quinta-feira, 16 de novembro de 2006

UM ARTIGO DE D. ANTÓNIO MARCELINO

MUDAM OS ROSTOS,
PASSAM OS ANOS...
Já alguém disse que hoje a única coisa permanente é a mudança. De facto, tudo muda. Bem vistas as coisas, foi e será sempre assim. A mudança tem a sua marca dentro das pessoas e das coisas vivas e assinalará o ritmo da vida até à grande e definitiva mudança, essa já sem retorno. A criança nasce e fica logo marcada pelo signo mudança. A noite dá lugar ao dia. O Inverno à Primavera, a ignorância ao saber. Muda-se de residência, de profissão, de partido político. Muda-se de opinião e de hábitos, de costumes e de tradições. É tal a sua vertigem que até já se muda de marido ou de esposa, não de filhos, mais depressa e com maior facilidade do que se muda de casa, de lugar de trabalho ou do café habitual. Não mudar, diz-se, é para muitos sinal de estarem velhos e ultrapassados, de pouca abertura ao tempo que vivemos e às coisas novas que vão surgindo tão depressa e tão sem controle, como vento que sopra de todos os lados, sem que se saiba de onde vem. Porém, também se fala de resistência à mudança, pela dificuldade de se terem atitudes consequentes, sem se olhar, cuidadosamente, às razões que levam às convicções e referências estáveis, capazes de orientar e comandar a vida. Não podemos esquecer que as mudanças mais difíceis têm a ver com a capacidade de acolher os desafios inevitáveis e as oportunidades que não criamos. Mudou muita coisa após a implementação do regime democrático. Porém, muita gente que fala de democracia continua a ser fundamentalista e intransigente com quem pensa e age de modo diferente. E, pior ainda, quando se tem poder económico ou político. O Concílio Vaticano II marcou a exigência de novos rumos para a Igreja, quer em relação à sua expressão comunitária, como à sua relação com a sociedade, por força da sua missão. A verdade é que muitos cristãos, e mesmo responsáveis, que são capazes de falar com eloquência sobre os textos conciliares, não dão grandes sinais de mudança interior no seu agir e deturpam o rosto da Igreja que procura a renovação.
Há ainda as vicissitudes da vida, como a idade e o caminho já andado, que levam à mudança exterior e à separação de muitas coisas que se consideravam indispensáveis. Esta, porém, corre o risco de se tornar corrosiva das atitudes e dos sentimentos, se interiormente não se assume como espaço de novas oportunidades, investimento de experiências adquiridas, desbravar de campos pouco cultivados, abertura a uma doação mais gratuita, ou seja, se não promove mudança interior, sinal de conversão à novidade, que sempre espreita em nós pela sua vez. Quem tem fé e horizontes de vida entende melhor esta exigência interior e entende também o que alguém deixou aí como hino do bispo diocesano: “Mudam os rostos, passam os anos, não passa Cristo, nem muda o amor.” A mudança nestes casos é um problema de bússola e de capacidade do essencial. A fé abre caminho, ilumina-o e estimula a que nele se ande sem medo nem nostalgias.
As mudanças que se nos impõem não são todas iguais, nem têm a mesma dimensão existencial e social. Cada um de nós, porém, permanece o mesmo, sempre que entende e aceita o que subsiste nas mudanças que o atingem, a ponto de não cair na tentação de passar ao lado, mas se dispõe a enfrentar serenamente a realidade, de se orientar no que muda, de modo a que tudo tenha um sentido positivo. A fé ajuda a que na vida tudo seja luz, mesmo quando a noite se torna longa e incómoda. A mudança pode ser uma ocasião de nos apercebermos que estamos vivos e levamos connosco uma força impar, que pode não ser física, mas acaba por ser a mais determinante.

quarta-feira, 15 de novembro de 2006

PROCRIAÇÃO MEDICAMENTE ASSISTIDA

Bispos aprovam nota sobre a PMA e apelam ao «Não» no referendo sobre o aborto
A assembleia plenária da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), reunida em Fátima, anunciou que vai publicar uma Nota Pastoral sobre a Procriação Medicamente Assistida (PMA). Mesmo com uma nova Lei aprovada no Parlamento, os Bispos publicam o documento para “orientar” os fiéis católicos. Sobre o próximo referendo ao aborto, D. Carlos Azevedo, Secretário da CEP, disse aos jornalistas que os Bispos esperam que os portugueses possam “amadurecer serenamente a sua consciência” nesta matéria e deixou um apelo aos que “estão convictos do Não” para que não deixem de votar. Os trabalhos da assembleia, iniciados na passada segunda-feira, abordaram ainda algumas questões da relação entre a Igreja e o Estado. A CEP lamenta o atraso do Governo na nomeação dos seus representantes na Comissão bilateral, prevista na Concordata para o desenvolvimento dos bens da Igreja que integrem o património cultural português. O Ministério da Cultura ainda não terá indicado o nome do vogal escolhido. “Não compreendemos a razão deste atraso”, lamentou D. Carlos Azevedo, frisando que “o Património é algo que todos valorizamos”. Outro tema é a questão das novas percentagens dos descontos que o Clero passará a fazer para a Segurança Social, com os Bispos a manifestarem disponibilidade para negociar. A assistência espiritual nos Hospitais e as aulas de EMRC no 1º ciclo são assuntos em que é preciso um acordo entre Igreja e Estado. D. Carlos Azevedo lamentou ainda a ausência de uma representação da Igreja no Conselho Consultivo das Famílias, um órgão de natureza consultiva composto por representantes de entidades não governamentais, criado este Verão. Seguindo o plano de reflexão sobre a transmissão da fé, os Bispos abordaram o papel da família, da escola e da universidade neste processo. O Secretário da CEP salientou “a crise da família na transmissão da fé” e salientou a importância de a Igreja apresentar “intensificar e renovar pedagogias”, criando métodos e técnicas eficazes.
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Fonte: ECCLESIA

Um livro de D. Manuel de Almeida Trindade

"Pessoas e Acontecimentos"

Eu não sei se os meus amigos leitores gostam de reler os livros de que gostaram, e gostam, muito. Eu tenho esse hábito e não o quero perder. Porque o que é bom vale sempre a pena repetir, como quem saboreia uma guloseima que nos estimula o sabor das coisas. 
Aconteceu há dias com a releitura de “PESSOAS E ACONTECIMENTOS”, um livro com textos de D. Manuel de Almeida Trindade, publicado em 1987, aquando da celebração do 25.º aniversário da ordenação episcopal do então Bispo de Aveiro. 
D. Manuel de Almeida Trindade escreve muito bem e consegue transmitir a quem o lê uma faceta importante da sua personalidade, que é a serenidade. Mas também nos conduz a fontes de conhecimentos e de vivências que refletem o homem de fé profunda e o humanista que olhava para todos como irmãos na caminhada da vida. 
O atual Bispo Emérito de Aveiro, que vive em Coimbra, evoca, com maestria, figuras gradas do seu tempo, fala do Vaticano II em que participou com uma sensibilidade rara, mostra o que pensa com uma facilidade enorme, recorda acontecimentos importantes com uma fidelidade a toda a prova, ou não fosse ele um cultor do diário pessoal, de onde saíram outras obras significativas. Penso que “PESSOAS E ACONTECIMENTOS” merece uma releitura… ou leitura, em tempo de tanta futilidade que enche os escaparates das livrarias. 

Fernando Martins 

Foto: Retrato de D. Manuel,
feito pelo artista aveirense Gaspar Albino

PASTORAL DA CULTURA

PASTORAL DA CULTURA
COM NOVO “PORTAL”
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O Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura (SNPC) lançou, há dias, um novo “Portal”, com morada certa em www.snpcultura.org, tendo por finalidade promover o diálogo com a cultura e com os agentes culturais. Pretende fazer, no fundo, uma leitura cristã dos acontecimentos mais marcantes no campo das expressões artísticas, mas também das ciências. O SNPC é um organismo da Comissão Episcopal da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais, comissão esta liderada por D. Manuel Clemente, Bispo Auxiliar de Lisboa. O SNPC está sob a responsabilidade do padre, docente universitário e poeta José Tolentino Mendonça. A partir de agora, quem estiver interessado em saber algo mais sobre a cultura, numa visão da Igreja Católica, pode consultar este “portal”, que está em permanente actualização, através de textos diversos, tendo em vista levar cada um de nós a reflectir e a experimentar o diálogo com a cultura, sob os mais diversos ângulos. Várias rubricas, logo a abrir, são um desafio à nossa ânsia de saber mais, num mundo marcado por um certo indiferentismo, ao nível da cultura religiosa. O meu convite aqui fica, pois. F.M.

PARA QUEM ESTUDA

NO CUFC, nos dias 22 e 29 de Novembro
OFICINA
"SABER ESTUDAR"
Por vezes, há iniciativas interessantes, como a que me chegou às mãos – OFICINA "SABER ESTUDAR". É uma organização do CUFC (Centro Universitário Fé e Cultura) e destina-se a alunos do Ensino Superior. A orientação fica a cargo do Prof. Luís Sancho, docente da Escola Superior de Saúde da Universidade de Aveiro e dirigente do CNE (Corpo Nacional de Escutas). Os objectivos apontam para verdades indesmentíveis: é sempre possível estudar melhor… pois estudar bem é uma arte!... É possível gerir melhor o tempo e encontrar o melhor método de estudar… Por isso, é lançado um desafio aos universitários: venham ampliar as muitas capacidades que todos têm, no sentido de descobrirem novas formas de estudar, através da organização do tempo e da procura de outras técnicas. A acção decorre na CUFC, nos dias 22 e 29 de Novembro, das 15 às 17 horas. As inscrições poderão ser feitas no CUFC, junto à Universidade de Aveiro.

UM ARTIGO DE ANTÓNIO REGO

QUANDO OS JOVENS
ENVELHECEM
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Mesmo que nos horizontes económicos se acendam ténues lampejos de esperança, apercebemo-nos que o cidadão comum continua a sentir o seu dia-a-dia mais caro e sacrificado. Os discursos de estímulo podem ter algum efeito no investimento, na criação de novas empresas, na aceitação de algumas medidas de risco, na confiança com que se inventam novas formas de sobreviver. Os pobres vão rodando nas escalas, mas são quase sempre os mesmos, nas pequenas culturas e trabalhos de sobrevivência, nas inúmeras faltas do essencial dentro dos novos conceitos de alimentação, saúde, casa, trabalho, educação, etc. Todos sabemos que emergiram novas pobrezas. Muitas, próximas de carências afectivas, dependências, isolamentos, marginalizações, ou simplesmente a recusa de se deixar encaixar numa sociedade que cerca o cidadão de servidões e vassalagens para poder triunfar. A Caritas de Espanha acaba de revelar que, no último ano, se alterou, na Europa, o perfil dos sem-abrigo. Grande parte deles é constituída por jovens, que sofrem agressões cada vez mais frequentes. Os jovens sempre inventaram margens na evolução das sociedades. Com muitas contestações, cantares, ritmos e gritos. Tudo isso existirá mas com alguns problemas agravados pelas alterações no acesso ao ensino, com a desvalorização social dos cursos, com os mestrados no desemprego, com o desentendimento familiar que leva muitos a fugir para o deserto da noite e para as celas do vão de escada. Numa sociedade envelhecida como a nossa, parece que os idosos teriam fechadas todas as oportunidades e que todas pertenceriam aos jovens. Mas não é assim. Eles próprios envelhecem mais cedo. Basta ver a sequência de adolescentes e jovens que entram nas televisões a vender a frescura da sua vida e, num pequeno intervalo de séries, passam a fazer de adultos com os rostos marcados pelo desgaste que nenhuma maquilhagem consegue disfarçar, num anúncio precoce de envelhecimento. Importa, todavia acentuar outros quadros: que eles próprios descrevem: “há entre nós uma rede multiforme de vidas ao serviço da vida… queremos uma cultura da vida nas relações familiares, na vida associativa, no compromisso social, no empenhamento profissional, na aceitação positiva do diferente, no diálogo de gerações, na generosidade de gestos de partilha de bens e serviços”. O Conselho Nacional da Pastoral Juvenil foi uma oportunidade de muitos jovens reverem o seu próprio rosto… rejuvenescido.

terça-feira, 14 de novembro de 2006

UM ARTIGO DE ALEXANDRE CRUZ

Os tempos e lugares
do essencial
1. Atravessa a forma de pensar do mundo contemporâneo ocidental uma ideia de que tudo tem de ser muito prático, directo, de que de tudo tem que se tirar um lucro, um proveito, um benefício. No fundo sempre assim foi e será no realismo da condição humana. Mas se é natural o carácter prático (da realidade) das coisas que estão sempre aí, todavia, mal vai quando nesse benefício não se vê mais que o interesse pragmático próprio em desvalor do bem comunitário. Perder-se a noção do bem comum, pelo apressar e concorrência muitas vezes feroz da vida social, será caminhar para uma progressiva pobreza de horizontes de vida e de felicidade (que tanto de procura), deitando a perder o próprio futuro. Não existam dúvidas, quanto mais progredir o sentido prático que acentua exclusivamente os (contra) valores do interesse próprio mais a sociedade cristalizará nas suas noções de cooperação e mais um espírito agreste de menor sensibilidade ética vai fazendo o seu caminho para a menoridade. Há, naturalmente, um espírito prático que na vivência da responsabilidade diária faz parte do caminho no procurar fazer bem e da melhor forma possível tudo o que se faz. Isto é muito positivo na óptica de ser-se profissional (fazer bem) naquilo que compete; mas outra coisa bem diferente e menos feliz será assumir uma “mente pragmática” e, a certa altura, não ser capaz de, com flexibilidade de espírito, ver bem mais longe que a “vírgula ou a fórmula” que bloqueia a mente. Como proporcionar um crescimento para a abertura de horizontes que saibam apurar finalidades acima do prático diário? 2. A questão anterior, mais premente que nunca (pelo fechar de muitas mentalidades a novas dimensões de vida e ao encontro com o “outro” diferente), pode obter resposta muito positiva nas correntes de solidariedade e entreajuda que, de forma espontânea e criativa vão proliferando. Fala-se hoje muito, entre nós, da renovação dos sistemas sociais, institucionais, religiosos e políticos, e mais ainda na renovação urgente dos sindicatos; verifica-se, em contraposição com essas instituições que vivem “do e no passado”, cada vez mais como a simplicidade e acessibilidade de processos e de comunicação é sucesso visível, que se poderá espelhar (entre tantos outros exemplos) na mundialização do microcrédito e nos móveis IKEA, e em muitos outros sectores; processos simples, acessíveis, pessoais, que souberam superar a complexidade fixista dos sistemas clássicos. Todas as correntes de solidariedade, hoje global, traduzida numa rede de milhares de ONG’D (Organizações Não Governamentais para o Desenvolvimento), imbuídas de um espírito prático mas ético, são assim sinal de um novo essencial encontrado como resposta aos desafios reais da própria Humanidade. As energias, os tempos e os lugares onde estas ONG’D actuam semeando dignidade humana e esperança, representarão hoje uma corrente de liberdade sem fronteiras e sem “registo de propriedade”. 3. Diz-nos esta nova realidade “livre”, sem tutela de registo político, filosófico ou religioso e ao mesmo tempo num espírito inclusivo de todas as visões de mundo no que elas têm de dignificante, que estamos diante de um novo essencial. Sendo certo que importará reflectir, dar tempo e lugar, interiorização no entendimento dos “porquês” da ética, fazendo caminho de aperfeiçoamento e profundidade das razões, muitas vezes surpreende-nos a pequenez de espírito de alguns sistemas religiosos que, tão codificados e donos da “propriedade solidária”, menorizam o que o outro faz de bem, apelidando-o de “mera filantropia”. Será que como todas as “filantropias”, em partilha e sua reflexão, não estaremos mais perto da personalização do absoluto? A verdade é que os tempos e lugares do mundo global presente não coabitarão com as mentes fechadas mas serão de espíritos abertos na urgência de novas sínteses de proximidade humana pois estamos num tempo totalmente novo. Também é certo que dos primeiros passos será assumir um continuado espírito de renovação e inclusão, e tal abertura de mentalidade, mesmo na era da especialização globalizada, só se atinge mais plenamente com o necessário “momento” de discernimento e reflexão sobre “qual é o “essencial” no meio de tantos acessórios(?)”. Sendo a “reflexão” algo invisível ao olho clínico, todavia ela precisa de nós, do nosso tempo e lugar para irmos apurando a qualidade do ideal que buscamos e não nos perdermos nas coisas (só) práticas. Tal como a felicidade não é um presente que se compre assim também o idealizar da vida e da sociedade que se quer (ou não se quer) não poderá depender (só) da prática do orçamento. Que seria de um país com o slogan do défice equilibrado mas com uma multidão desmotivada, desempregada e, mesmo lutando e trabalhando, sem lugar para sobreviver? Nem tudo podem ser números ou coisas práticas, e a noção de “sustentabilidade” implicará mais horizontes de caminho com as pessoas (estas sim, são a realidade prática).