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sábado, 5 de junho de 2021

Hans Küng e Francisco

Crónica de Anselmo Borges 
no Diário de Notícias

A Igreja não pode entender-se como um aparelho de poder ou uma empresa religiosa, mas como povo de Deus e comunidade do Espírito nos diferentes lugares do mundo

1 Faz amanhã dois meses que, como aqui dei a devida notícia, morreu Hans Küng, o teólogo católico mais conhecido dos últimos decénios e um pensador de influência mundial.
Küng tinha imensa esperança no Papa Francisco, que lhe escreveu duas vezes, inclusivamente a dizer que a infalibilidade pontifícia era questão a estudar, e lhe enviou uma bênção antes da morte. Lamentavelmente, talvez para não ferir Bento XVI, não o reabilitou de modo oficial. De qualquer forma, julgo que é inegável a influência do seu pensamento na primavera da Igreja prosseguida por Francisco, não só por causa das suas investigações sobre o cristianismo primitivo mas também do seu contributo incalculável para o encontro da fé com o mundo moderno e pós-moderno e um ethos (nova atitude ética) global.

sábado, 29 de maio de 2021

Tudo e todos interligados. 2

4 Continuando a reflexão sobre a interligação de tudo e de todos, perguntamos: e para onde vamos? Sobretudo: para onde queremos ir? Que futuro?

Face ao futuro, é essencial pensar. E voltamos à escola, que vem do grego scholê, que significa ócio, não o ócio da preguiça, mas tempo livre para homens e mulheres livres pensarem e governarem a pólis (daí vem política): a Cidade, isto é, a Casa comum da Humanidade. Hoje o que mais falta é precisamente este ócio. Ora, sem ele, tudo se torna negócio (do latim nec-otium). A própria política tornou-se sobretudo negócio(s). Assim, sob o império da técnica e do(s) negócio(s), não se pensa, calcula-se: o filósofo M. Heidegger chamou a atenção para isso: a técnica não pensa, calcula, o mesmo valendo para os negócios.

5 Olhando para o futuro, o que nos vincula é a esperança. Mas, mais uma vez, não há esperança autêntica sem pensamento. Quando olhamos para o futuro, encontramos evidentemente, motivos para imensa satisfação - voltando à pandemia, não temos de agradecer à ciência, pois, para dar um exemplo, nunca se tinha conseguido tão rapidamente uma vacina, e foi por causa das novas tecnologias que pudemos continuar, apesar de tudo, com mais ligação nos diversos níveis e facetas da vida? -, mas é preciso tomar consciência também das ameaças e dos perigos, que são gigantescos e globais. Há problemas de tremenda complexidade, já presentes e que se agravarão.

domingo, 24 de janeiro de 2021

Vivemos no tempo, não na eternidade

Crónica de Bento Domingues 
no PÚBLICO


«É na Igreja, a comunidade dos baptizados, que tanto homens como mulheres podem ser convocados para determinados serviços e encargos. Não são nem as mulheres nem os homens que podem atribuir-se, a si próprios, essas funções como se fosse um direito.»

1. Algumas pessoas telefonaram-me para dizer que o 3.º ponto da minha crónica do Domingo passado não respeitava nem o Papa Francisco nem João Paulo II. Chamava bilhetinho desnecessário e, por isso, irónico à Carta Apostólica, Spiritus Domini, do Papa Francisco. Insinuava que Bergoglio recorria a esse estilo por causa da Carta Apostólica de João Paulo II, Ordinatio Sacerdotalis (22.05.1994), da qual deixei apenas a conclusão: “A ordenação sacerdotal, mediante a qual se transmite a função confiada por Cristo aos apóstolos, de ensinar, santificar e reger os fiéis, foi reservada sempre, na Igreja Católica, exclusivamente aos homens.”
Poderia ter sido útil avisar que esta referência se inscreve nas declarações de Paulo VI, de João Paulo II e nos comentários dos Prefeitos da Congregação para a Doutrina da Fé, J. Ratzinger e L. Ladaria. No entanto, o sentido eclesial das minhas intervenções exige o exercício responsável da liberdade, sem o qual o debate teológico não tem qualquer sentido.
Exprimi uma preocupação que é também um desafio. As mulheres lutam, na sua diferença, por um estatuto igual ao dos homens na vida familiar, profissional, cívica, cultural e política. Muitas queixam-se de que, no interior da Igreja católica, a sua diferença é afirmada pela exclusão. Por serem mulheres não são chamadas para exercer os ministérios ordenados que, na organização actual, resultam do sacramento da Ordem e do qual dependem os diáconos, os presbíteros e os bispos.

domingo, 13 de outubro de 2019

Anselmo Borges - Sínodo para a Amazónia: um mini-Concílio Vaticano II


1. Começou em Roma no passado dia 6 e estará activo até ao próximo dia 27 o Sínodo para a Amazónia. Estão presentes 185 Padres sinodais, mas participam também membros da Cúria, religiosos e religiosas, auditores e auditoras, peritos, membros de outras confissões religiosas, convidados..., o que perfaz, em números redondos, 300 pessoas. 
Embora de modo expresso se dirija directamente só a uma zona determinada do planeta, ainda que extensíssima e tocando nove países (Brasil, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana Francesa), a sua temática -"Amazónia: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral" - é universal e vai marcar este pontificado com um antes do Sínodo e um depois. Penso que estaremos num processo de recuperação da dinâmica do Concílio Vaticano II, um dos acontecimentos mais importantes, se não o mais importante, do século XX, para a Igreja e para o mundo. O Papa Francisco acentua que a sua missão fundamental é criar "processos" no tempo, irreversíveis, sem possibilidade de voltar atrás, a caminho de objectivos essenciais, que já vêm do Vaticano II. 

2. Destaco quatro desses pontos fundamentais, a debater no Sínodo e que influenciarão a Igreja universal. 

2. 1. Logo na terminologia. O Papa quer uma Igreja sinodal, isto é, na qual, como diz o étimo da palavra sínodo, se faça o caminho juntos. Repete constantemente: "a Igreja somos nós todos". Se é assim, o que é de todos deve ser partilhado por todos. Na véspera da abertura do Sínodo, aquando da imposição do barrete cardinalício aos novos cardeais, lembrou-lhes que não são príncipes, e pediu-lhes "lealdade" e "compaixão", também no sentido etimológico da palavra: partilhar as alegrias, as tristezas e as angústias de todos, a começar pelos "descartados", com os quais devem ser samaritanos, e que evitem ser "funcionários". Um desses novos cardeais, Cristóbal López, arcebispo de Rabat, sabe que assim deve ser, ao afirmar: "Os cristãos são todos iguais, o ser bispo ou cardeal não nos torna superiores a ninguém". Na Igreja, não pode haver duas classes: os clérigos e os leigos, pois toda a Igreja é uma Igreja de iguais, ministerial. 

domingo, 14 de julho de 2019

Anselmo Borges - Confissões do Papa Francisco. 3

Valentina Alazraki entrevista o Papa Francisco

Termino a longa e bela entrevista do Papa Francisco à jornalista Valentina Alazraki, de Noticieros Televisa, México. Temas importantes de hoje: a reforma da Igreja, erros cometidos e a confissão, acusação de heresia, o diálogo com o islão, o desejo de ir à China, quanto tempo ainda de pontificado?

2. 15. Francisco e a reforma da Igreja. A jornalista: “Qual é a coisa mais bonita que julga ter feito?” “O mais bonito para mim é, foi e é sempre estar com as pessoas, que queres que te diga? Eu renasço quando vou à praça (Praça de São Pedro), quando vou a uma paróquia. Às prisões..., estar com as pessoas. Sim, sou Papa, sou bispo, fui cardeal..., isto tudo pode cair, mas, por favor, não me tirem o ser padre, cura.” 
Erros? “Erros há sempre. Confesso-me todos os 15 dias, o que significa que cometo erros.” A jornalista: “E são confissões longas ou curtas?”. Francisco: “A curiosidade feminina!, ‘the human touch’! “Como reagiu a essa de o acusarem de herege?” “Com sentido de humor, filha”. A jornalista: “Não lhe dá muita importância?” Resposta: “Não, não, rezo por eles porque estão equivocados, por vezes, pobre gente, alguns são manipulados. Vi quem eram os que assinavam... Não, a sério, sentido de humor e eu diria, ternura, ternura paternal. Quer dizer, isso não me fere minimamente. A mim o que me fere é a hipocrisia, a mentira.” 
A jornalista: “E com a sua reforma tem a sensação de que estamos...” Resposta: “A reforma não é minha. Foram os cardeais que a pediram. Isto é assim, tal qual. As pessoas têm vontade de reformar. O esquema de corte tem de desaparecer. Foram os cardeais que o pediram. Bem, a maioria, graças a Deus.” A jornalista, referindo o caso de Maciel, fundador da Legião de Cristo, observou que o Papa João Paulo II tinha “obstaculizado essas reformas...”. Resposta: “Por vezes, enganaram João Paulo II.” No caso de Maciel e dos Legionários, “Bento XVI foi corajoso. E João Paulo II também. Quanto a João Paulo II, é preciso entender certas atitudes, porque vinha de um mundo fechado, a cortina de ferro, ainda estava vigente o comunismo lá... E havia uma mentalidade defensiva. Temos que compreender bem, ninguém pode duvidar da santidade desse homem e da sua boa vontade. Foi um grande.” 

quinta-feira, 4 de julho de 2019

Uma Igreja que tarda em abrir os olhos às realidades

Flausino Silva

"Francisco voltou a surpreender com a sua franqueza, desta vez ao referir-se ao sistema vaticanista de governo da Igreja Católica, apesar das conhecidas críticas às "doenças da Cúria". 
Segundo o portal Sete Margens, em entrevista à Televisa, quando "Valentina Alazraki lhe pergunta sobre a eventual contradição entre 'uma Igreja em crise e um Papa que goza de popularidade', o Papa Bergoglio responde com uma dura crítica à forma de governo que domina ainda o Vaticano." Chega mesmo a classificar a sede do poder católico-romano como "última corte europeia de uma monarquia absoluta"(7 Margens). 
Ao pensar nesta reflexão de um Papa que todos admiram, mesmo não crentes, pela clarividência e coragem das afirmações, interrogamo-nos acerca do profundo alcance da suas palavras: quererá o Sumo Pontífice significar, com a sua crítica, que eu e a minha família nos comportamos como absolutistas, quando usamos a nossa posição social, os nossos bens, a nossa cultura, para nos impormos aos que dependem de nós, que estão sob a nossa influencia e domínio, submetendo-os à nossa prepotência, ao nosso poderzinho, ao nosso estatuto social?

sexta-feira, 29 de março de 2019

Georgino Rocha: Abraço do Pai acolhe Filho reencontrado



«“O meu filho voltou à vida. Foi reencontrado. Façamos festa”. O símbolo não podia ser mais rico. O rosto de Deus que Jesus anuncia fica bem desenhado. Captemos o seu sentido. Vivamos a sua misericórdia. Deixemo-nos envolver pelo seu abraço de reconciliação sanadora»

A parábola do “filho pródigo” atinge o seu momento mais expressivo no abraço do Pai que, pacientemente esperava o seu regresso. A narração é uma maravilha saída da pena de Lucas. A mensagem é um primor que Rembrandt visualiza de forma magistral. Os protagonistas apresentam traços humanos do rosto de Deus que Jesus insistentemente quer que os seus interlocutores acolham, admirem e apreciem. A Igreja prolonga na história a missão de Jesus e esforça-se por lhe ser fiel e por fazer brilhar em si e nos seus membros a ternura, o calor e a misericórdia que transparecem naquele gesto familiar. Os cristãos ficam constituídos em seus discípulos missionários pelo estilo de vida e pela prática de obras de justiça impregnada de amor de serviço generoso.
Assim o proclama o Papa Francisco que, no passado dia 25, no Santuário de Loreto, na Itália, assinou a exortação pós-sinodal sobre os Jovens e afirma que a preocupação do seu novo texto é ajudar as novas gerações no processo de “escuta da palavra-projeto de Deus”, discernimento e decisão, envolvendo os diversos campos da pastoral da Igreja – juvenil, vocacional e familiar”. E acrescenta: “A família e os jovens não podem ser dois setores paralelos da pastoral das nossas comunidades, mas devem caminhar juntos, porque muitas vezes os jovens são aquilo que uma família lhes deu, no período de crescimento”. Bela e oportuna coincidência!

segunda-feira, 4 de março de 2019

Anselmo Borges: Revolução copernicana na Igreja

Anselmo Borges
1. Foi uma verdadeira revolução copernicana. Com Copérnico, ficámos a saber que não é o Sol que gira à volta da Terra, é a Terra que gira à volta do Sol. Com a Cimeira no Vaticano, de 21 a 24 de Fevereiro passado, para se tomar consciência da monstruosidade da pedofilia na Igreja e pôr-lhe termo, convocada, num gesto inédito, corajoso e histórico, que se impunha, do Papa Francisco, ficámos a saber que, de agora em diante, o centro não continuará a ser ocupado pela Igreja enquanto instituição, mas pelas vítimas, que serão defendidas com toda a seriedade. 
No encerramento, perante os 190 participantes, entre os quais 114 Presidentes das Conferências Episcopais de todo o mundo, membros da Cúria, superiores e superioras gerais de ordens e congregações religiosas, peritos e alguns leigos, Francisco, num discurso histórico, muito bem elaborado e com dados arrepiantes sobre o abuso físico e psicológico de menores e adultos vulneráveis não só dentro da Igreja mas transversalmente na sociedade global, incluindo as famílias e outras instituições (nesta abrangência, as vítimas são muitos milhões), comprometeu-se a que a Igreja “não se cansará de fazer tudo o que é necessário para levar à justiça seja quem for que tenha cometido abusos de tipo sexual” e que nunca “tentará encobrir ou subestimar nenhum caso”. 
Perante o horror da pedofilia, afirmou que ela lhe fazia lembrar “a prática religiosa cruel, difundida no passado em algumas culturas, de oferecer seres humanos (muitas vezes crianças) como sacrifício às divindades nos ritos pagãos”. Perante a “monstruosidade da pedofilia” na Igreja, assegurou: “Quero reafirmar com clareza: se na Igreja se descobrir nem que seja um único caso (que representa em si mesmo uma monstruosidade), esse caso será enfrentado com a máxima seriedade”. Prova inequívoca disso foi, ainda antes da Cimeira, a redução ao estado laical do ex-cardeal norte-americano Theodore McCarrick, e, depois, no passado dia 26, a sanção imposta ao cardeal australiano George Pell, a terceira figura do topo da Igreja, ex-superministro das finanças do Vaticano, condenado por abuso sexual de menores: enquanto decorre o recurso nos tribunais, está suspenso e impedido de contactar, seja de que modo for, com menores. 

domingo, 30 de dezembro de 2018

2019: Uma Igreja com antigos e novos desafios

Bento Domingues

 «Entre mulheres e homens, jovens e adultos, não há falta de vocações nas comunidades católicas para que toda a Igreja responda à sua missão.»

1. Diz-se que este Papa devia estar caladinho acerca de economia e política, para as quais não tem nem competência reconhecida nem mandato divino ou humano. A economia e a política do Estado do Vaticano não têm dimensão para merecerem qualquer relevância a nível mundial. As referências a escândalos financeiros da banca vaticana tiveram muito eco na opinião pública por que manchavam uma instituição que devia dedicar-se à promoção da virtude, da santidade, da justiça, mas nunca à corrupção.
A atribuição da responsabilidade da pedofilia clerical ao actual Pontífice Romano é a cruz que os seus inimigos lhe puseram aos ombros para não terem de se confrontar com as reformas que ele procurou e procura introduzir na Igreja, a todos os níveis.
Outros acusam-no de não enfrentar a questão mais fácil de resolver e a mais urgente: a abertura dos ministérios ordenados a homens casados e a mulheres.

sábado, 29 de dezembro de 2018

Desafios para Francisco

Anselmo Borges
Perante uma das mais graves crises de sempre da Igreja, o desafio maior para Francisco continuará a ser tentar converter a cristãos os católicos, começando pela cúpula: cardeais, bispos, padres, religiosos e religiosas. Essa conversão implicará uma organização eclesial na linha do Evangelho.
O próximo ano será marcado por acontecimentos decisivos para se saber qual o lugar que a história reservará a Francisco: um Papa da continuidade ou o Papa da ruptura que se impõe.

1. Em fevereiro, reunião em Roma com os presidentes das Conferências Episcopais de todo o mundo sobre a pedofilia. Ter-se-á a coragem de tomar medidas que acabem com essa podridão estrutural na Igreja? Vão ser abertos os arquivos para ficar a claro por uma vez tudo o que tem acontecido? E serão devidamente sancionados, colaborando também com a justiça civil, os abusadores e os encobridores? E para a formação dos novos padres: mais presença feminina e testes de maturidade, também com peritos credenciados de saúde mental?

2. Em março, será aprovada a nova Constituição Apostólica sobre a Cúria Romana, governo central da Igreja. Continuará o centralismo ou haverá uma Constituição democrática, de comunhão, com representação de todos, incluindo as mulheres, e das Igrejas locais do mundo, superando o dualismo clero-leigos a substituir pela relação viva: comunidade-ministérios (serviços)?

3. O Sínodo sobre a Amazónia em outubro: ocasião para aumentar a consciência ecológica global e avançar com novos ministérios, incluindo a ordenação de homens casados?

4. Em janeiro, na Jornada Mundial da Juventude no Panamá: o anúncio da próxima Jornada em Portugal em 2022, com o regresso do Papa ao país, constituirá um novo impulso para reanimar a Igreja em Portugal, que parece continuar paralisada?

Anselmo Borges no DN

Padre e professor de Filosofia. Escreve de acordo com a antiga ortografia.

sábado, 25 de agosto de 2018

O equívoco da fé "na" Igreja

Anselmo Borges


1.É de A. Loisy um dos ditos que, desde o seu pronunciamento, no início do século XX, mais animaram o debate teológico: "Jesus anunciou a vinda do Reino de Deus, mas o que veio foi a Igreja." E é um dito decisivo também para a compreensão em profundidade da tragédia da pedofilia por parte do clero.
Quando se recita o credo (a síntese da fé cristã), é necessário estar prevenido contra possíveis alçapões. Vejamos. Diz-se: "Creio em Deus Pai, em Jesus Cristo, no Espírito Santo." Em português também se diz "Creio na Igreja una, santa, católica", como se esta estivesse ao mesmo nível de Deus. Realmente, não pode ser nem é assim. Aliás, o latim faz a distinção essencial, pois diz: "Credo in Deum..."; porém, não diz "Credo in Ecclesiam", mas "Credo Ecclesiam". A diferença essencial está naquele "in": Creio "em" Deus, o que significa: entrego-me confiadamente a Deus, mas não creio "na" Igreja; o que lá está é: em Igreja, isto é, fazendo parte da Igreja como comunidade de todos os baptizados, creio em Deus, em Jesus e espero a vida eterna...
Como habitualmente se coloca tudo no mesmo plano, dizendo "creio na Igreja", é fácil interiorizar a ideia de que se acredita na Igreja enquanto instituição, e instituição divina, com todos os enganos e desastres que se sucedem.

sexta-feira, 15 de junho de 2018

Novos cardeais para um novo papa

Anselmo Borges

«Impõe-se uma educação em todos os domínios para a autonomia e a responsabilidade, pois frequentemente o que se deu foi a infantilização das pessoas»


Francisco sabe que não é eterno e precisa de preparar a sucessão de tal modo que não haja volta atrás nas reformas que iniciou, pelo contrário, que continuem e se aprofundem, para que o Evangelho seja o que é e deve ser, por palavras e obras: notícia boa e felicitante para todos.
Tudo indica que este é o intuito da criação de novos cardeais no próximo dia 29. Então, os cardeais eleitores passarão a ser 125, dos quais 59 criados por Francisco, 46 por Bento XVI e 18 por João Paulo II. Como observa Jesús Bastante, os cardeais "franciscanos" serão quase metade dos participantes num futuro conclave, mas, dentro de um ano, uma vez que mais dez deixarão de ser eleitores, por causa da idade, a maioria será absoluta. Por outro lado, o Colégio Cardinalício é cada vez mais universal.
Entre os novos cardeais, está o amigo e antigo colega de Universidade, António Marto, bispo de Leiria-Fátima, claramente "franciscano" e favorável à reforma da Igreja: "A reforma é necessária e é para levar para a frente", diz. Uma profunda e gigantesca reforma, digo eu. Em duas vertentes, que se interpenetram: a da conversão pessoal e a institucional.

domingo, 13 de maio de 2018

A Igreja não é de gente pasmada

Frei Bento Domingues

1. A festa litúrgica da Ascensão não é a celebração da passagem de Jesus à reforma, nem a sua fuga para o céu, seu lugar de repouso junto de Deus, onde aguardaria, no eterno descanso, os discípulos que fossem aparecendo.
A este respeito, as narrativas dos Evangelhos e dos Actos dos Apóstolos, embora não sejam contraditórias, ajustam-se com alguma dificuldade. Frutos de várias estratégias, e em contextos diferentes, tentam interpretar a significação do itinerário terrestre de Jesus para comunidades que não O conheceram. Parecem um retorno ao passado - “naquele tempo” -, mas por causa do presente. As promessas paradisíacas não são evasões deste vale de lágrimas.
São textos que procuram, por um lado, mostrar que o tempo da visibilidade da figura histórica de Jesus está encerrado; já não há ninguém para dizer eu vi! Por outro, todas as narrativas, discursos e exortações insistem na sua invisível presença. Como disse o Ressuscitado ao empirista Tomé: felizes os que crêem sem ver.
Nada disto impediu que, muito cedo, tenham surgido na Igreja duas tendências que não deveriam ser dissociadas, mas complementares: uma insiste mais na dimensão contemplativa, na comunhão mística com Cristo, e outra que não aceita a espiritualidade de gente consolada e pasmada a olhar para o céu, quando há tanto que fazer pela alegria pascal, transformante da sociedade. 

quarta-feira, 25 de abril de 2018

Como ficou a Igreja católica após o 25 de Abril

A opinião de Luís Salgado de Matos



«A Igreja, perante o novo ambiente social e político posterior ao 25 de Abril [revolução ocorrida em 1974], procurou acima de tudo a unidade dos crentes e seguiu uma estratégia defensiva e prudente. Conservou sempre a sua capacidade de enquadramento, adaptando-se com agilidade ao novo ambiente social. Com esta base, enfrentou um novo Estado, potencialmente hostil.
Face à contestação interna, não a combateu frontalmente e cedeu o bastante para isolar os seus autores da maioria dos católicos. Ultrapassado o estigma da culpa na manutenção da ditadura do Estado Novo, a Igreja reforçou as suas estruturas de participação interna. Nos momentos de crise, atenuou o seu perfil nacional em benefício do diocesano, mais flexível. O Santuário de Fátima continuou a ser um polo de irradiação espiritual, tocando pessoalmente milhões de portugueses.
Surgiram em diversos momentos divergências táticas no interior da Igreja institucional. Uns favoreciam o partido e o sindicato católico; outros opunham-se-lhe e vieram a vencer. Alguns queriam um nítido pedido de perdão pelos pecados da Igreja; outros recusavam-no; veio a ser adotada uma solução intermédia. Alguns fizeram as manifestações de rua de apoio ao episcopado no caso da Rádio Renascença; outros opuseram-se-lhe, sem questionarem a sua legitimidade. Estas divergências, porém, nunca impediram que fosse mantida a unidade de ação - interna à Igreja tanto como nas relações com a política.»

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quinta-feira, 12 de abril de 2018

REVISTA “IGREJA AVEIRENSE”



“IGREJA AVEIRENSE”, editada pela Comissão Diocesana da Cultura (CDC), publica-se semestralmente há XIII anos e o mais recente número corresponde ao período de julho a dezembro de 2017. Trata.se e uma publicação de interesse histórico, cultural e pastoral, estando aberta a todos os que tenham curiosidade, gosto pela formação ou se dediquem ao estudo da vida da Diocese de Aveiro.
Como membro da CDC, até à entrada de D. António Moiteiro, fiz parte da criação e edição desta revista, que muito prezo, embora lamente que não tenha a repercussão e a leitura que merece, já que o passado e o presente são, notoriamente, os alicerces do futuro.
Desde o número um, a revista “IGREJA AVEIRENSE” regista nas suas páginas todos os documentos do nosso bispo, nomeadamente, mensagens e comentários, cartas e notas pastorais, visitas pastorais e conferências de imprensa, homilias e decretos relacionados com o semestre a que diz respeito. Mas não se fica apenas por aí, pois a vida da Igreja não se circunscreve apenas ao que diz e escreve D. António Moiteiro. Há, portanto, capítulos para a Vigararia Geral, Pastoral, Serviço Diocesanos, Clero, Arciprestados e Paróquias, Instituições de Ensino e Cultura, Movimentos e obras de Apostolado, Vida Consagrada, Publicações, Efemérides, Em Memória de…, Breves e Pessoa Notável, neste número, D. António Francisco dos Santos.
Como desde o primeiro número da revista, a Apresentação foi escrita por Georgino Rocha, que foi presidente da CDC, sendo atualmente assistente. E nela sublinha que a «“Igreja Aveirense” faz memória reconhecida de programas e relatos deste labor pastoral como suporte humano organizado ao agir livre do Espírito Santo, o grande responsável da missão eclesial e agente de renovação da “face da terra”».
Citando Bruno Forte, bispo teólogo, Georgino Rocha salienta que «Será a caridade que nos permitirá valorizar o bem presente em todo o fragmento, sem renunciar ao horizonte unificador do amor que salva, fazendo-nos reconhecer o Evangelho nos sinais dos tempos, nos fragmentos da vida e da história comum, no serviço à pessoa humana e ao bem comum».
“IGREJA AVEIRENSE” apresenta-se com 267 páginas, muitas delas ilustradas a preto e branco. O diretor é Georgino Rocha e a redação é constituída por Luís Manuel Pereira da Silva, Georgino Rocha e Carlos Alberto Lourenço Nunes. A administração, composição e paginação são de Carlos Alberto Lourenço Nunes.

Fernando Martins

terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

UMA COISA COMOVEDORA E INTERESSANTE

A Igreja dos caminhos 
que se bifurcam

«Uma das coisas mais comovedoras em Portugal é o zelo dos indiferentes e dos ateus pela Igreja Católica. Não vão à missa, “não acreditam em nada daquilo”, mas ei-los sempre cheios de opiniões sobre o que devia ser o catolicismo. Cento e dezassete anos depois da separação, a Igreja continua a ser discutida como se fosse o equivalente religioso do Serviço Nacional de Saúde.»

Rui Ramos, no OBSERVADOR 

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Igreja “importa” padres para chegar a todas as paróquias

Reportagem de Natália Faria 
publicada no PÚBLICO de ontem

«Vêm da Ucrânia, Brasil, Angola, Itália, mas também Polónia, Espanha. À míngua de padres, a Igreja Católica entregou paróquias a dezenas de estrangeiros. Alguns, casados e com filhos. Trata-se — acusam os mais críticos — de mero remendo para um problema que reclama a ordenação de mulheres e homens casados.»

Vigário-geral da diocese de Aveiro


“Fujo à ideia do sermão”

«Na diocese de Aveiro, dividida em 101 paróquias, contam-se cinco padres estrangeiros, nas contas do vigário-geral, o padre Manuel Joaquim da Rocha. “Chegámos a ter uma irmã religiosa que fazia a celebração da palavra numa paróquia, mas agora não. O que temos agora são diáconos responsáveis pela celebração da palavra nalgumas paróquias.” Em tudo iguais a uma missa, as celebrações da palavra distinguem-se pelo facto de não serem evocadas as palavras de Jesus na última ceia nem serem consagrados o pão e o vinho (são-no previamente por um sacerdote). Os diáconos permanentes podem ser casados e ter filhos e podem baptizar, presidir a casamentos, baptizados ou funerais. Não podem é dar a santa unção, ouvir os fiéis em confissão nem chamar missa à missa que efectivamente celebram. Para serem reconhecidos enquanto tal pela Igreja, têm de ter mais de 35 anos, uma vida estável na comunidade em que se inserem e passar por uma formação que os habilita a exercer aquelas funções.»

NOTA: Texto transcrito do jornal Público. Foto do meu arquivo. 

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quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

CUFC — O mesmo ambiente acolhedor

"Criamos pontes, 
estreitamos laços. 
Procuramos novos desafios, 
concretizamos ideias contigo neste campus." 



Já não ia ao CUFC (Centro Universitário Fé e Cultura) há muito. Houve tempo em que por ali andava a colaborar com quem dirigia aquele espaço de apoio espiritual, mas não só, aos estudantes da Universidade de Aveiro, mesmo em frente, com diversos blocos para as mais variadas opções académicas. E o CUFC promovia habitualmente, em especial durante o tempo letivo, atividades muito importantes para quem, para além da formação curricular universitária, precisa de se enriquecer sob o ponto de espiritual, humanista e mesmo religioso, que o ser humano, consciente da sua realização pessoal, não pode prescindir de todas as competências que o ajudem a ser mais útil à sociedade. 
Ontem fui para participar no lançamento do mais recente livro do P.e Georgino Rocha — Rostos de Misericórdia – Estilos de vida a irradiar —, sobre o qual me debruçarei um dia deste, e no CUFC tive a oportunidade de ver e de conversas com pessoas que não via há bastante tempo. Foi muito bom, quer a apresentação do livro quer o encontro com as pessoas. 
Antes do motivo que lá me levou, procurei recordar tempos ali vividos e vi o mesmo ambiente acolhedor com sorrisos cativantes, os cartazes e demais informações bem visíveis e desafiantes, o café servido com simpatia, as mesas decoradas com frases apelativa e as pessoas, sempre as pessoas, vocacionadas para servir. 
Num folheto, afixado num expositor, pude ler o que se faz no CUFC: "Criamos pontes, estreitamos laços. Procuramos novos desafios, concretizamos ideias contigo neste campus." 
Passe por lá. As portas estão normalmente abertas.

Fernando Marins

sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

O CANCRO DA IGREJA



Anselmo Borges 

1. "O Papa Francisco é hoje um dos homens mais odiados no mundo." Esta afirmação recente pertence a Andrew Brown, no The Guardian, que acrescenta: "E quem mais o odeia não são ateus, protestantes ou muçulmanos, mas alguns dos seus próprios seguidores."
Pessoalmente, não sei se trata mesmo de ódio, mas tenho a convicção firme de que Francisco tem na Igreja muitos opositores e inimigos, furiosos por causa das reformas que está a operar e por verem os seus interesses, incluindo o clericalismo e o carreirismo, ameaçados. Sobretudo na Cúria Romana, que, como já aqui escrevi, quando se olha de modo atento para a história, foi fazendo mais ateus do que Marx, Nietzsche e Freud juntos.
Mas, por outro lado, Francisco é hoje um dos líderes mundiais mais estimados, amados e influentes do mundo. A simplicidade e a humildade, a simpatia e o afecto, reais e genuínos, que manifesta pelas pessoas, a começar pelos mais débeis, fragilizados, abandonados, o seu amor pelas periferias geográficas e existenciais, tornaram-no uma figura popular em toda a parte.