quintais de bacalhau, 222806 foram pescados pela frota figueirense.



Manuel

O TESOURO MAIS VALIOSO


Madre Teresa



O tesouro mais valioso é a pessoa humana


A maior aspiração da pessoa humana é alcançar o tesouro mais valioso da sua vida. Como o jovem rico de que fala o Evangelho. Faz tudo o que está ao seu alcance. Comporta-se segundo as regras do tempo: no campo social, económico, familiar e religioso. É íntegro e honesto em tudo e para com todos. Mas algo lhe falta.


Corajoso, vence as resistências interiores e parte à procura. Confiante, corre para o caminho por onde Jesus passava. Ousado, aproxima-se e reconhece a excelência de quem lhe pode valer. Humilde, abre o coração, expondo a sua preocupação inquietante: Que hei-de fazer para alcançar a vida eterna?


Este jovem “habita” em nós e manifesta-se de vez em quando. A sensação de que algo importante nos falta: a cura de certas feridas psicológicas e espirituais, a realização de sonhos apaixonantes, a capacidade de “segurar” o eterno da vida que vai escapando e nos convida a alargar os horizontes de Infinito.

A corrida do jovem é também nossa. Há urgência de obter resposta, de encontrar o que se pretende, de saborear o que tanto se deseja. De contrário, a insatisfação abre as “fendas” do mal-estar, da ansiedade e frustração.

“Um coisa te falta” – adianta Jesus na sua proverbial sabedoria.

Falta-lhe rever a sua relação com os bens a fim de ser livre. Falta-lhe abrir-se aos pobres e ser compassivo e solidário. Falta-lhe aceitar que por esta relação passa a sua realização pessoal definitiva. “Vai vender o que tens, dá o dinheiro aos pobres” e terás o tesouro definitivo da tua vida.


Ser livre é saber gerir os bens e não se deixar possuir por eles. É saber ser seu dono e não se sujeitar à sua tirania. É saber trabalhar com honradez e viver com sobriedade, abrir-se aos outros em sintonia afectiva, fazer suas as necessidades alheias e ajudar a minorá-las, sempre que possível.

Ser livre é cortar as “amarras” com que os bens prendem os seus possuidores e progressivamente os desumanizam. Ser livre é disponibilizar-se para servir em qualquer circunstância, amar os feridos e amargados, e progredir com eles nos caminhos de libertação.

O tesouro maior da humanidade e da Igreja é o coração liberto, a inteligência desinibida e peregrina da verdade, a vontade firme e persistente na prática do bem. O tesouro mais valioso é a pessoa humana, chamada à plenitude do seu ser e conviver, que encontra em Jesus Cristo o modelo da sua auto-realização.


Georgino Rocha

Dia Mundial dos Cuidados Paliativos

Mais um Dia Mundial para nos fazer pensar na pertinência do tema "cuidados paliativos". A (quase) certeza do sofrimento, físico ou outro, nosso ou de quem nos rodeia, deve levar-nos a estar atentos para a informação necessária. Laurinda Alves, voluntária em Cuidados Paliativos, escreve sobre a sua experiência. Veja aqui.


Neurociências e liberdade




Com a biotecnolgia o novo continente científico é o cérebro, e a pergunta é se, com os avanços neste domínio, o enigma do homem será finalmente superado ou se, pelo contrário, ele permanecerá. Grandes debates se travam entre as neurociências e a filosofia, precisamente por causa de temas candentes e incendiários, como a subjectividade, a autodeterminação, a vontade livre.



Sobre estas questões, o conhecido filósofo e professor da Universidade de Tubinga Manfred Frank acaba de dar uma longa entrevista ao alemão DIE ZEIT. O que aí fica reflecte esse debate.



A questão da subjectividade pertence ao núcleo da reflexão humana. Embora algumas correntes filosóficas falem da sua dissolução, penso que o sujeito é ineliminável. Argumento, mostrando que a condição de possibilidade de objectivar - no caso do homem, de objectivar-se - é o sujeito, de tal modo que, por mais que objective de si mesmo, o homem nunca se objectivará completamente, já que continuará a ser o sujeito que (se) objectiva.



M. Frank também afirma que nunca será possível reduzir a consciência e o espírito a processos neuronais, e isso "por razões de princípio". Há uma questão de princípio: como explicam as neurociências a passagem de processos físicos inconscientes a processos mentais conscientes? "Não é possível substituir o saber sobre nós mesmos por um saber objectivo sobre o mundo." A subjectividade cai fora do mundo, não pertence ao mundo dos objectos.



O "eu" do autoconhecimento não é redutível àquilo a que nos referimos com nomes ou caracterizações. "A autoconsciência é um conhecimento único, reflexivo, no qual uma pessoa se refere conscientemente a si mesma, mas a si mesma em posição objectiva. Como poderia ela, porém, captar este eu-objecto como ela mesma enquanto sujeito, se, antes desta apresentação objectiva, não tivesse tido uma consciência inobjectiva de si?" Esta consciência inobjectiva quer dizer vivida, pré-reflexiva.



Permanece uma questão: "Quando identifico espírito com matéria, não identifico matéria com matéria." Trata-se como que dos dois lados de uma moeda, mas as condições de verdade do neuronal não se identificam com as do espírito: as primeiras encontram-se num tratado de fisiologia enquanto as dos estados mentais são verificadas introspectivamente, como viu Descartes. Isso é experienciado também ao nível do vocabulário, que é diferente para descrever o psíquico e o estado físico correspondente: não teria sentido exprimir a inclinação amorosa por alguém, descrevendo os processos electromagnéticos no cérebro.



A tese de neurocientistas que afirmam não haver, por detrás do alegado livre arbítrio, senão processos neuronais, que determinam a vontade, contradiz não só a compreensão jurídica de responsabilidade mas também a nossa própria autocompreensão: queremos ser autores racionais de mudanças no mundo - tentamos "tomar decisões racionais".



Para lá dos sistemas jurídico-penais, que pressupõem a liberdade, um exemplo. Suponhamos que alguém tropeça, sem querer, e, ao cair sobre outra pessoa, esta é apanhada por um carro e morre. Distinguimos muito bem esta situação daquela em que alguém empurra intencionalmente outra pessoa. E há esta virtude admirável: resistir moralmente à maioria. Os opositores ao Terceiro Reich "merecem o nosso sumo respeito", precisamente porque foram poucos e capazes de enfrentar a morte. Aí, "os neurocientistas têm muito para justificar no sentido de dar conta do correcto normativamente dessas decisões a partir de processos neuronais".


Tudo o que é essencial, quando pensamos na humanidade, "vinculamo-lo ao pensamento da subjectividade e não à nossa representação do cérebro. São sempre pessoas, sujeitos, que consideramos como criadores de literatura, cultura ou religião". Afinal, "temos cérebros e somos eus". Daí poder formular-se o imperativo categórico de Kant nestes termos: "Nunca trates os seres humanos como coisas, mas sempre como sujeitos e pessoas." Se o mundo consistisse só em objectos, não haveria ninguém a quem dirigir o preceito: "Porta-te decentemente com os outros sujeitos."



Para começar o dia


Grande Veleiro Canadiano Concordia entre nós



No seguimento da Regata dos Grandes Veleiros, realizada em 2008, com reconhecido sucesso que instituiu o Município de Ílhavo e o seu Porto de Aveiro com “friendly port”, vai estar entre nós mais um grande veleiro, o Concordia, pertencente a uma universidade privada do Canadá, a “West Island College International”.

O “tall ship class A” - SV Concordia - chega ao Porto de Aveiro no próximo dia 14 de Outubro, quarta-feira, aqui permenecendo durante cinco dias (largada a 18 de Outubro), com visitas em horário a definir proximamente.

A sua tripulação de 57 pessoas (dos quais 48 Alunos) terá um programa cultural e turístico durante o tempo da estadia, com centralidade no Município de Ílhavo.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

País real ou "Portugal dos pequeninos"?




Cada vez aparece mais lúcida e actual a expressão “país real”. Esse país que, de norte a sul, trabalha no campo ou nas empresas, nos serviços ou nas escolas, que luta pela justiça e pelo bem-estar, que sofre injustiças de que ninguém se acusa, solta gritos que ninguém ouve. País real, como lhe chamou Sá Carneiro, é este povo desconhecido de muitos que dele falam eloquentemente e até dizem que é ele quem ordena, e se julgam mesmo, ciclicamente, os legítimos delegados e defensores dos seus direitos.

Só conhece o país real quem se cobre com o pó dos seus caminhos, suja os pés na sua lama, gasta tempo a ouvir quem nele luta e é a reserva nacional do bom senso, da honestidade, do trabalho, do respeito, da verdade e da justiça a toda a prova. Povo que cresceu com a chave sempre na porta, aberta, como o coração, a quem chegava e, agora, se vê ameaçado e inseguro nas suas pessoas e bens, vendo admirado, incólumes e à solta, os profissionais da mentira, do assalto aos bens alheios, do ataque infame a idosos indefesos, do crime frequente. Povo com centenas de milhares de portugueses que não querem o pão dos subsídios, mas o salário justo de um trabalho certo.

Pó e lama deste povo significam a dor e os sacrifícios de milhões de portugueses que, aqui ou lá fora, lutam para viverem uma existência de pessoas, que muitos não a tiveram antes, e poderem transmitir aos filhos, com a educação que os prepare para a vida, os valores duradoiros que a tornam digna.

Pó e lama é a carência sofrida de muita gente que ainda não dispõe de meios para cuidar a tempo da saúde, nem possibilidade de uns dias de férias repousantes, necessárias e justas. É o esforço inglório de milhares de jovens para quem um diploma de curso é pouco mais que um papel inútil, e vêem voar o tempo, sem lobrigarem trabalho e condições para constituir uma família com estabilidade. É a dor inconsolável de muitos idosos que trabalharam uma vida inteira sem horários, antes do sol nascer e para além do sol se pôr, e, que hoje, sofrem com a míngua do pão, cada dia mais caro, e a premência de ter de contar os tostões para poder comprar remédios indispensáveis. Os passeios gratuitos por todo o país, com almoço incluído, que os políticos lhes proporcionam, não apagam carências essenciais do dia a dia, nem enxugam lágrimas choradas no silêncio das noites sem fim e, agora, de uma casa sem gente.

Muitas coisas melhoraram neste pai real. Mal seria se assim não fosse. Mas não se atribuam honras próprias ao que se faz por dever e sempre com o dinheiro que não é dos que governam. Nenhum bem social é favor, a que título seja, de políticos generosos.

Ao lado deste país há outro que, também, é Portugal. Quem vir os canais de televisão em concorrência, onde cada vez mais vale tudo, ler os jornais que procuram fugir à falência, vendendo títulos enganosos, folhear, ainda que só nas salas de espera dos consultórios médicos, as revistas cor-de-rosa que desvirtuam a vida e os sonhos de muita gente; quem reduzir os seus horizontes humanos e sociais ao mundo do futebol, perceber os objectivos, públicos e ocultos, de algumas juventudes partidárias, e mesmo de gente adulta que navega nas mesmas águas, observar a saída apressada das tocas e esconderijos dos que nela escondidos na hora da luta, investem logo que lhes cheira a proventos possíveis da morte ou da infelicidade de outros do seu mundo, ficará, com uma ideia razoável, ainda que não perfeita, do que é o “Portugal dos pequeninos”.

Intrigas e coscuvilhices políticas, até ao extremo, dão horas intermináveis a politólogos, jornalistas, políticos profissionais, gurus do pensamento e do saber, que esclarecem pouco e intoxicam muito. Tudo gente que só tem certezas, fala e não deixa falar, só as suas opiniões são verdades incontestáveis. Neste momento, Portugal são apenas duas pessoas. O resto é gente que não interessa. Neste país de gente pequena, os modelos em promoção reduzem-se a políticos vazios, futebolistas de milhões, gente fútil de telenovelas e passarelas… O povo que trabalha, esse não tem história.

António Marcelino

Para começar o dia: OBAMA Prémio Nobel da Paz


Obama

Acrescidas responsabilidades para Obama


Para começar o dia e o fim-de-semana nada, nada melhor do que uma excelente notícia. Obama, o Presidente dos EUA, é Nobel da Paz. Não pela obra feita, mas essencialmente pela esperança que espalhou no mundo de uma nova ordem social. Uma nova ordem social de mais paz, de mais solidariedade, de mais justiça.
Por mais justos que sejam os prémios, por mais oportunas que sejam as distinções e as honras, há sempre quem desdenhe, quem critique, quem discorde e quem diga mal das escolhas feitas. Contudo, penso que neste caso as discordâncias até servem para sublinhar a importância do Nobel da Paz atribuído a Obama. O Presidente da mais poderosa nação da Terra recebe com o prémio, talvez o mais apetecido, uma acrescida responsabilidade nas respostas aos problemas que dele todos esperam.

FM

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Crónica de um Professor: Negligência médica



Nesta era da globalização, é um lugar comum dizer-se que a comunicação está à distância de um click do rato, no computador.
Todos sabem e estão atentos aos rápidos progressos que as novas T.I.C.s (tecnologias de informação e comunicação) têm operado e o quanto têm influenciado a celeridade dos contactos interpessoais.
Sim, é um facto incontestável, a rapidez com que hoje se comunica. Partindo deste pressuposto, esperar-se-ia que as relações humanas fossem mais profícuas e até incrementadas. Seria, numa sociedade moderna que acompanha esta evolução tecnológica a seu favor.
O episódio que vou relatar, vem, infelizmente contrariar esta realidade e pôr a nu os podres duma sociedade enferma, em termos de comunicabilidade.
Tive conhecimento através de pessoa amiga, dum caso de omissão em efectiva comunicação.
Aconteceu ali na Costa Nova, quando por imperativos de solidariedade humana, uma pessoa chamou os serviços do INEM, para socorrer um senhor que estava a sofrer aquilo que se pensava ser um acidente vascular cerebral. Pelo menos, foi isso que pareceu à senhora, detentora de uma provecta idade, cuja longa experiência de vida lhe consente fazer este diagnóstico clínico. Dada a gravidade da situação, a senhora insistia na urgência da vinda do INEM, relatando sumariamente os sintomas do acidentado. Do lado de lá da linha telefónica, ouvia uma voz feminina a inquirir com uma curiosidade mórbida, em contextos destes, todos os sintomas e reacções do indivíduo, em questão. Estranhando tal atitude, nesta situação de urgência interventiva, insistia a senhora que não se podia estar com aquela minúcia, já que ali, estava a vida duma pessoa em jogo. Foi tal a demora no atendimento do pedido de socorro, que o nervosismo começou a apoderar-se dos familiares do doente e no auge do desespero, chegou a haver uma troca ácida de palavras, entre os dois lados da linha O senhor entrou em paragem respiratória, que se a princípio era intermitente, passou a ser contínua…acabando o senhor por falecer.
Aí, vem ao de cima a inoperância dos serviços médicos de instituições como o INEM, ou…de pessoas inaptas para o serviço que desempenham.
Chegaram a vir, tarde e a más horas, justificando a demora com a ocorrência de chamadas indevidas de pessoas que brincam com estas situações da emergência médica. Fica a pergunta: será que haverá criaturas tão desmioladas que se põem a brincar com coisas tão sérias como a vida das pessoas? Custa a crer que haja de facto brincadeiras deste mau gosto, que sirvam de justificação para se perderem vidas humanas. E…ainda que tais situações tenham já, ocorrido, pontuais, depreende-se, nunca se poderá fazer uma generalização. É de lamentar, profundamente, que tais erros humanos ainda aconteçam em pleno século XXI.
E…lá no fundo fica a perplexidade da pergunta: tendo isto ocorrido no dia 5 de Outubro, será que o pessoal também fechou a loja para desfrutar do feriado e deixou lá alguém incompetente para as funções de alta responsabilidade que lhe estão acometidas?
Perdeu-se uma vida e nada no mundo poderá ocupar o vazio que ela deixou.
Fica aqui o aviso: a família da vítima tenciona recorrer judicialmente para apurar das responsabilidades e muito bem!

M.ª Donzília Almeida

08.10.09

O FIO DO TEMPO: Povo que Participas?


AMÁLIA
NO TOPO
DA MONTANHA


1. A incontornável Amália (1920-1999) tanto cantava com a nostalgia lusitana «povo que lavas no rio…». As tábuas de Amália continuam a ecoar, quer numa maravilhosa nova geração de fado quer na candidatura do Fado Português a património da Humanidade na UNESCO. Uma ideia que dá que pensar é como o fado, a cantiga da alma das gentes, fez um caminho admirável até aos palcos internacionais, percurso esse de uma irreverência criativa, mas que, predominantemente, revela uma face saudosa que muitas vezes, mais que mobilizar activamente, poderá fazer parar nostalgicamente. Não é linear, nem o fado tem muitas regras, como se sabe… Sabe-se e reconhece-se a originalidade do fado, enaltecido por tantos nomes que terão na Amália o topo da montanha.

2. Se muitos sentimentos reflectidos no fado poderão até ser reflexo de conjunturas sociopolíticas, a verdade é que a canção portuguesa nunca se deixou aprisionar e traz sempre consigo a ânsia de novos mares a navegar. Também é verdade que pertencerá à história da identidade nacional, sem mitologias excessivas, que o fado como destino da aceitação de tudo e tristeza que paralisa reflecte-se naqueles estudos europeus ou mundiais que volta e meia nos dizem que somos mais tristes que alegres, nostálgicos do passado que empreendedores do futuro(?). Claro que o fado não tem culpa de nada, ele acontece, reflecte, manifesta, espelha… O fado poderá aliar a memória da tradição ao projecto visionário e aventureiro do amanhã? Claro que sim, as gentes do povo têm a “caneta” nas mãos em cada dia…

3. Não parece mas eis-nos diante de outro acto eleitoral de altíssima responsabilidade cívica. O fado de que tudo está mal ou tudo está bem (até porque tal nunca é verdade) não pode aprisionar e limitar a intervenção dos cidadãos. Povo que participas…! Mais que uma questão que seja a afirmação convicta de todos serem actores da construção do bem comum. Só a participação dá razões para a exigência! Dar frescura ao fado!

Alexandre Cruz

Universidade Sénior da Fundação Prior Sardo



                               
Portas abertas à partilha de saberes


Comecei o meu dia no blogue com artes. Penso que as artes devem estar sempre nos nossos horizontes, porque a beleza dá outro sentido à vida. Tal como a bondade, a tolerância e o amor. Mas hoje também poderia começar com outros temas enriquecedores, como a solidariedade, a disponibilidade e a beleza da partilha. É que, a abertura do ano lectivo da Universidade Sénior da Fundação Prior Sardo, que ocorreu da parte da manhã, suscitava isso mesmo.
Mais de meia centena de pessoas interessadas em partilhar saberes e alguns jovens (e menos jovens) disponíveis para as acompanhar e animar, nessa troca de conhecimentos, marcaram significativa presença na sede da Fundação Prior Sardo.
Afinal, e ao contrário do que muitos pensam, há gente que gosta de dar e de receber cultura e valores, que emprestam mais vida à vida de cada um e de todos.
Gostei de tudo, mas não posso deixar de valorizar o precioso contributo de jovens, abertos ao convívio com uma geração mais idosa, que não velha. Idosos que não são velhos são aqueles que acreditam que o saber não ocupa lugar, que há continuamente razões para aprender mais e para dar o seu saber a outros.
Jovens que podiam ser meus netos, mas que ali estavam animados pelo prazer de pôr em comum o que podem (e podem muito) e sabem dar.
Quando vejo uma certa juventude mais voltada para futilidades, mais aprecio esta, que cultiva a solidariedade, a disponibilidade e a beleza da partilha.

FM

Nota: Inscrições e Informações na sede.

 

ARTE PARA COMEÇAR O DIA: Sobre a Igreja de Santa Maria, de Siza Vieira


Igreja de Marco de Canavezes

A substância dos sonhos é a luz

A igreja de Santa Maria nasceu duma necessidade, mas depressa se tornou num sonho. Há realidades assim: nascem como nascem os dias, previsíveis, com uma determinação habitual. E depois, há um lanço de luz, um encontro essencial, uma notícia, sei lá, uma dobra do tempo súbita e surpreendente, que tudo alteram. A igreja de Santa Maria (na altura, apenas a igreja nova) era mais uma igreja que era necessário construir, como muitas vezes e em muitos lados acontece. Um dia, talvez ao acordar, tomei consciência do fardo enorme que os meus ombros teriam de suportar. O que fazer, como fazer, por onde começar?

Nuno Higino

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quarta-feira, 7 de outubro de 2009

O FIO DO TEMPO: Ajudar é em tempo real



1. O turbilhão do sismo e tufões tem marcado os dias difíceis da costa asiática. Indonésia e Filipinas, especialmente, foram fustigadas por tragédias naturais que nos devem deixar a pensar. As designadas sociedades de bem-estar ocidental são, volta e meia, abaladas por imagens de tragédias cuja proveniência sendo de longe se fazem bem perto. Se o tsunami de 2004 teve grande impacto na consciência do mundo, seja registado o dado histórico que estas chuvas torrenciais de há mais de uma semana bateram os máximos registados desde 1976, tendo inundado mais de 80% de Manila (capital das Filipinas) e provocando centenas de mortos e desaparecidos. Em zonas do planeta tão frágeis, em termos de construção civil para as gentes do povo, poder-se-á dizer, o safanão da natureza provocou estragos em casas e edifícios atingindo alguns milhões de pessoas.

2. Números são números, pouco valem, porque o que conta é cada pessoa que sofre. Esta visão personalista da vida e dos valores humanos aplicados na solicitude para com cada ser humano faz-nos ficarmos sensibilizados para com cada situação. É esta a alma que é a chama sempre nova da multidão de missionários modernos que são presença de apoio humanitário. Muitas coisas (mesmo passos e ideias em termos de clubismos ou visões sociopolíticas e religiosas) poderão ser questionáveis, mas o que nunca o será é o espírito do «amor ao próximo», esta a autêntica escola da vida que gera futuro. Nesta hora da tempestade merecem lugar de apreço especial as organizações que largam a teoria e partem para o lamaçal. Apoio em termos de saúde e de alimentação são nesta hora a presença da «salvação».

3. Milhares de pessoas soterradas, cerca de mil mortos e uma multidão de deslocados. Nesta hora da necessária ajuda em tempo real a AMI – Assistência Médica Internacional está lá (www.ami.org.pt). Nas Filipinas e Indonésia, como em tantos outros locais, aqui e ali, é hora do essencial: gerar espírito de serviço.

As minhas reportagens: Banco do Tempo de Ílhavo


Maria das Dores, Jorge Neves e Maria de Lurdes


O Banco do Tempo
é o único que não vai à falência


“Aqui, no Banco do Tempo (BT), não queremos dinheiro nem subsídios de ninguém, apenas queremos dar horas e receber horas; o BT é o único que não vai à falência.” No final da entrevista, Jorge Neves, um dos coordenadores do BT de Ílhavo, sintetizou de forma lapidar o que é esta estrutura, criada pelo Graal.
Aposentado das suas obrigações profissionais, pensava que ficaria livre, mas está completamente ocupado. “110 por cento envolvido em trabalhos de casa, pertenço ao Grupo Poético de Aveiro, digo poesia e estou no BT”, disse.
O “bichinho” da solidariedade surgiu-lhe quando o Diniz Vizinho, “que é o maior entusiasta deste projecto”, o convidou, em 2008, para o ajudar a reorganizar o Banco, que estava um tanto ou quanto adormecido, depois de ter sido criado em 2002.
As dificuldades que encontraram foram muitas, mas tudo se compôs e hoje já há 50 pessoas que aceitaram trocar horas, ao jeito do espírito de vizinhança, o qual está a perder-se com o corre-corre da vida dos nossos tempos.
Segundo Jorge Neves, “os ilhavenses mostravam-se um pouco cépticos, à espera do que isto iria dar; também mostravam algumas reticências em admitir que alguém entrasse em suas casas, para partilharem ajudas”. E acrescentou: “As pessoas gostam mais de dar do que pedir.”
Sabendo que é cada vez maior o número de idosos nas nossas comunidades, graças à esperança de vida que continua a crescer, Jorge Neves adiantou que muitos ficam “inactivos e descrentes da vida, caindo na solidão”. Torna-se necessário, por isso, envolver essas pessoas em tarefas que lhes dêem prazer. E explicou: “durante a vida profissional faziam sempre as mesmas coisas, deixando de lado gostos que ficaram à espera de poderem ser realizados; agora podem concretizá-los, porque têm tempo para isso; só precisam de ser estimulados, tarefa que nos cabe a nós.”
Recordou o caso de uma senhora que vive só, porque os filhos trabalham e residem longe. “Um dia foi apanhar umas folhas de couve ao quintal para uma sopinha; sentiu-se mal e caiu; sem poder levantar-se, ali ficou 24 horas, suportando o frio da noite e a angústia de não ter quem lhe valesse. Passado esse tempo, uma vizinha estranhou a sua ausência e foi encontrá-la naquela situação. Felizmente resistiu.”
“Este exemplo – sublinha – leva-nos a cultivar o gosto de olhar para o lado, porque a solidariedade não é nem pode ser uma palavra vã; tem mesmo de ser vivida e trabalhada 100 por cento, por cada um de nós e por toda a comunidade.”
Maria de Lurdes está no BT desde o início. A primeira fase foi desanimadora, mas agora, felizmente, há mais motivação. Neste momento dedica quatro horas semanais à confecção de bonecas, em colaboração com Maria das Dores, para serem enviadas para a Guiné.
Muito importante foi, sem dúvida, conseguir estimular um vizinho que ficou sem as pernas de um dia para o outro. Como é membro do BT, envolveu-o na tarefa das bonecas. “Quando lhe falei para colaborar, ele ficou muito emocionado”, frisou a Maria de Lurdes. E explicou: “O BT tem de olhar para casos de pessoas que estão em situação difícil e que precisam de incentivos, para não pensarem nas doenças.”
A Maria de Lurdes confessa que não gosta muito da cozinha. “Se puder fugir da cozinha, fujo!” Por isso, pediu ao banco alguém que a pudesse ajudar na confecção de comida para uma filha, que exerce a sua profissão no Porto. E lembrou que os pedidos e ofertas de horas têm de ser feitos no BT, directamente ou pelo telefone. “Isto não é um clube de amigos”, referiu.
Uma senhora aderente logo se prontificou a fazer aquilo que a Lurdes desejava. Como as trocas podem não ser directas, outros membros do banco trataram-lhe do jardim e pintaram-lhe uma parede. A Lurdes, contudo, já foi passar a ferro.
Maria das Dores, que colabora na confecção das bonecas, também aderiu ao BT desde a primeira hora. Ofereceu-se, no acto da inscrição, para estar com idosos necessitados de companhia, escrever cartas e ler a quem não o possa fazer, ajudar em tratamentos, seguindo instruções de enfermeiros, e cuidar de crianças.
Considera importantíssimo o espírito de entreajuda, o que a leva a falar do BT, com o objectivo de cativar mais gente para este serviço. Os que aderem precisam, naturalmente, de ser apoiados na integração. Mas a Maria das Dores ainda lembrou outras tarefas, entretanto programadas. Como Ílhavo é uma terra de marinheiros, sabe-se que muitos homens, com carro próprio, já não podem conduzir, estando impossibilitados de ver o mar e de passar pelas nossas praias. Pois isso vai ser feito, com alguém do BT a conduzir os seus carros.
Jorge Neves esclareceu que os membros do BT não são apenas pessoas reformadas ou aposentadas. “Temos bastantes com os seus empregos, incluindo crianças.” Crianças? E apontou três exemplos: “Uma, depois de ouvir histórias contadas pela avó, começou a contar-lhe as suas próprias histórias; outra veio ao banco pedir que lhe indicássemos uma colega que quisesse passear com ela de bicicleta; outra, menina de 13 anos, ofereceu-se para fazer fosse o que fosse; as primeiras tarefas foram passar a ferro no Lar de São José e andar com velhinhos nas suas cadeiras de rodas.”
O Lar de São José foi o aderente n.º 1. Nessa linha, o BT substitui alguma voluntária que falte, na hora de passar a ferro, e no Verão disponibilizou-se para conduzir o autocarro do lar, transportando os idosos para a praia e acompanhando-os.
O BT de Ílhavo está ligado ao Banco Central, coordenado pelo Graal. Há uma rede de 27 BT no país, todos motivados para apoiar a família e a conciliação entre a vida profissional e a vida familiar, através da oferta de soluções práticas da organização da vida quotidiana. Desta forma, pretende-se construir uma cultura da solidariedade, promovendo o sentido de comunidade, o encontro de pessoas que convivem nos mesmos espaços e a colaboração entre gerações. No fundo importa construir relações sociais mais humanas, valorizando o tempo e o cuidado dos outros, estimulando os talentos e promovendo o reconhecimento das capacidades de cada um.
Em Ílhavo, o BT mantém uma parceria institucional com a paróquia de São Salvador, contando com apoios pontuais da CGD (para a confecção de cartazes), Jornal Ilhavense e Rádio Terra (para a difusão dos ideais e projectos do banco) e Junta de Freguesia (para despesas de água, luz e telefone).

Fernando Martins
 

Caras e corações


Será que existe a razão pura? Sem mancha de interesses ocultos, envolvências afectivas, ziguezagues de simuladores ardilosos? Segundo Kant essa razão cristalina, límpida, transcendental, criaria a grande base da ciência. Se é possível ter acesso à ciência, também é possível ter acesso ao bem.
Que terá tudo isto a ver com as eleições, concretamente as autárquicas?
A verdade do governo da cidade não vem muitas vezes duma ideologia, dum projecto, duma razão pura e objectiva. Nem sequer dos confrontos teatrais ou cómicos largamente expandidos nas televisões. Desta vez não há figuras mitificadas pelos media.
Estamos perante um voto de proximidade, vizinhança, com nome familiar, presença nos acontecimentos da comunidade, que ajuda a desenhar a cidade velha e a construir a nova cidade. Mas também a rua, o bairro, o muro, a casa, a janela, o canteiro das flores e o candeeiro em frente. Esse rosto tem poder, o seu governo, os seus ministros, que se reúnem, discutem e decidem. Aprovam e recusam, erguem e derrubam. Tudo ao pé da porta, com gente que a terra viu nascer, fazer-se doutor ou engenheiro, ou nunca aprendeu nada na vida a não ser passear-se por gabinetes e riscar sentenças. Certas ou erradas, desabam sobre o quotidiano da comunidade, no caminho que percorre, no asfalto às ondas ou nas estátuas por vezes inúteis que nada assinalam a não ser quem as mandou construir. Mas também quem se dá pela comunidade, a acompanha na sua festa e na sua dor. Quem vê e acompanha por dentro os grandes tempos e as rotinas da aldeia deserta e esquecida.Com testemunhos históricos: o pelourinho, a igreja, a escola, festa anual e esse orgulho com que cada um diz que esta é a sua terra.
Grande parte dos votos tem este cenário e recai sobre pessoas mais que conhecidas. Por isso se pergunta: será que o coração deixa funcionar a razão na eleição dos governantes locais? Será a comunidade lúcida na escolha dos homens e mulheres que vão gerir os seus destinos? Não será necessário escolher os melhores em vez dos mais amigos e simpáticos? Haverá democracia na miscelânea de interesses imediatos e de conluios com caciques com fachada de benfeitores?
Evocar Kant para lembrar que a razão deve funcionar nos grandes tempos pessoais e comunitários, é apenas aceitar que importa ver corações para além das caras. E que, como disse Jesus: “a verdade vos libertará”. (João 8, 32)

António Rego

terça-feira, 6 de outubro de 2009

IMIGRANTES: Portugal é o país mais generoso




Ao nível do acolhimento dispensado aos imigrantes, as Nações Unidas consideraram o nosso País como o mais generoso de todos. Assim  o afirma o Relatório do Desenvolvimento  Humano de 2009, ao sublinhar que Portugal foi considerado o mais bem classificado na atribuição de direitos aos imigrantes, em especial nas áreas da educação e da saúde. Por isso,  não vale a pena passarmos a vida a gritar que somos maus em tudo. Não somos. Neste como noutros sectores, estamos, afinal, bem classificados.

AMÁLIA: A minha simples homenagem


O FIO DO TEMPO: O lugar da UNESCO




1. Olhando os sinais do mundo, para além da agitação de campanha do nosso quotidiano mais próximo, valerá a pena reparar em importantes passos andados na UNESCO. Se a educação, nos países de liberdade democrática, é apresentada como o factor essencial de progresso humano e social, então as instâncias mais amplas na proposta de indicativos para a educação hão-de ter lugar de referência central. A UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), cujo lugar-sede é em Paris, é uma dessas organizações primordiais que têm emanado continuamente e com pertinência documentos, recomendações e conclusões a propósito das mais variadas matérias.

2. A UNESCO foi fundada a 4 de Novembro de 1946, «com o objectivo de contribuir para a paz e segurança no mundo mediante a educação, a ciência, a cultura e as comunicações». Com propósitos tão nobres o seu lugar haveria de sair reforçado, sendo os seus preciosos documentos resgatados do público especializado para o público em geral. Por vezes é estranho observar como, quer na sociedade do conhecimento e da comunicação, quer nos designados sistemas educativos formais, ainda há tão pouco lugar para estes grandes documentos estruturantes, pensados por investigadores de diferentes formações e culturas. Como é possível que sobre determinados assuntos de plena actualidade haja tão pouco lugar para o pensamento daqueles que já passaram pelas mesmas dúvidas socioeducativas que hoje temos?

3. A UNESCO a 23 de Setembro elegeu para directora-geral a diplomata búlgara Irina Bukova. É a primeira mulher eleita para a responsabilidade de presidir à UNESCO. Do seu programa de ideias destacam-se, no espírito das raízes da organização, o respeito pela cultura da paz e o património cultural como factor de desenvolvimento. Eleição que honra a instituição em fase de renovação e que poderá despertar a comunidade para que o lugar da UNESCO seja a casa de cada um.

Alexandre Cruz