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quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

Deus criou-nos livres

Só há liberdade humana neste pressuposto: o pressuposto de que podemos negar Deus. Ele não nos criou para sermos servos acríticos e geneticamente impossibilitados de negar Deus, não. Ele não nos criou como robôs incapazes de negar o dono. É esta a dimensão do seu imenso amor por nós: criou-nos livres e, por isso, Ele submete-se, desde o início, à possibilidade de ser negado pelas suas criaturas.

Henrique Raposo
Rádio Renascença,
26-11-2021

quinta-feira, 25 de novembro de 2021

Comer outras coisas

«A produção de gado em massa, sobretudo bovino, tem consequências dramáticas na ecologia: a desflorestação e a emissão de gases com efeito de estufa. Como corrigir isto? Três mudanças são relativamente fáceis de fazer. Em primeiro lugar, como sugeri há dias noutro espaço, podíamos voltar a introduzir o ritual religioso do jejum em relação à carne à sexta-feira, pelo menos. Teologia rima sempre com ecologia. Em segundo lugar, podemos e devemos comer outro tipo de carne, coelho, cabra, ovelha, peru. Em terceiro lugar, claro que não podemos simplesmente substituir a morte industrial de vacas pela morte industrial de coelhos. A questão de fundo, portanto, passa por sabermos comer outras coisas. Não temos de comer carne todos os dias, há feijão, há cogumelos, há ovos, há mil e uma coisas.»

 Henrique Raposo Expresso, 
22-11-2021

Nota: Citação extraída do "Correio do Vouga"

terça-feira, 22 de agosto de 2017

Henrique Raposo — E se a barriga de aluguer for um útero artificial?


Não, não é um delírio à Frank Herbert ou à Philip Dick. O útero artificial deixou a estratosfera da ficção científica e aterrou na realidade. Uma gestação mecanizada e sem a necessidade do corpo da mulher já não é uma impossibilidade. Já estão a ser feitas experiências com bezerros criados em úteros artificiais que se assemelham às máquinas que suportam as pessoas em coma: bombas mecânicas, tubos e seringas bombeiam ar e injectam os nutrientes que permitem o crescimento do feto.

Mas a pergunta fundamental não está no campo da possibilidade, está no campo da legitimidade. A questão “é possível criar um ser humano num útero artificial?” é insignificante ao pé do dilema “é legítimo criar um ser humano num útero artificial?”. A ciência não se legitima a si própria.
Se servir para salvar ou proteger de forma mais tranquila a vida dos chamados bebés prematuros, esta máquina pode ser uma dádiva, um avanço notável da medicina. Contudo, se for usada como barriga de aluguer dos caprichos dos Ronaldos e das Kardashians, esta máquina pode ser uma porta para um inferno pós-humano onde o ser humano passa a ser uma mercadoria como outra qualquer.

Neste cenário, o útero artificial deixa de ser medicina e passa a ser distopia, deixa de ser um instrumento que auxilia uma vida já criada (o bebé prematuro) e passa a ser um portal para a criação de seres humanos ex nihilo. Ou seja, estamos à beira de um pesadelo ético (o negócio das barrigas de aluguer torna-se ainda mais fácil porque a “mãe” passa a ser uma relíquia), de um pesadelo político (um útero mecânico é o sonho molhado dos nazis) e de um pesadelo criminal - se o comércio de seres humanos e de órgãos já é uma realidade, como será no dia em que as máfias poderão simplesmente criar seres humanos para vender ou para servirem de estufas de órgãos humanos para colher e vender?

Sem grande alarme colectivo, estamos a caminhar para uma sociedade em que o ser humano pode ser comercializado ao abrigo das leis do mercado. O que não deixa de ser curioso: a resistência ao comércio de bens inertes (vulgo “capitalismo”) coabita lado a lado com a indiferença perante o comércio de seres humanos. Mas, já que invoco o conceito de “ser humano”, convém prosseguir com uma pergunta: será que um bebé criado ex nihilo numa máquina ainda pode ser considerado um “ser humano”? Uma pessoa que entra neste mundo através de uma máquina e não através de outro ser humano ainda pode ser considerado “ser humano”?

Até Jesus precisou de Maria para entrar neste mundo. O Salvador não apareceu do nada num portal de metal à ficção científica; Ele precisou de Maria, portal humano. Julgo que até os não crentes percebem este ponto de forma intuitiva. E também não é preciso acreditar no conceito cristão de “alma” para perceber que nós não somos apenas matéria, não somos compostos apenas de carne e fluidos. Durante a vida intra-uterina, a nossa personalidade começa a ser formada através da interacção com a nossa mãe. No vácuo da máquina, que tipo personalidade pode ser desenvolvida?

Este debate devia estar a ser feito, mas o tema tem sido desprezado. Porquê? A meu ver, a razão para o silêncio é a seguinte: o útero artificial desarruma os termos actuais do debate do aborto. Os defensores da “IVG” tentam tudo para desumanizar o nascituro, tentam reduzir ou menosprezar a vida intra-uterina, para assim retirar a carga odiosa do acto. Ora, o útero artificial vem mostrar é que “aquilo” não é um “mero amontoado de células”. Moral da história? Paradoxalmente, o útero artificial vem mostrar que os críticos do aborto sempre tiveram razão. O problema é que abre uma nova caixa de Pandora.

Li na Renascença 

sábado, 24 de junho de 2017

Pergunta Henrique Raposo: Como é que Deus permite isto?


«Como é que se articula a evidente imperfeição da cidade dos homens com a ideia de um Deus misericordioso? Ou seja, como é que Deus permite desgraças como a de Pedrógão Grande? Se Deus nos ama, porque é que permite que uma família de quatro morra sufocada e queimada num Renault ou num Opel numa estrada à vinda da praia? Como é que Deus permite uma aflição assim? Como é que Deus permite que um pai veja o seu bebé morrer queimado? Como é que Deus permite que o corpo de um bebé se funda com o alcatrão? Como? É o drama de Job e Eclesiastes, dois dos grandes romances da Bíblia.»

Para ler tudo aqui 

terça-feira, 4 de março de 2014

As mães solteiras do Papa

Crónica de Henrique Raposo 


«Este Papa não é um panzer intelectual, não tem a profundidade teológica de Ratzinger, nunca terá dez lombadas na estante cá de casa. Mas o argentino sorridente tem outra qualidade. É um almocreve que anda na realidade, é um sujeito carnal que anda cá em baixo junto da carne pecadora. Eu gosto disso. Andar à beirinha do pecador devia ser o pão com manteiga do catolicismo, mas não é. Há demasiada gente a fugir da imperfeição quando o caminho certo é o inverso, sim, o caminho católico é feito na direcção daqueles que estão à margem, daqueles que não tiveram a chance de serem perfeitinhos. O caminho não passa por ficar sentado numa virtude fechada, na posse só de alguns, uma virtude que se alimenta do ódio em relação ao exterior, uma raiva contra certas tribos de pecadores.»