terça-feira, 18 de março de 2008

CUBA: Abertura já começou


Cubanos autorizados a criticar

Li no PÚBLICO que o jornal do PC cubano passou a autorizar a crítica à actividade governativa. Até aqui, os principais jornais concentravam os seus artigos no inimigo ideológico do regime de Fidel, os Estados Unidos. A partir de agora, poderão escrever sobre a ineficácia da administração, o roubo ou a corrupção na economia estatal. Não sei se poderão avançar com sugestões, mas penso que sim.
Também uma notícia recente, da passada semana, dizia que os cubanos poderiam adquirir torradeiras e outros artigos eléctricos, porque a energia já suportava a sobrecarga produzida por esses utensílios domésticos. Isto tudo ao fim de 50 anos de regime e depois de Fidel ter deixado o poder estatal.
Dá para pensar…

FM

PORTUGALIDADE NO MUNDO



“Em 2002 fiz uma volta ao mundo e passei quase um mês no Havai.
Visitei duas ilhas, a Ilha do Grande Havai e a Ilha do Oahu. A primeira coisa interessante foi descobrir a influência portuguesa. Eu não fazia a mais pequena ideia e penso que poucos portugueses sabem disso.
Quando eu pensava que estava num lugar muito longe, Portugal aparecia nas horas mais impróprias e das maneiras mais estranhas: em quase todos os restaurantes havia uma “sopa de feijao” e muitas padarias tinham neons e dizer “pao doce”. O principal cómico local, que era uma espécie de Herman José de lá, tinha um nome português, era Ferreira ou Pereira ou algo assim.
Há também uma base religiosa católica no Havai que foi levada pelos portugueses. Passei o tempo a tropeçar em portugalidades… até o ukelele tinha lá qualquer coisa da nossa guitarra portuguesa.”

Edson Athayde, conhecido publicitário de sucesso, que vive em Portugal.
In Fugas, suplemento de Viagens, Prazeres e Lazer do PÚBLICO


NOTA: É sempre bom sabermos que Portugal deu mesmo novos mundo ao mundo. E que ficou, com marcas indeléveis, em qualquer ponto da Terra, como que à nossa espera para se mostrar e nos mostrar os portugueses que fomos e que... ainda somos, se quisermos.

FM

Ao encontro do silêncio de Deus


“…a Quaresma convida-nos a “treinarmo-nos espiritualmente”, para que, neste “processo de renovação interior estejam presentes a oração, o jejum e a esmola.” -, diz-nos o Papa Bento XVI na sua Mensagem para a Quaresma de 2008.
Nestas breves palavras, como se diz na gíria popular, “os dados estão lançados” e o desafio está feito a cada um para (re)descobrir e (re)criar o caminho que o há-de preparar e transportar à Páscoa do Senhor.
No sábado passado, ainda que o tempo não estivesse muito convidativo, decidi pôr-me a caminho da Serra da Freita, com o sentido de me “treinar” espiritualmente.
Desde há muito, que gosto deste passeio, que me leva pela Serra do Arestal até à Serra da Freita.
Não são as belas paisagens ou as novas perspectivas da beleza que vou encontrando que são o motivo deste apelo espiritual. Sinto, isso sim, que este (re)encontro com a natureza oferece-me um outro gosto, decantado por toda a beleza que a envolve, pela originalidade da busca e pela surpresa que, na montanha, se torna mais imprevista, ou seja, mais original e autêntica.
Como dizia o Padre José Tolentino Mendonça, na entrevista que concedeu à Agência Ecclesia, no passado mês de Fevereiro: “Cada um de nós tem a sua serra, onde encontrará o silêncio matricial.”
Na mesma entrevista, o Padre Tolentino Mendonça, acrescenta: “ele [o silêncio] é necessário para fugirmos ao nosso próprio ruído. O grande ruído não está na cidade, mas aquele que nós transportamos . É ressonância confusa que as coisas deixam dentro de nós. A Páscoa é um tempo de discernimento. É um tempo para treinar os sentidos.”
Chegado perto da zona da Albergaria da Serra (outrora Albergaria das Cabras), eis que estava pronto a iniciar o meu “treino”. Não tinha, nem podia ter, um plano estabelecido e muito menos a mais pequena perspectiva do que podia sentir, ver, ouvir ou encontrar. Só sabia que ía dar o melhor de mim, porque o “treino”, por experiência própria, tem que ser muito exigente para dar bons resultados.
É deste “treino” que irei falar amanhã.

Vítor Amorim
:
Nota: Agradeço, como não podia deixar de ser, a colaboração do meu assíduo leitor Vítor Amorim. Só partilhando celebraremos a Páscoa. Obrigado.
FM

segunda-feira, 17 de março de 2008

Aveirenses Ilustres

JOÃO JACINTO MAGALHÃES UM ILUSTRE DESCONHECIDO João Jacinto de Magalhães é um ilustre aveirense, mas desconhecido da maioria das gentes desta região. É o patrono da Fundação do mesmo nome, ligada à Universidade de Aveiro. Foi evocado hoje na décima conferência de “Aveirenses Ilustres, que se realizou no Museu da Cidade.
: “Oriundo de uma ancestral família do Minho, cujas origens remontam a meados do século XIII, João Jacinto de Magalhães teve origem num ramo dos Magalhães de Pedrógão, que se transferiu no século XVIII, para Aveiro, onde nasceu a 4 de Novembro de 1722. Tendo entrado no colégio do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, com onze anos, veio a pedir o ingresso na própria ordem, tornando-se frade crúzio com o nome de Frei João de Nossa Senhora do Desterro. Em 1754, obteve a secularização por breve do Papa Bento XIV. Morreu em Fevereiro de 1790. Filósofo, como ele próprio se define, cientista como hoje o entendemos, foi considerado um dos mais notáveis portugueses da segunda metade do século XVIII.”
Lê-se no site da Fundação João Jacinto Magalhães, onde pode ficar a saber mais sobre esta personalidade ímpar da ciência e cultura.

Na Linha Da Utopia

Chiara Lubich

CHIARA LUBICH, A VIDA ECUMÉNICA

1. Era o tempo da II Guerra Mundial. A jovem Chiara Lubich, natural de Trento (Itália), vendo a dramática situação da Europa na decadência dos ideais humanos, vem propor uma mensagem de esperança e de diálogo, assente na condição de abertura do ser humano ao ser dos outros e ao ser de Deus. Chiara recebe agora, na hora da partida (14 de Março 2008), os frutos da sua sementeira plantada ao longo da intensa vida (de 88 anos) dedicada a anunciar caminhos de UNIDADE. Não é só o mundo ecuménico das igrejas que está reconhecido e vive a sentida hora da despedida quando (terça, às 15h) em Roma o mundo celebra o dom de sua vida. João Paulo II acolheu e apreciou a sua obra, dizendo que ela corresponde na essência ao espírito renovador do Vaticano II.
2. Chiara Lubich (1920-2008), fundadora do Movimento Ecuménico dos Focolares (http://www.focolares.com/), do seu coração universal transborda um testemunho de vida que interessa a todos. Não foi por acaso que a sua raiz fraterna da mensagem «que todos sejam um» espelha pelo mundo fora frutos de unidade nas múltiplas vertentes do diálogo (quatro): entre católicos, entre cristãos das várias confissões, com membros de outras religiões e com pessoas de visões não religiosas. Uma verdadeira catolicidade (universalidade) que hoje torna presente a sua obra em 182 nações (também em Portugal), num universo de pertença de cerca de 140 mil focolarinos activos e na ordem de dois milhões de aderentes.
3. Enraizada na essência da mensagem cristã, como visão aperfeiçoada da “fraternidade” (emblema ideológico que a Revolução Francesa de 1789 havia desvirtuado cabalmente quando se observam os factos sucedâneos da exclusão de género e de raça), o mundo não esquecerá que ela foi a primeira mulher a partilhar a sua experiência de vida e de fé em auditórios de diferentes religiões como entre muçulmanos, hindus e budistas. A sua mensagem, como afinal as grandes mensagens, não se esgota no campo da religião mas abre-se a uma totalidade de experiência humana fraterna. Neste contexto de uma vida vivida ao serviço dedicado do bem comum estão concepções que iluminam as sociologias e as economias, propondo mesmo conceitos como a «economia de comunhão».
4. Factos muito relativos e mesmo secundários para ela como para as pessoas grandes porque simples, mas elementos identificadores do reconhecimento dos alcances da vida e obra de Chiara Lubic na sociedade civil, estará o facto dela ter sido aclamada por variadas universidades de todo o mundo com o título de honoris causa. Em áreas tão díspares como a teologia, psicologia, filosofia, economia, sociologia, política. Parte da história humana para uma história sem tempo e espaço mais um símbolo das lutas e das esperanças do passado Séc. XX. A semente caiu na boa terra e deu largos frutos! Acreditamos eles vão permanecer porque anteciparam futuros de unidade humana nas diversidades do tempo global. Mas, que não se percam esses ideais abertos, temos de compreender e sensibilizar mais para a raiz profunda que moveu a vida de gente tão generosa como Chiara Lubich. O mundo está reconhecido e quer continuar a aprender da dádiva que a inspirou em tempos conturbados como os seus.

Alexandre Cruz

ÍLHAVO: Dia Mundial da Poesia


GRUPO POÉTICO DE AVEIRO
APRESENTA POESIA DE JOSÉ RÉGIO
Integrado nas comemorações do Dia Mundial da Poesia, o Grupo Poético de Aveiro vai realizar um recital de poesia na Biblioteca Municipal de Ílhavo no dia 21 de Março, pelas 21.30 horas, com organização da Confraria Camoniana de Ílhavo. Com este recital, o Grupo Poético de Aveiro pretende homenagear o grande poeta José Régio. Entrada livre.


Fado português

O Fado nasceu um dia,
quando o vento mal bulia
e o céu o mar prolongava,
na amurada dum veleiro,
no peito dum marinheiro
que, estando triste, cantava,
que, estando triste, cantava.

Ai, que lindeza tamanha,
meu chão, meu monte, meu vale,
de folhas, flores, frutas de oiro,
vê se vês terras de Espanha,
areias de Portugal,
olhar ceguinho de choro.

Na boca dum marinheiro
do frágil barco veleiro,
morrendo a canção magoada,
diz o pungir dos desejos
do lábio a queimar de beijos
que beija o ar, e mais nada,
que beija o ar, e mais nada.

Mãe, adeus. Adeus, Maria.
Guarda bem no teu sentido
que aqui te faço uma jura:
que ou te levo à sacristia,
ou foi Deus que foi servido
dar-me no mar sepultura.

Ora eis que embora outro dia,
quando o vento nem bulia
e o céu o mar prolongava,
à proa de outro veleiro
velava outro marinheiro
que, estando triste, cantava,
que, estando triste, cantava.

José Régio

AVEIRO: Jornada Diocesana da Juventude

Em Anadia, celebrou-se, ontem, a Jornada Diocesana da Juventude, com organização do Secretariado Diocesano da Pastoral Juvenil. Presidiu o Bispo de Aveiro, D. António Francisco, que, à homilia da Eucaristia, dirigiu palavras de estímulo aos muitos jovens presentes:

"Ir ao encontro de Deus, viver de Cristo, deixar-se guiar pelo Espírito e anunciar o Evangelho não é para vós jovens uma opção facultativa. É uma decisão assumida; é uma decisão consciente; é um caminho que urge percorrer e uma missão hoje 'mais necessária do que nunca'”.
(...)
"A bem-aventurança cristã e a felicidade verdadeira são irmãs gémeas do escândalo da cruz de Jesus e renascem sempre vencedoras do âmago de tantas situações de injustiça e de sofrimento. A morte recente do arcebispo católico caldeu de Mossul, no Iraque, e o sofrimento daquele povo mártir, o esquecimento de tantas vítimas inocentes da história em numerosos lugares onde se ultraja a dignidade das pessoas e se espezinha o direito dos povos não podem assassinar a Esperança nem silenciar o Evangelho."
:
Para ler mais, clique aqui e aqui

CHINA: Ofensas à liberdade continuam

O Dalai Lama, líder espiritual tibetano, não se cansa na sua luta, pacífica, contra a ocupação chinesa do seu país. As manifestações pela libertação do Tibete repetem-se, ciclicamente, mas os países ocidentais não estão interessados em pressionar a China. A China é um gigante a caminho da hegemonia económica mundial, e o Tibete é uma pequena nação sem importância no mundo dos negócios. A hipocrisia da civilização ocidental mantém-se, face à tirania da China. Sempre de cerviz domesticada face à força dos poderosos antidemocráticos, os ocidentais precisam de ser mais corajosos na defesa dos ideais em que acreditam. Em Portugal, as ditaduras de esquerda são aceites com alguma naturalidade, sobretudo quando os seus dirigentes nos visitam. As da direita são logo hostilizadas com manifestações. Para mim, todas as ditaduras são de condenar. Dialogar com elas, porque do diálogo pode vir a luz, mas nunca com palmas e festas. A minha simpatia e apoio vai, pois, para o Dalai Lama e seu povo, na esperança de que em breve possam cantar e viver a sua liberdade.


FM

AVEIRO: Zona histórica sem carros

Segundo li hoje, a Zona Histórida da Beira-Mar, em Aveiro, vai ser vedada ao trânsito automóvel. Ali, num futuro próximo, só poderão circular e estacionar os moradores. Boa ideia, a meu ver. Preserva-se um espaço de ruas estreitas do excesso de carros. Há parques à volta e todos nós precisamos de caminhar. A notícia dizia, ainda, que esta será uma experiência-piloto, no sentido de ser alargada a outras zonas da cidade. O ambiente precisa deser preservado.

domingo, 16 de março de 2008

Laudate Dominum, de Mozart

Laudate Dominum, de Mozart, pode ser um momento lindíssimo para este fim-de-semana. A sugestão veio-me do blogue Mar Sem Sal, de uma minha conterrânea, especialista de música e da arte de bem cantar. Com os meus agradecimentos aqui partilho este Laudate Dominum, de Mozart.

Na Linha Da Utopia



Uma canção para “Ser Tempo”

1. Vivemos esta semana um tempo especial. Desde a antiguidade cristã que, na aproximação à Páscoa, na semana antecedente, se procura interiorizar de forma mais plena o centro da mensagem da revelação do Absoluto de Deus na forma personalizada, numa Pessoa chamada “Jesus Cristo”. Todas as comunidades que cultivam valores com raiz de esperança alicerçada no divino têm os seus “tempos fortes”. Para a comunidade cristã vive-se a designada “Semana Santa”; uma semana que começa com a celebração festiva do Dia Mundial da Juventude (DMJ), uma iniciativa de João Paulo II comemorada no domingo de Ramos anterior à Páscoa. Na diocese de Aveiro este ano foi escolhido o (arciprestado) Concelho de Anadia para acolher a multidão de jovens da área diocesana. Mil, dois mil jovens… o importante é sempre a vivência de cada um no sentido dos valores comunitários de uma esperança que se quer fortalecer em ambiente pré-pascal. E ficam sementes de paz para a vida!
2. Também, periodicamente, vão surgindo propostas e iniciativas de partilha através da música, esta uma arte de apurada sensibilização para a juventude. Da organização do Secretariado Diocesano da Pastoral Juvenil, como todos os anos e no quadro da proposta diocesana para a juventude, este ano na véspera do DMJ realizou-se o Festival da Canção. Em noite de tantas e ricas mensagens, coube à Paróquia de Aradas, pelo seu grupo de Jovens e numa caminhada permanente de juventude como em todas as paróquias da diocese, a construção da mensagem mais reconhecida pelo júri do festival (melhor letra e canção vencedora). Abaixo partilhamos esta mensagem que vai abrindo a ponte pascal: SER TEMPO!

Fui procurar…onde se esconde o tempo
Saber como faz p’ra não parar
É que saber uns truques dava jeito
Para poder levar-te e ensinar-te…
Mesmo a dormir!

Não o encontrei e o tempo não parou
Não sei onde falhei, o que me escapou
Eu só queria aprender a ser mais eu
E a toda a hora e a todo o momento
Saber estar em ti…

Também eu quero ser tempo
P’ra nunca parar
Ser a tua voz no vento
E poder renascer em ti
Ser o que queres anunciar

O tempo é da gente, o tempo somos nós
O tempo é a correr e a vida é uma só
Porque me falas a mim isso eu não sei
Só sei que quero ser…sei que quero viver
P’ra ser a tua voz!

O que seria de nós, sem o espírito divino?
E o que seria do mundo sem um olhar de Paz!

[ARADAS:
Letra e música: Daniel Lopes.
Interpretação: Daniel Lopes, Liliana Monteiro, Paulo Gravato, Tiago Marinho.]

Alexandre Cruz

TECENDO A VIDA UMAS COISITAS - 69


REGENTES ... E “PATRONOS”

Caríssima/o:

A Regente Escolar não é necessariamente uma figura comum na minha paisagem escolar. Consultando a rede escolar da nossa região apenas encontramos postos escolares na Boa Hora e na Costa Nova – e, creio que, já muito por meados do século XX, na Barra.
De facto, saíra eu há anos da nossa Escola, encontrei um dia, uma Regente na Escola da Ti Zefa - creio que estaria a substituir o titular do lugar. Com espírito de grande abertura e afabilidade, bom trato e humildade, fiquei com a convicção de que, à semelhança dos nossos artífices, superava a falta de preparação científica com boa dose de senso e o saber de experiência feito.
Aqui, pois, a minha palavra de muito apreço e a minha homenagem a essas Mulheres simples mas decididas na pessoa da Elvira!

E, por fim, os “Patronos”...(Quem diria que se tornaria matéria quente da actualidade o nome a atribuir às escolas?!...) E refiro-me apenas e só aos patronos das escolas que “frequentei”, pois as da Chave e da Cale da Vila assim eram designadas por nós. Fá-lo-ei muito levemente... (Área aberta a investigação: a biografia das “figuras públicas” da nossa Terra; ao Professor Fernando um puxão amigo para que invista... ou alguém avance...)
Dito isto, acrescentarei:
Zefa – diminutivo de Josefa – lavradeira nossa contemporânea que se dedicou à venda de leite na praia da Barra;
Bola, comerciante e industrial;
Lopes, emigrante.

Sei que é pouco mas poderá actuar como ponto motivador.

Manuel

sábado, 15 de março de 2008

AS VÍTIMAS INOCENTES: TRISTEZA METAFÍSICA


Na encíclica sobre a esperança Salvos em Esperança, Bento XVI debruça-se sobre uma pergunta decisiva - "a pergunta fundamental da filosofia" (Max Horkheimer): o que podem esperar as incontáveis vítimas inocentes da História? Quem lhes fará justiça? As vítimas inocentes clamam, um grito sem fim e ensurdecedor percorre a História.
No mundo moderno, conduzido em grande parte pela ideia de progresso, ergueu-se, nos séculos XIX e XX, um ateísmo moral por causa das injustiças do mundo e da História. "Um mundo no qual há tanta injustiça, tanto sofrimento dos inocentes e tanto cinismo do poder, não pode ser obra de um Deus bom."
Quase se poderia dizer que se é ateu ad majorem Dei gloriam, para a maior glória de Deus, como se, perante o horror do mundo, a justificação de Deus fosse não existir. É-se ateu por causa de Deus, que é preciso recusar por causa da moral.
Afastado Deus, deve ser o Homem a estabelecer a justiça no mundo. Mas não será esta uma pretensão arrogante e intrinsecamente falsa? "Um mundo que tem de criar a sua justiça por si mesmo é um mundo sem esperança. Ninguém nem nada responde pelo sofrimento dos séculos", escreve o Papa.
Aqui, Bento XVI apela para a Escola de Frankfurt, nomeadamente para Max Horkheimer e Theodor Adorno, que viveram filosoficamente a inconsolável "tristeza metafísica" da impossibilidade de fazer justiça às vítimas da História. De facto, mesmo supondo, no quadro do marxismo e da ideia do progresso moderno, que algum dia fosse possível a edificação de uma sociedade finalmente justa, transparente e reconciliada, ela não poderia ser feliz. A razão é simples: ou essa sociedade se lembrava de todas as vítimas do passado, que não participam dela, e então seria atravessada pela infelicidade, ou não se interessava por essas vítimas, mas então não era humana, porque insolidária.
Horkheimer e Adorno exprimiram uma filosofia em tenaz: por um lado, não podiam acreditar num Deus justo e bom; por outro, há uma verdade da religião, apesar de todas as suas traições no conluio com o poder e os vencedores: a religião "no bom sentido" é, segundo Horkeimer, "o anelo inesgotável, sustentado contra a realidade fáctica, de que esta mude, que acabe o desterro e chegue a justiça". Não se trata de um desejo egoísta, mas da esperança contrafáctica de que a realidade dominante da injustiça não tenha a última palavra. Daí, o "anelo do totalmente Outro", o "anelo da justiça universal cumprida", "a esperança de que a injustiça que atravessa a História não permaneça, não tenha a última palavra".
Esta esperança tem de traduzir-se numa praxis solidária tal que "não se possa pensar que não existe um Além". Nesta praxis, está implicado o pensamento do Absoluto, não para afirmá-lo, mas como anelo de que o finito e o mundo da injustiça não sejam a ultimidade e o definitivo.
Também neste sentido, Adorno escreveu que "o pensamento que se não decapita desemboca na transcendência". Frente às aporias da razão, neste domínio, a única filosofia legítima seria "o intento de contemplar todas as coisas como aparecem à luz da redenção". Embora se não possa afirmar nada para lá da imanência, a pergunta pela esperança truncada das vítimas, que acusam o mundo da história dos vencedores, obriga a pensar para lá dos limites da imanência, colocando a pergunta pelo Absoluto enquanto pergunta pela justiça universal.
Em diálogo com a Escola Crítica de Frankfurt, Bento XVI reconhece que a necessidade individual da realização plena e da imortalidade do amor já é "um motivo importante para crer que o Homem está feito para a eternidade", "mas só o reconhecimento de que a injustiça da História não pode de modo nenhum ter a última palavra" convence da necessidade da ressurreição dos mortos e da vida eterna.
Na Sexta-Feira Santa, lembra-se Cristo na cruz, que morre, inocente, e gritando uma oração em pergunta, que atravessa os séculos: "Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?" Os cristãos acreditam que o Deus do amor, seu Pai, respondeu, ressuscitando-o dos mortos, dando esperança ao clamor das vítimas da História.


Anselmo Borges, no Diário de Notícias

sexta-feira, 14 de março de 2008

Pacheco Pereira conta uma história interessante ou sem graça nenhuma

Será que esta história (verdadeira, claro) pode acontecer noutras aldeias?
:
"Duas bicicletas de miúdos com 10, 12 anos, deixadas na rua à porta de um pequena biblioteca onde eles estavam, foram roubadas. É dia e é uma aldeia. Eles aperceberam-se muito pouco tempo depois, quinze minutos, no máximo meia hora e vão falar com a responsável da biblioteca a chorar. Esta contacta a polícia, neste caso a GNR. Hesitou, porque de há um ano para cá, todos os dias há nessa aldeia roubos, quase sempre pequenos roubos, há uma semana ovelhas, na anterior uma dispensa de uma quinta, objectos diversos, bicicletas, dinheiro aos velhos, computadores, etc,, etc. Hesitou porque de todas as vezes que foram feitas queixas nunca houve qualquer sequência, nem sequer a polícia veio interrogar quem fez a queixa. Zero, nada. As pessoas duvidam que valha a pena o trabalho e o risco. Mas fez. Pouco tempo depois chega um carro da GNR."
Podem ler o resto da história de Pacheco Pereira na SÁBADO, ou no Abrupto

Barbosa de Melo no CUFC


Ruído e alarido à volta da justiça


Há muito ruído e alarido à volta da justiça por causa da comunicação social. Os jornalistas acham-se especialistas e difundem erros. Sem autonomia mental, mal pagos e com insegurança no emprego, os jornalistas tendem a prestar um mau serviço. Ao quererem captar a atenção da opinião pública, por exemplo, impedem com frequência que a investigação prossiga o seu caminho.

Leia mais no Correio do Vouga

Sporting salva a noite

Ontem à noite, enquanto lia, alguém se encarregou de procurar na TV o que convinha. As mudanças incidiam sobre Sócrates e Sporting. De Sócrates, o pouco que se viu, não teve interesse. Luís Filipe Menezes, idem. O Sporting, que nos tem dado tantos desgostos, cá em casa, ainda me obrigou a sair da sala e a comentar que a noite estava perdida. Para mim e para ele. A não ser que me virasse de vez para as leituras. Aí tinha muito por onde escolher. Ainda bem.
Estava neste dilema, quando um “miúdo”, o Pereirinha, mostrou a gente mais velha, que ganha uma pipa de massa, como se marca um golo soberbo, dando a vitória merecida ao Sporting. O suficiente para fazer rejubilar os adeptos, deixando o Paulo Bento menos gago.
A noite valeu por isso. E também pelas leituras que se seguiram. Sócrates e Luís Filipe Menezes? Sem interesse.

FM

Prenúncio de Primavera


Quem há por aí que não sonhe já com a Primavera? Quem há por aí que não se delicie com as flores que desabrocham por todos os cantos? Quem há por aí que não aprecie a natureza na sua fase, maravilhosa, de ressurreição? Quem há por aí que não sinta os cheiros frescos e doces deste prenúncio da espação das flores? Há muitos, com certeza. Então, saiam de casa e casem-se com o novo ambiente que nos bate à porta e entra, até nós, por todos os interstícios que nos rodeiam.
FM

Ainda a marcha da indignação

Filomena Mónica

A conhecida socióloga, escritora, investigadora e professora universitária Maria Filomena Mónica participou, a convite da revista SÁBADO, na marcha da indignação. Foi para observar, para depois comentar. O que fez, para a SÁBADO desta semana.
A dado passo das suas considerações, muitas delas pertinentes e justas, disse que “a Educação é o maior falhanço do actual regime”, e que, a seu ver, “as reformas educativas deveriam começar pelo topo, introduzindo-se o numerus clausus nas univeridades”. A seguir referiu que, “diante da pressão das classes médias, o Estado corria o risco de abrir demasiado as portas ao ensino superior”. E acrescentou: “Foi o que aconteceu. As faculdades passaram a receber mais alunos do que os professores doutorados (os únicos competentes para ensinar) tinham capacidade para leccionar. Os resultados viram-se: todos os anos foram lançados no mercado licenciados analfabetos. Entre a multidão reunida no Terreiro do Paço havia provavelmente quem (como a ministra) tivesse sido meu aluno. Apesar do meu esforço em preparar bem as aulas, tenho consciência de que muitos acabaram as suas licenciaturas sem competência para ensinar.”
Tenho dificuldade em aceitar esta generalização. Há muito este hábito entre nós. Por um lado, nada nos garante que só os doutorados é que têm competência para ensinar. Alguns até - admito - podem saber muito e não ter capacidade para transmitir o muito que sabem. Ensinar, se é uma ciência, também é uma arte, a meu ver.
Por outro lado, custa-me aceitar que o nosso mercado de trabalho tenha assim tantos licenciados analfabetos. Acredito, e conheço, licenciados que pouco ou nada lêem, para além do específico da sua profissão, que não vão ao cinema nem a exposições, que não frequentam concertos nem livrarias, que nada sabem, em resumo, do mundo em que se inserem. Mas há outros, com certeza, que se valorizam no dia-a-dia, que lêem e vêem o que possa contribuir para a sua formação integral. Como há licenciados trabalhadores, competentes e esforçados a par de outros que se baldam. Há de tudo, afinal, como em qualquer profissão. Por exemplo, também conheço doutorados que, para além da sua especialidade, não passam de uns ignorantes, direi mesmo analfabetos, sobre muitas expressões culturais, sociais, artísticas e religiosas que existem à sua volta.

FM

quinta-feira, 13 de março de 2008

Na Linha Da Utopia


Educar “em” Direitos Humanos

1. A Comissão de Solidariedade Social da Associação Académica da Universidade de Aveiro (ORIGAMI), na sua organização do Ciclo de Tertúlias para a Tolerância, levou nestes dias a efeito importante iniciativa sobre «Educação para os Direitos Humanos». Um apelo e um convite fundamental aos estudantes na reflexão continuada sobre as preocupações do mundo em geral (em que continuam a ser tantas as violações dos direitos humanos); mas numa dinâmica da “transferência” dessas preocupações globais para as visões do compromisso diário no âmbito do estudo, investigação e trabalho. A dinamização esteve a cargo da Amnistia Internacional, instância de referência no zelo e promoção dos direitos humanos e na denúncia de situações de seu desumano incumprimento. Conhecer “o que falta” é sempre o primeiro passo para que não falte; a este nível a Amnistia Internacional transfere o “grito” de situações silenciadas para a visibilidade global. Um impulso decisivo em ordem à dignificação da pessoa humana no mundo actual.
2. Felizmente que hoje são muitas as sensibilidades nesta área, no esforço de proporcionar o encontro do «ideal comum a atingir por todos os povos» com às práticas concretas, em todo o tempo e lugar. São também muitas e diversificadas as instâncias e organizações que vivem e promovem esta causa de todos. Também se sublinhe que, hoje, falarmos correntemente de «educação para os direitos humanos» já é por si um sinal de conseguida e múltipla abertura; tanto da educação como tarefa abrangente e por isso que estabelece ponte com as realidades a transformar, como do referencial da Declaração Universal dos Direitos Humanos que quer chegar a todas as áreas do conhecimento (mesmo técnico-científico) para que ele seja e esteja, sempre mais, ao serviço da Humanidade. Este horizonte de diálogo transdisciplinar é, afinal, o caminho que corresponde a concepção plural e inclusiva da dignidade da pessoa humana.
3. Pese, embora, os caminhos já percorridos como eco histórico do dia «10 de Dezembro de 1948» (em que simbolicamente estamos), uma consciência mais efectiva e participada, motivada e sensibilizada está sempre em reconstrução. Enquanto o desejado desenvolvimento humano dos povos continuar a escrever páginas de sangue e indignidade este quadro de referência sócio-educativo não pode esperar. Talvez, nos tempos em que estamos, onde convivemos todos os dias as notícias da miserabilidade correndo o perigo de nos habituarmos, nestes contextos, a aposta decisiva será mesmo na qualidade da proposta como educação «em» direitos humanos, onde estamos totalmente envolvidos naquilo que comunicamos. Felizmente que hoje uma multidão vive este caminho e dá por ele a vida, o tempo, a esperança. Mas ainda falta sempre tanto para este ideal descer ao coração de cada um, e, talvez até mesmo na educação, a começar pelo filme dos brinquedos para crianças (muitos carregados de “guerra”)! O “refrão” dos “direitos humanos”, por si, tem vida curta; para ir mais longe precisa de incluir a “dignidade humana” na sua raiz aberta à Totalidade que cultive e aprecie o que é SER e existir no mundo com os outros. O caminho longo da dignidade!

Alexandre Cruz

Batalha em campo aberto, sem vencedores à vista

O que se está a passar no mundo do ensino e da educação escolar é altamente preocupante. Ministério, professores, pais, cidadãos, porque também estes têm palavra, parece que já ninguém se entende. Todos falam de todos, todos atiram pedras, todos se queixam, todos dizem que não cedem, todos se consideram vencedores numa batalha que, já por si, mais parece de vencidos, antecipados ou a curto prazo.
Se há acção em que toda a gente se deve entender para colaborar sem preconceitos, sendo pressuposto, como é normal e legítimo, o diálogo em que se discutam abertamente os problemas em campo, bem como o modo possível de os ir resolvendo, com mérito e civilidade, é a acção educativa, que se espera da escola e de todos os seus mais directos intervenientes. Neste mundo concreto, o mais importante são os alunos, que querem e têm direito a aprender, com pais, professores, governantes e cidadãos em geral, a preparar-se para a vida e a capacitar-se para serem cidadãos responsáveis, conscientes e participativos. O livro que lhe abrem com toda esta batalha, que podia ser dispensável, não traz lição apetecível que se possa aprender.
Os professores de há muito se vêm desmotivando, por razão das contínuas medidas do Ministério, unilaterais e não admitindo réplica, dando a impressão de que quem governa lá de longe tudo resolve com ordens e papeis, parecendo não ter em conta, nem a natureza do trabalho de quem ensina, nem a realidade de muitas escolas que hoje, em muitos casos, são campo difícil, que só o conhece bem quem vive e actua lá dentro.
Os educadores escolares são agentes necessários na escola e na missão que a esta compete. Há que contar sempre com eles e não entrar em conflitos evitáveis, que deixam muitas vezes marcas difíceis de apagar.
Há, em ligação à escola, problemas urgentes a resolver. Todos o sabemos. Não são sempre boas as condições de trabalho. O ambiente, dentro e fora da escola, deteriorou-se. Em muitos casos, deparamos com gente que está no ensino porque não teve outra saída e se mostra incapaz de criar relações propícias para comunicar vida e saber aos seus alunos e proporcionar boa colaboração aos seus colegas.
Gente que parece ter feito da escola um apêndice do seu dia a dia. Mas, se são estes agentes que o Ministério quer atingir, deve saber que se trata de uma minoria, que não pode constituir motivo ou ocasião para se esquecer a grande maioria dos professores das escolas do Estado, que fazem esforços heróicos para serem fieis à sua missão, gente com direitos adquiridos e vidas organizadas, gente séria, competente e sabedora, que vai marcando vidas e gerações, colegas amigos e fiéis aos outros colegas, profissionais que se gastam, diariamente, numa tarefa que constitui para si uma autêntica paixão. Não o reconhecer, se for o caso, é ser injusto, exacerbar e irritar, por menosprezo, um mundo de gente de que o país precisa. Está na rua e em luta o que nunca deveria ser preciso levar à rua.
O governo assume-se como reformador e, quando há que reformar, está no seu direito e cumpre o seu dever. Nunca, porém, a ditar sozinho do palanque alto e distante do poder. Diz a técnica jurídica que, para que as leis sejam aceites e eficazes, se deve procurar, antes da sua promulgação, que sejam desejadas e esperadas. Isto não se faz sem auscultação aberta e pedagogia adequada. O poder emanado do povo nunca pode dispensar o povo e os que o servem nas bases. A fidelidade de quem faz do governar um serviço, não é simplesmente fidelidade a um programa eleitoral, mas ao serviço a prestar, em cada momento e circunstância, ao conjunto nacional.
Parece urgente acabar-se com esta batalha em campo aberto, entre o Ministério e os professores, com manifestações e contra manifestações. Há batalhas muito graves e urgentes na vida e no agir da escola e no campo da educação. Elas não se podem adiar e aí todos fazem falta. O importante não pode apagar o essencial. Na escola está o futuro.

António Marcelino